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Luta do rochedo com o mar

Desde o dia 2 de maio, e pelos próximos 30 dias, estão postas ao debate, no site da Anatel (www.anatel.gov.br) as Consultas Públicas 18,19 e 20/2014 sobre a licitação da faixa de 700 MHz. Nessa discussão, há uma briga de cachorro grande entre os radiodifusores e as empresas de telecomunicações. Enquanto os primeiros afirmam que há interferência na TV digital com a utilização do celular na faixa, os segundos apresentam testes garantindo não haver interferência significativa. Já para a Anatel, “os testes realizados indicam que a convivência entre os serviços nesta faixa é plenamente possível”. Essa briga demonstra a necessidade de tratar o uso do espectro como uma questão de Estado. E não se trata de exagero. É assim na China, nos EUA e na Inglaterra, por exemplo.

Não há como analisar essa Consulta Pública como algo meramente técnico. Segundo a Anatel, “com a utilização da faixa de 700 MHz será adotado no Brasil o mesmo padrão de quarta geração do serviço móvel adotado em outros países, como os Estados Unidos. Haverá possibilidade de levar a telefonia móvel e a internet em banda larga, inclusive às áreas rurais, a um custo operacional mais baixo, uma vez que essa faixa é ideal para a cobertura de grandes distâncias. Atualmente, o 4G no Brasil funciona na radiofrequência de 2,5 Gigahertz (GHz), a mesma faixa utilizada em 27 países da Europa, Ásia e Oriente Médio”.

O artigo 157 da Lei Geral de Telecomunicações define o espectro de radiofrequências como um recurso limitado, constituindo-se em bem público, administrado pela Anatel. A atratividade do espectro depende do momento e do avanço tecnológico. Faixas de radiofrequências que num momento não são percebidas como importantes, em outro se tornam essenciais para o fomento de políticas públicas.

Um regulamento define as faixas para fins militares, serviços de telecomunicações a serem prestados em regime público e em regime privado, serviços de radiodifusão, serviços de emergência e de segurança pública, e para outras atividades de telecomunicações. Um regulamento deve enfrentar questões como a convergência tecnológica, exploração industrial de radiofrequência, multidestinação, multiautorização. Estes dois últimos pontos relacionam-se, por exemplo, ao telefone celular que chega a prestar 18 serviços.

Até agora, a implantação da TV digital no Brasil tem se resumido à melhoria de som e imagem. No entanto, já no decreto nº 5.820, de 29 de junho de 2006, era destacada a importância da interatividade e da inclusão digital. Afinal, a TV digital pode, e deve, cumprir este papel.

Por isso, é fundamental que os pontos destacados na consulta sejam transformados em realidade: medidas de atenção para a “massificação” de TV digital junto às famílias listadas no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal, especialmente aquelas cadastradas no Programa Bolsa Família; transformação do aparelho de televisão digital em plataforma multimídia; antecipação do cumprimento de metas de abrangência constante do edital 2,5GHz; atendimento com telefonia móvel de alto padrão em áreas rurais e remotas; reflexos positivos nos preços dos serviços de telecomunicações decorrentes da otimização de infraestrutura; compromisso de aquisição de bens, produtos, equipamentos e sistemas de telecomunicações e de rede de dados com tecnologia nacional.

O Instituto Telecom tem defendido insistentemente que essa discussão não diz respeito apenas à tecnologia ou sobre qual lado do mercado irá se beneficiar. Trata-se, principalmente, da definição de uma política pública que poderá ter grande impacto econômico, político, cultural e social para toda a sociedade. A sociedade tem que ser a vencedora nessa luta do rochedo com o mar.

Texto originalmente publicado no Blog do Intervozes na Carta Capital.

#CopaDasCopas pode virar a #ViolaçãoDasViolações. E a comunicação com isso?

Por Daniel Fonsêca*

Está em curso, no País, uma série de violações de direitos, com a justificativa da necessidade de manter a “ordem” e de viabilizar megaeventos como a Copa do Mundo e as Olimpíadas. Duas das principais questões apontadas pelos movimentos e ativistas que criticam os megaeventos são a política de remoções forçadas de milhares de famílias, que deve afetar cerca de 170 mil pessoas nas doze cidades-sede, de acordo com a Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa (Ancop), e a criação de leis de exceção, que confirmam a prática recorrente de desconstrução dos direitos mais básicos, já fragilizados no País, como as liberdades de ir e vir, de manifestação e de expressão.

