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O backhaul é reversível. E não poderia ser diferente.

Embora a Pro Teste – Associação Brasileira de Defesa do Consumidor – insista que o decreto do presidente Lula, que determinou a troca da instalação de postos telefônicos pela construção da rede de banda larga como meta de universalização das concessionárias de telefonia fixa, é ilegal e injusto, a justiça federal decidiu negar o pedido de “antecipação dos efeitos da tutela”. Em outras palavras, não concedeu a liminar solicitada pela entidade, para que estas novas metas não fossem implementadas até o julgamento final da ação. Ao negar a liminar, a  juíza Maria Cecília de Marco Rocha, da 6ª Vara Federal, não entra no mérito da questão. Apenas questiona a representação da entidade para encabeçar a ação.

O argumento central da Pro Teste é que esta rede de banda larga não seria uma rede do STFC (serviço telefônico fixo comutado), não  podendo, por isso, fazer parte de metas de universalização. No entender da entidade, a telefonia pública estaria subsidiando, “ilegalmente” um serviço privado, o que impediria, como conseqüência, a redução nas tarifas da telefonia fixa.

Para a representante da Pro Teste, Flávia Lefrève, que encabeça a ação, a confirmação desta tese está no fato de que o aditivo ao contrato de concessão enviado pela Anatel ao seu conselho consultivo junto com a proposta de plano de metas de universalização, previa expressamente que  o backhaul ou a “infra-estrutura e equipamentos de suporte aos compromissos de universalização” fosse  enquadrado como bem reversível à União, item este que deixou de existir nos aditivos contratuais assinados pelas concessionárias. Para ela, essa omissão significa que a rede não retornará à União ao fim da concessão.

Outra posição

Para Anatel, Ministério das Comunicações, Palácio do Planalto e mesmo para as concessionárias, contudo, não há qualquer dúvida de que o backhaul é infra-estrutura do STFC, e por isso, reversível à União.

Se a imagem da rede de telecomunicações, explica uma fonte, está associada ao corpo humano, onde “backbone” é coluna dorsal e “backaul” são as costelas, essa simples imagem tem que estar vinculada aos seus termos técnicos próprios, e é por isso que, nos contratos de concessão, estão listados seis itens que compõem a reversibilidade dos bens. São eles: a) infra-estrutura e equipamentos de comutação, transmissão incluindo terminais de uso público; b) infra-etsrutura e equipamentos de rede externa; c) infra-estrutura e equipamentos de ar condicionado; d) infra-estrutura e equipamentos de sistemas de suporte a operação; e f) outros indispensáveis à prestação do serviço. Ou seja, a infra-estrutura com a qual se constrói a rede de banda larga (ou o backhaul) já está enquadrada como bem reversível.

Confusão

Para Rodrigo Barbosa, chefe de gabinete da presidência da Anatel, só foi possível a troca de metas justamente porque se confirmou juridicamente que esta infra-estrutura faz parte do STFC. Tanto que, explica, o próprio decreto presidencial explicita: “o backhaul é a infra-estrutura de rede de suporte de STFC para conexão em banda larga, interligando as redes de acesso ao backbone da operadora.” Afirma ele: “o backhaul é reversível, não há dúvida nenhuma”.

Para Barbosa, pode estar havendo uma confusão de conceitos, entre esta troca de metas e a conexão às escolas públicas. Enquanto o backhaul integra o STFC, a oferta de internet banda larga às escolas, segundo a Lei Geral de Telecomunicações, não é serviço sob concessão. Por isso, essa conexão se dará sob a licença do serviço de comunicação multimídia. “Embora um dependa do outro, a conexão às escolas não pode ser confundida com o backhaul”, afirma ele.

Minuta

Mas a Pro Teste insiste em argumentar que, se a primeira minuta do contrato foi submetida à avaliação prévia do conselho consultivo da Anatel, por que a versão definitiva não o foi?

Para Barbosa, os poderes de cada instância estão bem estabelecidos na lei. “O conselho consultivo deve analisar os planos de metas de universalização e os planos de outorgas. Somente o conselho diretor da Anatel tem autonomia e poder para, depois de uma consulta pública, aditivar os contratos de concessão. E o conselho decidiu que os aditivos contratuais não precisavam reproduzir as cláusulas basilares do conteúdo integral.” Assim, explica, os dirigentes da Anatel aprovaram a versão final dos contratos, e os assinaram, como sempre. 

