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Rádio digital avança sem debate público

No momento em que se transita para a digitalização dos meios de comunicação, a velocidade peculiar ao rádio manifesta-se ainda mais intensa nas decisões políticas e de mercado acerca das escolhas tecnológicas. Neste caso, porém, tal rapidez pode ser prejudicial aos futuros ouvintes: sociedade e a comunidade científica estão sendo praticamente ignoradas. Os empresários do setor adiantam as suas preferências, antecipando-se a qualquer possibilidade de debate público sobre a questão. Para justificar o processo oblíquo de escolha do que será o rádio digital no Brasil, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) abriu, nesta semana, Consulta Pública para avaliar o Iboc, padrão americano escolhido pelos radiodifusores para ser implementado no país.

Enquanto ainda se definem especificações técnicas e critérios diplomáticos de cooperação entre Brasil e Japão para a implementação da TV digital brasileira, o sistema de digitalização do rádio se encaminha, ao que tudo indica, para uma definição bem mais rápida. A agilidade, característica intrínseca do rádio, se transpõe para as decisões políticas sobre o veículo, com resultados discutíveis. Para colher contribuições acerca do sistema americano de Rádio Digital AM Iboc (In Band on Channel), em fase de testes desde o ano passado, a Anatel abriu a Consulta Pública nº 771, em 5 de março de 2007, que estará vigorando até 24 de abril (leia íntegra da Consulta), baseada no documento Proposta de Critérios e Procedimentos para Avaliação do Sistema de Rádio Digital AM Iboc elaborado pela Universidade de Brasília – UnB.

Para o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), estes são os arremates de um processo que iniciou torto, pois não incluiu qualquer tipo de consulta além do que já estava dado: a escolha do padrão americano pelos radiodifusores. “Sem nem mesmo um arremedo de debate, como foi o da TV digital, a Anatel baterá o martelo pelo Iboc”, declarou o coordenador-geral do FNDC, Celso Schröder. A consulta da Anatel limita-se a um único padrão, mas poderá servir como justificativa pública para embasar a decisão final. Em levantamento realizado no ano passado, o FNDC estimou que a transição para o padrão proprietário Iboc poderá custar R$ 15,7 bilhões ao cidadão e mais de R$ 1,3 bilhão às emissoras (leia matéria).

Legitimado pelo ministro

Em entrevista concedida a Abert (Associação Brasileiras das Emissoras de Rádio e TV), esta semana, o ministro Hélio Costa anunciou a criação de um Comitê Consultivo interministerial, com a participação da indústria e os radiodifusores, que observará a Consulta Pública do Iboc. Da indústria, participarão especialmente os representantes das áreas de transmissão e recepção – os radiodifusores, através de suas associações e as emissoras educativas, comunitárias e culturais. (acesse trechos da entrevista).

Segundo Costa, em 90 dias será divulgado um estudo indicando o sistema de rádio a ser adotado no país. Ele anunciou, ainda, que há um cronograma para implantação do rádio digital até dezembro, nas capitais. Confirmando mais uma vez sua posição, Costa disse que o padrão americano Iboc é o mais adequado à realidade brasileira, mas ainda não está definido. Adiantou que os radiodifusores terão acesso a linhas de crédito especiais.

Na opinião de Regina Motta, pesquisadora em Comunicação e professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que participou dos estudos do Sistema Brasileiro de TV Digital (SBTVD), difícil é imaginar que o modo como os radiodifusores pressionam o poder público pela adoção do padrão norte-americano IBOC não vai influenciar nessa escolha. “Se for para haver um debate tal qual o da TV Digital, para depois dele resolver por um padrão que já estava previamente escolhido, a iniciativa é só um gasto de dinheiro público.” A seu ver, nesta decisão, tudo indica que o Ministério das Comunicações vai passar por cima tanto das comunidades acadêmicas e científicas, quanto da sociedade civil.

Para Nélia Del Bianco, coordenadora de pesquisa "Jornalismo e Sociedade" na UnB, a tendência é clara: a escolha recairá sobre um modelo de transmissão digital que não coloque em risco o status quo das emissoras existentes. “Neste caso, o Iboc oferece segurança em tempos de incerteza, porque mantém os radiodifusores onde estão, com suas freqüências, e garante a transição pela coexistência (um valor caro aos processos de transição tecnológica) com o analógico”, reflete.

Segundo a pesquisadora, a tendência por um modelo comercial que desconsidere o processo de adaptação de emissoras públicas e comunitárias revela a essência do modelo de concessão de rádio e televisão no Brasil, de natureza patrimonialista. “Um bem público explorado pela iniciativa privada com enfoque essencialmente comercial”, analisa Nélia, acrescentando: “Aqueles que já exploram os serviços ganharam o direito de continuar no sistema de forma indefinida, sem o questionamento de sua prática de uso”. A escolha dos radiodifusores de emissoras comerciais pelo Iboc, reforça a pesquisadora, é um esforço para combinar vantagens tecnológicas com a possibilidade de preservação do negócio e da marca.

Testes não empolgam

Apesar da escolha dada, há informações de que os radiodifusores não estão muito animados com os primeiros testes com o Iboc, por conta do delay. Segundo Nélia, o digital apresenta um atraso (chamado delay) de oito segundos em relação ao analógico, que, na fase de transição, quando os dois sistemas conviverão por algum tempo, o ouvinte perceberá. “Você começa a ouvir uma notícia, aí sai do digital, passa para o analógico e o analógico já está lá na frente, pulando uma parte da notícia. A sensação é de que há um avanço no tempo. Mas quando se dá o contrário, com a queda do sinal digital e o retorno para o analógico, o ouvinte é obrigado a escutar a repetição da fala do locutor pelos mesmos oito segundos”, explica.

O Iboc é uma tecnologia cara e que ocupa uma faixa larga do espectro. Tanto que a empresa Ibiquity, proprietária do padrão Iboc, pediu à Comissão Federal de Comunicações, agência reguladora dos setores de radiodifusão e telecomunicações nos EUA, a ampliação do uso de espectro de 200 kHz para 250kHz. (leia matéria). Se a ampliação da banda digital é requisito técnico para que o sistema funcione sem interferência, o aumento da faixa concedido a uma emissora significará que outras terão que sair para dar espaço a ela. Considerando ainda o alto custo de implantação dessa tecnologia, pode-se deduzir que cairão fora do espectro as pequenas rádios comerciais, as comunitárias e as educativas.

A pesquisadora da UnB esclarece que, para ser disseminada, uma nova tecnologia passa por aceleradores e freios de acordo com a indústria, o poder econômico, pressões competitivas e políticas em confronto naquele momento. “Atualmente, as rádios estão tentando entender como funciona essa tecnologia. Falta capacitação técnica e em muitas rádios será necessário trocar os transmissores. A rádio Globo em SP ainda funciona com transmissores analógicos”, lembra. Nélia pondera, entretanto, que por mais que a tendência seja a indicação do Iboc, é provável que se abra espaço para o padrão aberto europeu DRM (Digital Radio Mondiale), por exemplo, para atender às emissoras públicas. Quanto às comunitárias, diz, “pouco se fala e não parece ser uma preocupação no momento”.

 

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Comissão da Cãmara vai rever concessões de rádio e TV

Gilberto Nascimento/Ag.Câmara
 

Foi aprovado nesta semana, na Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara dos Deputados, o requerimento solicitando a reinstalação da subcomissão especial que revisará as normas para concessão de rádio e de TV no país. Será formada por 14 parlamentares, integrantes da Comissão. O Ministério das Comunicações irá cooperar na formulação de novas regras.

Os partidos têm prazo até a próxima segunda-feira (5) para indicarem seus representantes na subcomissão. Os trabalhos deverão iniciar em até 30 dias, após a sua formação. A subcomissão vai retomar a tarefa de estudar a situação das outorgas existentes – renovação de concessão, permissão e autorização para exploração de serviços de rádio e televisão comercial – um trabalho que teria iniciado no ano passado, mas que não foi adiante porque o presidente Lula pediu a devolução dos processos ao Executivo (leia matéria).

Em dezembro do ano passado, numa ação inédita, a CCTCI rejeitou 83 processos de outorga de retransmissoras de rádio e televisão, porque faltavam documentos. O ministro Hélio Costa, em encontro esta semana com o deputado Júlio Semeghini (PSDB-SP), presidente da Comissão, concordou com a necessidade de atualizar alguns procedimentos para agilizar os processo de pedidos de outorgas e concessões.

A deputada Luiza Erundina (PSB-SP), que presidiu a subcomissão na última legislatura e está coordenando a retomada dos trabalhos, enfatiza que uma das prioridades é a regulamentação do artigo 223 da Constituição, que trata da competência do Executivo para outorgar e renovar concessões de rádio e TV. Na sua visão, a ausência de regulamentação desse dispositivo prejudica a transparência dos processos, devido a existência de um vazio legal. "A gente quer aperfeiçoar o marco regulatório da matéria e corrigir eventuais distorções", reforçou, segundo matéria da Agência Câmara (leia aqui).

Ainda conforme a matéria, o deputado Jorge Bittar (PT/RJ) afirma que no ano passado a comissão negou-se a votar diversas outorgas de retransmissoras de TV porque a documentação estaria incompleta. O ministro Hélio Costa, que se “sentiu ofendido” com a postura dos parlamentares, pediu toda a documentação de volta. Agora, Bittar quer convidar o ministro para participar de uma audiência pública na subcomissão, a fim de debater os procedimentos e o papel de cada órgão do governo na análise das concessões de radiodifusão.

Em junho último, este e-Fórum publicou um levantamento exclusivo (leia aqui) revelando que 40% das televisões brasileiras operam com outorgas vencidas. A matéria constatava que a lentidão do Congresso contribui para caducidade das concessões e apontava algumas emissoras que não renovam sua concessão há duas décadas, e, mesmo assim, continuam funcionando. (conheça as emissoras vencidas).

Coronelismo fere Constituição

Na legislatura anterior, a subcomissão assistiu a uma apresentação do trabalho do Consultor Legislativo da Câmara, Cristiano Aguiar Lopes, na qual ele descrevia um histórico sobre a regulamentação da radiodifusão no Brasil; a legislação existente e os resultados que o grande volume de leis, decretos, resoluções e normas – muitos deles desatualizados – trazem para a regulamentação destes serviços. Lopes constatava que as propostas apresentadas para melhorar a lei, propondo uma nova regulamentação, não são aprovadas porque esbarraram em interesses de membros do Executivo e do Legislativo ligados à radiodifusão e no lobby dos radiodifusores. Apesar do artigo 54 da Constituição Federal (CF) determinar que os parlamentares estão proibidos de manter contrato com empresa concessionária de serviço público (como emissoras de rádio e televisão), é uma prática corriqueira no Brasil fazer uso político das concessões.

Nas últimas eleições, foram eleitos para a Câmara e o Senado 133 parlamentares que possuem concessões de rádio e TV. Conforme levantamento feito em novembro pela Agência Repórter Social (leia aqui), o PMDB é o campeão disparado de parlamentares detentores de concessões de rádio e TV, com 12 deputados estaduais, 13 federais e sete senadores, seguido do PFL, com 12 estaduais, nove federais e nove senadores; e o PSDB, com oito estaduais, 10 federais e seis senadores. Os dados são do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), da Universidade de Brasília (UnB) e do Instituto de Pesquisas e Estudos em Comunicação (Epcom).

Novas concessões

Na opinião da deputada Luiza Erundina, apesar das autorizações terem de ser aprovadas pelo Congresso Nacional, o organismo ainda não tem base e sustentação para votar concessões em todo o País. “Nós votamos, às vezes, 60 concessões de uma só vez, sem conhecimento suficiente e uma análise mais aprofundada para renová-las ou homologá-las", afirmou, segundo matéria veiculada pela Agência Câmara, nesta semana. O grupo se propõe a analisar tanto o ato normativo que estabelece regras para análise da outorga e renovação das concessões quanto a legislação que trata do tema. Segundo a matéria, Erundina quer a questão tratada "publicamente, de forma transparente, incorporando sugestões apresentadas". Numa primeira ação, a comissão decidiu suspender por 30 dias a tramitação de 150 processos desse tipo até que a subcomissão conclua a proposta de novas regras.

Um dia antes, porém, (27), a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania aprovou 14 projetos que autorizam ou renovam concessões de serviços de radiodifusão em vários estados. Conforme a Agência Câmara, as propostas da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática tramitam em caráter conclusivo e serão analisadas agora pelo Senado. As concessões são as seguintes:

AMAZONAS – Associação Beneficente das Comunidades Carentes do Município de Anori – Anori

BAHIA – Associação Novo Horizonte dos Pequenos Produtores Rurais e Moradores do Bairro Santa Cruz – Palmas de Monte Alto; Rádio FM Sabiá Ltda. – Camaçari

CEARÁ – Associação Comunitária Alto Bandeirante – Ipaumirim

MINAS GERAIS – Fundação Sara Nossa Terra – Mateus Leme

PARAÍBA – Fundação Cultural Mainha Geralda para Educação e Assistência à Criança – Patos

PARANÁ – Associação Comunitária Ecológica de Radiodifusão de Guairaçá – Guairaçá

RIO GRANDE DO SUL – Fundação Educacional União da Serra – Marau; Sociedade de Radiodifusão Fortaleza Ltda. – Rio Pardo

SANTA CATARINA – Rádio Progresso de Descanso Ltda. – Descanso Rádio Colon Ltda. – Joinville

SÃO PAULO – Associação Beneficente, Cultural de Comunicação Comunitária Educadora – Cedral; Associação Comunitária Cultural, Ambiental e Esportiva de Santo Antônio da Alegria – Santo Antônio da Alegria; Associação Comunitária Rosa Mística – Estiva Gerbi

 

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Norte-americanos debatem novo contrato com a mídia

Michael J. Copps, comissário do Federal Communications Commission, órgão norte-americano regulador da comunicação, propôs um novo “Contrato Norte-Americano com a Mídia”, pelo qual as emissoras teriam que cumprir mais obrigações para obter aprovação ou renovação de suas licenças. Ele participou da Conferência Nacional pela Reforma da Mídia. O evento foi organizado pela Free Press, nos Estados Unidos, em janeiro. Celso Schröder, Coordenador Geral do FNDC e Murilo Ramos, da UnB, comentaram as declarações de Copps.

“Meio trilhão de dólares. Essa é uma avaliação conservadora do espectro que nosso país deixa para o uso das emissoras de rádio e televisão – de graça. Na verdade, é a maior parcela de dinheiro que nosso governo dá para qualquer indústria privada”, afirmou Copps no discurso que proferiu. O comissário questiona o que a população norte-americana, dona do espectro público, recebe em troca. “Pouquíssimas notícias, pouco entretenimento de qualidade, muitas pessoas comendo insetos em reality shows. Isso é o que recebemos por meio trilhão de dólares. É um péssimo negócio, vocês não acham?”

Ele sugere a adoção de rigorosos compromissos públicos das emissoras para atender o interesse público. “Essa é uma maneira de partirmos da defesa para o ataque”, declarou. Um novo “Contrato Norte-Americano com a Mídia” substituiria as regras atuais que favorecem os magnatas da mídia. A legislação de comunicação foi criada em 1936 nos Estados Unidos, através do Communications Act. No mesmo ano surgiu o FCC, a agência reguladora à qual pertence Copps. A partir dos anos 70, principalmente na gestão do presidente Ronald Reagan, houve um retrocesso nas leis que restringiam a propriedade privada e monopólios.

Avanços norte-americanos

Mesmo com uma postura neoliberal em relação à legislação, a luta pela democratização nos Estados Unidos está muito mais avançada que a brasileira, aponta o jornalista Celso Schröder, Coordenador-Geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação. “O Estado Norte-Americano é muito mais democrático, e tem os conceitos republicanos consolidados há muito mais tempo”, constata.

Schröder participou desse mesmo evento, a National Conference for Media Reform, na edição de 2005, realizada em St. Louis, no Missouri. Para ele, os movimentos são muito pulverizados nos Estados Unidos, e o encontro organizado pela Free Press é um dos poucos momentos de unificação de diversas entidades. O FCC tem um papel importantíssimo em termos de regulação, considera o coordenador. “Durante o governo Reagan houve um esvaziamento da agência e uma crescente desregulamentação neoliberal, que a sociedade já estava derrubando em 2005”, comentou.

Legislação ultrapassada Na opinião do professsor Murilo César Ramos, coordenador do Laboratório de Políticas de Comunicação da Universidade de Brasília, a principal diferença entre os dois países é a ausência no Brasil de uma lei que regulamente o setor de rádio e televisão. “A Lei de Imprensa, mesmo sendo de 1962, está mais ultrapassada que o Communications Act e não contempla a possibilidade de ter mecanismos em prol da desconcentração de mercado”, ressalta. Ele lembra que essa lei norte-americana foi revista em 1997 e já se tornou menos rígida.  

O embate fundamental no Brasil, para Ramos, é criar uma legislação que regulamente e regule o setor, para que possamos chegar ao nível das discussões norte-americanas, contemplando questões de espectro e controle de propriedade. “Há anos é necessário rever nosso modelo. Essa discussão é o principal ponto a ser contemplado na Conferência da Comunicação”, afirma.

 

A Free Press foi criada em 2002, pelo professor e escritor Robert McChesney, pelo jornalista John Nichols e pelo advogado Josh Silver, para defender a reforma da mídia. A atuação da ONG se dá junto aos congressistas americanos, propondo regulamentações, e apresentando políticas públicas ao FCC.

PAC fica devendo projeto para incentivar a inclusão digital

Setores da sociedade envolvidos com a democratização da comunicação avaliam que o Plano de Aceleração de Crescimento anunciado pelo Planalto é insuficiente quanto ao estímulo à inclusão social pela digitalização dos meios de comunicação.

Há pouco mais de um ano, o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) lançou um manifesto motivado pela definição do Sistema Brasileiro de TV Digital (SBTVD), então em fase de estudos. O Fórum se posicionou sobre a digitalização, considerando-a como um processo de decisiva importância para a determinação da cultura nacional, da produção audiovisual, da democratização da comunicação, da cidadania e do desenvolvimento sustentado. Sustentou que a digitalização representava mais do que uma nova tecnologia. “Trata-se de uma oportunidade histórica, em virtude da inovação científica e tecnológica, de equipararmo-nos todos. De passarmos, nesse setor, a competir de igual para igual com os países desenvolvidos e suprimirmos nossas deficiências em estágios anteriores do desenvolvimento econômico”, dizia o FNDC.

O Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), anunciado pelo governo federal recentemente, trouxe medidas para a área de infra-estrutura do País que contemplam a promoção do desenvolvimento tecnológico dos setores da TV digital e de semicondutores. Porém, não traz em seu texto planos relacionados à inclusão possibilitada pela TV digital. Basicamente, o programa estimula a pesquisa, desenvolvimento e produção dos equipamentos aplicados à TV digital, exceto os set top boxes (conversores para sinal digital), que contarão com os incentivos da Zona Franca de Manaus, e de bens de microeletrônica (semicondutores).

Os benefícios constam da isenção de IRPJ (microeletrônica), redução à zero das alíquotas do IPI, do PIS, da COFINS e da CIDE incidente sobre a venda de equipamentos transmissores de sinais e as vendas de semicondutores e displays, e sobre a aquisição de bens de capital e as transferências para aquisição de tecnologia e softwares. O PAC também amplia os limites do valor de venda a varejo de microcomputadores e notebooks beneficiados com alíquota zero de PIS e COFINS, cujos limites atuais de R$ 2,5 mil e R$ 3 mil, respectivamente, passarão para R$ 4 mil, em ambos os casos.

Limitações

Durante a semana, através da imprensa especializada, surgiram várias manifestações de representantes do setor de telefonia e de especialistas, considerando que os incentivos previstos no PAC são limitados. Segundo o coordenador-geral do FNDC, Celso Schröder, as medidas anunciadas no plano do governo para a TV Digital estão plenamente de acordo com o ponto de vista da manutenção do modelo de negócios da televisão aberta brasileira. Para Schröder, desde que o governo decidiu-se pelo padrão japonês, privilegiando em sua decisão os fatores tecnológicos, nada mais coerente do que lançar, agora, políticas que contribuam neste sentido. “A articulação e o projeto [do governo para a TV digital] são tímidos para a dimensão que uma planta dessas representa, que é muito maior do que o mercado de um só país”, avalia.

O documento lançado há um ano pelo FNDC estimava que, para o campo democrático, a digitalização da televisão poderia ser uma possibilidade inédita de romper com a monopolização e a oligopolização do mercado de radiodifusão no Brasil, “abrindo uma fase extremamente dinâmica para a competição e o estabelecimento de novos atores”.

Representantes da Associação Brasileira de Telecomunicações (Telebrasil) criticaram a ausência de incentivos ao setor, no PAC, que não contemplou as Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs). Eles declararam à imprensa, durante a semana, que a entidade vai procurar sensibilizar órgãos do governo no sentido de construir uma diretriz política interna a favor da inclusão digital.

Conforme matéria do informativo Telebrasil em Foco, dia 29/1, o vice-presidente da Telebrasil, José Fernandes Pauletti, acredita que a população precisa aprender a utilizar os serviços do governo com base nas TICs – através da internet – para educação, saúde e segurança. Porém, deve haver vontade política do governo de adotar essas tecnologias para aumentar a quantidade e a qualidade da prestação se serviços. Pauletti citou o exemplo do Network Readness Index (NRI), um serviço que classifica os países pela infra-estrutura de sua rede (considerando o preparo da população, do serviço público e do governo), e que foi utilizado no Fórum Econômico Mundial para medir quanto a economia de um país está preparada para se beneficiar dos desenvolvimentos das TICs. O Brasil, diz, ocupa 39º lugar. Segundo Sílvio Genesini, diretor estatutário da Telebrasil, “o uso intensivo da TICs pelo governo tem um efeito alavancador ainda mais poderoso do que outras medidas consideradas mais concretas”.  José Fernandes Pauletti, segundo a matéria, considerou que o governo poderia estar com um conceito de infra-estrutura – energia, petróleo, estradas – ultrapassado.

Voz comum

O FNDC destacou, no manifesto publicado há um ano, a retroalimentação entre a democratização da comunicação, suscitada pela digitalização – através da oferta de interatividade, multisserviços, multiprogramação – o desenvolvimento do mercado de bens eletrônicos de consumo, e a geração de emprego e renda. “Há, entre a democratização da comunicação social, a convergência das novas tecnologias de informação e comunicação (TICs) e o desenvolvimento da economia nacional, um estreito enlace. Trata-se de uma nova economia, de uma nova indústria, que alguns denominam como “indústria do conhecimento”, apontava o texto.

A Telebrasil defende a existência de “uma voz comum” para os órgãos de classe e as associações que representam o setor da TICs, para construir, com o governo, uma plataforma ampla e unificada. O já citado manifesto lançado pelo FNDC observa que a base objetiva para o avanço da democratização pode ser fornecida pela confluência tecnológica e a possibilidade de interatividade entre emissor e receptor nela contida. “Dependendo do contorno desse processo, se decidirão as bases para o exercício da democracia, da soberania e da inserção internacional do Brasil no Século XXI”, projetava o Fórum.

Para o consultor em políticas de comunicação Israel Bayma, se o PAC não inclui o setor de telecomunicações, isso mostra principalmente que o Ministério das Comunicações (Minicom) não participou efetivamente neste sentido. “É sinal que o ministério não formulou seu conjunto de contribuições para colaborar com o projeto”, sustentou. Ele pondera, entretanto, que a inclusão digital também é obtida através de investimentos na área de infra-estrutura (objeto do PAC). Bayma avalia que o texto do Plano poderia orientar, por exemplo, para o equacionamento sobre o uso do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (FUST), mas não o fez.

Quanto à desoneração do ICMS para as empresas de telecomunicação, considera, “este é um assunto que deve ser tratado pelos estados, e não pelo governo federal”. Assim como o FNDC em seu documento, o consultor não considera aceitável legitimar a TV digital no País sob o ponto de vista do desenvolvimento tecnológico e da indústria eletroeletrônica. “O Plano contribui, mas não viabiliza exatamente a inclusão. Espero que este PAC seja apenas um primeiro programa, que ainda receba contribuições da sociedade e que possa conter detalhes de inclusão social”, afirmou.

Deputada requer Conferência Nacional de Comunicação

Uma demanda do setor de comunicação, defendida pelo FNDC, poderá ser realizada em 2007. A I Conferência Nacional de Comunicação é o espaço onde a sociedade civil e organizações do setor poderão debater e elaborar políticas públicas. Para essas deliberações serem executadas, é necessário que ela seja convocada pelo Governo. A deputada Iriny Lopes (PT-ES) defendeu a idéia em requerimento apresentado esta semana na Câmara Federal.

A parlamentar entrou com um requerimento na Câmara dos Deputados para a realização da Conferência, pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias, em parceria com organizações da sociedade civil e governamentais. A finalidade, segundo o requerimento 56/2006 é definir objetivos para o pleno exercício do direito humano à comunicação, “entendido como o direito da pessoa se expressar, manifestando sua identidade civil, política, econômica, social e cultural".

A formulação da Conferência da deputada vai ao encontro da proposta aprovada na XIII Plenária do FNDC, realizada em outubro de 2006. A exigência da realização do evento consta igualmente no documento Propostas de Políticas para a área das Comunicações, enviado pelo Conselho Federal de Psicologia e pela Federação Nacional dos Jornalistas aos candidatos à Presidência da República neste ano.

O Direito Humano à Comunicação ganhou relevância especialmente a partir de 2005, na visão de Iriny, quando a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados realizou o Encontro Nacional do Direito Humano à Comunicação. “O direito à comunicação constitui-se em um direito cujo conteúdo é destinado à coletividade. Nesse aspecto o direito à comunicação, como direito social, determina-se pelo acesso à informação, ao conhecimento e aos meios de produção e veiculação de idéias mediante condições técnicas e materiais que permitam o exercício pleno do seu direito de ter voz e de ser ouvido.”

Ainda de acordo com o requerimento, tornaram-se mais evidentes obstáculos ao exercício da liberdade de expressão e de difusão de informações à sociedade, relacionados à forte concentração da propriedade sobre os meios de comunicação. “Como espaço de poder e sociabilidade, a mídia atua na formação da opinião pública em relação a valores, crenças e atitudes. Por isso, seu potencial educativo é tão forte quanto sua capacidade de difundir estereótipos que negam as conquistas expressas na Declaração Universal e na legislação em vigor.”

Participantes da Conferência

Para a parlamentar, diferentes atores, direta ou indiretamente envolvidos nos processos de comunicação social, devem participar da Conferência para estimular o debate e a proposição de políticas públicas que assegurem a diversidade, a defesa e a promoção dos direitos humanos, no sistema de comunicação e informação. Devem fazer parte também diferentes setores do Estado, responsáveis por diferentes valores e segmentos do interesse público, concessionários de serviços de comunicação, profissionais e anunciantes.

A deputada defende também a participação da Comissão de Direitos Humanos e Minorias “uma vez que tem contribuído para que o direito de expressão e de acesso à informação esteja mais presente na consciência dos defensores dos direitos humanos”. A CDMH tem debatido as rádios comunitárias e se envolvido com outras questões de comunicação popular e pública, como a campanha Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania, exemplo de conscientização e mobilização social nessa temática.