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#ComunicaDF: um passo por políticas públicas de comunicação

No último sábado (18), a sociedade civil e o Governo do Distrito Federal deram o primeiro passo rumo à concretização de políticas locais de comunicação.  As cerca de 400 participantes do #ComunicaDF – Seminário de Comunicação do Distrito Federal – aprovaram 12 prioridades de políticas públicas para atender uma demanda histórica da capital do País.

O compromisso, já na abertura, do governador Agnelo Queiroz em criar o Conselho Distrital de Comunicação Social e iniciar as discussões para a implementação de uma TV pública do DF, demandas apresentadas como prioritárias pelos movimentos sociais, confirmam a força de mobilização da sociedade em busca de uma comunicação democrática.

Luta que teve seu ápice na 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) em 2009, quando a população do Distrito Federal participou ativamente da construção de propostas locais e nacional. E que se desdobrou na construção da carta com 10 pontos "Pela democracia das comunicações no DF", entregue ao grupo de transição do recém-eleito governador Agnelo.

Já em 2011, entidades da sociedade civil iniciaram uma articulação para sensibilizar o governo para a necessidade de implementar tais medidas. O Sindicato dos Jornalistas, dos Radialistas, dos Trabalhadores em Telecomunicação, o Intervozes, o Movimento Negro Unificado, a Comissão dos Jornalistas pela Igualdade Racial, a Associação Brasileira de Radiofusão Comunitárias, a Frente Nacional pela Valorização das TVs do Campo Público, a Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social e o Laboratório de Políticas de Comunicação da UnB estiveram a frente desta iniciativa.

A partir de um diálogo envolvendo a Secretaria de Comunicação, de Cultura, de Publicidade, de Educação, de Governo e da Casa Civil, se construiu esse importante seminário, com objetivo de uma construção democrática da política de comunicação.

Das 12 prioridades aprovadas, vale ressaltar, além da criação do Conselho de Comunicação e de uma nova estrutura para comunicação pública do DF, as propostas aprovadas criação de um fundo de apoio à comunicação pública e popular, o investimento em infraestrutura estatal para a universalização da banda larga, a formação de centros públicos de formação e produção de conteúdo e a implantação de práticas para promoção da diversidade e da pluralidade na comunicação distrital, entre outros. (Confira aqui as propostas aprovadas)

Todo este esforço de construção, após mais de um ano e meio de articulação entre a sociedade e o governo, traz otimismo para a implementação de políticas de Estado que reconheçam a comunicação como um direito de todas e todos.

O próximo passo da luta é a concretização das propostas acordadas no #ComunicaDF. Mais do que aguardar pela ação do executivo, a sociedade deve é participar ativamente dos processos de elaboração, implementação e monitoramento para a plena execução destas políticas.

É hora do Governo do DF caminhar conjutamente com os interesses sociais, assumindo uma postura de vanguarda no Estado brasileiro, priorizando a comunicação social com pauta essencial pra promoção da cidadania do povo.

Gésio Passos é membro da Coordenação Executiva do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Socia

O Conselho do Sarney toma posse

A posse do Conselho de Comunicação Social (CCS), nesta quarta-feira, dia 09 de agosto, foi numa sala de uns 100 metros quadrados da presidência do Senado. Metade do espaço era reservado para as cadeiras dos 26 conselheiros titulares e suplentes, além de empresários e o senador Fernando Collor de Melo, que viria alternar na solenidade suas conhecidas expressões faciais compenetradas com sorrisos discretos. A mesa onde o presidente do Senado José Sarney conduziria a primeira sessão do órgão, depois de seis anos parado, levava outros dois terços da área. Já os muitos profissionais de televisão e seus respectivos equipamentos ficaram com toda a parte ao fundo. Nos corredores da sala apinhavam-se umas 25 pessoas, entre familiares, jornalistas, membros do Conselho de Comunicação da Bahia, e o presidente da EBC, Nelson Breve.

Já somavam-se 100 pessoas no auditório, e uma funcionária repetia insistentemente: “Deixa espaço só para o Marco Maia passar”. Ao chegar o presidente da Câmara dos Deputados, abriram-se os trabalhos, e coube a ele o primeiro discurso. A saudação inicial foi para o presidente da OAB, Ophir Cavalcante, o mesmo que se pronunciou contrário a instalação dos Conselhos estaduais. Flávio Lara Rezende, diretor da Associação Brasileira de Radiodifusores (ABRA), o segundo. Seguiram-se os cumprimentos com aqueles que se retiraram da I Conferência Nacional de Comunicação (Confecom): Ricardo Pedreira da Associação Nacional de Jornais (ANJ); a Globo e a editora Abril foram as únicas empresas mencionadas com distinção na solenidade.

