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Secretaria do Ministério da Fazenda quer que Ancine seja mais rigorosa nas regras de controle

A Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda (SEAE), em suas contribuições à consulta pública da Ancine para as instruções normativas que regulam o Serviço de Acesso Condicionado (SeAC) trouxe pelo menos um elemento bastante polêmico para o debate, em linha com o que já haviam sugerido entidades de defesa da democratização das comunicações. Para a SEAE, a Ancine não adota um caminho adequado do ponto de vista concorrencial ao recuar nas regras de controle estabelecidas na proposta de alteração da Instrução Normativa 91 (IN 91, referente ao credenciamento das empresas). Para a secretaria, este recuo em relação aos níveis atuais considerados para interesse nos vínculos societários relevantes tem impactos nas relações verticais entre fornecedores ou potenciais fornecedores de serviços da cadeia da TV paga. O comentário da SEAE está disponível na homepage do site TELETIME.

A Ancine, na proposta de alteração da IN 91, reduziu os elementos de caracterização de controle que já existiam na regulamentação ao ponto de considerar controlador apenas o "titular de direitos de sócio que lhe assegurem, de modo permanente, preponderância nas deliberações sociais e poder de eleger a maioria dos administradores". Segundo a agência, foi um movimento para alinhar o conceito ao da Lei das S/A. Até então, a IN 91 previa não só esse elemento de caracterização de controle como também direito de veto, voto em separado e impedimento à verificação de quórum qualificado. Essa definição será fundamental para que se caracterize uma programadora como a Globosat, por exemplo, como programadora independente.

Mais simples que a lei

Para a SEAE, a Ancine está simplificando a definição para além do que prevê, inclusive, a Lei das S/A. E, independente disso, diz a secretaria do Ministério da Fazenda, a atividade reguladora prevê a possibilidade de definições mais amplas. Para a SEAE, o conceito de controle para efeitos regulatórios pode até se utilizar de elementos do conceito de controle para efeitos societários, mas não lhe deve, necessariamente, obediência. Para a secretaria, enquanto no direito societário se quer identificar os centros decisórios, para fins de definição de reconhecimento do comando das empresas e, eventualmente, proteção de minoritários, na regulação o que se busca é moldar o mercado para um funcionamento mais eficiente, com minoração de riscos de abusos de poder econômico e práticas exclusionárias. Por isso, defende a SEAE, a Ancine deveria manter a IN 91 inalterada em relação à definição de controle.

Segundo a SEAE, ao simplificar a esse ponto a regra de controle, igualando-a simplesmente à titularidade de mais de 50% das ações, a Ancine coloca inclusive a definição de controle prevista no Artigo 5 da Lei 12.485/2011 em risco. Para a secretaria, a alteração planejada pela Ancine para o conceito de pessoa jurídica controlada, no fim das contas, transforma o termo controle do artigo 5 da Lei em algo sem utilidade. O artigo 5, recorde-se, é o que separa os mercados de conteúdo e de distribuição.

IN Geral

Em relação à Instrução Normativa do Serviço de Acesso Condicionado em si, a SEAE faz uma série de sugestões pontuais. Entre elas estão a recomendação para que as regras da IN tenham um prazo máximo de vigência de 12 anos, em conformidade com a Lei; que haja garantias de que em caso de dispensa de cumprimento parcial de cotas, seja assegurada a presença daqueles conteúdos produzidos por quem tem mais dificuldade de acesso e; a recomendação para que a Ancine liste os eventos considerados de interesse nacional.

Entidades defendem papel regulador da Ancine

Entidades da sociedade civil com atuação geral e no campo da comunicação apresentaram propostas comuns nas consultas públicas da Ancine (Agência Nacional do Cinema) que regulamentam a Lei nº 12.485/11. A CUT (Central Única dos Trabalhadores), o Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), o Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé e o Coletivo Intervozes registraram contribuições que enfatizam a importância do papel regulador do audiovisual da Agência.  

Ao apresentar as propostas, também apoiadas pela Fitert (Federação Interestadual de Trabalhadores em Rádio e Televisão) e pela Arpub (Associação das Rádios Públicas do Brasil), as organizações mostraram-se ainda preocupadas com a 'Declaração dos direitos dos cineastas', publicada por um pequeno grupo de produtores, que busca explicitamente capturar a Ancine para seus interesses particulares. A declaração foi publicada às vésperas do fechamento do processo de consulta pública.

