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Futebol: TV Globo vs. vereadores paulistanos

A polêmica está na mesa. A Câmara de Vereadores de São Paulo aprovou projeto de lei que limita até 23h15 o término das competições esportivas no município. A matéria foi encaminhada para o Executivo. O prefeito Gilberto Kassab tem até o dia 31/3 para vetá-la ou sancioná-la.

Na quinta-feira (25/3), o Arena SporTV debateu o projeto. Participaram o secretário de Esportes da cidade de São Paulo, Walter Feldman, o deputado estadual Luciano Batista (PSB), o vereador Celso Jatene (PTB) e os jornalistas da casa Marco Antonio Rodrigues e Paulo César Vasconcelos.

Ponto novamente para o SporTV. Embora todos saibam o interesse da TV Globo no projeto, o debate foi em alto nível. Partidas de futebol às quartas-feiras têm sido marcadas para as 21h50 e até 22 horas por causa da grade de programação global.

A emissora que detém os direitos de transmissão do Campeonato Brasileiro, aliás, foi esticando esse horário até chegar às 22h. Se não houvesse um "não mais", certamente haveria partidas começando por volta das 22h30, o que seria absurdo para com o torcedor.

A Rádio Jovem [Pan] faz campanha pela mudança dos horários. Em editorial veiculado diariamente, a emissora diz que houve tentativa da TV Globo e da Federação Paulista de Futebol de manipular a opinião do torcedor, levando-o a concluir que o horário atual faz bem aos cofres dos clubes.

"Em toda essa novela indigesta, inconsequente, que ainda envolve o povo, Câmara Municipal, prefeito, Federação Paulista de Futebol e TV Globo, um ato é indesculpável: a forma primária e leviana como se pretendeu manipular a opinião pública e a consciência de nossos vereadores e deputados", diz trecho do editorial.

Sono tardio

A rádio conclui sua opinião afirmando que "a grade de uma televisão não pode regulamentar a vida, a ponto de prejudicar a paz, o sono e segurança dos cidadãos, o descanso de todos, de quem vai ao estádio e até de quem assiste TV em casa. Essa não é uma briga do bem contra o mal. É um movimento que coloca de um lado o apelo popular, as pessoas pedindo o fim dos jogos as 10 da noite, o bom senso, enfim".

Para este colunista, o ideal seria que partidas de futebol fossem iniciadas entre 21h e 21h30, no máximo. O horário avançado não atrapalha apenas o dia seguinte de quem vai ao estádio. Impõe barreiras também àqueles que ficam em casa.

No meu caso, tenho o hábito de acompanhar o pós-jogo com entrevistas de técnicos e jogadores. Não vou para a cama antes de 1h da manhã. Quem vai ao estádio em partidas no horário imposto pela Globo, certamente irá dormir por volta das 3h. Não dá mesmo. É preciso rever os horários das partidas no meio de semana.

Mais imposição

Torcedores de determinados estados têm sido obrigados a engolir jogos de péssima qualidade por conta do monopólio da TV Globo na transmissão dos campeonatos estaduais.

Quem mora em Brasília e torce por equipes paulistas se vê forçado a encarar Botafogo e Olaria, por exemplo, ao mesmo tempo em que Santos e Palmeiras fazem jogo eletrizante, com sete gols. Isso ocorreu, de fato, no dia 14 de março.

A Globo se superou naquele domingo: a partida entre os cariocas foi interrompida por causa das fortes chuvas que caíram sobre o Engenhão. Ao invés de entrar com as imagens de Santos e Palmeiras, a Globo seguiu mostrando Botafogo e Olaria.

Só que, dessa vez, narrando a chuva que caía. Só faltou o repórter de campo entrevistar os funcionários que tentavam conter a força do temporal, usando rodos e muita disposição.

O mesmo ocorre em outros estados nos quais a Globo empurra jogos ruins entre equipes paulistas e deixa de lado um clássico carioca, por exemplo.

A Bandeirantes, que deveria ser o diferencial na transmissão dos campeonatos estaduais e nacionais, aceita as condições da emissora carioca e só transmite o que está programado. Quem determina o que irá passar em cada praça é a Globo.

Essa postura, que revela a crueldade do monopólio da transmissão esportiva, tem passado dos limites. Por isso, a necessidade das demais emissoras se unirem para tentar quebrar o monopólio da Globo. O torcedor não tem mais opção aos domingos e às quartas-feiras. Engole-se aquilo que lhes enfia goela abaixo. No seco. Sem choro.

