PL-29: risco de desfiguração

No dia 17 de dezembro, o deputado Jorge Bittar (PT-RJ) entregou à presidência da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados o seu substitutivo ao Projeto de Lei 29/2007, que unifica os serviços de TV por assinatura, permite a entrada das empresas de telecomunicações nesse mercado e estabelece mecanismos de proteção ao conteúdo nacional. Não se trata de um documento oficial, já que o projeto de lei ainda tramita na Comissão de Defesa do Consumidor e as articulações para que fosse remetido diretamente para votação em plenário não prosperaram por falta de apoio do PMDB.

Com o relatório, Bittar – ele não volta à Câmara em 2009 pois assume, em 1º de janeiro, a Secretaria de Habitação do Estado do Rio de Janeiro – quis não só registrar o trabalho de um ano e nove meses e o consenso construído em torno de temas polêmicos como a defesa do conteúdo nacional, mas deixar os fundamentos para que o trabalho seja levado em frente, já que depois de tramitar pela CDC o projeto volta à Comissão de C&T. Mas muitos apostam que todo o capítulo relativo ao estímulo à produção nacional, com uma cota geral de 3,30 horas diárias, metade das quais produzidas por produtor independente, além de outras cotas secundárias, tende a ser bombardeada sem a presença de seu autor.

Contra as cotas estão as empresas de TV por assinatura e os produtores estrangeiros, por razões óbvias. As empresas não querem obrigações a cumprir e os produtores querem hegemonia de mercado. Contra as cotas sempre se manifestou a Globo, que tem o monopólio da programação nacional por meio da Globosat e não quer dividir com os produtores independentes um naco de seu mercado. Embora tenha firmado um acordo com o relator em outubro, os executivos da Globo não se empenharam para que o projeto de lei fosse remetido ao plenário. Aliás, Henrique Alves, líder do PMDB, que não endossou a medida, é um tradicional aliado das Organizações Roberto Marinho, já que sua família tem uma retransmissora no Rio Grande do Norte. Assim, contra as cotas estão todos os parlamentares que mantêm relações com a Globo. As empresas de telecomunicações aceitaram as medidas de proteção ao conteúdo nacional, mas no fundo preferem que as cotas, por serem polêmicas, sejam deixadas de lado.

O estado de ânimo entre parte dos parlamentares poder ser medido pelas declarações do relator do PL-29 na CDC, deputado Vital do Rêgo Filho (PMDB-PB). Ele já disse que se voltar à CDC na próxima legislatura e se mantiver relator, vai eliminar as cotas.

Isso significa que só uma articulação da sociedade civil e dos produtores independentes garantirá pressão para que a Comissão de C&T, que terá que designar novo relator, não recue frente ao longo e exaustivo trabalho do deputado Jorge Bittar, que aproveita um momento de transição tecnológica para introduzir na legislação novos conceitos de estímulo à indústria de produção audiovisual brasileira e democratização dos canais de distribuição de conteúdo. As condições para a aprovação do projeto não são as mais favoráveis, mas já foram mais adversas.

O risco é que o PL-29 caia no limbo, o que será uma perda importante para a cultura nacional. Até porque se a Anatel liberar novos licenças de TV a cabo, todas as concessionárias de telefonia fixa controladas por capital nacional (Oi, Brasil Telecom, CTBC e Sercomtel) vão poder adquirí-las mesmo em sua área de concessão. “Como não se trata de bem escasso, o novo planejamento deve prever um número maior ou mesmo ilimitado de licenças. E a Lei do Cabo permite à concessionária comprar licença em sua área de concessão desde que haja manifesto desinteresse por parte de outros agentes”, observa um executivo. Assim, se a Anatel realmente apresentar logo seu novo planejamento e lançar as novas licenças, o interesse das empresas de telecom no PL-29 diminuirá sobremaneira. Por que, à exceção da Telefônica, que terá que se associar minoritariamente a empresa de capital nacional, todas as demais concessionárias poderão compra licença de TV a cabo.

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