Fundação Piratini retoma trabalhos na TVE e FM Cultura com mudanças na programação

Após a decisão judicial que determinou que a Fundação Cultural Pircom os respectivos sindicatos seja concluída, conforme divulgou a Justiça do Trabalho na quinta-feira da semana passada, a direção da Fundação anunciou que TVE e FM Cultura retornariam à programação local.

Os funcionários das emissoras estavam afastados desde o dia 26 de dezembro, após a aprovação da extinção da Fundação Piratini pela Assembleia Legislativa. Durante esse período a grade estava sendo ocupada pela reprodução de programas de arquivo e retransmissão das redes TV Brasil e TV Cultura.

Logo no retorno da programação local da FM Cultura, na terça-feira, dia 03, ao meio-dia, a locutora do programa “Cultura na Mesa”, Lena Kurtz, leu uma nota explicando os motivos pelos quais a programação própria estava fora do ar e que os funcionários da Fundação voltaram ao trabalho em razão de liminar obtida na Justiça. “Os trabalhadores da comunicação pública do Rio Grande do Sul agradecem o apoio de ouvintes e telespectadores durante todo o processo de discussão e votação do projeto no Parlamento e contam com a continuidade da mobilização para preservação das emissoras”, diz a nota lida no ar.

Na quarta, 04, foi a vez da TVE retomar a sua produção. Porém, ao invés de 30 minutos, o jornal passou a ter só 15 minutos, como foi anunciado pela direção da Fundação que gere tanto a FM Cultura quanto a TVE.

O segundo jornal local da TVE, que roda à noite, também terá a mesma redução. O horário do Segunda Edição será das 19h às 19h15min. Os funcionários, assim como da FM Cultura, voltaram ao trabalho ontem. Mas, como a televisão demanda mais tempo para a produção de conteúdo, retornou um dia depois.

De acordo com a jornalista Marta Kroth, não haverá mais operações de jornalistas no turno da noite ou em plantões de fim de semana. Ela classifica o clima geral como otimista durante esta “volta de resistência” do jornalistas, garantindo que há confiança na justiça em defesa das instituições. “Nossa luta não é pela manutenção do emprego; ele é uma consequência da não extinção dos canais de comunicação”, afirmou em entrevista para o jornal SUL21.

Nesse momento, os principais prejudicados serão os programas apresentados por profissionais com contratos encerrados no dia 31 de dezembro de 2016, como o Radar, que não serão mais transmitidos ou passarão por um remanejo de profissionais. Outra grande mudança é a diminuição da duração dos telejornais, que passarão a ter apenas 15 minutos em cada uma de suas edições – garantindo apenas a cota de programação local exigida pelo Ministério das Comunicações.

A Fundação Piratini teve extinção aprovada pela Assembleia Legislativa gaúcha no último dia 21, a pedido do governador José Ivo Sartori, que ainda precisa sancionar a medida para ter validade. Cinco dias após a extinção, a Justiça do Trabalho determinou que a Fundação Piratini suspenda qualquer demissão antes de abrir negociações coletivas junto a trabalhadores da TVE e da FM Cultura. A decisão foi referendada pelo Tribunal Regional do Trabalho. A legislação aprovada na Assembleia sobre a extinção das fundações permite que o governo demita todos os servidores da Piratini que não tenham estabilidade. A ação promovida pelo Sindicatos dos Radialistas e dos Jornalistas do Estado do Rio Grande do Sul (Sindjors) garantiu uma esperança de dialogo para tentar garantir o futuro da comunicação pública. Caso a ordem não seja cumprida, a organização é penalizada com multa diária de R$ 10 mil por servidor dispensado.

Na terça, 03, o procurador-geral do Estado, Euzébio Ruschel, em entrevista à Rádio Gaúcha, afirmou que o Estado não pretende recorrer da decisão e que grupos de trabalho devem ser criados, a partir da sanção da lei, para tratar do tema das demissões dos servidores das fundações.

Proposta fere a Constituição Federal

A proposta de extinção da empresa pública fere a Constituição Federal de 1988 em seu artigo 223, que diz: “Compete ao Poder Executivo outorgar e renovar concessão, permissão e autorização para o serviço de radiodifusão sonora e de sons e imagens, observado o princípio da complementaridade dos sistemas privado, público e estatal”. A extinção da fundação cria um desequilíbrio aos sistemas de comunicação e deixa um vazio para as manifestações culturais no estado, que estavam fortemente representadas nos espaços oferecidos pela TVE e FM Cultura.

Os defensores da radiodifusão pública admitem que o papel que essas emissoras cumprem, em complementariedade aos sistemas privados e estatais, conforme estabelece a Constituição, ainda não são muito claros para a sociedade em geral. O jornalista Luciano Alfonso, funcionário da TVE há 28 anos, ressalta que a comunicação pública tem um ”papel voltado para a sociedade e que abraça causas que a TV privada não abraça, pois não é feita pra ganhar lucro”.

Governo fala em crise mais gasta muito com publicidade

Alexandre Leboutte, funcionário da TVE, contesta a suposta economia gerada. Ele apresenta dados do Portal da Transparência para mostrar que, até novembro, a Fundação Piratini havia gasto R$ 23,5 milhões, de um orçamento anual previsto de R$ 34,1 milhões. Leboutte afirma que, se o governo diminuísse o número de cargos de confiança (CCs) e o investimento em publicidade, já garantiria a manutenção dos funcionários de carreira das fundações. Citando editais de publicidade para 2016, o servidor chama atenção para o volume de recursos disponibilizados pelo Poder Executivo em propaganda, que chegam a R$ 80,6 milhões.

Destes recursos, R$ 3,5 milhões foram aplicados pelo governo em uma campanha publicitária somente para informar sobre a tal crise financeira do estado. Boa parte deste dinheiro foi para emissoras de rádio e TV privadas. Enquanto o governo repassava mais de R$ 80 milhões para publicidade a qualificação dos sinais de cobertura da TVE e da FM Cultura recebeu apenas R$ 156.760,92, enquanto a qualificação dos recursos humanos na administração contou com R$ 10.350,52.

Ainda segundo o portal Transparência, somadas as áreas de qualificação de assentamentos, dos sinais de cobertura da TVE e FM Cultura e de recursos humanos, elas receberam juntas R$ 539.911,00, menos do que o jornal Zero Hora que recebeu R$ 583.185,21 entre janeiro e novembro de 2016, enquanto o Correio do Povo ficou com R$ 222.655,28 no mesmo período.

Por Ramênia Vieira – Repórter do Observatório do Direito à Comunicação

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