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Sob críticas, lei de rádios comunitárias completa 10 anos

Os 10 anos da lei 9.612, que regulamenta a radiodifusão comunitária no Brasil, foram lembrados no dia 19, na Cinelândia, de maneira crítica e reabriu espaço para velhas reivindicações do setor. "Na época, fizemos uma pesquisa no Congresso Nacional e constatamos que 70% dos parlamentares ou eram donos diretos ou representavam os interesses de donos de rádio e TV comercial. Por isso, sabíamos que seria uma lei que não atenderia as necessidades de uma rádio comunitária", disse o coordenador da Rede Viva Rio de Rádios Comunitárias, Tião Santos.

As organizações ligadas às rádios comunitárias consideram a atual lei antidemocrática e exigem mudanças. "As rádios comerciais têm todos os direitos do mundo: sua potência é praticamente ilimitada e são isentas de impostos. Já as rádios comunitárias têm que atuar com apenas um canal, o alcance determinado é de 25 watts, enquanto as comerciais têm até mil watts. Nós só podemos atuar em um raio de mil metros e não temos direito ao comercial e à proteção se houver algum tipo de interferência. A essência da lei é positiva, talvez seja o que há mais de concreto em nível de regulação de comunicação pública. No entanto, em questões técnicas é extremamente restritiva, colocando as rádios comunitárias como algo pequeno e insignificante", afirmou Tião Santos.

Segundo Tião Santos, foram criados dois grupos de trabalho no governo Lula para agilizar e dar transparência aos processos que modificariam a lei, mas os relatórios produzidos com a participação popular foram engavetados. "Queremos que o presidente encaminhe imediatamente ao Congresso Nacional, assim como fez com a soja transgênica para beneficiar os empresários, uma Medida Provisória ou um Projeto de Lei que prevê a descriminalização das rádios comunitárias. Não é possível que um país democrático trate a rádio comunitária como algo criminoso. É um absurdo, isso não cabe no Brasil de hoje".

Conselhos de Comunicação Social

De acordo com o coordenador administrativo da Central de Desenvolvimento de Rádio Difusão Comunitária do Grande Rio, Ângelo José Ignácio, o movimento reivindica ações a nível municipal, estadual e federal. A idéia é criar Conselhos de Comunicação Social e destinar 1% da verba destinadas ao município, estado e federação para esta cadeira.

"Estamos organizando frentes parlamentares em favor das rádios comunitárias. No nível estadual as coisas já estão mais adiantadas. O Carlos Minc já fez a lei que prevê a criação do Conselho Estadual de Comunicação Social, mas precisa ser regulamentada e aprovada pelo governador. No nível federal, o Crivela propôs a municipalização das rádios. A Constituição diz que o que está dentro do município é de responsabilidade do executivo municipal e a freqüência da rádio não passa dos limites do município. Mas o prefeito não nos atendeu", disse.

Criminalização

Segundo Tião Santos, o governo de Lula fechou mais rádios comunitárias do que o governo de Fernando Henrique. "O governo federal é quem mais manda campanhas educativas de saúde e segurança pública para as rádios atuarem com esses programas nas comunidades, mas não há contrapartida. A única contrapartida que temos é a repressão, prisões de companheiros e seqüestros de equipamentos", afirmou.

A rádio Pop-Goiaba, que funcionava com outorga há seis anos no campus da UFF, convive com constantes invasões da Polícia Federal. Em 2006, segundo um dos integrantes da Pop-Goiaba, Daniel Vidal, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) fechou a rádio de maneira arbitrária. "A Anatel alegou que não tínhamos especificado o nosso funcionamento no protocolo, corremos atrás com um advogado e reavemos a rádio. A nossa penalidade foi fazer spots para entidades comunitárias, falamos para o juiz que seria uma satisfação. Eles levaram vários equipamentos para serem periciados. Já estamos há seis meses no ar, mas funcionamos há quase três quilômetros da UFF, no Largo da Batalha".

