Nem telefonia fixa, nem televisão paga, nem dados. O que precisa de nova e efetiva política pública de universalização é a banda larga, forma de acesso às redes de comunicações que permite ao usuário ter serviços de voz (telefonia fixa), conteúdo audiovisual (TV paga) e navegação na rede mundial de computadores, Internet (dados em alta velocidade).
Nesse aspecto, a nova edição do Plano Geral de Metas para Universalização (PGMU) dos serviços de telecomunicações da telefonia fixa local, editada pelo governo Lula por decreto publicado na segunda-feira (8), é visto como instrumento fundamental à perseguição de um futuro da banda larga, em que o acesso das classes menos privilegiadas será custeada por recursos do Fust (Fundo para Universalização dos Serviços de Telecomunicações).
Essa é a conclusão a que chegaram os palestrantes do seminário “O futuro das telecomunicações”, José Leite (professor e ex-conselheiro da Anatel), Luiz Cuza (presidente da Telcomp), e o jornalista Rubens Glasberg (editor das revistas Teletime, PayTV e Tele Viva). A Telcomp é uma associação que reúne pequenos (900), médios (CTBC, Intelig, GVT e Nextel) e um grande (Embratel) prestador de telecomunicações, na defesa de mais competição no setor.
Durante quase quatro horas, os palestrantes expuseram e debateram, na Câmara dos Deputados (Auditório Freitas Nobre), os principais temas que no momento concentram o foco das preocupações políticas e regulatórias no País: o processo de revisão do Plano Geral de Outorgas, para acomodar a compra da Brasil Telecom pela Oi; e o Projeto de Lei 29/07. O evento foi iniciativa do Instituto Teotônio Vilela (PSDB) e Astrojildo Pereira (PPS) e reuniu na platéia parlamentares como Roberto Freite e José Aníbal.
O PL29 abre às teles o mercado de distribuição de conteúdo audiovisual e impõe cota às emissoras pagas de 3h30 semanais para veiculação de produções nacionais (metade disso oriunda de produtores independentes). O projeto também cria fundo anual de R$ 300 milhões para estimular a produção genuinamente brasileira, a partir da aplicação de alíquota de 10% sobre o Fistel (Fundo de Fiscalização dos serviços de telecomunicações), responsável pela arrecadação de R$ 3 bilhões anuais das empresas do setor.
No caminho tinha a tecnologia
Para Leite, o esgotamento do modelo de mercado de serviços de telecomunicações, criado há dez anos no governo Fernando Henrique Cardoso, deu-se devido ao veloz avanço tecnológico e a telefonia móvel celular, que trouxe o conforto e a pessoalidade das comunicações para dentro do bolso. A tecnologia permitiu o desenvolvimento da internet, atropelou o acesso discado (que dava os primeiros passos em meados da década passada, no decorrer da discussão da Lei Geral de Telecomunicações) e produziu meios de transmissão de dados com taxas de compressão sempre mais elevadas, veiculando sinais digitais capazes de trafegar em velocidades inimagináveis. E tanto no ambiente da telefonia fixa quanto na móvel.
“Não prevíamos que (a internet) fosse ficar tão importante em tão pouco tempo e que o acesso fosse ficar banda larga”, admitiu Leite, que participou de todo o debate da lei e ajudou a tornar a Anatel uma realidade, nos dez anos que foi seu conselheiro. Ele acaba de cumprir período de 120 dias de quarentena pelo afastamento da Agência (em 4 de novembro). Sua participação no debate de hoje foi a primeira aparição pública que faz após o desligamento.
A universalização da banda larga necessitaria, segundo Leite, de mudanças na Lei Geral de Telecomunicações (LGT), já que não existe esse serviço – a BL é apenas uma tecnologia de acesso – e da lei do Fust, que só pode ter seus quase R$ 6,5 bilhões destinados a programas e políticas públicas que integram obrigações e metas de atendimento exclusivas das concessionárias.
Para ele, a conversão das metas de instalação de PSTs (postos de serviços de telecomunidações) por backhaul (infra-estrutura de transporte de serviços de telecomunicações), feita no PGMU, é "muito boa" e "ardilosa", já que, sendo a banda larga um serviço prestado em regime privado, não poderia ser prestado dentro do contexto da LGT e em regime público, o das concessionárias fixas. A troca espontânea das metas, numa negociação direta entre governo e prestadoras, driblou a restrição legal.