Quanto as atribuições e objetivos do CCS, o gaúcho Marco Maia (PT) foi sucinto. Lembrou da regulamentação na Lei 8389 de 1991, e recebeu como resposta o sorriso do presidente da República na época, mesmo sem ser mencionado. Depois citou a responsabilidade de orientar e colaborar com o Congresso e a democratização das comunicações, além de temas como utilização de veículos, as concessões e a programação. Arriscou dar uma alfinetada no colega: “Demoramos um pouco [para empossar], né Sarney?!” Em seguida amaciou com uma justificativa: “Devido a importância de representar a integralidade da sociedade brasileira”. Talvez constrangido pela pequena ousadia, Maia voltou a nomear os setores empresariais envolvidos no CCS, e ao lembrar das organizações sociais não discriminou nenhum sindicato se quer, nem mesmo o presidido pelo seu conterrâneo, Celso Schroder (FENAJ), que estava a sua frente, com um adesivo da PEC do Diploma, a espera de ser empossado. Ao final Maia rasgou elogios e agradecimentos a Sarney: “Ele foi entusiasta deste Conselho. Me ligava quase toda semana para constituí-lo”

José Sarney (PMDB) abriu sua exposição com retribuições profundas ao colega de Congresso: “Nunca tive uma afinidade tão grande com um presidente da Câmara. Foi um braço direito no processo”. Marco Maia foi tomado por um semblante de emoção e acariciou o colega, que começou a ler as atribuições constitucionais até reforçar as anedotas sobre sua imortalidade, ao lembrar das dificuldades e lideranças envolvidas na formulação da Constituição de 1823. Sarney também mencionou os mecanismos de censura à imprensa via poder dita dorial, econômico e publicitário, e disse serem coisas do passado: “Tudo isso acabou em 1985, quando assumi, em nome de Tancredo Neves, a Presidência da República”. Nesse momento um jornalista da EBC reclamava do lado de fora por não poder acompanhar a sessão: “Tenho uma matéria gigantesca para fazer!”.

A partir de então foi iniciada a parte de assinatura de cada um dos integrantes. O representante das empesas de rádio, Walter Ceneniva (ABRA), largou o celular e foi o primeiro a receber as honras. Collor voltou a sorrir. Ao chegar no representante dos radialistas, José Nascimento, foi quebrado o protocolo, ao mencionar a presença de dois dos membros do Conselho de Comunicação da Bahia. A sala foi tomada por um frisson, e até Collor realçou suas expressões de seriedade.

Passada essa fase, foi a vez da eleição para a presidência do Conselho. Arcebispo Dom Orani João Tempesta da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) foi escolhido por unanimidade, o mesmo se deu com seu vice, Fernando César Mesquita, ex porta-voz de Sarney enquanto presidente da República, e atualmente na  Secom do Senado. Aclamados pelo público, Sarney ficou descontraído: “Voltamos aos gregos que elegiam por palmas”. Ainda deu tempo do presidente do Senado pular alguns séculos e demonstrar seu conhecimento a cerca da lógica que rege o funcionamento das instituições nacionais. Antes de assinar os últimos papéis e ouvir as palavras de Dom Orani, brincou mais uma vez: “Herdamos dos portugueses a burocracia”.

*A viagem para participar da posse foi custeada pelo Conselho Estadual de Comunicação da Bahia.

Pedro Caribé é membro do Intervozes e um dos representantes da sociedade civil no Conselho Estadual de Comunicação da Bahia

Sociedade descartada

Você sabia que a tão prometida consulta pública para a construção do novo marco regulatório da comunicação eletrônica prevista para o primeiro semestre deste ano será mais uma vez adiada e provavelmente lançada depois das eleições de outubro?  A proposta elaborada pelo Minicom já está, inclusive, fechada. No entanto, apesar das inúmeras cobranças dos movimentos sociais, nem eles, nem a maior parte dos cidadãos brasileiros afetados diretamente por esta regulamentação sabem qual é ela. Mas um grupo restrito de “especialistas” convidados pelo Ministério, já sabe.

A informação, divulgada no dia 27 de julho numa publicação especializada em telecomunicações que participou da apresentação, assegura que o tão cobrado e aguardado marco regulatório das comunicações está pronto. Lamentavelmente, não é a primeira vez que o governo privilegia setores na divulgação de informações importantes que, por sua própria natureza, deveriam ser tornadas públicas imediatamente.