Daniel aproveita para esclarecer que as rádios comunitárias não derrubam aviões, como têm dito os meios de comunicação da burguesia. "Com 25 watts a nossa freqüência não consegue ultrapassar um morro pequeno, o alcance é limitado. Queremos democratizar a comunicação, potencializar a voz da comunidade, colocar o artista local para cantar e fortalecer a cultura nacional".

Na Venezuela, ofensiva contra o monopólio privado

A história dos meios de comunicação da Venezuela deverá ganhar um marco divisor no domingo (27), quando a concessão do canal de televisão RCTV – um dos grupos mais poderosos e antigos da comunicação do país – chega a seu final e não será renovada.

O governo de Hugo Chávez argumenta que o canal é 'antidemocrático' e 'desrespeita as regras de responsabilidade social' estabelecidas pela legislação, razão pela qual decidem não renovar a concessão à emissora.

Na meia-noite do domingo, o sinal do canal 2, que transmite a RCTV, será substituído peloda nova TV de serviço público, a Teves, criada há em maio. 'Acabou a concessão e agora nasce esta nova televisão que aumentará a liberdade de expressão e opiniões', afirmou Chávez durante um seminário sobre o 'direito à informar e a estar informado', realizado em Caracas, dia 18.

Na avaliação do presidente não renovar a concessão à RCTV significa um ato de 'soberania' e de 'recuperação do espectro radioelétrico'. Para o ministro de Comunicação e Informação, William Lara, a democratização dos meios depende da participação da sociedade. 'Haverá mais democracia na TV, no rádio, nos jornais venezuelanos quando mais pessoas participarem no desenho da mensagem', afirmou, ao assegurar que a direção do novo canal Teves atuará de maneira independente ao Estado.

'A vida é uma novela'

Já para a oposição não renovar a concessão da emissora representa um ataque à liberdade de expressão. A uma semana do fim da concessão, a oposição reuniu, no sábado (19), milhares de pessoas nas principais avenidas da zona Leste da cidade para protestar contra o que denominam o 'fechando da RCTV', como divulga a campanha dos meios de comunicação privados, solidários à rede. Os empresários ignoram o argumento legal do término da concessão pública.

'Queremos liberdade de expressão, não queremos comunismo. A RCTV é nossa', disse ao Brasil de Fato, Guillermina Oropeza, uma das dezenas de manifestantes que vestiam camisetas com a frase 'A vida é uma novela'. RCTV é a principal produtora de telenovelas no país. Durante a marcha, antigos cenários, equipamentos de gravação e roupas de artistas da RCTV utilizados em telenovelas exibidos em cima de caminhonetes contrastavam com grafites pintados nos muros da cidade registrando lemas como 'Pátria, socialismo ou morte' ou 'Viva a Revolução Bolivariana”.

No domingo (20), uma caravana vermelha de carros e motos percorreu a zona Oeste da capital, dessa vez, para apoiar a decisão do governo. Estão previstas outras manifestações de rua, tanto para apoiar como para rechaçar o fim das transmissões por canal aberto da emissora RCTV. A oposição anunciou que não acatará a decisão do governo.

Acerto de contas

Ainda que o argumento seja jurídico,a batalha lançada pelo presidente venezuelano contra o braço midiático da oposição traz à tona uma disputa que se arrasta desde abril de 2003, quando o chamado 'golpe midiático' pretendeu derrocar a Chávez do poder.

O golpe articulado por parte das Forças Armadas dissidentes e grupos de oposição fracassou e com evidenciou que os meios de comunicação assumiram abertamente o papel de partidos políticos, orientando pela televisão as manifestações de 11 de abril de 2003 e ocultando, dois dias depois, o levantamento popular que permitiu o regresso de Chávez àPresidência.

A partir de então, ganhou força a discussão entre os simpatizantes do governo sobre a democratização dos meios de comunicação, da responsabilidade social e da participação popular nos meios de comunicação, em especial na televisão.

No ar há 53 anos, a RCTV já havia sido sancionada por governos anteriores com multas e interrupção temporária da programação por desrespeitar a lei de telecomunicações. Dessa vez, fora do ar na freqüência VHF, o canal somente poderá transmitir sua programação por TV à cabo. ( Leia mais no jornal Brasil de Fato edição 221 )