O direito ao serviço essencial – A Pro Teste e o STFC

Em 1998 eram 20 milhões de acessos individuais de telefones fixos em uso, o que poderia nos encher de vergonha, pois, à excelência técnica da Telebrás contrapunha-se administração marcada por viés político e falta de compromisso com a universalização, o que resultava em teledensidade insuficiente e inadequada diante da grandeza da economia e da população brasileiras. 

Esse quadro legitimou o Presidente Fernando Henrique Cardoso para privatizar o sistema Telebrás, com resultados positivos incontestáveis, no que diz respeito ao desenvolvimento das telecomunicações. Passou-se de 20 milhões para 41 milhões de acessos instalados e em uso, de 1998 para 2001. Para promover a universalização, a Lei Geral de Telecomunicações estabeleceu  modalidades distintas de serviços, submetidas a regimes específicos: público e privado; e mais, que o serviço prestado em regime público seria o Sistema de Telefonia Fixa Comutada e suas respectivas modalidades e, todos os demais, seriam prestados em regime privado.

A Lei estabeleceu, ainda, que metas de universalização só seriam impostas para os serviços prestados em regime público e que não poderia haver subsídios entre modalidades distintas de serviços; no estabelecimento da estrutura tarifária e sua aplicação, não se poderia utilizar receitas oriundas do serviço público para promover o crescimento de serviços privados.

Sendo assim, para promover a volumosa expansão do STFC na primeira fase da privatização – julho de 1998 a dezembro de 2005, a receita para os investimentos necessários viria da prestação da telefonia fixa ou, quando essa receita fosse insuficiente, seriam utilizados os recursos do FUST.O valor da habilitação foi radicalmente reduzido, para viabilizar ganho de escala às concessionárias e a tarifa da assinatura básica subiu mais de 500%, gerando receita para a expansão da rede.

Além disso, garantiu-se às concessionárias o uso exclusivo da rede, que até hoje cobram para que os competidores possam utilizá-la, o que explica a inexistência de concorrência na telefonia fixa local e a posição dominante das concessionárias na longa distância.

Portanto, o que propiciou a expansão da infra-estrutura para o STFC foi a receita proveniente das assinaturas, com enormes sacrifícios para o consumidor. Porém, o sacrifício feito pelos consumidores nesses últimos dez anos não beneficiou a maioria dos cidadãos, que não têm condições de pagar pelo serviço essencial; são mais de 12 milhões de linhas ociosas, sendo que menos de 32 milhões de acessos fixos em uso e, desses, mais de 25% têm pessoas jurídicas como titulares.

Redução tarifária

O justo e correto, de acordo com a LGT, seria que a Anatel e o Minicom atuassem para reverter essa situação ilegal, incentivando a redução da tarifa das assinaturas.

A despeito de tudo, foi editado o Decreto 6.424/08, permitindo a inclusão nos contratos de concessão de nova meta de universalização: a construção de uma rede para prestação do Serviço de Comunicação Multimídia, contando com a receita do STFC – o backhaul internet em banda larga.

Ou seja, o decreto, além de ilegal é injusto, pois, a inclusão nos contratos de concessão de novas metas de universalização, que não se classifica como STFC, cria condições para a manutenção do alto valor da assinatura, incompatível com o nível de renda da maioria dos cidadãos brasileiros – R$ 40,00, ou 10% do salário mínimo,  para subsidiar um serviço privado. E, mais, o backhaul, ao final da concessão, ficará incorporado ao patrimônio das empresas.Trata-se, então, de rede privada, que não será alcançada pela desagregação. As concessionárias serão detentoras das redes e poderão cobrar caro das concorrentes no mercado do SCM.

O decreto, então, fere três preceitos da LGT: a) para cada modalidade de serviço deve haver um contrato de concessão distinto (art. 85); b) universalização só se impõe para serviço prestado em regime público (art. 64); c) não é permitido subsídio entre modalidades distintas de serviços (art. 103, § 2°).

A lei assim dispõe para garantir finalidades constitucionais: acesso universal a serviço essencial – o STFC, e a competição entre agentes com posições de mercado  desiguais: as concessionárias dominantes e as concorrentes bastante vulneráveis nesse cenário (as concessionárias também já são dominantes em suas áreas de atuação nos serviço da banda larga: o Speedy da Telefônica, o Brturbo, da Brasil Telecom e o Velox, da Telemar/Oi superam os concorrentes).