O Instituto Telecom considera esse fato gravíssimo. Desde o final do governo Lula entidades e representantes da sociedade civil exigem, por meio de ofícios, manifestações na rede e protestos, a divulgação do documento e a abertura de consulta pública. A proposta, uma das principais resoluções da primeira Conferência Nacional de Comunicação realizada em 2009, tem por meta adequar as regras existentes para o setor à atual realidade da comunicação digital e meios convergentes.

A lei brasileira está muito atrasada em relação a países desenvolvidos e, salvo as diferenças e conflitos de interesses específicos, já é realidade em países da América Latina como Venezuela (2000), Argentina (2009) e Bolívia (2011) onde foram aprovadas normas para regulamentar a atividade de comunicação.

Divulgado de forma não oficial, o documento parece ser organizado em cinco partes: Princípios, Direitos do Cidadão, Arranjo Institucional das Comunicações, Organização da Prestação dos Serviços e Ordenamento Econômico.

Nos princípios, entre outros, estão a defesa da ampla liberdade de expressão, proibindo a interferência do poder público na atividade editorial dos veículos de mídia; a preservação da língua e da cultura nacional; estímulo à programação e à produção independente e regional; a promoção da diversidade de fontes e de distribuição de bens, e serviços culturais que incentivem a livre circulação de conteúdo. Já na parte dos direitos, a garantia de inviolabilidade da comunicação do cidadão; o acesso aos serviços de comunicação eletrônica com qualidade e regularidade, em todo território nacional; liberdade de escolha da prestadora de serviço; proteção de sua privacidade, honra e imagem pública de atos que violem os direitos humanos e dignidade da pessoa por parte dos serviços de comunicação eletrônica.

Outro dado importante divulgado na matéria é o adiamento da consulta do novo marco, por conta das eleições municipais de outubro. A justificativa é de que, neste momento de disputa eleitoral entre os partidos, "não há ambiente para um debate dessa importância”. Mais uma vez, a lógica do interesse coletivo é invertida e o governo e Congresso se ausentam do papel de mediador entre sociedade e mercado na busca pela solução democrática.

Para o Instituto Telecom, já passou da hora de discutir as comunicações e telecomunicações brasileiras no contexto da convergência. A sociedade deve, e quer, sim, saber o que pensam os candidatos e futuros políticos e governantes sobre o novo marco regulatório das comunicações. Assim como tem que estar a par do que o Minicom vem planejando para as comunicações. Não dá para aceitar uma política de exclusividade de informações de interesse público, principalmente quando o assunto é uma legislação capaz de defender o direito à comunicação. O governo tem que ser o primeiro a agir de acordo com o que defende o marco: meios de comunicação regulados de forma equânime, pública e transparente.

Anatel ocupada, celulares fora de área

A atitude da Anatel de suspender a venda de chips de uma operadora por estado fez muita gente pensar que a agência tinha finalmente se colocado ao lado dos consumidores. É verdade que era necessário dar um freio de arrumação na prática das empresas de vender mais capacidade do que têm a oferecer, mas uma análise rápida mostra que a grande responsável pela situação ter chegado aonde chegou é a própria Anatel. E há fatos pouco comentados que ajudam a entender melhor a história.

Pouco antes de a Anatel adotar a medida contra as operadoras, o Tribunal de Contas da União havia votado um relatório que mostrava que a Anatel não cumpriu suas tarefas de fiscalização do serviço de celulares. Apenas um terço das determinações e recomendações feitas pelo TCU em 2005 e 2006 foram cumpridas. O TCU exigiu da agência o mesmo que a Anatel viria a exigir das empresas: apresentar um plano de trabalho em 30 dias com cronograma para adoção de medidas que a façam cumprir o que pede o tribunal. Irônico, não? Sem contar que o próprio TCU já havia demonstrado que a apenas 4% das multas aplicadas pela Anatel foram efetivamente pagas pelas empresas. O pior índice entre todas as agências.

Mais irônico é constatar que a Anatel suspendeu as empresas baseada nas reclamações dos clientes, porque se dependesse dos parâmetros de qualidade estabelecidos por ela, não faria isso. Na maioria dos casos, eles vinham sendo cumpridos. É verdade que já há novos parâmetros aprovados ano passado por pressão da sociedade civil (que entram em vigor outubro), mas ficou provado que os atuais não servem para muita coisa.