* Antonio Carlos Teixeira é jornalista e colunista do Observatório da Imprensa.

Imprensa versus governos

O novo ataque do presidente da República aos jornais que qualificou de "tablóides", feito durante solenidade em Brasília [ver abaixo], provocou editoriais, artigos, declarações e pouca ou nenhuma contribuição para evitar o desastre que se avizinha: um provável rompimento entre o Executivo e a imprensa.

O presidente Lula da Silva se queixa freqüentemente, e voltou a fazê-lo na solenidade de quarta-feira (24/3), de que a imprensa, ou parte dela, tem grande predileção pela desgraça. E de que cobre os atos do governo federal com má-fé. Citou, como exemplo, o que considera mau jornalismo: o governo constrói duas mil casas, nada sai nos jornais, mas se desaba um barraco, noticia-se que caiu uma casa.

Os jornais usam o discurso do presidente para reafirmar que ele sofre de "devaneio autocrático", conforme o editorial da Folha de S.Paulo (25/3), e que não tolera receber críticas. O presidente claramente demonstra exagerada necessidade de aprovação por parte da imprensa, suas alianças políticas são fonte permanente de más notícias, mas a afirmação do editorial carece de maior fundamento.

A Folha chega a publicar uma lista de entreveros de Lula com jornalistas, ou de declarações, que, segundo o jornal, descrevem sua relação conflituosa com a imprensa.

São apenas sete ocorrências em seis anos e os exemplos escolhidos não refletem necessariamente um estado de conflito permanente, mas um rol de episódios que poderiam ser considerados corriqueiros na vida de qualquer governante.

Censura e controle

A situação pode remeter ao período vivido pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em seu segundo mandato. A imprensa cobrava obcecadamente mudanças na economia, principalmente na política cambial. Quando finalmente o governo, após a reeleição do então presidente, desvalorizou o real, as críticas se renovaram, desta vez pelo motivo oposto, e o Brasil passou meses assombrado por avisos de retomada da inflação, alimentados pelos jornais.

No mesmo período, o voluntarismo de alguns repórteres, com base em vazamentos de inquéritos promovidos por representantes do Ministério Público, criou um inferno de acusações contra o então secretário-geral da Presidência, Eduardo Jorge Caldas Pereira.

Desde 2006, Eduardo Jorge vem colecionando uma série de vitórias na Justiça contra seus detratores.

É papel da imprensa fiscalizar o poder público – todos os poderes –, desconfiar em princípio de negócios envolvendo governos – todos os governos –, fazer as perguntas que ninguém quer ouvir. E cobrar as respostas.

Mas esse espírito precisa estar impregnado no fazer jornalístico, e deve ser praticado naturalmente em todas as relações da mídia com as instituições.

O risco da relação conflituosa entre governantes e a imprensa é o estabelecimento de um estado permanente de guerra, que certamente deprecia a imprensa e municia aqueles que, em qualquer instituição pública ou partido político, alimentem sonhos de controle do jornalismo.

Como a política nacional tem mais visibilidade, escapa aos observadores o fato de que também nos Estados há constantes problemas de relacionamento. Há governadores se queixando de má vontade ou partidarismo por parte dos jornais. E há partidos oposicionistas denunciando a adesão total da imprensa a governos locais. Os jornais sempre reagem denunciando ameaças de censura.

Mas, atenção: é preciso atentar para a abissal diferença que existe entre a censura institucional à imprensa e o controle social dos meios de comunicação. Apesar dos esperneios de dirigentes de empresas jornalísticas, a liberdade da imprensa não corre o menor risco no Brasil.

Guerra declarada

O risco maior para a imprensa vem da própria imprensa, quando os jornais se associam para agir como um partido político. E quem faz essa revelação é a própria presidente da Associação Nacional dos Jornais (ANJ), Maria Judith Brito, conforme já apontado neste Observatório: em encontro realizado em São Paulo, a presidente da ANJ declarou textualmente, segundo O Globo: "A liberdade de imprensa é um bem maior que não deve ser limitado. A esse direito geral, o contraponto é sempre a questão da responsabilidade dos meios de comunicação", acrescentou – e até aí tudo bem. Mas ela continuou:

"E, obviamente, esses meios de comunicação estão fazendo de fato a posição oposicionista deste país, já que a oposição está profundamente fragilizada. E esse papel de oposição, de investigação, sem dúvida nenhuma incomoda sobremaneira o governo."

Intrinsecamente contraditória, a declaração estabelece a ruptura, afeta a credibilidade da imprensa e traz insegurança a todos os governantes, pois tal afirmativa serve também aos governos estaduais e dos municípios onde a oposição estiver fragilizada. Tal distorção – imprensa declaradamente partidária – independe de quem está no poder, uma vez que os jornais se assumem publicamente como partido político.

Quando a imprensa abandona seu eixo, todos saem perdendo. Principalmente a imprensa.

* Luciano Martins Costa é jornalista e colaborador do Observatório da Imprensa.

“Excrescências” do direito à comunicação

Desde sua publicação no final de dezembro de 2009, o III Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH) tem sido objeto de violenta campanha conservadora apoiada e, em parte, promovida pela grande mídia. O tema já foi tratado inúmeras vezes neste Observatório (ver, por exemplo, "A mídia contra a Constituição " e "A unanimidade reacionária ").

Contra o III PNDH vale tudo: quem discorda de uma de suas propostas ataca o conjunto do plano, coloca tudo no mesmo saco, como se não houvesse distinção entre descriminalização do aborto e mediação de conflitos agrários. E, para o ataque à única diretriz referente ao direito à comunicação, são utilizadas até mesmo citações de propostas de "controle social da mídia" que simplesmente não constam do III PNDH (2009) e estão, ao contrário, no II PNDH (2002) [veja abaixo o texto integral da Diretriz 22].

Excrescências

Os opositores deram, agora, um passo à frente no vale-tudo de suas acusações: passaram a divulgar "afirmações" do ministro da Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH) sobre modificações no III PNDH que, na verdade, nunca foram feitas.

E mais: a presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ) – a mesma que comparou o papel da entidade ao da deusa mitológica Atenas-Minerva, de ética questionável (ver "Atenas, a ANJ e a liberdade") – chamou o III PNDH de "excrescência" [cf. "Ações contra tentativa de cercear a imprensa", O Globo, 19/3/2010, pág. 10).

Excrescência é uma palavra feia que, na verdade, soa pior do que seu significado – segundo o Aurélio, "demasia, excesso, superfluidade". Aproveito a palavra utilizada pela presidente da ANJ para descrever algumas excrescências que estão sendo praticadas pela grande mídia no vale tudo contra o III PNDH.

Manipulação grotesca

Após a reunião do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH) em que foi apresentado o III PNDH, acompanhada por jornalistas, inclusive da Rede Globo, na terça-feira (16/3), o ministro da SEDH conversou com alguns repórteres. Reafirmou que havia disposição do governo de rever três pontos do III PNDH: defesa ao direito ao aborto, condenação do uso de símbolos religiosos em prédios públicos e criação de novos mecanismos de mediação de conflitos agrários.

Perguntado por um repórter do Estado de S.Paulo se "no capítulo da imprensa há algum reparo ou não?", o ministro respondeu literalmente:

"No capítulo da imprensa não estamos fechados para fazer reparos. Agora, há pouco ainda relia, pela milésima vez, `definir critérios editoriais de ranking´, e não conseguimos nos convencer de que haja aí a menor intenção de censura a imprensa. Esse governo, por todos os seus ministros, pelo presidente, dezenas de vezes, reafirma que é absolutamente contra qualquer tipo de censura à imprensa. O presidente Lula declara: `Eu sou fruto da liberdade de imprensa´. Então, nesse sentido, foi interpretado como se fosse intenção de censura aquilo que é um chamamento à mídia para parcerias, para engajamento, das próprias entidades empresariais, dos sindicatos de jornalistas do Brasil inteiro, dos profissionais, para entendermos juntos as nossas co-responsabilidades. Então o que está dito lá é definir critérios editoriais de ranking, pra premiar, pra valorizar as boas matérias, como já há em inúmeras experiências, o prêmio Vladmir Herzog de jornalismo e Direitos Humanos; o prêmio da ANDI, e também no ranking, localizar, na programação, programas que eventualmente tenham conotação racista, de discriminação à mulher, que sejam homofóbicos. O Brasil já tem instrumentos, para esse ranking sendo feito, o MP, defensores, as autoridades constituídas tomarem as iniciativas adequadas. Então, nesse sentido o ranking pode ser feito em parceria com as próprias empresas, elas podem ser convidadas a isso, seja com os Direitos Humanos, seja com o MJ, onde está sediada a classificação indicativa, seja no próprio Ministério das Comunicações. Então o que nós estamos fazendo no momento é fazer o diálogo sereno, o debate, explicando que não há nenhuma(…). E se houver uma argumentação de que determinado aspecto, determinada ação, das 521, 500 de grande acordo e polêmica em torno de 20, que merece reparo porque pode suscitar uma interpretação equivocada, também incluiremos esse reparo. [Transcrição da Assessoria de Comunicação Social da SEDH )

Na mesma noite, o "Jornal Nacional" da Rede Globo, deu a chamada: "O governo admite alterar pontos mais polêmicos do Programa Nacional de Direitos Humanos". No telejornal, o apresentador leu a seguinte nota coberta:

"O secretário nacional de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, declarou nesta terça-feira que serão alterados quatro pontos do programa que provocou polêmica com setores da sociedade.

Segundo Vannuchi, vai ser retirada do Programa de Direitos Humanos a parte que previa negociação de invasores de terra com uma comissão do governo antes de se recorrer à Justiça.

O plano não vai mais tratar da descriminalização do aborto, nem da proibição de símbolos religiosos em prédios públicos.

O secretário disse ainda que vai alterar a proposta de impor um limite à autonomia das empresas de comunicação. A versão final deve sair em abril [ver aqui].

Os três pontos que poderiam ser alterados se transformaram em quatro, incluída a referência a uma "proposta de impor um limite à autonomia das empresas de comunicação" que, além de não ser especificada, também não foi mencionada na fala do ministro da SEDH.

Curiosamente, no dia seguinte, 17 de março, a matéria sobre o assunto publicada no jornal O Globo sob o título "Estamos dispostos a fazer correções", cita os três pontos relacionados pelo ministro e não faz qualquer referência ao "quarto" ponto mencionado no JN [cf. O Globo, 17/3/2010, pág. 10].

Partidarização assumida

Após encontro na Fecomercio, que reuniu representantes da ANJ, da Abert e da Aner, e discutiu a possibilidade de ingresso no Supremo Tribunal Federal (STF) contra o III PNDH, no dia 18 de março [cf. "Ações contra tentativa de cercear a imprensa", O Globo, 19/3/2010, pág. 10), a presidente da ANJ – que é também diretora-superintendente do Grupo Folha – afirmou:

"A liberdade de imprensa é um bem maior que não deve ser limitado. A esse direito geral, o contraponto é sempre a questão da responsabilidade dos meios de comunicação. E, obviamente, esses meios de comunicação estão fazendo, de fato, a posição oposicionista deste país, já que a oposição está profundamente fragilizada. E esse papel de oposição, de investigação, sem dúvida nenhuma incomoda sobremaneira o governo."

A presidente da ANJ assume publicamente que os jornais estão desempenhando o papel de partidos de oposição ao governo, vale dizer, estão agindo partidariamente, e ainda justifica: a razão é que "a oposição está profundamente fragilizada".

Estratégia conservadora

Em artigo recente, o professor Laurindo Lalo Leal, da ECA-USP, escreveu com propriedade sobre a campanha conservadora contra o III PNDH, em particular, e contra as propostas relativas ao direito à comunicação. Para ele, a campanha faz parte de uma estratégia conservadora que é nossa velha conhecida.

"Elege-se um tema de impacto que tenha amplo apoio na sociedade e se atribui ao adversário a intenção de destruí-lo. No caso, a democracia e a liberdade de expressão. Dizem que o governo elaborou um Plano Nacional de Direitos Humanos propondo o controle social da mídia. Repetem isso à exaustão e passam ao ataque."

Para aqueles que não se esquecem do passado é impossível não lembrar de situações históricas em que as bandeiras eram outras, mas a estratégia, a mesma. É exatamente isso o que está sendo feito hoje com o suporte e a participação da grande mídia e a liderança de suas entidades representativas: ANJ, Abert e ANER. Até onde se pretende chegar, não se sabe.

A escalada dos ataques, todavia, sobe a cada dia. E no vale-tudo para que se atinjam os objetivos, vale qualquer excrescência.