Em resumo, o Governo está deixando de atuar para reduzir os preços ilegais do STFC, para presentear as concessionárias: INCLUIR NO CONTRATO DE CONCESSÃO DO STFC UM SERVIÇO PRIVADO, SEM LICITAÇÃO E QUE, AO FINAL DO CONTRATO, FICARÁ INCORPORADO AOS SEUS PATRIMÔNIOS.

Para justificar esse terço de ilegalidades, alega-se que a telefonia fixa perdeu interesse no mundo. Todavia, a teledensidade de acessos fixos na Europa e EUA está por volta de 80% , sendo que no Brasil está em 20% – menor do que na Argentina.

É injusto e ilegal que o Governo se contente com o fato de os mais pobres ficarem sujeitos à telefonia móvel pré-paga – o serviço móvel no Brasil tem o quarto preço mais alto do planeta e ocupa o penúltimo lugar em utilização.

Foram esses fatores que levaram a Pro Teste a ajuizar ação civil pública para requerer a declaração de nulidade do Decreto 6.424/2008.A Pro Teste apóia a universalização da banda larga e o acesso gratuito desse serviço para as escolas públicas, desde que se respeite a lei, a garantia de serviços básicos para todos os cidadãos brasileiros e a concorrência.

* Flávia Lefèvre Guimarães é coordenadora da Frente dos Consumidores de Telecomunicações – FCT e membro do Conselho Consultivo da ANATEL, representando as entidades representativas dos usuários

Breque na queda da telefonia fixa

Á exceção da Oi, Telefônica e Brasil Telecom registraram, no primeiro trimestre, um freio na redução das linhas telefônicas em serviço. Nos dois casos houve uma leve recuperação, contra a tendência contínua de queda dos trimestres anteriores, que se manteve na Oi. A razão, explicam executivos das concessionárias, vai ser encontrada na conjunção de três fatores: o desempenho geral da economia; o aumento do poder aquisitivo do chamado andar de baixo e a adequação dos planos alternativos voltados para a baixa renda; os planos da economia que garantem um tempo menor de conversação e impedem ligações de fixo para celular ou ligações de longa distância. Esses eventos só no cartão pré-pago. Isso, quando toda a comunicação não estiver dependente do plano pré-pago.

Cada vez mais, a receita da telefonia fixa das operadoras está vinculada aos planos alternativos. Na Telefônica, quase a metade. Na Oi, 35%. Na Brasil Telecom, outros 44,8%. Uma tendência natural, já que o usuário, não importa sua faixa de renda, quer um plano aderente ao seu perfil de uso e ao seu orçamento. Com a mudança da cobrança de pulsos para minutos, os planos alternativos se multiplicaram. “Oferecemos perto de dez planos e dezenas de pacotes. Isso permite ao nosso cliente ir calibrando sua demanda em relação ao plano”, diz Luis Antonio da Costa Silva, diretor de produtos e serviços da Brasil Telecom. A oferta aderente ao bolso do cliente diminuiu a aceleração da curva natural de redução da telefonia fixa, pressionada pela concorrência não só da telefonia móvel, mas do serviço de voz, seja sobre protocolo IP ou não, oferecido pelas operadoras de cabo. Enfim, o que está em jogo é a oferta do serviço de banda larga, que traz a voz como valor adicionado.

Mas como, por enquanto, quem pode pagar pelo serviço de banda larga é o cliente das classes A e B, as concessionárias tentam manter sua base instalada de telefonia fixa, e banda larga sobre tecnologia ADSL, também de olho nas classes C e D. E aí os planos alternativos para a baixa renda, os chamados planos da economia, estão fazendo diferença. Maurício Giusti, vice-presidente da Telefônica, observa que houve uma redução da queda das linhas em serviço no primeiro trimestre de 2008. “No segmento residencial, a queda se reduziu de 1,5% no último ano para 0,4%”, diz ele. E isso se deve, avalia, especialmente à ampliação dos clientes do plano da economia — são 600 mil, pouco mais de 10% do total de 5,5 milhões de usuários de planos alternativos. Na avaliação de Giusti, é graças à oferta mais adequada ao perfil de gasto do cliente e de produtos combinados, a venda de duos ou trios, que a telefonia fixa tem mantido uma boa performance num cenário que lhe é desfavorável. “Para continuar vendendo serviço de telefonia fixa, é preciso oferecer ao cliente banda larga e vídeo”, observa.

