Abert apresenta em outubro testes com tecnologia Iboc

Durante todo o primeiro semestre de 2007, representantes de radiodifusores e integrantes do governo, em especial o ministro das Comunicações, Hélio Costa, uniram-se no coro em defesa da aprovação da tecnologia estadunidense HD Radio/Iboc como padrão para o rádio digital brasileiro. A promessa foi que até setembro daquele ano o Executivo teria informações suficientes sobre o sistema para tomar uma decisão.

Quase um ano depois, a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV (Abert) promete entregar o resultado dos testes com a tecnologia norte-americana ao governo e à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) até o dia 15 de outubro. Segundo o presidente da entidade, Daniel Slaviero, faltam apenas alguns ajustes finais no relatório para que os radiodifusores comerciais possam apresentar uma avaliação técnica sobre o padrão que vêm defendendo como ideal para adoção no país há cerca de dois anos.

"O estudo irá confirmar que o Iboc tem as melhores condições técnicas para o rádio digital brasileiro", disse Slaviero em ato de divulgação de pesquisa sobre o perfil sócio-econômico das rádios brasileiras [saiba mais]. "Até porque é o único no mundo que atende as faixas de AM e FM", completou o diretor-geral da Abert, Flavio Cavalcanti Júnior.

A expectativa da Abert é que, com a apresentação do resultado dos testes, o governo tome uma posição a respeito do modelo de rádio digital até o fim do ano. Porém, para o professor Carlos Eduardo Esch, da Universidade de Brasília, a definição do modelo envolve muitas outra variáveis. "O Estado deve pensar na política industrial, para que não haja descompasso entre a escolha tecnológica e sua implantação junto à população. Além disso, é preciso discutir uma política de formação para os técnicos e produtores de conteúdo", ressalta.

Durante as discussões do conselho consultivo montado no Ministério das Comunicações para debater o modelo de rádio digital, acadêmicos e representantes de entidades da sociedade civil apontaram a importância de não restringir a escolha à adoção do padrão tecnológico em si, mas pensá-la em sua completude, envolvendo dos aspectos industriais à política de fomento à produção de conteúdos digitais. No entanto, as últimas declarações do ministro das comunicações, Hélio Costa, têm indicado a disposição do governo em ratificar a sugestão dos radiodifusores.

Estudo polêmico

Os radiodifusores argumentam que apenas a tecnologia estadunidense consegue fazer a transição na mesma faixa e na mesma banda. Esta seria a melhor opção para a migração do analógico ao digital no caso brasileiro porque permitiria às emissoras manterem o seu número no dial. Caso houvesse uma alocação das frequências em digital em outra faixa do espectro, como ocorreu em vários países europeus, isso poderia, na avaliação do setor, trazer prejuízos às rádios pois descaracterizaria as frequências, ativo importante na fidelização da audiência.

Porém, o estudo que será apresentado pela Abert tem sido alvo de polêmicas desde o seu início. Primeiro, porque os testes estão sendo realizados pelos atores diretamente interessados nos seus resultados, sem qualquer tipo de critério definido publicamente ou mesmo acompanhamento dos órgãos reguladores. A Anatel, que deveria regular a transição para o digital, sequer acompanha os testes [saiba mais].

Em segundo lugar, a própria entidade contratada pela associação dos radiodifusores para realizar o estudo contesta o seu resultado. Os pesquisadores do Instituto Mackenzie negam-se a assinar o relatório, pois, segundo eles, o texto está sendo adaptado para dar conta das expectativas da Abert. Os pesquisadores afirmam que não recomendam o Iboc, especialmente porque não foram feitos testes comparativos com outras tecnologias [saiba mais ].

Transição cara

Ainda assim, as grandes emissoras seguem defendendo o Iboc. A Abert afirma que a escolha do sistema Iboc (In Band On Channel, ou "na mesma banda e na mesma frequência") viabilizaria a convivência durante um tempo maior entre as estações já digitalizadas e aquelas que levarão mais tempo para entrar no sinal digital. Esta preocupação é grande uma vez que um dos principais questionamentos de acadêmicos, entidades da sociedade civil, pesquisadores e inclusive de veículos do próprio setor comercial tem sido como as pequenas e médias rádios comerciais e as emissoras educativas e comunitárias conseguirão arcar com o custo da transição.

Mesmo as projeções dos dirigentes da Abert apontam neste sentido: a transição deve atingir primeiro as estações AM e FM das grandes cidades. "O problema do AM está nas grandes cidades. Ali é que migração deve se dar", aponta Daniel Slaviero. "A grande questão está no AM, que vem perdendo competividade nos grandes centros em relação ao FM. Já nas regiões médias e pequenas, a demanda será menor e a transição deve demorar muito mais tempo", prevê Flávio Cavalcanti Júnior.

Segundo Daniel Slaviero, cada rádio terá de pagar entre US$ 80 mil e US$ 120 mil para comprar transmissor e antena digitais. Ele afirmou que as estações comerciais mais modestas não devem esperar que o custo seja bancado pelo governo, mas sugeriu que provavelmente haverá demanda por uma linha de financiamento. No entanto, de acordo com fontes que acompanham o processo, as altas despesas têm assustado os pequenos radiodifusores, o que tem gerado desconfortos dentro do setor.

Tais preocupações são motivadas também pela falta de perspectiva de novos investimentos para sustentar a mudança. "Num primeiro momento não haverá incremento da publicidade, o aumento da receita virá com a maturação da distribuição de receptores, o que deve ocorrer entre 2 e 3 anos", prevê Slaviero.

Um risco colocado é a possibilidade de haver resistência da população à compra de receptores digitais ainda maior do que a existente hoje no caso dos conversores da TV digital. "Quem irá pagar 1.000 reais ou qualquer preço próximo a este para ter um rádio digital com as mesmas estações?", indaga o professor Carlos Eduardo Esch. A aposta dos radiodifusores é nos receptores embutidos nos automóveis. No preço total dos novos modelos, o preço dos novos dispositivos seria melhor aceito.

Em um cenário de altos custos e inexistência de novas receitas, tende a haver uma diferenciação entre o pequeno grupo de grandes rádios nas maiores cidades, que irão transmitir em digital também para um grupo seleto de receptores próprios para este tipo de tecnologia, e um segundo conjunto de médias e pequenas rádios que continuarão com seu sinal analógico.

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