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Livro problematiza uso da TV pública digital

Ontem em Fortaleza foi lançado o livro Comunicação Pública e TV Digital, do jornalista e professor universitário Alberto Perdigão. A obra é o primeiro resultado da pesquisa que o jornalista realiza sobre a utilização das novas tecnologias da informação e comunicação aplicáveis à televisão, para o fortalecimento da gestão pública e da democracia.

Publicado pela Editora da Universidade Estadual do Ceará – EdUece- tem 260 páginas e está divido em cinco capítulos. O primeiro trata da comunicação como direito, o segundo sobre comunicação na gestão pública, o terceiro aborda o conceito de comunicação pública – que se fundamenta da Teoria do Discurso, do alemão Jürgen Habermas, e se instrumentaliza com o teórico francês Pierre Zémor. Um quarto capítulo trata da TV pública no advento da TV digital interativa. E, finalmente, o sexto capítulo analisa as condições tecnológicas e políticas da TV Ceará (a primeira emissora estatal estadual a transmitir em digital) para que se transforme em canal de interatividade e a serviço do diálogo entre governo e cidadãos.  
Outros lançamentos do livro de Alberto Perdigão estão programados para o Rio de Janeiro (2 e 6/12), Teresina (7/12), Brasília (9/12).

Contato: (85.9909.8639), aperdigao@terra.com.br.

Livro propõe indicadores para se medir o direito à comunicação

Indicador, do latim “indicare” (apontar), significa aquele que indica, revela, propõe, sugere, expõe, menciona, aconselha. Todos esses significados explicam o porquê do lançamento de uma proposta de indicadores do direito à comunicação por parte do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social. Indicadores são usados para construir, medir e monitorar a aplicação de políticas públicas. Quanto àquelas que visam implementar o direito à comunicação, o novo livro Contribuições para construção de indicadores do direito à comunicação está cheio de propostas para se avaliar em que pé está o Brasil em relação a esse direito.

Lançado na semana passada em São Paulo, o Indicadores traz um modelo de pesquisa para monitorar a garantia do direito à comunicação no país. São 23 questionamentos divididos em sete dimensões: [1] perfil do sistema, [2] meios de comunicação e poder político, [3] diversidade de conteúdo, [4] acesso aos meios de comunicação, [5] participação social, monitoramento e gestão democrática, [6] financiamento da comunicação, [7] percepção da representação e do direito à comunicação.

O livro é o resultado de uma proposta que surgiu em 2004, no relatório que o Intervozes fez sobre o Brasil para o Global Governance Project da Campanha Communication Rights in the Information Society (CRIS), feito em mais quatro países. O Indicadores colabora com propostas relativamente completas principalmente para a área de rádio e TV, cujo estudo não é tão tradicional no país quanto aqueles sobre a internet (realizados pelo Centro de Estudos sobre Tecnologias da Informação e da Comunicação) e liberdade de expressão (Repórteres sem Fronteiras, Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo).

O critério de desenvolvimento dos indicadores propostos foram aqueles que mais estão atrasados, e são importantes para o Brasil, no caso os meios de comunicação eletrônicos tradicionais, por serem os mais utilizados.

Segundo o livro, o estudo se concentrou nos indicadores que demonstram apropriação de fato de aspectos do direito à comunicação, que podem não estar garantidos por lei, e pretende ser referência servindo como base comparativa, ponto de partida. “Não tratamos no livro sobre internet e liberdade de expressão por já existirem iniciativas significantes nesse aspecto. Mas existem buracos. Não tratamos da questão da criança e adolescente, por exemplo. Porque não pretende encerrar o assunto, mas abrir a discussão”, afirmou João Brant, um dos organizadores da publicação.

Aplicação

A parceria entre o Intervozes, a Unesco, o Laboratório de Políticas de Comunicação da UNB, e o Núcleo de Estudos Transdiciplinares de Comunicação e Consciência da UFRJ é que definirá os próximos passos no desenvolvimento e aplicação de indicadores no Brasil. “Ainda esse ano queremos no reunir com setores da sociedade civil e governo para criar ambiente propicio à aplicação dos indicadores, e discutir prioridades. Ao longo do ano que vem, fazer aplicação”, disse João sobre a continuidade do projeto.