Leve recuperação

Pioneira na oferta de planos alternativos, inclusive para a baixa renda, o que lhe permitiu reduzir o ritmo do encolhimento do número de linhas fixas em serviço, a Telefônica não está mais sozinha nessa empreitada. Brasil Telecom e Oi têm acompanhado de perto essa estratégia. Com seus planos alternativos e sua linha economia, que recebeu o nome de Plano Controle, a Brasil Telecom conseguiu, segundo os dados de primeiro trimestre de 2008, segurar a curva de redução das linhas em serviço da telefonia fixa. Não houve perda pela primeira vez em muitos trimestres, embora o ganho seja marginal. Mas como a perda se deve, como reconhecem seus técnicos, não só a concorrentes, mas, especialmente, ao telefone celular, segurar o vazamento do dique é uma grande conquista.

Ao analisar os números, Costa Silva vai direto ao ponto. “Dos 113 mil clientes do plano Controle, que passaram a assinar o serviço no primeiro trimestre de 2008, 43% nunca tiveram telefone fixo”, informa. Ou seja, o aumento do poder aquisitivo das classes C e D está permitindo que quem tinha apenas um celular para, na maioria das vezes, receber chamada, possa, agora, se dar ao luxo de ter um telefone da família com controle de gastos (esse plano da Brasil Telecom é todo pré-pago). A oferta de planos adequados à capacidade de pagamento do cliente facilita a adesão. “É importante assinalar que não se trata de uma reversão de expectativa. Mas com o aumento do poder aquisitivo e planos mais adequados, a curva de queda da telefonia fixa, que é uma tendência mundial, vai ser mais lenta”, observa ele. Ao lado desse movimento, a Brasil Telecom, a exemplo da Telefônica, registra uma redução dos índices de inadimplência. “A responsabilidadenão é só do desempenho da economia, mas de termos produtos mais adequados à capacidade de pagamento do cliente”, pondera Maurício Giusti.

Já na Oi, o número de linhas fixas em serviço continuou em redução. A queda foi de 1,3% em relação ao trimestre anterior e de 2,1% nos últimos 12 meses (de 14,338 milhões para 14,037 milhões). A receita também caiu, em ritmo menor, graças aos planos alternativos, redução que vem sendo compensada, como nas demais concessionárias, pelo aumento dos ganhos com o acesso em banda larga, com a telefonia móvel e a oferta de serviços combinados.

Avanço do celular

Três são as razões apontadas pela Oi para ainda não ter conseguido estancar a redução do número de linhas, mesmo com a grande quantidade de planos alternativos comercializados. A primeira delas, afirma o diretor João de Deus, — e a de maior impacto — é que a competição com a telefonia celular é mais acirrada. “Enquanto em São Paulo há apenas três operadoras, em nossa região a competição é muito maior entre as quatro empresas de celular”, assinala. E, nessa briga de preços, a substituição da linha fixa pela móvel se dá de forma mais acelerada, justifica. Ele lembra, por exemplo, que a taxa de penetração do celular em estados como Pernambuco ou Rio de Janeiro já é maior do que em São Paulo.

Outra razão, argumenta, é que a Oi não podia oferecer os planos alternativos em vários municípios de sua área de concessão, medida que está sendo revertida este ano. Isso porque, na mudança da tarifação do pulso para minuto, as empresas tiveram a opção de, nas cidades por elas escolhidas, não migrarem para a nova tarifação. Em contrapartida, não poderiam bilhetar o tempo de uso, e só cobrar a assinatura básica.  A Oi havia resolvido fazer a tarifação em minutos em 96% dos 6.500 municípios de sua região. Nas demais cidades, a operadora não podia oferecer os planos alternativos, já que não bilhetava o consumo. Mas, segundo o executivo, até o final do ano, a empresa terá implantado o sistema de bilhetagem em minutos em todas as cidades de sua região, podendo, assim, oferecer novos planos tarifários.

Impacto da banda larga

Por fim, uma outra razão, esta de menor impacto, devese ao próprio crescimento da oferta de banda larga na região, fazendo com que os usuários que tinham duas linhas fixas em casa — uma para acessar a internet discada e outra para falar — , ao instalarem o seu ADSL, cancelavam a segunda linha. Esse fenômeno, reconhece João de Deus, deve ter se repetido nas demais operadoras, mas o impacto desse desligamento ainda ocorre na Oi porque a empresa ingressou tardiamente, com pelo menos um ano de atraso, no mercado de banda larga.