Nesse contexto, a defesa da comunicação como direito humano se coloca como indispensável às lutas sociais de comunidades, favelas e populações tradicionais em defesa desses direitos, como denuncia o caso de constrangimento promovido pelo Exército contra a jornalista Camila Marins, o cartunista Carlos Latuff e o fotógrafo Naldinho Lourenço, no dia 10 de maio, no conjunto de favelas da Maré, no Rio de Janeiro, realidade enfrentada cotidianamente pelos moradores.

De acordo com o relato de Marins e Latuff – a narração a seguir é baseada em texto de denúncia feito por ambos –, quando perceberam o início de uma ação militar de abordagens a moradores, ambos começaram a fotografar. No mesmo momento, foram abordados por militares. Um deles, com tom intimidatório, alertou: “Vocês têm autorização? Sem autorização está proibida a cobertura. Vocês precisam ser conduzidos ao CPOR [Centro de Preparação de Oficiais da Reserva do Rio de Janeiro] para explicar o motivo de cobertura e pedir autorização!”. Os comunicadores não recuaram diante da abordagem. Alegaram falta de fundamentação legal para serem conduzidos ao CPOR e ainda prestarem justificativas para realizarem a cobertura. Um dos militares assentiu e liberou os três.

O texto finaliza com uma defesa da comunicação como base para uma sociedade democrática: “qualquer tipo de impedimento, obstáculo ou violência a esses trabalhadores significa um atentado à democracia e à liberdade de imprensa. O fato de ‘ter que pedir autorização’ para exercer o jornalismo é um retrocesso aos tempos mais sombrios deste país. Mais do que isso, é dever e função social do jornalista acompanhar as ações do Estado e reportar à sociedade seus respectivos abusos. Diante do exposto, solicitamos esclarecimentos do Comando Oficial do Exército, do Ministério da Justiça e do Ministério da Defesa sobre a tentativa de coibir o exercício profissional”.

Atingidos pela Copa defendem democratização da comunicação

Também no Encontro de Atingidos pela Copa, que contou com pessoas que tiveram direitos violados pelas Olimpíadas e por megaempreendimentos, a democratização da comunicação foi reivindicada como um dos temas prioritários dos movimentos, na Carta aprovada ao final do evento. O documento defende a comunicação como direito humano, critica o “oligopólio dos meios” e denuncia a mídia como reforçadora do “extermínio da população negra com a criminalização da pobreza”. Enquanto isso, aponta o texto, “as reais consequências da Copa da Fifa no Brasil são ocultadas”.

Além da invisibilidade dos efeitos negativos da Copa, inclusive das mortes de 9 operários que trabalhavam na construção dos estádios, os participantes criticaram a representação social estereotipada dos moradores das comunidades atingidas pelas remoções e dos demais ativistas que protestam contra o evento. O manifesto dos (as) Atingidos (as) finaliza reivindicando a construção de um novo marco regulatório para as comunicações, o que inclui a revisão da atual legislação das rádios comunitárias, “para que, de fato, a comunicação seja um direito humano, que vocalize a realidade do povo brasileiro e que seja diversa, popular e emancipadora. Defendemos o respeito aos midiativistas e à imprensa popular e independente”.

A chamada “Copa das Copas”, de fato, também tem efeitos discutíveis para a comunicação comunitária. De acordo com o capítulo brasileiro da Associação Mundial de Rádios Comunitárias (Amarc Brasil), no caso das rádios livres e comunitárias sem outorgas, a realização do megaevento “vai trazer mais repressão”. Conforme já noticiado neste blog, em comunicado oficial enviado às organizações que trabalham com comunicação comunitária, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) anunciou que vai reforçar a fiscalização para “garantir a viabilidade das comunicações para a Copa do Mundo de 2014”.

