Lei de Imprensa: muito além da letra da lei

O Supremo Tribunal Federal deve votar na quinta-feira (30) a proposta de extinção da Lei de Imprensa, parte do chamado "entulho autoritário" herdado da ditadura militar. A iniciativa é do deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) e já teve dois votos favoráveis: dos ministros Carlos Ayres Britto (relator) e Eros Grau.Caso não se repita a recente refrega entre o presidente da corte Gilmar Mendes e o ministro Joaquim Barbosa, e os ânimos dos meritíssimos estejam efetivamente serenados, é possível que a votação se encerre nesta semana.

O deputado Miro Teixeira está eufórico com a nova oportunidade de vestir a toga na mais alta instância judiciária. Mantém-se completamente afastado do turbilhão que envolve a totalidade dos seus pares na Câmara Baixa (baixíssima, aliás) envolvidos nas mordomias e no tráfico das passagens aéreas.

A euforia do deputado é justificada: a Lei de Imprensa é um estatuto caduco. Porém sua extinção pura e simples não resolverá os problemas relacionados com a liberdade de expressão e acesso à informação. Nosso jornalismo – digital, eletrônico ou impresso – não se tornará mais qualificado, mais livre e mais responsável no momento em que for extinta, integral ou parcialmente, a famigerada legislação promulgada em 1967, há 42 anos.

Rapidez e firmeza

Miro Teixeira está vivamente empenhado em acabar com este símbolo do autoritarismo. Acredita que uma imprensa é livre a partir do momento em que supera os constrangimentos impostos pelos poderes políticos, militares e econômicos. Ainda não sabemos o que pensa o ex-jornalista, ex-ministro das Comunicações e incansável parlamentar a respeito do acesso irrestrito à informação, concentração dos meios de comunicação nas mãos de poucas empresas e, sobretudo, qual o seu projeto para a criação de entidades capazes de constituir um contrapoder democrático ao poder incontrolado dos grandes conglomerados de comunicação.

O direito de resposta é uma questão que ocupa nossos legisladores desde os tempos da primeira Carta Magna. O "crime de imprensa" é uma noção antiquada que, para ser efetivamente removida, necessita de um ambiente informativo pluralista, diversificado, sem o qual a sociedade jamais saberá com precisão qual é a ofensa, quem o ofendido e o ofensor. Mas existem novas circunstâncias, criadas a partir da redemocratização, que precisam ser encaradas com rapidez e firmeza de modo a evitar que a eventual extinção da abominável Lei de Imprensa não se transforme em ritual remotamente semelhante à conquista da liberdade.

Processo de mudança

Se a Lei de Imprensa é o símbolo da ditadura, a sua eliminação não pode ser simbólica nem subjetiva. Se o deputado Miro Teixeira comover e convencer os supremos magistrados a sepultar os mecanismos censórios entranhados na Lei 5.250, está automaticamente convocado para obrigar o Congresso – onde milita – a restabelecer o Conselho de Comunicação Social, previsto pela Constituição Cidadã de 1988 e seqüestrado há dois anos pelos interesses escusos dos coronéis eletrônicos.

Denunciados por este Observatório da Imprensa numa representação à Procuradoria Geral da República, continuam na ilegalidade na dupla condição de parlamentares-concessionários. Não será necessário vestir a toga nem desgastar as cordas vocais para desarquivar uma denúncia que poderá acabar com a aberração original da nossa mídia eletrônica.

O fim da Lei de Imprensa não é um fim. É um início. Deve gerar providências complementares imediatas. Um processo de mudança – se é que desejamos efetivamente uma mudança no campo da informação – exige novos instrumentos, novo sistema de forças e freios. Exige, principalmente, uma aliança de vontades, um mínimo de consenso entre os principais atores do elenco.

O fim da Lei de Imprensa não pode parecer uma quixotada.

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