A Lei nº 12.485 e o papel regulador da Ancine têm sido alvo de ataques, também, por parte do setor privado. A ABTA (Associação Brasileira de TV por Assinatura) e a operadora SKY são os principais porta-vozes desse segmento. Esta última, inclusive, veiculou recentemente campanha enganosa entre seus assinantes para se contrapor à lei. Para Renata Mielli, diretora do Barão de Itararé, o que há de comum entre as manifestações de empresários e cineastas é uma visão ultraliberal de defesa de um mercado que atua sem regras e sem regulação. “Para ambos o ‘negócio do audiovisual’ lhes pertence e não está vinculado a qualquer interesse público”, afirma Renata.

Contribuições

Os dois pontos principais das contribuições apresentadas pelas organizações da sociedade civil tratam dos temas de coligação e controle e da possibilidade de dispensa do cumprimento de cotas, que afeta diretamente os produtores e programadores independentes.

A importância do tema de coligação e controle se dá porque ele incide na classificação das programadoras brasileiras independentes, para quem estão reservados 1/3 das cotas de canais. Nos textos em consulta, a Agência atenua a definição de controle e retira do texto original as possibilidades de sanções sobre as empresas. João Brant, membro da Coordenação Executiva do Intervozes, ressalta que no texto em revisão, o poder estatutário ou contratual de veto em qualquer matéria ou deliberação era um elemento que fazia parte da própria definição de controle. “Com a versão nova proposta pela Ancine, o poder de veto deixa de ser inclusive um indício de preponderância nas deliberações sociais, o que pode gerar situações em que uma programadora exerce um controle ‘de fato’ sobre uma empacotadora, com poder de veto nas matérias sobre empacotamento (como entrada de novos competidores ou formação do lineup), e ainda assim ser considerada programadora brasileira independente”, alerta Brant.

A proposta apresentada pelas entidades modifica esses textos, tomando como referência a definição da resolução 247 da Comissão de Valores Mobiliários, que é mais forte que a definição básica da Lei das Sociedades Anônimas, usada como referência pela Ancine. Elas propõem ainda que 'poder de veto em qualquer questão relacionada à programação ou ao empacotamento' seja incluído entre os indícios de preponderância nas deliberações sociais. A contribuição apresentada recoloca no texto da Instrução Normativa 91 os mecanismos que dão à Ancine as condições de exercer plenamente seu poder regulatório e fiscalizatório. Segundo Guilherme Varella, advogado do Idec, “a regulação do audiovisual é fundamental para equilibrar os interesses dos atores envolvidos, evitar assimetrias e reconhecer a importância estratégica do segmento”.

Dispensa das cotas

O outro tema central das contribuições é a possibilidade da dispensa de cotas, prevista pela Lei nº 12.485 “em caso de comprovada impossibilidade de cumprimento integral”. Para Renata Mielli, o texto posto em consulta tinha problemas por não detalhar bem esses critérios – deixando a cargo de regulamentação posterior – e abrir a possibilidade de essa dispensa se dar não apenas em casos de impossibilidade técnica ou econômica, mas também de inadequação do perfil da programação. “Ao sugerir que um canal possa ser dispensado das cotas por motivos como esses, a agência desestimula a criatividade dos programadores na busca de programação brasileira e independente que combine com seu perfil de canal, e abre um enorme flanco para que o previsto na lei como exceção seja considerado possibilidade corrente”, aponta a diretora do Barão de Itararé.

A Secretária Nacional de Comunicação da CUT, Rosane Bertotti, ressalta que “mesmo que não conflitantes com a lei, essas possibilidades enfraquecem seu espírito original de garantia de conteúdo nacional e independente no horário nobre em todos os canais de espaço qualificado”. Na consulta, as organizações propuseram a retirada do critério “perfil de programação” como um dos que permite a dispensa de cotas, e incluem outros critérios que buscam restringir as possibilidades de dispensa. Além dessas duas grandes questões, as organizações contribuíram em relação às regras sobre reprise e ao tempo de publicidade.

Representante dos cineastas?

A afirmação do poder regulador da Ancine feita pelas organizações na consulta pública deixa evidente o conflito com o manifesto apresentado pelos cineastas Luiz Carlos Barreto, Cacá Diegues e Renata de Almeida Magalhães. O manifesto, que parafraseia a Declaração de Direitos de Virgínia, escrita no ano de independência dos Estados Unidos, afirma que “todo o poder da Ancine emana dos cineastas, aqui englobando todos os que representam e exercem os diversos segmentos da produção audiovisual, e, em seu nome, deve ser exercido”.

Para Renata Mielli, essa afirmação é completamente absurda e desconsidera todo o caráter público das agências, que devem responder ao interesse público, e não a interesses particulares de qualquer segmento. Renata lembra que a lei que cria a agência a define como um órgão de “fomento, regulação e fiscalização da indústria cinematográfica e videofonográfica”, e a define como “dotada de autonomia administrativa e financeira”.

Esses poderes são questionados pelo manifesto, que afirma que a agência não deveria misturar as atribuições de normatização, fomento e fiscalização. Guilherme Varella, do Idec, lembra que entre as atribuições das agências estão justamente as de “construir normas e critérios para qualidade dos serviços e fiscalizar infrações, falhas e abusos, contribuindo de forma essencial para a proteção dos produtores, mas também dos telespectadores, que consomem esses serviços culturais e devem ter seus direitos garantidos”.

O manifesto também é criticado pelo representante do Intervozes. “É surreal que em pleno século XXI surjam peças como essas, que reforçam assumidamente uma visão clientelista de Estado e propõem de forma aberta a captura de uma agência reguladora por um setor”. O manifesto afirma textualmente que a Ancine é “representante dos cineastas” e propõe que os debates sobre as decisões sejam realizados antes de as propostas serem colocadas em consulta pública. Para Brant, contudo, os cineastas que têm essa visão são minoria. “A maioria dos produtores tem trabalhado de maneira séria, contribuído com as consultas e dialogado com a Ancine sem buscar qualquer tipo de privilégio”.

Confira as contribuições das entidades da sociedade civil.

Já em vigor, Lei da TV Paga muda as regras da produção nacional

Depois de cinco anos de discussões no Congresso Nacional, a Lei 12.485 — ou a nova Lei da TV Paga, como ficou conhecida — já está em vigor. E é ela que mudará o perfil do que o telespectador vem assistindo na programação. Depois de passar por consulta pública e ainda sem regulamentação pela Agência Nacional do Cinema (Ancine), a lei muda as regras do jogo para os canais de televisão por assinatura. A partir do segundo semestre, eles terão que exibir uma hora e dez minutos de programação nacional por semana em seu horário nobre, num processo gradativo que, até 2014, chegará a três horas e 30 minutos — com pelo menos metade desse tempo composto por atrações de produtoras independentes.Outras determinações fazem parte da nova ordem, que será fiscalizada pela Ancine. Uma delas define que os pacotes de TV por assinatura devem incluir um canal brasileiro para cada três que apresentem predominantemente séries, documentários, filmes e animações (considerados como de espaço qualificado). No entanto, canais de TV aberta, esportivos e jornalísticos não mudam: sua grade continua a mesma, sem a obrigação de exibir obras nacionais, mas o limite máximo de publicidade será de 25%, como nas demais emissoras.

Afinal, o que muda? Os canais estão se preparando para atender à nova demanda e as produtoras já estão se mexendo.

— Para atender às previsões, a maioria dos canais terá que ajustar as grades de programação do horário nobre. Quanto às cotas, esperamos que a regulamentação as mantenha dentro dos limites definidos na Lei — explica Fernando Ramos, responsável pela distribuição dos Canais Globosat.

Segundo Fernando, aguardar para ver como a lei vai atuar na rotina televisiva do público é necessário:

— É preciso esperar para ver quais serão os impactos nos hábitos dos assinantes. A outra cota, imposta às operadoras, permitirá que os programadores optem por adaptarem os seus canais, ou não, para as cotas dos "canais brasileiros de espaço qualificado". Caberá a cada programador analisar os prós e contras desta adaptação de suas grades, em alguns casos certamente profundas.

Canais como GNT e Multishow, diz Fernando, já cumprem ou estão muito próximos de cumprir os requisitos da lei. Portanto, suas grades não devem ser tão mexidas. No caso do Viva, ajustes serão feitos. Já o Canal Brasil, por ter mais de 12 horas diárias de conteúdo nacional, é considerado qualificado para cumprir a cota específica de canais brasileiros.