A Amarc denuncia que a agência “pretende silenciar o direito à comunicação no ar para garantir o ‘bom’ funcionamento da grande mídia”. Como resposta, a associação promove, desde o dia 28 de abril, a campanha “Rádio Vs. Futebol – quem ganha a Copa Antidemocrática?”. A regra, de acordo com o site, é a seguinte: a cada semana, um autor expõe argumentos sobre os déficits democráticos do Futebol, enquanto outro responde com críticas ao rádio. A iniciativa é aberta à participação e pode ser acompanhada pelo site http://radiofutebol.amarcbrasil.org/.

Pela liberdade de organização, de manifestação e de expressão

É frente a essa gama de questionamentos que um conjunto de movimentos se articula para o 15 de Maio de 2014 (#15M), Dia Internacional de Lutas contra a Copa, inspirados pelo Encontro Nacional dos Atingidos(as) por Megaeventos ocorrido em BH entre 1º e 3 de maio de 2014. Movimentos e organizações sociais, militantes e pessoas críticas aos megaeventos e aos megaempreendimentos que violam direitos estarão nas ruas, segundo o chamado da Ancop, contra as distintas violações da Copa e das Olimpíadas e em repúdio a todos os processos que hoje levam à tentativa de construção de um projeto de cidades cada vez mais excludentes e privatistas.

O outro lado está preparado. A um mês da Copa do Mundo, um levantamento “exclusivo” feito pelo Exército a pedido do portal G1 mostra que, desde a Copa das Confederações, em junho do ano passado, as polícias militares reforçaram o estoque das armas denominadas de “não letais”. De acordo com a matéria, “entre junho de 2013 e abril deste ano, os órgãos de segurança pública do Brasil compraram mais de 270 mil granadas e projéteis de gás lacrimogêneo e de pimenta, além de 263.088 cartuchos de balas de borracha de vários tipos e modelos”. Essa munição seria suficiente para fazer mais de 819 lançamentos de granadas de gás e 797 disparos de balas de borracha por dia nos últimos 11 meses.

As informações deixam claro também o aumento da compra de armamento devido ao medo, pelos governos, de uma nova onda de manifestações durante a Copa. Desde junho de 2013, foram adquiridas pelas PMs 113.655 granadas de gás lacrimogêneo e 21.962 granadas de pimenta, cuja maioria foi adquirida nos primeiros meses de 2014. Foram comprados 134.731 cartuchos de gás de diversos calibres, que são lançados a uma longa distância para evitar que os policiais cheguem muito perto das pessoas.  A Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), órgão vinculado ao Ministério da Justiça, fez três pedidos de armas não letais, totalizando 12.700 sprays de pimenta, tanto em gel quanto em espuma. O arsenal inclui ainda bombas com carga tríplice de lacrimogêneo.

Apesar das ameaças, tem crescido o sentimento crítico ao modo como a Copa foi organizada no Brasil, seja pela violação de direitos ou pelo que significa em termos de prioridade política e orçamentária, em um país com tantas necessidades. Por isso, o chamado para o 15M já se espalhou pelo país. Além de um ato nacional, Rio de Janeiro, DF e Entorno, São Paulo, Porto Alegre, Salvador, Curitiba, Vitória, além de outras cidades brasileiras, e inclusive Santiago do Chile.

* Daniel Fonsêca é jornalista, integrante do Conselho Diretor do Intervozes e doutorando em Comunicação na ECO/UFRJ.

Texto originalmente publicado no Blog do Intervozes na Carta Capital.

Para onde vai o dinheiro da Ancine?

Por Gustavo Gindre*

O fomento ao audiovisual com recursos públicos conta com uma série de mecanismos municipais, estaduais e federais, dispersos e desprovidos de uma lógica sistêmica. Dentre esses mecanismos, de longe, a Agência Nacional de Cinema (Ancine) administra os mais significativos.

Grosso modo, os mecanismos de fomento com recursos públicos, no âmbito da Ancine, podem ser divididos em dois tipos: renúncia fiscal e fomento direto.