***
Decreto Nº 7.037, de 21 de dezembro de 2009
Aprova o Programa Nacional de Direitos Humanos – PNDH-3 e dá outras providências [íntegra aqui].

Diretriz 22: Garantia do direito à comunicação democrática e ao acesso à informação para consolidação de uma cultura em Direitos Humanos.

Objetivo Estratégico I:
Promover o respeito aos Direitos Humanos nos meios de comunicação e o cumprimento de seu papel na promoção da cultura em Direitos Humanos.

Ações Programáticas:
a) Propor a criação de marco legal regulamentando o art. 221 da Constituição, estabelecendo o respeito aos Direitos Humanos nos serviços de radiodifusão (rádio e televisão) concedidos, permitidos ou autorizados, como condição para sua outorga e renovação, prevendo penalidades administrativas como advertência, multa, suspensão da programação e cassação, de acordo com a gravidade das violações praticadas.
Responsáveis: Ministério das Comunicações; Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República; Ministério da Justiça; Ministério da Cultura

b) Promover diálogo com o Ministério Público para proposição de ações objetivando a suspensão de programação e publicidade atentatórias aos Direitos Humanos.
Responsáveis: Ministério da Justiça; Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República

c) Suspender patrocínio e publicidade oficial em meios que veiculam programações atentatórias aos Direitos Humanos.
Responsáveis: Ministério das Comunicações; Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República; Ministério da Justiça

d) Elaborar critérios de acompanhamento editorial a fim de criar ranking nacional de veículos de comunicação comprometidos com os princípios de Direitos Humanos, assim como os que cometem violações.
Responsáveis: Ministério das Comunicações; Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República; Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República; Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres da Presidência da República; Ministério da Cultura; Ministério da Justiça

e) Desenvolver programas de formação nos meios de comunicação públicos como instrumento de informação e transparência das políticas públicas, de inclusão digital e de acessibilidade.
Responsáveis: Ministério das Comunicações; Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República; Ministério da Cultura; Ministério da Justiça

f) Avançar na regularização das rádios comunitárias e promover incentivos para que se afirmem como instrumentos permanentes de diálogo com as comunidades locais.
Responsáveis: Ministério das Comunicações; Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República; Ministério da Cultura; Ministério da Justiça

g) Promover a eliminação das barreiras que impedem o acesso de pessoas com deficiência sensorial à programação em todos os meios de comunicação e informação, em conformidade com o Decreto no 5.296/2004, bem como acesso a novos sistemas e tecnologias, incluindo Internet.
Responsáveis: Ministério das Comunicações; Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República; Ministério da Justiça

Objetivo Estratégico II: Garantia do direito à comunicação democrática e ao acesso à informação.

Ações Programáticas:
a) Promover parcerias com entidades associativas de mídia, profissionais de comunicação, entidades sindicais e populares para a produção e divulgação de materiais sobre Direitos Humanos.
Responsáveis: Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República; Ministério da Cultura; Ministério das Comunicações

b) Incentivar pesquisas regulares que possam identificar formas, circunstâncias e características de violações dos Direitos Humanos na mídia.
Responsáveis: Ministério das Comunicações; Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República

c) Incentivar a produção de filmes, vídeos, áudios e similares, voltada para a educação em Direitos Humanos e que reconstrua a história recente do autoritarismo no Brasil, bem como as iniciativas populares de organização e de resistência.
Responsáveis: Ministério das Comunicações; Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República; Ministério da Cultura; Ministério da Justiça.

* Venício A. de Lima é pesquisador sênior do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política (NEMP) da Universidade de Brasília e autor, entre outros, de "Diálogos da Perplexidade – reflexões críticas sobre a mídia", com Bernardo Kucinski (Editora Fundação Perseu Abramo, 2009).

Manda quem pode

A história dos meios de comunicação no Brasil sempre esteve atrelada ao poder público. Seja no surgimento do rádio, em 1922, na televisão, em 1950, e no aprimoramento técnico do impresso com Zero Hora, há um rastro que indica um vínculo entre os veículos e as instituições políticas. Com a ditadura, a força do Estado dentro da imprensa foi maior. A censura limitou o trabalho de repórteres, em todas as mídias, em especial naquelas que eram contrárias ao regime.

Com o início da reabertura democrática, no final da década de 1970, começou a ser discutido, novamente, o papel da imprensa dentro da sociedade. De meros divulgadores de notas prontas do regime, foi indicado que o trabalho dos jornalistas é um reflexo do direito de expressão e liberdade de informação.

