LGT e contratos emperram Programa Nacional de Banda Larga

A Lei Geral de Telecomunicações (LGT) e os contratos firmados na privatização das empresas de telefonia fixa na década de 90 emperram o Programa Nacional de Banda Larga (PNBL). Por isso, depois de seis meses de tensões na negociação do 3º Plano Geral de Metas e Universalização (PGMU III), tende naufragar o desejo do Planalto de ter expansão da infraestrutura para internet vinculada às projeções do Serviço de Telefonia Fixa Comutada (STFC).

O imbróglio começa com os modelos de autorizações de cada serviço na LGT. O STFC [telefonia fixa] é uma concessão em regime público, isso significa que a infraestrutura pertence à União e cabe aos concessionários universalizar o seu uso dentro das metas estipuladas. Já o Serviço de Comunicação Multimídia (SCM), que inclui a Internet, segue o modelo de autorização de regime privado, que pode ter no máximo metas de massificação e de qualidade da oferta. Diferente do STFC, a infraestrutura da SCM [banda larga] pertence às empresas e não é tarifado, cabendo aos proprietários decidir pelo compartilhamento com outras empresas, como pequenos provedores e a Telebrás.

O problema é que parte rede de troncos do SCM – o backhaul – foi desenvolvida basicamente com recursos da STFC, tornando as empresas de telefonia fixa as principais fornecedoras do SCM no país. Um emaranhado que muitas vezes infringi a Resolução Nº 272 de 2001 da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), que instituiu o SCM, mas não determinou se o backhaul funcionaria em regime público ou privado.

Na definição utilizada no PGMU II de 2008 o backhaul é :"infraestrutura de rede de suporte do STFC para conexão em banda larga, interligando as redes de acesso ao backbone da operadora". Em setembro de 2010, já com o PGMU III em debate, a reativada Telebrás estabeleceu conceito técnico mais detalhado para o backhaul: "Realiza a distribuição da capacidade de trânsito de dados aos municípios vizinhos ao backbone" e "poderá ser de dois tipos: rádio enlace, usando rádios ponto-a-ponto de alta velocidade, ou óptica em anéis metropolitanos para atendimento a grandes cidades e capitais".

A partir destas definições, a maioria dos backhauls das operadoras se concentram na capitais do eixo sul-sudeste, segundo Flávia Lefèvre, advogada do instituto de defesa do consumidor Pró-Teste. Nesses locais há grande quantidade de usuários, suficiente para altos lucros que financiaram o bachkaul e consequente oferta de internet em alta velocidade por preços atualmente mais baratos.

Público x privado

A proposta inicial do governo no PGMU III era que as empresas teriam como uma das metas a expansão do backhaul pelo país, o que atingiria basicamente as regiões metropolitanas. Nesses termos, o plano abria brechas para definir essa infraestrutura no regime público e consequentemente tarifar e compartilhar a sua utilização. Em resposta, as teles entraram na justiça sob alegação de ilegalidade da proposta e reforço na tese de que o backhaul está no regime privado. As empresas se valem da LGT que impede a prática de subsídio cruzado, ou seja, a reversibilidade de metas de um serviço para outro, neste caso do STFC para SCM – por essa lógica, é ilegal obter pacotes conjuntos  de banda larga e telefonia, prática muito comum das operadoras.

Antes de sair da presidência, Lula conseguiu a retirada dessas ações na justiça, como pré-requisito para retomar o diálogo. Na volta das negociações em 2011 o Ministério das Comunicações continuou a bater na tecla que o backhaul poderia ser incluído no PGMU III porque no processou que culminou no leilão da Telebrás em 1998 foi permitida às empresas de STFC a licença para oferecer o Serviço de Rede e Transporte de Telecomunicações (SRTT), apta a transportar sinais de voz e dados, o que se adequa para internet. Posteriormente o SRTT foi convertido em SCM, em 2001.

Desta forma, as empresas já praticam o subsídio cruzado desde origem em 1998, quando fatiaram o Sistema Telebrás com direito a licença do SRTT. Depois utilizaram os recursos oriundos das metas de universalização do STFC para expandir a banda larga – por isso é comum ter acesso à internet na mesma empresa de telefone fixo no Brasil. Tal situação foi endossada pelo PGMU II e bem aceito pelas teles, quando o backhaul foi incorporado às metas de universalização.

A diferença é que agora a infraestrutura de telefonia fixa já foi praticamente concluída, não interessando aos empresários fazer novos investimentos deste caráter e ainda serem passíveis de incorporação às metas do PNBL sob regime público. Pra completar, as teles desejam que recursos do Fundo de Universalização das Telecomunicações (Fust) sejam utilizados para o desenvolvimento de backhaul sob caráter privado, o que também é ilegal e foi vetado pelo governo.  O Fust só pode ser disponibilizado para telefonia fixa, por ser de regime público.

Travado na infraestrutura no PGMU III, o governo tenta endossar novos caminhos para o PNBL, em especial regular a oferta de internet no atacado por cerca de R$ 30,00 com velocidade média de 500 kbps. Outro caminho imediato foi liberar a Telebrás para comercializar a banda larga no varejo com a licença para o SCM por tempo indeterminado, publicada no Diário Oficial do dia 21 de fevereiro.

Alternativas

Em 2008 o Instituto Pró-Teste entrou com ação pública para regulamentar o backhaul como regime público. No PGMU III o instituto classificou o Acesso Individual Classe Especial (AICE) de ilegal e risível – o AICE é o telefone fixo social que o novo PGMU pretende ofertar por R$ 15,00. Flavia Lefèvre apelida a proposta do governo no PGMU III de um "puxadinho", dotado de muita fragilidade jurídica, e acredita que o melhor caminho é reaver o contrato de privatização e a LGT.

Já Veridiana Alimonti, do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), defende que a revisão do setor deve ser acompanhada da definição de Marco Legal para internet, no qual o serviço da banda larga deve ser em regime público, com metas de universalização desvinculadas da telefonia fixa. Outro ponto central para o Idec é aumentar a competição no setor com o fortalecimento dos pequenos provedores.

 

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