Por Bruno Marinoni*
No dia 16 de julho, foi apresentada no parlamento australiano, terra de Julian Assange, uma proposta de lei para perseguir e prender jornalistas que noticiarem informações vazadas sobre operações de espionagem. A ação acontece às vésperas de expirar o prazo de asilo concedido pela Rússia à Edward Snowden e expressa a mobilização das forças conservadoras para defender nacionalismos tacanhos contra o avanço dos direitos humanos no plano internacional.
No mesmo dia 16, mais de 60 entidades brasileiras entregaram, no Ministério da Justiça, uma carta dirigida à presidenta Dilma Roussef, reivindicando um posicionamento sobre o pedido de asilo para Snowden no Brasil. A ação faz parte de uma campanha em apoio ao exilado, que tem sua permanência na Rússia garantida apenas até o dia 31 de julho.
Snowden afirmou, em entrevista exclusiva à Rede Globo, que havia oficializado o seu pedido de asilo no Brasil, mas o chanceler brasileiro Luiz Alberto Figueiredo alegou que o Ministério das Relações Exteriores não recebeu a solicitação. O analista de sistemas teria solicitado também a prorrogação da sua permanência na Rússia, além da colaboração de outros países como o Equador, que hoje abriga o australiano Julian Assange, outro perseguido por revelar informações ultrassecretas da diplomacia internacional.
Motivos para colaborarmos com Edward Snowden não nos faltam. Podemos começar, por exemplo, pelo mais elementar: retribuição. O ex-funcionário da CIA revelou um esquema estadunidense de espionagem por meio da agência NSA que tinha como um dos seus principais alvos o Brasil. Agora que o conhecemos, podemos tomar algumas medidas necessárias para nos proteger. Por isso, somos gratos.
Se tivermos alguma inclinação para qualquer tipo de nacionalismo, mais uma vez temos motivos para ajudar Snowden. O analista de sistemas permitiu que conhecêssemos um mecanismo que roubava informações relativas à estratégia política e econômica do Brasil, penetrando nos sistemas de comunicação dos mais altos escalões do governo. Até mesmo as investidas sobre as comunicações pessoais da presidenta da República foram reveladas. Mais um ponto para ele.
Destacamos, porém, o motivo que nos aparece como o principal. A ação de Snowden trouxe para o centro da discussão internacional a importância de se regular os sistemas de telecomunicação tendo em vista direitos fundamentais como a privacidade e o direito à informação.
Os direitos fundamentais sobrepuseram-se, assim, às estratégias de concorrência entre nações e as telecomunicações se revelaram como ambiente no qual a tensão entre a violação e a garantia desses direitos se coloca em plano global.
Com o empurrãozinho que nos foi dado pelo caso Snowden, conseguimos fortalecer nossa luta em defesa da garantia de direitos fundamentais, o que resultou na aprovação do Marco Civil da Internet no Brasil e na realização do NET Mundial, primeiro encontro mundial e multissetorial tendo como agenda central o debate sobre o futuro de uma nova governança da Internet. Defender esse exilado contra a perseguição que vem sofrendo atualmente é reafirmar como prioridade a salvaguarda desses direitos.
A carta entregue no Ministério da Justiça pode ser acessada aqui: http://www.fndc.org.br/system/uploads/ck/files/CartaAbertaaPresidenta-AsiloaoSnowdenPT%282%29.pdf
Mais informações sobre a campanha em: https://www.facebook.com/asiloparasnowden
*Bruno Marinoni é repórter do Observatório do Direito à Comunicação, doutor em Sociologia pela UFPE e integrante do Intervozes.
Texto originalmente publicado no Blog do Intervozes na Carta Capital.