— A Globosat tem acordo com mais de 100 produtoras brasileiras independentes, que produzem em média mais de 10 mil horas ao ano de conteúdo audiovisual para seus canais. E utilizará a relação com as produtoras para cumprir as $ências. Mas isso será de forma planejada e de acordo com a gradualidade estabelecida na lei, já que tais alterações envolvem aspectos econômicos e estratégicos dos canais — diz Fernando.

Presidente da Associação Brasileira de Produtoras Independentes de TV (ABPITV), Marco Altberg tranquiliza o telespectador mais aflito e diz que nada vai mudar da noite para o dia.

— É como se estivéssemos iniciando um novo momento no negócio de TV por assinatura. Estamos diante de uma chance de se fazer uma programação de conteúdo brasileiro voltada também para um novo consumidor, a chamada classe C — explica Marco, dizendo ainda que a associação está "examinando com lupa" a proposta de regulamentação da Ancine: — Somos da corrente que quer que dê certo e que entende que vai haver uma margem de experimentação e acomodação de mercado. Todos cederam e todos saem ganhando com a lei. A cota de conteúdo brasileiro é mínima e só a metade cabe às produtoras independentes.

Durante o Rio Content Market, evento que discutiu a produção audiovisual no Brasil na última semana, executivos de canais deram seu ponto de vista. Vice-presidente do grupo Turner (que engloba, entre outros, TNT, TBS, Space, Cartoon Network e Boomerang), Anthony Doyle se preocupa com o custo de produção e com as restrições ao conteúdo considerado qualificado para atender às exigências.

— A TV por assinatura é diferente da aberta, do orçamento ao modelo de negócio. Com a lei, tudo indica que parte do financiamento deve vir do mercado. Mas nos preocupa a falta de conhecimento do mercado em relação aos canais. Não podemos nos dar ao luxo de fazer nada que não se encaixe nas cotas e ainda temos dúvidas sobre o que é conteúdo qualificado. Pensamos em coproduções com canais abertos. Não se pode achar que a TV por assinatura, sozinha, vá produzir, financiar e ainda amortizar esses custos.

No TNT, o investimento em séries nacionais está em andamento. Já no Space, no qual o foco é mais jovem, o reality "Amazing race" terá uma versão feita no Brasil, com competidores daqui. Além disso, o canal pretende investir em seriados locais de ação, suspense e terror. A produção verde e amarela também vem com tudo no Cartoon Network, mesmo antes das mudanças na lei, com "Tromba trem" e "Gui e Estopa", além da "Turma da Mônica".

No Boomerang, que já exibiu três temporadas do reality "Temporada de moda Capricho", produzido aqui, a procura é por séries de ficção e atrações sobre comportamento e moda para meninas entre 12 e 17 anos. No Glitz*, a programação nacional com foco em lifestyle já faz parte da grade.

— Existe uma percepção de que todo reality é o "BBB" e que ganhamos milhões com eles. Não é verdade. O "Temporada de moda Capricho" focava nas tarefas e não na vida dos participantes. Para esse estilo de programa, temos espaço — explica Daniela Vieira, gerente de conteúdo do Cartoon Network, Boomerang e Tooncast Brasil.

Com o canal TBS, voltado para o riso, Anthony reconhece a importância da adaptação para o perfil do público brasileiro.

— Para um canal de comédias ser sucesso no Brasil, ele depende de conteúdo nacional. O país tem um estilo próprio de humor — diz o vice-presidente da Turner, a favor dos realities como programação aceitável nos termos da nova lei: — Existe a questão de se desqualificar os reality shows para as cotas. Se isso acontecer, um canal como o truTV deixa de existir e de ser opção para produtores.

De olho nos jovens, os canais Viacom — que incluem, no Brasil, o Vh1, o Comedy Central e a Nickelodeon — já se antecipam às mudanças.

— Já fizemos um programa de stand-up comedy, o "Comedy Central apresenta". O momento é de aguardar a regulação. Há alguns pontos em aberto, mas estamos nos planejando em termos de aquisição e estratégia, escolhendo projetos e recebendo produtores — diz o diretor de produção Roberto Martha.

Tatiana Rodriguez, vice-presidente sênior de programação e criação da Nickelodeon América Latina, também tem boas notícias para os profissionais brasileiros:

— Queremos produzir uma novela no Brasil nos moldes das que já fazemos, voltadas para a faixa entre 8 e 14 anos — avisa ela.

Diretor do Universal Channel, criado para ser um espaço para séries americanas, Paulo Barata não procura cópias de atrações importadas.