Provavelmente os setores citados coordenarão a aplicação que terá por base os indicadores da Unesco (Indicadores de Desenvolvimento da Mídia: Marco para a avaliação do desenvolvimento dos meios de comunicação. UNESCO, PIDC – programa internacional para o desenvolvimento da comunicação. Março 2008), usando referências práticas acumuladas na pesquisa do Intervozes para fazer aplicação piloto, que poderá ser nacional ou regional – e assim aplicada em algumas cidades piloto.

Desse modo, o livro foi lançado mais para dar uma continuidade ao trabalho que já estava sendo feito do que servir como modelo definitivo. Até por que já existe o modelo da Unesco, que apesar de não aprofundar em alguns temas que são interessantes para o Brasil – que o Intervozes aprofundou mais, acredita João -, tem legitimidade internacional. “Tem duas maneiras do livro ser utilizado. Ao aplicar os indicadores da Unesco podemos acrescentar alguns que fizemos, deixando claro até onde vão os deles e começam os nossos. Ou eles podem servir de métrica para indicadores da Unesco, que estão muito genéricos, e estão mais detalhados na nossa proposta”.

Quanto à importância que se tem dado ao tema em geral, João é otimista. Ele conta que aconteceram três eventos ano passado (em São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro). “As organizações do setor estão atentas ao debate, buscando pensar especificidades de cada setor, e internacionalmente é um momento bom”. O Equador, por exemplo, também lançará um documento com indicadores.

Direito à comunicação e democracia

Acompanhar o desenvolvimento do direito à comunicação é acompanhar o grau de desenvolvimento da democracia, afirma o Indicadores. “O grau de desenvolvimento da democracia depende diretamente da pluralidade e diversidade de idéias e valores que circula pelo espaço público. Pelo papel central que cumprem os meios de comunicação nessa esfera pública, a acessibilidade a eles com a garantia de efetiva liberdade de expressão e direito à informação é determinante para esse resultado” (pg. 16).

O termo surgiu na década de 60. Pela necessidade de transformar a liberdade de expressão em prática, era necessário ir além desse conceito. “A declaração universal dos direitos humanos reivindica a liberdade de expressão, mas na prática ela é para poucos”, afirma o livro. Os poderosos e os excluídos deveriam ter a mesma liberdade para procurar, receber e transmitir informações. Mas, “de acordo com a lei, uma pessoa pobre que busca dar visibilidade à injustiça que sofre tem a mesma proteção de seu direito à liberdade de expressão, de expressar seus pontos de vista, do que um poderoso magnata dos meios de comunicação. Porém, na prática, ela carece de recursos de toda ordem – econômica, política, técnica, cultural e social para fazer ouvir sua voz, enquanto o dono de um veículo possui todos os meios paras garantir que sua mensagem seja ouvida”.

Assim, o direito à comunicação pode ser um garantidor das condições para o exercício da liberdade de expressão em uma sociedade altamente midiatizada, onde o poder e o controle dos recursos são mal distribuídos. O termo nos obriga a compreender de forma mais ampla a liberdade de expressão enquanto liberdade “que não apenas requer a ausência de limitações sobre os indivíduos, mas também a eliminação das restrições que pesam sobre setores inteiros da sociedade e, em paralelo, a criação de instrumentos e recursos para construir o acesso dos grupos excluídos aos meios de comunicação” (pg.25).

Para promover a superação dessas desigualdades, é necessária a atuação do Estado. A abordagem da pesquisa não se limitou às ameaças desse à prática do direito à comunicação. Consideram que os impedimentos podem também estar no setor privado, “pelo efeito negativo que a concentração de propriedade exerce sobre a pluralidade e diversidade do conteúdo” (pg. 29). É preciso olhar tanto o Estado quanto o setor privado como potenciais algozes, e possíveis promotores da liberdade de expressão.