Renúncia fiscal

A renúncia fiscal, por sua vez, abarca dois diferentes tipos de mecanismos de fomento. De um lado, os mecanismos de patrocínio, onde agentes econômicos não relacionados ao audiovisual aportam recursos públicos de imposto de renda para a produção de obras audiovisuais. Em troca, essas empresas recebem apenas a exposição de suas marcas como patrocinadoras.

De outro lado, os mecanismos de investimento, onde distribuidores de obras audiovisuais, radiodifusores e programadoras de TV paga aportam recursos públicos de impostos sobre remessas ao exterior para a produção de obras audiovisuais. Em troca, essas empresas se tornam coprodutoras destas obras.

Regulamentação infralegal, expedida pela Ancine, define quais os direitos de coprodutores, permitindo que essas empresas tenham direito a 49% da receita líquida, a exibição gratuita por cinco anos em seus canais (no caso de programadoras e radiodifusoras) e a distribuir a obra por cinco anos (no caso de programadoras e radiodifusoras) ou até 70 anos (no caso de distribuidores), entre vários outros direitos.

Na prática, isso significa que essas empresas utilizam recursos públicos para se tornarem coprodutoras de obras audiovisuais brasileiras ditas “independentes” e, com isso, adquirem grande parte da receita dessas obras e influenciam fortemente em aspectos de sua produção (como roteiro, figurino, trilha sonora, locações, elenco, diretor e corte final, por exemplo).

Provavelmente, o Brasil é o único país do mundo a usar esse estranho mecanismo de renúncia fiscal para a produção de obras audiovisuais. Em geral, a renúncia fiscal movimenta cerca de R$ 200 milhões por ano.

Fomento direto

A Ancine pratica pequenas modalidades de fomento direto, através do uso de seus próprios recursos, como o apoio à participação e/ou exibição em festivais internacionais, o Prêmio Adicional de Renda (PAR) e o Programa de Incentivo à Qualidade (PAQ), mas é o Fundo Setorial do Audiovisual (FSA) que torna o fomento direto o principal instrumento de fomento ao audiovisual brasileiro.

Criado pela Lei 11.437/2006, o FSA recebe a imensa maioria de seus recursos da Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine). Inicialmente, havia dois tipos de Condecines, apelidadas de “Condecine Título” (taxa paga no registro de obras audiovisuais, brasileiras ou estrangeiras, que se destinem ao mercado brasileiro – exceto no caso da produção própria dos radiodifusores, que, por incrível que pareça, está isenta) e “Condecine remessa” (taxa paga na remessa de recursos ao exterior por agentes econômicos ligados ao audiovisual). Estas duas Condecines somadas movimentavam cerca de R$ 70 milhões por ano.

A nova Condecine

Mas, foi a Lei 12.485/2011 que mudou o cenário do FSA, prevendo uma nova Condecine, a ser paga por empresas de telecomunicações. Esta nova Condecine arrecadou, em 2013, pouco menos de R$ 1 bilhão. E o governo federal se comprometeu em repassar cerca de R$ 400 milhões para o FSA em 2014. Até 2013, a Ancine conseguia desembolsar apenas 17% dos recursos do FSA, com 83% retornando ao Tesouro.

Com a chegada desse novo montante, a Ancine tem sido pressionada para melhorar sua eficiência administrativa (conseguindo desembolsar o total dos recursos disponíveis) e para ampliar as linhas do FSA. Até 2013, o FSA praticamente emulava a renúncia fiscal, com fomento à produção de obras ditas “independentes”, em geral em parceria com distribuidores, radiodifusores e programadoras estrangeiras.

Ocorre que a lei permite gastar os recursos do FSA em praticamente qualquer coisa relacionada ao audiovisual, como infraestrutura, formação de mão de obra, canais comunitários, pequenos produtores, produção regional, etc, etc. As diretrizes do FSA são definidas pelo Conselho Superior de Cinema (CSC), organismos composto por representantes do Estado e da sociedade civil, mas fortemente hegemonizado pelos principais agentes do mercado, inclusive empresas estrangeiras.

Urge que a sociedade civil discuta uma nova política para o uso destes recursos que, no limite do superávit primário, podem chegar a R$ 1 bilhão por ano.

*Gustavo Gindre é integrante do Intervozes.

Texto originalmente publicado no Blog do Intervozes na Carta Capital.