Tais direitos foram garantidos na Constituição Federal. Apesar de existir na lei desde o período do império, foi na Constituinte de 1988 que esta prática tornou-se, fundamentalmente, um pilar da democracia. No inciso IX, do artigo cinco, está determinado que "é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença".

Apuração e seleção do conteúdo

De maneira prática, a interferência do Estado na imprensa ainda existe. O indicador histórico registra isso. Em 1988, a Constituição estabeleceu nova regulamentação para emissoras de rádio e televisão. Na época, segundo a BBC de Londres, foram liberadas mais de 300 concessões pelo Ministério das Comunicações no Brasil. A maioria foi para políticos, deputados e senadores. A emissora britânica produziu um documentário chamado Beyond Citizen Kane que conta a história das Organizações Globo. O vídeo, disponível no YouTube, afirma que, desde o surgimento da TV carioca, ela sempre foi favorecida pelos presidentes. No final da década de 1980, a Globo teria trabalhado, com afinco, para eleger Fernando Collor de Melo.

O caso Collor-Globo é emblemático no jornalismo. Segundo a BBC, até a quinta-feira, quatro dias antes da eleição, havia um empate técnico entre Lula e o candidato da emissora. Na sexta, aconteceu um debate que foi reprisado em partes no Jornal Nacional. Essa seleção teria mostrado os piores momentos de Lula. Por isso, atribui-se a eleição de Collor de Melo à empresa da família Marinho.

A partir da década de 1990, o desenvolvimento tecnológico, o rigor da legislação e o aumento da exigência do público tornaram a sociedade mais atenta a este tipo de conduta. Porém, a imprensa nunca esteve livre de erros. As histórias de Ibsen Pinheiro e da Escola Base são exemplos. A falta de critérios para apuração e seleção do conteúdo destruiu a carreira do ex-senador e acabou com um grupo educacional.

Grupos políticos impõem sua vontade

Em 1998, aconteceu a expansão da internet. A redução do custo dos computadores e o aprimoramento das redes facilitaram o crescimento. A mídia on-line, com interatividade e flexibilidade de acesso e conteúdo, tornou as informações mais fluídas. Algo que acontece do outro lado do mundo ganha espaço no mundo virtual em segundos. Segundo o ministro Franklin Martins, isso obriga os veículos a não sentarem em cima da informação. Como aconteceu com o movimento das "Diretas Já", que foi mostrado pela Globo com uma manifestação que fazia parte das comemorações do aniversário de São Paulo.

Apesar dos recentes avanços com a internet, que permite a participação dos cidadãos por meio da criação de blogs, ainda há presença maciça dos conglomerados de mídia. Em reportagem publicada no Estado de S. Paulo, o diretor do Monde diplomatique, Ignacio Ramonet, disse que os sites campeões de acesso são vinculados a grandes empresas. Para Ramonet, isso só reforça o poder destes grupos dentro da esfera social.

A família Sarney é um exemplo. Eles são donos da TV Mirante, afiliada da Globo; do portal que leva o mesmo nome; também, são proprietários do jornal O Estado do Maranhão e de mais cinco rádios na região metropolitana de São Luiz e outras no interior. Em Minas Gerais, a mídia já mostra uma predileção por Aécio Neves. O neto de Tancredo, que foi o cabeça da chapa presidencial com Sarney, é acionista dos Diários Associados – conforme indica o registro dos candidatos que disputaram a última eleição, disponível no site do Tribunal Superior Eleitoral. O grupo de comunicação tem 15 jornais, oito emissoras de televisão, 12 rádios, nove portais e uma fundação.

O grande irmão, como dizia George Orwell no livro 1984, é um ser quase onipotente que dita como devem ser as pessoas e de que forma elas devem agir. Na mídia, o grande irmão são os grupos políticos que impõem com o cabresto sua vontade. Sob esse fogo cruzado estão os jornalistas. Mal remunerados e sem uma legislação que mantenha um padrão de atuação, os profissionais servem-se unicamente da conduta estabelecida pelo código de ética da Federação, que defende a categoria, e dos padrões adotados por cada veículo.

* Tiago Severino é jornalista, especialista em jornalismo político, professor e escritor.

