Caso RCTV: Golpe de Estado II, o Retorno

* Freddy Fernandez é jornalista, escritor e diretor da Agência Bolivariana de Notícias (www.abn.info.ve)

 A estratégia é muito clara: a oposição venezuelana e os aparatos de inteligência do governo dos Estados Unidos estão montando um programa de televisão para comover a OEA. Os ensaios já foram realizados e se parecem com uma mobilização estudantil. A Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos ocorre a partir do próximo domingo (3) e termina na quarta, dia 5 de junho. A oposição venezuelana, vestida de estudante, convocou mobilizações durante os dias 3, 4 e 5 de junho de 2007.  

Durante a semana passada assistimos apenas aos ensaios. Os atores estão cada vez mais identificados com seus personagens. Neste momento, o título da obra é “Repressão violenta na Venezuela”.  

A trama funciona graças a mecanismos muito sensíveis. Os personagens são jovens que o público deve identificar como “estudantes”. É melhor não mencionar as instituições onde eles estudam, ainda que em algumas ocasiões não haja outra opção senão identificá-los como provenientes da Universidade Católica, da Santa Maria, “San Ignacio de Loyola”, ou seja, de instituições educativas privadas e privilegiadas.  

Eles são os bons. Os maus são os policiais. Para os bons, as palavras chaves são “espontânea” e “pacífica”. Essas palavras são repetidas insistentemente pelo canal venezuelano Globovisión, as emissoras privadas de rádio e pelo canal estadunidense CNN. Para os maus, as palavras chaves, com as quais devem ser identificados, são “brutal”, “repressão”, “armas” e “violenta”. 

O cenário é uma rua venezuelana por onde avança uma manifestação “estudantil” “espontânea e pacífica” que só é interrompida por uma barricada policial. O fato é transmitido ao vivo com várias unidades móveis de televisão. Quando o encontro ocorre, os “dirigentes estudantis” explicam a uma câmera de televisão que eles estão exercendo o seu direito a protestar mas “estão sendo impedidos de realizar esse direito em função da presença policial”.  

Enquanto o dirigente faz sua “declaração”, reiterando o caráter “pacífico” da mobilização, ali perto, a polícia começa a “reprimir brutalmente e sem justificação”. Durante os dias do encontro da OEA, as câmeras vão mostrar a polícia atuando. O “sonho” estaria plenamente realizado se essas mesmas câmeras puderem “captar” a utilização de armas de fogo. Tudo será transmitido ao vivo. As câmeras serão tão cuidadosas que nunca mostrarão nenhuma ação violenta por parte dos manifestantes.  

Será uma repetição do comportamento da televisão privada na Venezuela desde a última semana de maio. Somente a Venezuelana de Televisão, canal do Estado venezuelano, mostrou os “estudantes” lançando pedras e outros objetos, e identificou sujeitos violentos amplamente conhecidos em nosso país. As câmeras da Globovisión não. Elas só obtinham imagens de manifestantes ajoelhados, com as mãos ao alto, nos quais a polícia atirava água desde carros-pipa.  

Com toda probabilidade, mas omitindo as ações mais violentas dos manifestantes, as cenas vão se repetir na CNN e na Globovisión, de segunda a quarta. Os estudantes “desarmados, em uma manifestação “espontânea e pacífica” sofrerão “a arremetida brutal da repressão policial” sem que sejamos informados das causas. No Panamá, durante a Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos, algum representante do Perú, Costa Rica ou El Salvador, pedirá a palavra para solicitar que seja discutida, em caráter de  urgência, a situação da Venezuela.O noticiário terá sido visto por todos. As consultas serão difíceis e se tomará uma decisão contra a Venezuela. Tudo está montado numa jogada magistral dos Estados Unidos.  

É por isso que os venezuelanos não compreendem com facilidade a simbologia da mobilização “estudantil”. A bandeira invertida, de acordo com um enlatado de Hollywood, é usada pela marinha dos Estados como sinal de emergência, como um S.O.S. Se trata, pois, de uma solicitação de intervenção. As mãos para cima, de joelhos, como se estivéssemos diante de um grupo rendido e desarmado que  está sendo maltratado, funciona como elemento de ênfase do suplício por uma intervenção.  

Na TV, os manifestantes estarão vestido com roupas brancas, em que se poderá ler a frase de Simón Bolivar: “Maldito seja o soldado que dispara contra o seu povo”. As mensagens não são para os venezuelanos, são para a comunidade internacional.  

O filme já conta com quase tudo: locações, adereços, iluminação, câmeras, atores e atrizes. O roteiro parece sólido e repete a história de 11 de abril de 2002. Os espectadores podem eleger o título entre “A rebelião de Maio” ou “O Golpe de Estado II”.  

O pior é que os mortos, se houver, não morrerão apenas na televisão.

 

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