 

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Propostas de Indicadores:

 

1- Perfil do sistema (quantidade de veículos, grau de complementaridade entre os sistemas, concentração de mercado)

 

2 – Meios de comunicação e poder político (número de concessões outorgadas a detentores de cargos eletivos, números de detentores de cargos eletivos que são concessionários)

 

3 – Diversidade de conteúdo (regional, independente, concessões de rádio e TV, diversidade demográfica, diversidade de tipos de programa/formato, origem dos programas veiculados)

 

4 – Acesso aos meios de comunicação (acesso privado, acesso público à internet, preços e tarifas dos serviços de comunicação)

 

5 – Participação social, monitoramento e gestão democrática (mecanismos de monitoramento ativo do conteúdo, gestão democrática dos veículos públicos e comunitários, participação social nos processos sobre as outorgas, participação social nas políticas de comunicação)

 

6 – Financiamento da comunicação (recursos públicos para a comunicação, investimentos em publicidade, investimentos no sistema público de comunicação)

 

7 – Percepção da representação e do direito à comunicação (percepção geral do direito à comunicação, percepção da representação de grupos sociais)

 

 

Livro expõe cicatrizes do jornalismo brasileiro

De Porto Alegre à fronteira entre Estados Unidos e México; de Jânio Quadros a maridos assassinos; de Realidade ao Globo Rural, Carlos Azevedo construiu uma das mais respeitadas trajetórias do jornalismo brasileiro. Aos 67 anos, resolveu reunir algumas de suas principais matérias no livro Cicatriz de Reportagem – 13 histórias que fizeram um repórter (Editora Papagaio), que será lançado nesta segunda-feira, dia 10, em São Paulo.

Logo na apresentação, Azevedo explica o que há de comum nas reportagens que escolheu: “Seus personagens são índios, trabalhadores do campo procurando terra, seringueiros, petroleiros, operários, negros, boiadeiros, imigrantes desterrados em busca de trabalho, de um lar, de uma identidade. Gente que se garante cada dia contando somente com a própria fibra. Homens e mulheres cuja voz não costuma ser ouvida nos gabinetes do poder e na imprensa”.

Dono de um estilo saboroso e ao mesmo tempo contundente, Azevedo passou por redações como a de O Estado de S. Paulo, Quatro Rodas, Realidade, Caros Amigos, além do programa Globo Rural. “Sempre tive preferência por matérias que colocassem nosso povo na imprensa, mostrando como ele é. Ao mesmo tempo, para mim é difícil tratar com políticos, empresários. Na verdade, faz parte das minhas idiossincrasias”, disse ao Vermelho.

No entanto, revelou o antigo militante comunista, só depois de olhar toda sua obra, percebeu que quase havia escrito a respeito da gente simples. “Não foi proposital. Acabei me encaminhando para isso. E sempre foi muito rico para mim. Tenho muita resistência em trabalhar com essa coisa da aparência que as classes dominantes têm. Elas dizem falar em nome do povo, mas estão é fazendo as coisas para eles próprios”, enfatizou.

Conspiração contra Jango

Além de apresentar as 13 reportagens que mais marcaram sua carreira, Azevedo conta, antes de cada matéria, o contexto da época, como foi a preparação da reportagem e detalhes das viagens que fez em busca de boas histórias. A primeira delas foi publicada em 29 de agosto de 1961, em O Estado de S. Paulo. 

Com apenas 21 anos, Azevedo se viu diante do desafio de cobrir a renúncia de Jânio Quadros e os desdobramentos posteriores. O episódio deu início a um dos momentos mais tensos da história política brasileira e abriu caminho para a preparação do golpe militar de 1964.

Com o afastamento do presidente do poder central, João Goulart, seu vice, deveria assumir o palácio do Planalto. Porém, a elite brasileira e o comando das Forças Armadas, com o apoio dos grandes jornais, não admitiam que Jango, ligado à esquerda, assumisse a presidência. A decisão dividiu os militares e no Rio Grande do Sul, o então governador Leonel Brizola denunciou o golpe que estava por vir. 