O olhar vesgo da imprensa

Atenta, como sempre, às oportunidades do jornalismo como espetáculo, a imprensa brasileira dá grande destaque, nas edições de quinta-feira (18/3), à manifestação ocorrida no Rio de Janeiro em protesto contra a emenda do deputado Ibsen Pinheiro, que tenta alterar o sistema de partilha dos recursos da exploração do petróleo.

Os jornais estão prenhes de imagens e declarações, quase unanimemente repercutindo as queixas dos estados em cujas áreas territoriais é feita a extração, mas nenhum deles vai ao que interessa na questão dos royalties.

A análise mais interessante não cativou os editores e nem brotou de uma pergunta inteligente de um repórter. Ela foi dada espontaneamente pelo empresário Oded Grajew, um dos criadores do Instituto Ethos de Responsabilidade Social Empresarial e o principal articulador do movimento Nossa São Paulo.

Baixo IDH

Grajew declarou, inicialmente à rádio CBN, que os debates em torno da riqueza potencial das novas reservas de petróleo estão deslocados do seu eixo mais importante. Discute-se para onde deve ir o dinheiro, quanto cabe a cada estado e a cada município detentor dos direitos segundo a lei; se o dinheiro deve privilegiar ou compensar essas unidades da Federação ou se deve ser repartido igualmente para todos os Estados.

Na opinião de Oded Grajew, que sequer foi suspeitada pelos jornais, a questão principal é: o que fazer com a dinheirama.

O empresário lembra que, até agora, os royalties pago aos municípios que são sede de atividades petrolíferas não serviram a suas populações. Ele observa que os municípios fluminenses de Campos dos Goytacazes e Macaé, duas das principais entradas do petróleo da bacia de Campos, não registraram melhoras significativas nas condições de vida de suas populações desde que o petróleo começou a jorrar.

Segundo dados da ONU, Macaé se encontra na posição 815 no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano Municipal no Brasil. Campos dos Goytacazes é o município número 1.818 na lista do IDH-M, com altos índices de analfabetismo e uma renda per capita equivalente à de Nova Iguaçu e inferior à de Nilópolis.

Os jornais passam ao largo dessa questão. Por quê?

Benefícios de longo prazo

A maioria dos principais meios da imprensa brasileira ainda separa a economia do bem-estar social. Orçamentos, faturamentos, receita tributária, Produto Interno Bruto e outros dados sobre a riqueza nacional raramente são cotizados com o que podem ou devem produzir de bem-estar para a população.

No caso dos royalties do petróleo, a observação de Oded Grajew apanha a imprensa de olhos tapados. Por que antes que ele fizesse essa observação nenhum jornal havia proporcionado a seus leitores esse questionamento, que deveria ser a essência de todo o noticiário sobre os recursos financeiros disponíveis? A quem devem beneficiar?

No caso do Rio, centro principal dos protestos dos estados e municípios produtores de petróleo, que se sentem lesados pela emenda do deputado Ibsen Pinheiro, o principal argumento que se apresenta é o da suposta dificuldade que tal emenda, se vier a ser aprovada pelo Senado e aceita pelo Executivo, poderá provocar para o financiamento da Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016.

Muito provavelmente os queixosos têm razão, a se considerar o que diz a Constituição.

A pergunta que nenhum jornalista fez, e que foi respondida assim mesmo pelo empresário Oded Grajew, é: que benefícios de longo prazo as populações desses e de outros estados podem esperar da anunciada riqueza que deve jorrar das reservas do pré-sal?

Reproduzindo o chororô

Os principais jornais do país, aqueles que têm influência nacional, não se tocaram que essa é a questão mais importante porque não possuem, em seu DNA e em sua cultura interna, a sensibilidade para os temas relacionados à questão do desenvolvimento sustentável.

Costumam investir tempo e dinheiro na remodelação gráfica, como fez o Estado de S.Paulo na semana que passou, fazem esforços de cobertura dos grandes eventos, mas não tratam de introduzir em seu sistema de convicções os paradigmas da sustentabilidade.

Aceitar o chororô de governadores e prefeitos que alegam o risco da falência – sem perguntar o que o dinheiro do petróleo tem feito pelo bem-estar de suas populações – é o mesmo que reproduzir os press-releases, os comunicados oficiais dos governantes.

Para isso nem é preciso ser jornalista.

* Luciano Martins Costa é jornalista e colaborador do Observatório da Imprensa.