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“Se não garantirmos a neutralidade da rede agora, ela será quebrada”, diz Sérgio Amadeu

A audiência pública em torno do Marco Civil da Internet reuniu parlamentares, acadêmicos e representantes da sociedade civil para debater o tema neste sábado (26), durante o III Encontro Nacional de Blogueiros, em Salvador. Considerada pelos debatedores “uma das legislações mais avançadas do mundo”, os participantes do III BlogProg puderam dar suas contribuições no debate.

Para Sérgio Amadeu, representante do terceiro setor no Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), o desafio do Marco Civil é “garantir a privacidade em uma sociedade de rastros digitais”. A questão da guarda de logs e a neutralidade da rede foram os pontos que geraram mais discussão. “Além de ferir a liberdade de expressão e de navegação, a quebra da neutralidade da rede vai mudar a inovatividade e a lógica de criação da Internet”, diz. Apesar de o documento definir o conceito de neutralidade da rede, a queixa de Sérgio Amadeu, de Renata Mielli, do Barão de Itararé e da deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) é que o texto prevê uma regulamentação posterior específica para o ponto. “A Internet não pode ser que nem os Correios, onde quem paga mais tem o serviço mais rápido”, afirma Mielli.

De acordo com a jornalista, um setor da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) propõe a privatização de todo o serviço de telecomunicações. “Se o Marco Civil não garantir a neutralidade da rede, a regulamentação ficará a cargo de quem? Da Anatel?”, questiona. Na avaliação de Amadeu, ou aprovamos a neutralidade da rede agora ou quebramos a neutralidade da rede. “Para atender à criatividade e à liberdade de navegação, não é razoável que a operadora filtre ou bloqueie o tráfego de conteúdos”, justifica o pesquisador. Renata Mielli também provocu a discussão acerca da guarda de logs, outra questão que gera polêmica na regulação da Internet. “Guardar registros é garantir a segurança do usuário? Inverter o princípio constitucional da presunção da inocência não é a resposta”, afirma.

Amadeu endossou o coro: determinar que todos os prestadores de serviçoes guardem todos os logs de acesso – afirmou – não é razoável. “Os internautas são inocentes até que se prove o contrário”, diz. Jandira Feghali também se manifestou a favor da regulamentação da neutralidade da rede no Marco Civil da Internet. Quanto à questão da segurança e da privacidade, a deputada acredita que “é preciso encontrar uma saída para as contradições expostas na audiência”. Segundo ela, há contradições tanto no texto quanto em conceitos. “Ao invés de ‘incentivar o uso da Internet’, devemos fortalecer o conceito da universalização”, opina.

Contribuições acadêmicas

Além de Sérgio Amadeu, os professores André Lemos e Wilson Gomes, da Universidade Federal da Bahia, também participaram do seminário. Lemos ressaltou a natureza “colaborativa e aberta” para defender o princípio de neutralidade da rede. “Não podemos cercear as formas de comunicação, produção e compartilhamento próprias da Internet. A Internet não pode se transformar em um serviço como o da TV a cabo”, afirma. Para Lemos, o Marco Civil estabelece princípios adequados para garantir a liberdade na Internet.

Wilson Gomes destacou a finalidade do documento: “A Internet muda muito rápido, o que torna a regulamentação complicada. O Marco Civil estabelece diretrizes gerais”. Como contribuição, Gomes propôs legisção contra discursos de ódio, que firam grupos minoritários, como manifestações racistas e homofóbicas”.

Processo democrático

O deputado João Arruda (PDMB-PR), presidente da Comissão Especial formada pela Câmara para debater o Marco Civil da Internet, destacou as ferramentas de participação popular na construção do documento. “A Internet influencia a vida pública e estimula a participação política. É uma ferramenta pública”, diz. O Portal e-Democracia, da Câmara, transmitiu o debate ao vivo e os participantes puderam enviar suas contribuições pelo chat.

O deputado Alessandro Molon, (PT-RJ), relator do Marco Civil da Internet, também ressaltou o processo democrático de elaboração do projeto. “Além de recebermos contribuições pelo e-Democracia e pelo Twitter, estamos realizando diversos seminários pelo Brasil, para ouvirmos as sugestões presencialmente”. O III Encontro de Blogueiros vai até domingo (27) e discute questões relacionadas à blogosfera, liberdade na Internet e liberdade de expressão.

Em audiência pública, representante do governo afirma querer aprovação ainda em 2012

Foi realizada nesta terça-feira (16), em Brasília, a primeira audiência pública que debate o Marco Civil da Internet. O secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Marivaldo de Castro Pereira, afirmou que espera a aprovação do projeto ainda para 2012. Ele ainda disse que o Marco Civil da Internet é “prioritário para o governo”.

Na avaliação de Pereira, o marco legal deve deixar claro os princípios, conceitos, direitos e responsabilidades dos atores na rede, pois a falta de legislação tem levado a decisões judiciais desconexas. Segundo ele, isso cria um clima de insegurança para os usuários e prejudica novos negócios.

Além disso, para Pereira, “é importante que a discussão aqui na comissão especial fique focada no marco civil da internet”. A discussão de temas que ficaram de fora da proposta, como direitos autorais na Internet, spam e certificação digital, devem ser debatidos após a aprovação do Marco Civil da Internet.

Neutralidade da rede

Pereira também comentou a questão da neutralidade da rede. O projeto, segundo ele, exime a responsabilidade do provedor de internet pelo conteúdo divulgado por terceiros em suas redes. “Assim evitamos que o provedor atue como censor, analisando cada conteúdo divulgado por terceiros antes de publicá-lo”, disse.

O advogado do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), Guilherme Varella, ressaltou que o texto garante a neutralidade de rede – ou seja, a não interferência dos provedores nos conteúdos que transitam online. “Ter neutralidade é não ter um guarda de trânsito ou um árbitro na Internet; é não ter uma empresa privilegiando determinados conteúdos”, explicou.

Varella demonstrou preocupação, porém, com o fato de o projeto estabelecer que o princípio da neutralidade será garantido conforme regulamentação. “Vemos com preocupação isso, porque hoje há problemas na regulamentação feita pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel)”, afirma.

e-Democracia

O relator do projeto, deputado Alessandro Molon (PT-RJ), afirmou que todas as sugestões apresentadas pelos internautas serão analisadas pela Comissão Especial formada na Câmara dos Deputados. Para Guilherme Varella, o texto é um “paradigma de construção popular” de uma proposta legislativa. Na opinião do representante do Idec, “a sociedade civil conseguiu opinar sobre o seu direito à comunicação”.

De acordo com Marivaldo Pereira, o Marco Civil da Internet é o caso mais bem sucedido de construção democrática de uma proposta legislativa. O projeto passou por uma longa consulta pública e, a partir desta semana, os cidadãos também poderão contribuir com a proposta no site www.edemocracia.camara.gov.br.

Com informações da Agência Câmara

Neutralidade de rede: Teles vêem amarras, consumidores temem abusos

Com a apresentação, ao Congresso Nacional, do projeto de Marco Civil da Internet, boa parte das contribuições à consulta pública sobre o novo regulamento do Serviço de Comunicação Multimídia defende que a Anatel deixe as definições sobre neutralidade de rede e a guarda de registros de conexão para o texto da lei, ainda que por interesses distintos.

Segundo a proposta “é vedado à prestadora realizar bloqueio ou tratamento discriminatório de qualquer tipo de tráfego, como voz, dados ou vídeo, independentemente da tecnologia utilizada”. Porém, tal vedação “não impede a adoção de medidas de bloqueio ou gerenciamento de tráfego que se mostrarem indispensáveis à garantia de segurança e da estabilidade do serviço e das redes que lhe dão suporte”.

Operadoras e mesmo fornecedores de infraestrutura, como Alcatel e Cisco, preferem que não seja adotado o conceito de neutralidade de rede, em especial nos termos da redação apresentada. A leitura é de que o texto limita a capacidade de gerenciamento de tráfego pelos provedores.

“O Sinditelebrasil discorda veementemente da adoção desse conceito e defende que o mesmo seja alterado de forma a deixar claro que as empresas devem ter autonomia para fazer a gestão de tráfego de suas redes de forma a permitir a diferenciação por níveis de serviço e preço.”

As empresas defendem preços diferenciados por tipo de perfil de consumo e, além disso, “a possibilidade de cobrança, pelos detentores da infraestrutura junto aos provedores de conteúdo, de valores adicionais para a disponibilização de diferentes tipos de conteúdos, notadamente aqueles que demandam mais banda”.

Curiosamente, o mesmo texto que enseja tantos receios do lado das operadoras é tido como muito vago por entidades de defesa do consumidor, provedores de conteúdo e usuários que também apresentaram contribuições à consulta pública. Por isso, pedem maior clareza sobre as possibilidades em que medidas de gerenciamento de tráfego serão aceitas.

A UOL, por exemplo, quer “explicitações taxativas dos casos em que pode haver bloqueio de tráfego”, em especial limitando-os ao controle de ataques, sejam eles de negação de serviço, de entupimento de tráfego (flooding) aqueles direcionados a sistemas de resolução de nomes de domínios da Internet (DNS).

Em geral, porém, essas sugestões são de que – caso a Anatel insista em manter a questão no regulamento – aqueles critérios de bloqueio ou gerenciamento sejam amplamente divulgados e, mais importante, definidos preferencialmente por uma instituição como o Comitê Gestor da Internet e submetidos a consulta pública específica.

Guarda de logs

As diversas contribuições ao regulamento do SCM também defendem que a guarda dos registros de conexões, que a Anatel previu obrigatória por até três anos, seja tratado no Marco Civil da Internet ou, pelo menos, tenha o prazo de um ano previsto naquele projeto de lei incorporado pela agência.

Em essência, no entanto, a maior preocupação é com a definição clara de quais as informações farão parte de tais “registros de conexão”. Para isso, provedores e consumidores preferem que a Anatel especifique melhor a questão, em especial limitando a data, horário, duração, origem e destino das telecomunicações.

 

Governo quer punir empresa que limitar acesso de usuário a dados

O governo decidiu aplicar sanções às operadoras de telefone e aos provedores de conexão que restringirem, arbitrariamente, o acesso de usuários a determinados dados e serviços da internet.

Essa determinação, chamada de "neutralidade de rede", está no Marco Civil da Internet, previsto para ser enviado hoje ao Congresso.

O objetivo é coibir o que o governo já julga estar disseminado no mercado brasileiro: que empresas criem barreiras ao acesso de usuários a determinados conteúdos.

Exemplo: desacelerar a conexão de um cliente que costuma baixar muito vídeos ou que use o serviço Skype.

Segundo a proposta de projeto de lei, o "responsável pela transmissão, comutação ou roteamento tem o dever de tratar de forma isonômica quaisquer pacotes de dados, sem distinção por conteúdo, origem e destino".

As punições e a forma de fiscalização serão regulamentadas posteriormente, via decreto presidencial ou por norma da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações).

Em outro trecho da proposta, o Ministério da Justiça incluiu uma novidade no marco: sites, blogs e e-mails e outros "provedores de aplicações da internet" terão de preservar por até 60 dias os chamados registros de acesso de um determinado usuário desde que solicitados por autoridades de investigação.

Nesse intervalo a polícia, por exemplo, deve pedir à Justiça a liberação dos dados. Essa medida não estava prevista no texto que saiu da consulta pública em 2009.

Armazenar Dados

Conforme a Folha antecipou, provedores deverão guardar por ao menos um ano registros de conexão de um usuário à internet -dados sobre data, hora de início e término de conexão e o número IP usado pelo terminal para o recebimento de dados. Os dados permitem, numa investigação, chegar ao usuário.

O Planalto prevê uma guerra das empresas de telefonia no Congresso para derrubar o conceito de "neutralidade de rede". Muitas companhias reclamaram da medida durante os dois anos de discussão do projeto.

Os críticos argumentam que o Estado não deve se meter nessa questão, deixando o manejo do sistema para as leis de direito do consumidor e a livre concorrência.

Países como EUA também debatem o tema neutralidade de rede. Para o Planalto, o governo inova ao tentar coibir abusos nas transmissões de dados na internet.

O projeto chega com um ano de atraso ao Congresso, num momento em que o Legislativo debate a polêmica Lei Azeredo, que tipifica os crimes na rede. O governo é contra a proposta e espera que o marco civil congele a tramitação do projeto.

Paralelamente, deputados da base aliada prometem entregar até terça-feira um novo projeto, mais enxuto, de crimes penais na rede.

Sites jornalísticos querem ficar de fora do projeto do governo que regulamenta o setor

Preocupados com a institucionalização de um mecanismo que pode servir à censura prévia, entidades setoriais e da sociedade civil organizada, além de parlamentares, defendem que os sites jornalísticos sejam excluídos do escopo do Marco Legal da Internet. A proposta de regulamentação do governo, em consulta pública há uma semana, prevê a comunicação direta entre usuários e provedores para solução de conflitos, incentivando a retirada voluntária de conteúdo do ar antes de uma determinação judicial.

Apesar de o Ministério da Justiça garantir que a medida tem como foco blogs e outros tipos de página na internet, apoiados basicamente em opinião e não em informação, teme-se o cerceamento da liberdade no exercício do jornalismo. Entidades e parlamentares acreditam que sites jornalísticos devem ser submetidos à Constituição, que rege obrigações e direitos dos meios de comunicação de forma geral.

O coordenador-executivo do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), Celso Schröder, defendeu que não deve haver nem apologia de uma tecnologia que "produz milhares de informações ao mesmo tempo" nem "ação tuteladora", pois "isto seria uma estupidez":

– Os sites jornalísticos contam com as mesmas regras dos meios de comunicação. Para os blogs públicos, dos órgãos de imprensa, se houver mentira, eles são retirados. É garantido o direito de resposta.

– (O marco legal) Não deveria trazer responsabilidade para os provedores filtrarem conteúdos, a não ser em casos de determinação judicial. Há um perigo de deslizar para a censura – disse o deputado federal Paulo Teixeira (PT/SP).

Para a presidente da Associação Nacional dos Jornais (ANJ), Judith Brito, retirar uma informação do ar toda vez que alguém se sentir prejudicado "é inconstitucional".

– Isso é frontalmente contrário ao princípio maior da liberdade de expressão consagrado na nossa Constituição. É uma forma evidente de censura. (Deve haver) Total liberdade de expressão, sem a possibilidade de censura, e eventual punição posterior por danos morais quando definido pela Justiça.

O vice-presidente da Associação Brasileira de Internet (Abranet), Gil Torquato, argumenta que já existem leis e normas suficientes regulamentando também a internet e que, por responsabilidade civil, cada um "é responsável pelo que escreve".

Para governo, projeto inibe batalhas judiciais

O projeto prevê que pessoas que se sintam difamadas por algum conteúdo – por exemplo, o comentário de um internauta – entrem em contato com o provedor, que poderá manter o conteúdo no ar (se responsabilizando por sua veiculação) ou retirá-lo e comunicar seu autor sobre a reclamação. Se o autor quiser que as informações voltem à internet, ele terá que se identificar e responder por elas, inclusive perante a Justiça. Torquato considera a proposta inexequível.

Ciente da controvérsia, o chefe de gabinete da Secretaria de Assuntos Legislativos, do Ministério da Justiça, Guilherme de Almeida, defende a iniciativa como uma tentativa de evitar batalhas judiciais.

– O projeto em momento nenhum quer substituir a Lei de Imprensa – disse.

A Lei da Imprensa, da década de 1960, foi derrubada no ano passado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Jornalistas e veículos de comunicação estão sujeitos agora à legislação comum (códigos Civil e Penal).