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A mina de ouro dos 700 MHz

No mesmo momento em que ocorre a Consulta Pública sobre a utilização da faixa de 700 MHz, estratégica para a inclusão digital, o sindicato das operadoras vem a público questionar os dados da União Internacional de Telecomunicações, segundo a qual o Brasil tem um dos mais altos preços de celular do mundo. A posição das empresas vai contra a apresentação feita pela Anatel nas audiências públicas realizadas em Brasília e São Paulo, que indica a perspectiva de uma redução de preços nos serviços, “decorrente da otimização de infraestrutura”. Pelo questionamento das operadoras, o que se conclui é que elas não têm nenhum projeto de redução de valores.

O capítulo 157 da Lei Geral de Telecomunicações, que trata do espectro de radiofrequências, estabelece: “o espectro de radiofrequências é um recurso limitado, constituindo-se em bem público, administrado pela Anatel”. Ou seja, é um bem estratégico que deve ser utilizado para responder às demandas de políticas públicas da sociedade. É o caso da discussão dos 700 MHz, faixa hoje ocupada pelos radiodifusores, que darão lugar às operadoras de 4G.

As operadoras vencedoras, segundo a Anatel, arcarão com todo o processo de limpeza da faixa. Isso inclui aquisição e instalação de equipamentos e infraestrutura essenciais para garantir as mesmas condições técnicas de cobertura, capacidade e qualidade dos canais de TV; aquisição e distribuição de um conversor de TV Digital para cada família cadastrada no Bolsa Família; aquisição e distribuição de um filtro para cada família cadastrada no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal. O valor global desse custo deverá constar do edital de licitação da faixa.

Nós, do Instituto Telecom, consideramos que um dos critérios a serem utilizados para a concessão da faixa seria o compromisso da operadora de reduzir significativamente os preços praticados. A China Mobile acabou de anunciar uma redução de até 50% do valor das tarifas de sua rede 4G agora em junho. Não é uma boa referência?

Diante de tantas implicações técnicas, políticas, sociais e institucionais, o Instituto Telecom e o Clube de Engenharia estão encaminhando uma carta ao presidente da Anatel, João Rezende, propondo a prorrogação da consulta por mais trinta dias. Propomos ainda a realização de uma audiência pública no Rio de Janeiro, dada a importância da rede de usuários aqui presentes e a concentração de prestadores de serviço de telecomunicações e radiodifusores.

O que está em jogo é a oportunidade de discutirmos mais profundamente a utilização de uma faixa de frequência que, dependendo do resultado das consultas e audiências públicas e a consequente formatação do edital de licitação, poderá aumentar ou diminuir a desigualdade social, aumentar ou diminuir a exclusão digital. O acesso a um serviço de boa qualidade, a preços módicos, é fundamental.  A faixa de 700 MHz vale ouro.

Texto originalmente publicado no Blog do Intervozes na Carta Capital.

Luta do rochedo com o mar

Desde o dia 2 de maio, e pelos próximos 30 dias, estão postas ao debate, no site da Anatel (www.anatel.gov.br) as Consultas Públicas 18,19 e 20/2014 sobre a licitação da faixa de 700 MHz. Nessa discussão, há uma briga de cachorro grande entre os radiodifusores e as empresas de telecomunicações. Enquanto os primeiros afirmam que há interferência na TV digital com a utilização do celular na faixa, os segundos apresentam testes garantindo não haver interferência significativa. Já para a Anatel, “os testes realizados indicam que a convivência entre os serviços nesta faixa é plenamente possível”. Essa briga demonstra a necessidade de tratar o uso do espectro como uma questão de Estado. E não se trata de exagero. É assim na China, nos EUA e na Inglaterra, por exemplo.

Não há como analisar essa Consulta Pública como algo meramente técnico. Segundo a Anatel, “com a utilização da faixa de 700 MHz será adotado no Brasil o mesmo padrão de quarta geração do serviço móvel adotado em outros países, como os Estados Unidos. Haverá possibilidade de levar a telefonia móvel e a internet em banda larga, inclusive às áreas rurais, a um custo operacional mais baixo, uma vez que essa faixa é ideal para a cobertura de grandes distâncias. Atualmente, o 4G no Brasil funciona na radiofrequência de 2,5 Gigahertz (GHz), a mesma faixa utilizada em 27 países da Europa, Ásia e Oriente Médio”.

O artigo 157 da Lei Geral de Telecomunicações define o espectro de radiofrequências como um recurso limitado, constituindo-se em bem público, administrado pela Anatel. A atratividade do espectro depende do momento e do avanço tecnológico. Faixas de radiofrequências que num momento não são percebidas como importantes, em outro se tornam essenciais para o fomento de políticas públicas.