— Não queremos um "House" ou um "Law & order: SVU" brasileiros. A primeira razão é grana. A comparação é injusta: um episódio de "House" custa de US$ 6 a US$ 8 milhões. Vamos mostrar atrações antagônicas às produções de Hollywood que exibimos — explica Paulo.

Assim, surgiram "What’s off", uma espécie de reality show fake com um diretor de publicidade que sonha ser cineasta, e "Corta!", animação passada num set de gravações, ambas sem data de estreia. O tema são os bastidores, que serão explorados pelo canal nas novas produções nacionais, em parceria com produtoras como a Zohar e a 2DLab, respectivamente.

Presidente da operadora SKY, Luiz Eduardo Baptista da Rocha, o Bap, vem se posicionando abertamente contra a lei, em forma de cartas aos assinantes, declarações e vídeos. A briga é com a Ancine:

— Não é a competição que nos assusta, mas o excesso de controle da Ancine. As cotas são uma questão matemática, e não filosófica. Ficará mais caro para o telespectador — afirma, disposto a brigar contra a lei até "esgotar possibilidades": — Se o Supremo Tribunal Federal entender que ela está correta, aceitamos. Mas não vamos nos calar. Existem outras formas de estimular a produção nacional, atrvés de leis de fomento com caráter democrático.

Do lado das produtoras, João Daniel Tikhomiroff, presidente da Mixer, diz que "estão fazendo muito carnaval por pouca coisa". Para ele, que está produzindo o novo programa de Rafinha Bastos para o canal pago FX, o conteúdo nacional na TV é bem recebido pelo público em geral.

— Por causa da lei, já houve um aumento na demanda dos canais por produções. Não vejo a mudança como um problema, essa visão é distorcida. As boas séries internacionais não vão deixar de existir. Já as ruins poderão dar lugar a boas produções nacionais. No fim, o mercado vai se adaptar. O público sempre gostou de programas brasileiros. O sucesso da TV Globo está aí como prova. A TV fechada também pode conversar com o grande público — acredita.

Em meio ao debate, o diretor-presidente da Ancine, Manoel Rangel, diz que a ideia é que o impacto sobre o telespectador não seja tão grande.

— O cumprimento da obrigatoriedade de veiculação de conteúdo nacional em horário nobre pelos canais de espaço qualificado será progressivo: uma hora e dez minutos por semana no primeiro ano, duas horas e 20 minutos no segundo, três horas e 30 minutos a partir do terceiro. É quase imperceptível, mas extremamente relevante — explica Manoel: — Cada canal poderá escolher que obras brasileiras veicular, de acordo com seu perfil, e em que horário exibi-las dentro do horário nobre, com um impacto mínimo na sua grade.

De qualquer forma, as mudanças, ele diz, devem ser sentidas somente a partir de agosto:

— Com a publicação das Instruções Normativas, que regulamentam dispositivos do texto, e após sua apreciação pelo Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional, as empresas programadoras e empacotadoras terão 90 dias para se adaptar às regras. Também estarão valendo todos os demais dispositivos da lei, incluindo os limites para a publicidade, que não existiam na TV por assinatura.

Globo tenta manter controle na TV paga

A nova lei de TV paga, aprovada em agosto de 2011, restringe a atuação de uma mesma empresa nos segmentos de distribuição de pacotes, de um lado, e programação de canais, de outro.

O princípio, formulado para barrar o domínio do mercado por poucas empresas, está sob risco agora, quando se trava uma disputa para sua implementação.

As Organizações Globo tentam manter um grau de influência na Net -a distribuidora cujo controle passou para as mãos do bilionário mexicano Carlos Slim- e ao mesmo tempo credenciar-se como programadora independente, via Globosat.

No acordo de acionistas em que transferiu o controle da Net para a Embratel, de Slim, a Globo manteve o direito de indicar representantes para o conselho da distribuidora de TV paga, que domina 38% do mercado hoje.

Para a Anatel, a agência reguladora das teles, o arranjo não configura saída total da Globo do controle da Net. A agência exigiu a apresentação de um novo acordo de acionistas, no prazo de um ano, prevendo a retirada da Globo do controle da Net.

Sem desvencilhar-se completamente da Net, a Globo não poderia ter a Globosat classificada como programadora independente pela Ancine -agência federal que zela pela cota de conteúdo nacional na TV paga, uma outra inovação da lei.

