‘Aqui é um faroeste’, diz especialista; debate deve retornar após as eleições

No Brasil, a discussão sobre a regulação da mídia esquentou no ano passado, depois que o Supremo Tribunal Federal extinguiu a Lei de Imprensa elaborada no Congresso e promulgada durante o regime militar, em 1967. Hoje o país tem uma série de leis, normas e órgãos que regulam as empresas de comunicação, mas não há uma política nacional que considere todos os aspectos da comunicação nem uma lei geral.

O Código Brasileiro de Telecomunicações (lei 4.117) é de 1962; em 1996, a parte que tratava do setor das chamadas "teles" passou a ser regida pela lei 9.295, que permitiu a privatização do setor. O mesmo código voltou a ser modificado em 2002, para permitir a entrada de capital estrangeiro nas empresas de comunicação (até 30%). Outras leis específicas regulam a Empresa Brasileira de Televisão, a TV digital, a radiodifusão comunitária e outros aspectos.

Para o professor Murilo César Ramos, da UnB (Universidade de Brasília), é essa “miríade” de leis e normas que dintingue o Brasil do resto do mundo.

“Aqui é um faroeste. Não há uma lei efetiva para regulação de rádio e TV. A lei que existe é totalmente inaplicável, superada no tempo. Só para se ter uma ideia, ela antecede a radiodifusão em FM! Além disso, os dispositivos de propriedade cruzada, controle por grupos econômicos e regulação de programação regional previstos na constituição nunca foram regulamentados”, afirma Murilo César.

Um exemplo da falta de aplicação da lei é o artigo 220, que proíbe oligopólios e monópolios no setor e institui a complementariedade entre os três sistemas – público, privado e estatal – de rádio e TV. O artigo 221, que trata das finalidades educativas e culturais da programação e garante a regionalização e a presença da produção independente, é outro que nunca foi regulamentado.

Debate

É exatamente isso que está em pauta no debate sobre uma nova lei. Para Murilo César, o Brasil está ficando para trás em relação a outros países sul-americanos, como Argentina e Venezuela.

“Não estou entrando no mérito de se as leis desses países são boas ou ruins. O importante é que há leis novas. Essa que é a grande novidade. E por isso existe hoje no Brasil uma grande demanda por um marco regulatório novo, atual”, comenta.

O debate deve pegar fogo depois das eleições. Em novembro, haverá em Brasília um novo evento para discutir o marco regulatório para a indústria de mídia. Será o passo seguinte à Confecom (Conferência Nacional da Comunicação), que aconteceu em dezembro do ano passado e terminou com 633 propostas aprovadas.

Entre elas, havia novos critérios para concessões de frequência da rádio e TV; a criação do Conselho Nacional de Comunicação (órgão independente para criar políticas públicas e regular sua aplicação); a criação de mecanismos de fiscalização para punir rádios e TVs que veiculem conteúdos depreciativos; uma nova lei de imprensa que garanta direito de resposta e assegure a pluralidade de opiniões; cotas para programas educacionais, culturais e informativos; reserva de 50% para programação nacional nas emissoras; restrições à propriedade cruzada; e limite à formação de redes nacionais por emissoras de TV, reduzindo o número permitido de afiliadas.

Para João Brant, do Coletivo Intervozes, uma das medidas mais importantes seria criar um espaço de participação popular para discutir os rumos das políticas públicas. “A organização do sistema de comunicação protege grandes interesses comerciais, mantém a concentração e não institui a pluralidade e diversidade de conteúdo. Isso é grave porque os meios de comunicação têm um papel central na circulação de ideias e valores, é dessa fonte que a sociedade bebe. Quanto maior o acesso a esse espaço, mais democrático”, defende.

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