Um regulamento define as faixas para fins militares, serviços de telecomunicações a serem prestados em regime público e em regime privado, serviços de radiodifusão, serviços de emergência e de segurança pública, e para outras atividades de telecomunicações. Um regulamento deve enfrentar questões como a convergência tecnológica, exploração industrial de radiofrequência, multidestinação, multiautorização. Estes dois últimos pontos relacionam-se, por exemplo, ao telefone celular que chega a prestar 18 serviços.

Até agora, a implantação da TV digital no Brasil tem se resumido à melhoria de som e imagem. No entanto, já no decreto nº 5.820, de 29 de junho de 2006, era destacada a importância da interatividade e da inclusão digital. Afinal, a TV digital pode, e deve, cumprir este papel.

Por isso, é fundamental que os pontos destacados na consulta sejam transformados em realidade: medidas de atenção para a “massificação” de TV digital junto às famílias listadas no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal, especialmente aquelas cadastradas no Programa Bolsa Família; transformação do aparelho de televisão digital em plataforma multimídia; antecipação do cumprimento de metas de abrangência constante do edital 2,5GHz; atendimento com telefonia móvel de alto padrão em áreas rurais e remotas; reflexos positivos nos preços dos serviços de telecomunicações decorrentes da otimização de infraestrutura; compromisso de aquisição de bens, produtos, equipamentos e sistemas de telecomunicações e de rede de dados com tecnologia nacional.

O Instituto Telecom tem defendido insistentemente que essa discussão não diz respeito apenas à tecnologia ou sobre qual lado do mercado irá se beneficiar. Trata-se, principalmente, da definição de uma política pública que poderá ter grande impacto econômico, político, cultural e social para toda a sociedade. A sociedade tem que ser a vencedora nessa luta do rochedo com o mar.

Texto originalmente publicado no Blog do Intervozes na Carta Capital.

As Telecomunicações e a falta de compromisso com o usuário

Durante a renovação dos contratos de concessão do Serviço Telefônico Público Comutado – STFC – discutiu-se sobre a inclusão de metas de Banda Larga em um de seus documentos anexos, o Plano Geral de Metas de Competição – PGMU III. Compromissos estes, que o Minicom, por pressão das Operadoras, resolveu transformá-los em um termo de compromisso com as operadoras e relacionar vários regulamentos que seriam editados em seguida.

O Regulamento de Gestão de Qualidade – RGQ –, apesar de sempre questionado pelas Operadoras, teve sua Consulta Pública terminada e sua emissão realizada pela Anatel. Neste instante, com uma argumentação pifiamente jurídica, que em nenhum momento leva em consideração os direitos do usuário, a Oi volta aos mesmos argumentos vencidos da consulta pública, pedindo a anulação de diversos itens do regulamento. Em poucas palavras, a Oi acha impossível medir a velocidade entregue ao usuário em um circuito banda larga, o que já é uma obrigação implementada por diversas agências no mundo e já seguida inclusive, por muitas das próprias operadoras.

O surpreendente é que a Anatel, com alegação de seguir seus estatutos, reabriu a discussão em nova Consulta Pública que esta em vigor até o dia 1º de fevereiro. O Instituto Telecom, juntamente com outras instituições da sociedade civil, irá apresentar argumentos nesta consulta pública e defender que se respeitem os contratos celebrados com os usuários e fique transparente para estes o que vem sendo cumprido, ou não, pelas Operadoras. Já que se trata justamente do mais importante serviço de telecomunicações dos dias de hoje, a Banda Larga.

A interposição desse pedido de anulação dos itens de qualidade pela Oi, de forma alguma pode representar adiamentos na implementação das etapas do RGQ.  

Cabe ressaltar ainda que outras iniciativas da Anatel, como o Plano Geral de Metas de Competição – PGMC – (consulta pública finalizada) e a do Serviço de Acesso Condicionado – SeAC, (consulta em andamento), representam alternativas de maior competição que  viriam a dar maiores opções de serviço à sociedade. Mas, no entanto, até agora sofrem ferrenha oposição pelos prestadores de serviço.

Fica claro que o intuito do Minicom de colocar as obrigações acertadas com as Operadoras em um Termo de Compromisso amigável, não foi e não é uma boa decisão. Até agora, todas as propostas feitas pelo ministério sofreram resistências quase inqualificáveis por parte das concessionárias.

Isso deve servir de lição para que tenhamos clareza, na oportunidade das discussões do Marco Regulatório das Comunicações, de que somente com a prestação do serviço de banda larga em regime público se terá um campo fértil para o desenvolvimento de um serviço mais adequado ao usuário, que tenha regras claras a serem seguidas de fato pelas operadoras.

Marcio Patusco é do Clube de Engenharia do Rio de Janeiro