Cota para nacionais

A regra diz que todo pacote de programação a ser distribuído no país a partir de abril -prazo para que a lei entre em vigor- terá de incluir um canal produzido por empresas nacionais a cada três.

Caso seja considerada programadora independente, a Globosat (que reúne canais como GNT e Multishow) poderia oferecer 11 canais nacionais; 12 é o máximo previsto pela lei.

Se for considerada uma empresa coligada da Net, a Globosat só poderia oferecer oito canais nacionais.

As Organizações Globo, segundo a Folha apurou, pressionam a Anatel para que adote regras mais flexíveis, baseadas na Lei das S.A., pela qual a presença da Globo na Net não configuraria ingerência no controle.

A Ancine decidiu adotar a Lei das S.A. na sua regulamentação, que está sob consulta pública até este mês.

Sky lança campanha publicitária contra a Lei 12.485/11

A Sky lançou uma campanha contra a Lei 12.485/11, que estabelece novas regras para o setor de TV por assinatura. A campanha, voltada para o público final e assinante de TV paga, afirma que o controle remoto do assinante está nas mãos da Ancine, que quer "determinar o que você vai assistir na TV paga”.

O anúncio impresso destaca pontos da lei, em especial aqueles ligados às cotas de conteúdo e canais nacionais na programação, e faz interpretações sobre cada um deles.

Além do impresso, a operadora veicula para seus assinantes uma campanha em vídeo, com alguns de seus garotos-propaganda e atletas patrocinados, sobre os diversos pontos da lei. Um site também foi criado para divulgar a visão da operadora.

A campanha ainda informa telefones da Ancine e do Supremo Tribunal Federal para manifestação do público contra a lei e sua regulamentação.

Proposta e seus impactos

A Sky enumera em sua campanha impressa e em seu website diversos pontos da "proposta da Ancine" (embora muitos destes pontos estejam na própria lei, aprovada pelo Congresso e sancionada pela Presidência, e não na regulamentação proposta pela agência reguladora) e aponta os "impactos para quem tem TV paga". Entre os pontos destacados pela operadora estão a impossibilidade de cumprimento de cota de conteúdo nacional com conteúdos como programas de auditório; entrevistas; comentários; e transmissões ao vivo de esporte, jornalismo e programas de auditório.

Outro ponto atacado pela Sky na campanha é que a "lei estabelece que o conteúdo esportivo e os canais de esporte não são válidos para cumprir as cotas de conteúdo nacional e de canal nacional". Segundo a operadora, isso criará uma restrição à veiculação de esportes, prejudicando o esporte nacional.

Pela Lei 12.485, vale lembrar, um terço dos canais qualificados devem ser brasileiros. No line-up SD da Sky, se os canais esportivos e noticiosos fossem considerados qualificados, mais 12 canais entrariam na conta, dos quais sete são gerados no Brasil. Se apenas os esportivos fossem considerados qualificados, sete entrariam na conta, sendo apenas dois estrangeiros. Portanto, em ambos os casos a operadora sairia com um "crédito" nas cotas. O fato é que esta qualificação está na própria lei, e portanto não se trata de uma decisão "nas mãos da Ancine" e nem pode ser modificada na regulamentação.

O controle patrimonial das obras consideradas independentes, que deve ser das produtoras independentes, também está na campanha da Sky. Segundo a operadora, isto "desincentiva o desenvolvimento da indústria da produção nacional".

A operadora condena ainda a necessidade de qualificação dos conteúdos e dos canais por parte da Ancine e o poder de reclassificar um canal, ou de negar o registro de empresas que atuam no setor.

Em alguns pontos, a operadora induz o leitor ao erro. Por exemplo, segundo a Sky, a proposta da Ancine é que 10% do conteúdo de pay-per-view seja brasileiro e não seja repetido por mais de uma semana. "Impedir reprises restringe o seu acesso a obras brasileiras relevantes (Tropa de Elite, Tropa de Elite 2, Central do Brasil, entre outros)", diz a operadora. No entanto, o prazo de uma semana seria para o cumprimento de cota, o que não impediria a disponibilização do conteúdo "relevante" por mais tempo.

Sobre a obrigatoriedade de disponibilização dos sinais das operadoras à Ancine, sem encriptação, para que a agência fiscalize o cumprimento das cotas, a Sky afirma que "incentiva a pirataria" e "estimula a ilegalidade". No entanto, a lei não obriga que estes sinais trafeguem nas redes das operadoras sem encriptação.