Os absurdos da fusão da Oi com a Portugal Telecom

A Oi é fruto de uma história repleta de absurdos. A montagem do consórcio que comprou a Telemar no processo de privatização foi chamada, pelo próprio ministro que coordendou a venda, de “rataiada”. Durante muito tempo, BNDES, Previ e Petros foram seus principais acionistas, mas, por motivos desconhecidos, renunciaram ao direito de dirigir a empresa em prol de dois sócios privados: Carlos Jereissati (irmão de Tasso Jereissati, liderança tucana) e Sérgio Andrade (da construtora Andrade Gutierrez e um dos principais financiadores das campanhas de Lula). O governo alterou o Plano Geral de Outorgas (PGO) exclusivamente para permitir que a Telemar comprasse a Brasil Telecom, se transformando na atual Oi. E, aos poucos, os sócios estatais foram se retirando da empresa, em condições ainda não totalmente esclarecidas, e em benefício dos dois sócios privados nacionais e da Portugal Telecom. Uma história de escândalos que só fazem aumentar.

Atualmente, a Oi é uma empresa em sérios problemas. Sua dívida ultrapassou os R$ 30 bilhões, mesmo depois da venda de ativos importantes como todas as suas torres de telefonia celular e seus cabos submarinos. Sua infra-estrutura envelhece e não está em condições de prover o acesso a Internet com a velocidade e qualidade que os anos futuros necessitarão. Como resultado disso, seu valor de mercado vive depreciado e a empresa hoje vale menos de R$ 9 bilhões.

Mas, talvez o maior dos absurdos de sua história esteja acontecendo justamente agora, no processo de fusão com a Portugal Telecom, empresa que já detém cerca de 25% da Oi.

Os sócios da Portugal Telecom não aportarão um único real na fusão entre as empresas e entrarão apenas com o patrimônio da própria Portugal Telecom. O valor da empresa portuguesa foi avaliado pelo Santander, em laudo contratado pelos controladores da Oi. A área técnica da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) alegou que os controladores não poderiam votar na assembléia da empresa pela aprovação do laudo que eles próprios haviam encomendado. Já a diretoria da CVM, contrariando posições da própria CVM em casos semelhantes, permitiu o voto dos controladores, o que implicou, obviamente, na aprovação do laudo.

Os controladores brasileiros (Carlos Jereissati e Sérgio Andrade) ganham duas vezes. Primeiro, porque a nova empresa assumirá a dívida dos controladores e não apenas da Oi. Segundo, porque as ações dos controladores foram avaliadas em mais de 10 vezes o valor das demais ações em bolsa, em um dos maiores prêmios por controle já pagos na história do mercado acionário brasileiro.

Como se não bastasse, o prospecto de venda das ações no mercado acionário foi considerado indevido pela CVM. Nele os controladores afirmavam que um consórcio de bancos compraria as ações que não fossem adquiridas por outros investidores. A medida, chamada de “garantia firme”, visa dar segurança de que não sobrarão papéis sem compradores, desvalorizando o preço das ações. Na verdade, contudo, os bancos garantem adquirir apenas aquelas ações cujos compradores não honrarem o negócio. As demais ações ficarão mesmo sem adquirintes. A situação ganha ares de delito quando se sabe que o prospecto direcionado ao mercado internacional não trazia essa informação inverídica de “garantia firme” pelo consórcio de bancos.

Ao final do processo, os atuais sócios da Portugal Telecom terão, direta e indiretamente, cerca de 38% da nova empresa, resultado da fusão. Some-se a isso as ações que serão vendidas para novos investidores estrangeiros. Assim, completa-se o processo que levará a última grande empresa de telecomunicações de controle nacional a ter maioria de capital estrangeiro.

Texto originalmente publicado no Blog do Intervozes na Carta Capital.

Lei da Mídia Democrática será pauta nas eleições deste ano

Por Jonas Valente*

Entre os dias 25 e 27, mais de 80 representantes de organizações da sociedade civil de todo o país se reuniram na Escola Nacional Florestan Fernandes, em Guararema (SP), para a plenária do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC). Criado em 1991, o Fórum é o principal espaço de congregação de sindicatos, movimentos sociais e coletivos que lutam por uma outra mídia no país.