Também é curioso notar que a agência e o Ministério das Comunicações tiveram que modificar o discurso ufanista que vinham fazendo em relação ao crescimento no número de acessos móveis em serviço. O Brasil tem hoje mais de 250 milhões de linhas ativas, mas isso é na verdade um reflexo dos problemas do país nesta área. Esse número é tão alto porque boa parte das pessoas têm mais de um chip, para fugir do alto preço de ligações entre operadoras diferentes.

Dados da União Internacional de Telecomunicações analisando preços de 2010 mostram que o Brasil é 125º entre 165 países numa comparação da cesta de preços de telefonia móvel. O principal motivo dessa péssima colocação é a cara taxa de interconexão entre redes de diferentes operadoras. Este é outro ponto sobre o qual a Anatel poderia e deveria agir, mas pouco fez.

As operadoras, aliás, jogaram toda a responsabilidade dos problemas do serviço nas dificuldades que têm de instalar antenas, por conta de limites das legislações municipais. Embora o problema de fato exista, essa desculpa mostra que as empresas sabiam muito bem que estavam operando acima de sua capacidade. E seguiam, mesmo assim, criando promoções atrativas para fisgar novos clientes.

Por fim, um problema estrutural. A Anatel optou por manter o serviço móvel num regime de prestação que não permite que a agência ou o Ministério das Comunicações imponham às empresas obrigações de investimentos. Podia ter escolhido outro caminho, mas preferiu deixar prevalecer as regras do ‘livre mercado’. Na prática, isto significa que essa cena feita pela Anatel terá muito pouco efetividade. A Anatel vai ter de se contentar com qualquer plano que as empresas quiserem apresentar. E o papel, como se sabe, aceita tudo.

Juntando tudo, fica claro que a situação não precisava ter chegado ao ponto que chegou e que a Anatel agiu desta maneira para criar um fato político a seu favor. Anatel firme ao lado dos consumidores? Quem não a conhece que a compre.

João Brant é integrante do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social

*O artigo é uma versão ampliada de texto publicado no Brasil de Fato, edição de 3 a 9 de agosto.

Valério Brittos: Pesquisador incansável, líder admirado

O falecimento precoce de Valério Cruz Brittos abre uma lacuna irreparável para os estudos em Economia Política da Comunicação (EPC). Natural de Pelotas, o pesquisador da Unisinos, do Rio Grande do Sul, ingressou na instituição em 1997 e, desde 2001, atuava no Programa de Pós-graduação em Ciências da Comunicação (PPGCC) da universidade. Intensamente empírico em suas concepções, Brittos encontrava-se em pleno afinamento com os problemas fundamentais relacionados aos fenômenos midiáticos, especialmente no que diz respeito ao estudo do mercado brasileiro de televisão. A partir da EPC, interdisciplina que regia suas pesquisas, buscava analisar as relações de poder desenvolvidas nos processos de produção, distribuição e consumo dos recursos comunicacionais.

Organizador de diversos livros, seus esforços acadêmicos foram especialmente direcionados para a formação de novos pesquisadores. Não obstante, seu talento em gerir competências, sua capacidade intelectual e a forte exigência pessoal transformaram Brittos em um dos mais prolíferos colaboradores da sua área de conhecimento. Com uma densa coleção de publicações, o intenso ritmo de trabalho do pesquisador mantinha-se coerente com suas concepções materialistas, no melhor sentido da teoria marxista. Sob sua supervisão, era forte o intercâmbio de expertise entre docentes e discentes, uma vez que cada qual colaborava a partir de sua condição, aliando às análises a autoridade de um pesquisador sênior com o grau de conhecimento de seus colaboradores – essencialmente seus mestrandos e doutorandos.

Seu último livro em vida, o ainda inédito Economia Política das Indústrias Culturais, co-organizado com Andres Kalikoske, representa o esforço dos economistas políticos da comunicação em analisar as chamadas indústrias criativas, concepção que Brittos ambicionava pesquisar a partir do próximo ano. Com textos assinados por pesquisadores de renome, a obra será lançada simultaneamente no Brasil e em Portugal a partir de setembro de 2012, sob o selo da editora lusitana Media XXI.