O jovem repórter, enviado à capital gaúcha, viu seus informes serem deturpados para saírem no O Estado de S. Paulo. Uma entrevista feita com general Machado Lopes, que defendia a legalidade e a posse de Goulart, só foi publicada depois que a crise já havia passado, em 5 de setembro. “Naquela época, ficou muito clara a posição do Estadão: ele estava participando da conspiração para não dar posse ao João Goulart e tinha uma orientação clara quanto a isso”, lembrou Azevedo.

Conservadora, como sempre

Questionado sobre as posições conservadoras e elitistas da “grande mídia”, Azevedo diz que hoje isso se dá com mais força porque “temos um governo vindo das camadas populares, e não do setor dominante da sociedade. Então, essa imprensa aparece para representar os interesses dessa elite. Mas, isso sempre fez parte do modo dela operar”, lamenta. 

Atualmente, observa, “é uma imprensa mais corporativa e abre espaço apenas para um setor da sociedade. A CBN, por exemplo. Você ouve não sei quantos empresários, representantes da Fiesp, de bancos, os economistas e os especialistas – hoje se criou essa categoria, em geral formada por especuladores do mercado. Mas você não ouve, nenhuma vez, um líder sindical, um operário, um trabalhador rural.  Se esta fosse uma imprensa da sociedade, deveria dar espaço para que outros pontos de vista aparecessem”.

Outra marca da grande imprensa, comenta Azevedo, é a homogeneização das redações. “A indústria cultural foi monopolizada e isso acabou bloqueando a presença de talentos mais contestadores. Aqueles profissionais, que durante a ditadura continuavam se opondo ao regime, vendiam sua força de trabalho, mas não sua consciência e sua coerência. Aos poucos, esse pessoal foi saindo e criou-se um clima de total hegemonia”.

Com o processo de industrialização das redações, explica, “cada editor resolve a matéria com vários repórteres e os textos ficam impessoais”. Segundo ele, a solução para que haja mais reportagens de fôlego e maior diversidade de opiniões está na criação de novos espaços e no uso da Internet. “Ela vem rompendo com essa hegemonia da grande imprensa. Tenho esperanças de que está surgindo uma nova fase e que a imprensa brasileira vai se tornar multifacetada e mais complexa”.

Coração quente, cabeça fria

Ao ler os textos escolhidos para Cicatrizes de Reportagem, o leitor tem a impressão de estar batendo um papo com o autor. Sem rebuscamentos e mergulhando a fundo nos temas a que se dedica, Azevedo oferece um jornalismo de alta qualidade sobre assuntos variados. Em uma das reportagens, ele retrata a extinção de nossos índios e o descaso do órgão então responsável pela proteção dos povos nativos. Num outro texto, contava a saga de um motoqueiro de nome “Jacaré”. Em seguida, retrata os absurdos do muro que separa o território estadunidense e mexicano e discute a globalização a partir de histórias de gente que buscava do outro lado o “sonho americano”.

“Sempre fui sensível à questão das injustiças, da riqueza extrema de um lado e da pobreza absoluta de outro, sentimento que vinha desde a adolescência”, recorda. Mas, além desse tipo de denúncia e de se dedicar a retratar gente comum, suas reportagens carregam outro traço de similitude entre si: a profunda dedicação do repórter por seu trabalho. “Quando faço uma reportagem grande, me apaixono completamente e passo a viver com aqueles personagens e como eles. Viro um boiadeiro entre os boiadeiros e, se estou com os índios, vou nadar pelado. Às vezes, a gente até aluga a existência do outro para viver um pouco a vida dele”, conta. E completa: “cada reportagem foi uma paixão diferente. Eu as fiz com o coração quente e a cabeça fria. O texto vai nascendo de você, de tudo aquilo que viveu”.

Encerrando a conversa com o Vermelho, Azevedo vaticinou: “Esse livro pode dar a impressão de que estou fechando as portas, como quem faz um balanço do que já escreveu. Ao contrário. Estou abrindo novas portas. O livro tem a intenção de dizer  ‘estou aqui e estou a fim de fazer’”.

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