Os participantes reafirmaram a campanha centrada no projeto de iniciativa popular da Lei da Mídia Democrática. A proposta, elaborada a partir das resoluções da 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), traz um conjunto de medidas para coibir a concentração de propriedade no setor e promover a diversidade e a pluralidade nos meios de comunicação de massa.

Para chegar ao Congresso Nacional, o projeto de iniciativa popular precisa do apoio de 1,4 milhão de brasileiros. Por isso, as organizações integrantes do Fórum reafirmaram o compromisso com a coleta de assinaturas para o projeto de lei. Esse movimento será combinado com a pressão constante sobre o governo federal para que a elaboração de um novo marco regulatório para as comunicações brasileiras seja assumida pelo Executivo, a exemplo do que ocorreu em países da América do Sul como a Argentina, o Uruguai e o Equador.

Neste sentido, será central no próximo período a estratégia de diálogo com candidaturas ao Executivo e Legislativo em torno da aprovação de um novo marco regulatório, com base no projeto da Lei da Mídia Democrática. O objetivo é pautar essa discussão junto às candidaturas e transformar a comunicação em uma das agendas da disputa eleitoral, bem como obter o compromisso de candidatos e candidatas com a plataforma da sociedade civil.

Nos estados, os comitês regionais do FNDC também vão dialogar para apresentar uma agenda de políticas democráticas de comunicação na esfera local. Entre os principais pontos a serem propostos aos candidatos estão a implantação de conselhos de comunicação, o fortalecimento da comunicação pública e a criação dos Canais da Cidadania. Criado pelo Decreto que instituiu o sistema de TV digital brasileiro, o Canal da Cidadania deve ter espaço garantido no espectro e contará com quatro programações simultâneas, veiculando programação produzida pelo poder público estadual, poder público municipal e produções da sociedade.

Internet livre e para todos

A plenária do FNDC também celebrou a sanção do Marco Civil da Internet, aprovado dias antes pelo Senado Federal, e apontou a necessidade de uma nova mobilização popular para garantir que a regulamentação do texto afirme os princípios contidos na lei. A tarefa está a cargo do Poder Executivo e deve girar em torno de dois aspectos centrais: a regulamentação da neutralidade de rede e da guarda de dados de aplicação dos usuários, prevista no artigo 15 do Marco Civil.

As entidades e movimentos presentes à plenária do Fórum também reafirmaram que, com a aprovação do Marco Civil, é urgente o desenvolvimento de uma política mais agressiva por parte do governo federal para a universalização do acesso à Internet no país, com uma reorientação do Plano Nacional de Banda Larga, abandonado pelo governo federal. Da mesma forma, foi incluída na pauta do FNDC a luta por serviços de telecomunicações de qualidade, acessíveis e a preços baixos.

Nova direção

Durante o encontro, foi eleita a nova Coordenação Executiva do FNDC: Central Única dos Trabalhadores/CUT (Coordenação Geral); Barão de Itararé (Secretaria-Geral); Conselho Federal de Psicologia (Finanças); Intervozes (Comunicação); Associação das Rádios Públicas do Brasil/Arpub (Organização); Federação Interestadual dos Trabalhadores em Empresas de Radiodifusão e Televisão/Fitert (Formação) e Federação Nacional dos Jornalistas/Fenaj (Políticas públicas).

Já o Conselho Deliberativo do Fórum será integrado pela Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço), Associação Brasileira das Emissoras Públicas, Educativas e Culturais (Abepec), Federação Interestadual dos Trabalhadores em Telecomunicações (FITTEL), Clube de Engenharia, União de Negros pela Igualdade (Unegro), Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social (CNTSS), União Nacional dos Estudantes (UNE), Associação Mundial de Rádios Comunitárias (Amarc) e Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), além dos comitês regionais do Pará, Distrito Federal, Pernambuco, Santa Catarina e Minas Gerais.

* Jonas Valente é jornalista e integrante do Conselho Diretor do Intervozes.

Texto originalmente publicado no Blog do Intervozes na Carta Capital.