Multiplicidade da oferta

O grupo de pesquisa Comunicação, Economia Política e Sociedade (Cepos), criado e liderado por Brittos desde 2002, constituiu-se ao longo dos últimos dez anos um dos principais polos de produção científica dos estudos em EPC. Trata-se de um expoente regional que se materializa mundialmente a partir de sinergias acadêmicas diversas, que envolvem reconhecidos pesquisadores brasileiros, latino-americanos e europeus de importantes instituições. Apostando na diversidade, Brittos conseguiu reunir em seu grupo de pesquisa doutores, doutorandos, mestres, mestrandos, graduados e graduandos. Assim, inegavelmente fomentou um espaço plural e qualificado para o debate acadêmico. Os três principais conceitos desenvolvidos por Brittos durante sua atuação como pesquisador são recuperados e resumidamente discutidos a seguir.

Um dos conceitos-chave na obra de Brittos foi sua identificação sobre o fenômeno denominado Fase da Multiplicidade da Oferta, cujo desenvolvimento iniciou-se em 1995. Trata-se da ampliação substancial do número de opções comunicacionais, com todos os setores disputando a atenção do consumidor. Na indústria televisiva, tecnologia e comunicação rendem-se aos interesses do capital, representando uma maior possibilidade de escolha para o consumidor. Inicialmente concebido para o mercado televisivo, a Fase da Multiplicidade da Oferta acaba por compreender também a indústria radiofônica, sendo posteriormente estendido a diversos suportes digitais convergentes.

Mas tal ampliação não deve confundida com diversidade, alertava Brittos. Este foi um período marcado pela exclusão pelos preços, uma vez que a cobrança direta das ofertas disponibilizadas acabou por restringir o acesso a determinados conteúdos – como no caso da TV paga –, atingindo especialmente os consumidores economicamente menos favorecidos. As empresas recorrem a alianças, economias e sinergias para aumentar a rentabilidade de seus produtos e, assim, explorar novos espaços.

Conteúdos não-hegemônicos

Brittos foi o principal responsável por categorizar o padrão alternativo encontrado nas produções audiovisuais. Juntamente com seus colaboradores, considerou que este modelo de audiovisual envolve os seguintes elementos:

a) conteúdo social, a partir da realização e veiculação de material que contenha dimensão libertadora, portanto diferenciando-se do sistema hegemônico, independentemente de tratar de questões políticas ou de outra ordem;

b) baixo custo, uma vez encoraja-se o usuário doméstico a controlar todas as fases de produção de maneira a poder ser desenvolvida por comunidades e organizações de segmentos diversos, otimizando recursos públicos envolvidos e buscando não excluir através de taxas de acesso;

c) múltiplas plataformas, a partir de reconstruções e respostas dos usuários ao audiovisual originalmente produzido, que pode ocorrer a partir da produção de um novo audiovisual ou mesmo com o processamento coletivo do original em escolas ou comunidades, efetivando assim o debate do conteúdo;

d) produção descentralizada, a partir da disseminação do audiovisual entre agentes que tradicionalmente não integram esta cadeia de valor. Compreende-se que, para que isso possa ocorrer, é necessário financiamento, preparação dos usuários através de treinamento específico e utilização de plataformas amigáveis;

e) interação, estimulando a organização de debates nas comunidades, posteriormente a exibição dos conteúdos. Deve-se, portanto, ir além dos limites tecnológicos disponíveis, cuja utilização também deve ser encorajada;

f) criatividade, incentivando o espírito inventivo do brasileiro não somente como resposta para as limitações técnicas, mas no conjunto das ações que envolvem a produção audiovisual (formato, recursos humanos, logística, cenografia locações etc.).

A inovação da PluriTV

Um novo modelo de negócio para os conteúdos audiovisuais se clarificou a partir do conceito que Brittos denominou de PluriTV. Com a digitalização dos conteúdos, o pesquisador considerou a pluralidade das ofertas audiovisuais, uma vez que a televisão perde sua hegemonia e seus conteúdos passam a integrar novas telas – que se fazem presentes especialmente em grandes centros de compras e meios de transportes, etc. Com a convergência intensificada, a televisão perde gradativamente sua capacidade de mediar o controle social, passando a dividir este lugar também com outros aparelhos eletrônicos, como celulares multifuncionais, computadores portáteis e tablets.

Mas a TV tradicional não sai de cena, passando a conviver com uma pluralidade de telas, com modelos específicos de serviços e negócios, que passam a oferecer poucas certezas e muitas possibilidades. No quesito conteúdo, a inovação da PluriTV poderia ser muito maior. Isso porque seu potencial rapidamente chamou a atenção de atores hegemônicos do mercado televisivo, que passaram a redistribuir seus produtos estoques nas múltiplas telas.

Andres Kalikoske é coordenador e professor da especialização “Televisão e Convergência Digital” na Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos)