CGI: Anatel erra no modelo de medição da Internet

Em meados de janeiro, enquanto ainda repercutia o pedido da Oi de anulação das metas de qualidade na banda larga, a Anatel tomou uma direção capaz de comprometer a efetiva aferição do serviço de conexão à Internet, ainda que mantido o regulamento. Ao definir as premissas de medição dos indicadores, o regulador aceitou limitar o alcance dessa fiscalização.

No dia 18 daquele mês, a agência publicou a Requisição de Propostas para a seleção da Entidade Aferidora da Qualidade, elaborada pelas operadoras fixas e móveis. O documento e seus sete anexos definem o processo de escolha e o serviço a ser prestado pela eleita.

Ali, no Anexo III, a descrição de como deve ser feita a medição dos indicadores de rede extrapola o previsto na Resolução 574 da Anatel – o Regulamento de Gestão da Qualidade – e define que a atuação da entidade aferidora é restrita à rede interna das operadoras.

A regra diz que “a medição deve ocorrer do terminal do assinante ao PTT” e define Ponto de Troca de Tráfego como “solução de rede com o objetivo de viabilizar a interligação direta entre redes de transporte de diferentes Prestadoras que utilizam diferentes políticas de roteamento de tráfego”.

Já no rol de “premissas para medição dos indicadores”, parte da Requisição de Propostas, a definição começa parecida, mas ganha uma frase extra, porém significativa: “os pontos de medição serão pontos de presença na rede da prestadora, aptos a viabilizar a troca de tráfego internet com outras redes”.

Parece fazer sentido que apenas o quintal de cada prestadora seja analisado, por demarcar até onde ela pode ser responsabilizada. O nó do conceito é que ele reduz a uma rede única o que, de fato, é a interação de várias delas. “Isso não é Internet”, resume Demi Getschko, do Comitê Gestor da Internet brasileira.

“É como medir a qualidade de um PABX apenas pelas chamadas entre dois ramais, sem levar em conta a capacidade de fazer ligações externas”, compara Getschko. E a opção do colegiado da Anatel pela medição nos PTTs parece considerar esse raciocínio.

Afinal, praticamente toda a vintena de pontos de troca de tráfego existentes no Brasil não pode ser considerada como parte da rede das prestadoras, uma vez que foram instalados e são geridos pelo Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), braço operacional do Comitê Gestor da Internet.

Apesar de alertada sobre essa aparente fragilidade do modelo, a Anatel preferiu manter o texto. A questão é descrita como “grave erro” logo no primeiro pedido de esclarecimento das candidatas a Entidade Aferidora da Qualidade, durante o processo de seleção.

“Esta mensagem visa alertar sobre o grave erro no Anexo III da RFP [que] define que os pontos de medição ficam ‘dentro’ da rede da operadora. (…) A prestadora, se assim o desejar, tem todas as condições de influenciar nos resultados das medições, seja pela localização mais privilegiada do ponto de medição dentro de sua infraestrutura, seja por políticas de engenharia de tráfego de dados que privilegiam o setor da rede onde encontra-se o ponto de medição.”

E conclui: “Esta decisão é extremamente equivocada pois retira a isenção e neutralidade dos processos que executam as medições, e colocará em risco todo o esforço que visa dar transparência e credibilidade ao consumidor dos serviços de banda larga no país.”

De sua parte, a comissão de seleção da aferidora (composta por Anatel e operadoras) não concordou e respondeu que “a redação do texto com a definição de PTT está alinhada com o disposto nos regulamentos, considerando a garantia da neutralidade e imparcialidade na medição”.

0

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *