Caso Dantas lança dúvidas sobre compra da BrT pela Oi

As recentes revelações da Operação Satiagraha levantaram suspeitas sobre intervenção do banqueiro e ex-sócio da Brasil Telecom Daniel Dantas na fusão da companhia telefônica com a Oi. Segundo relatórios da Polícia Federal, Dantas teria usado o advogado petista Luiz Eduardo Greenhalgh para fazer lobby pela aprovação do negócio junto à cúpula do governo federal. Os indícios reforçam as críticas em relação à benevolência do Palácio do Planalto para com o banqueiro, que saiu da transação sem as ações judiciais até então mantidas contra ele por fundos de pensão e pelo grupo Oportunity por gestão temerária de recursos, além de US$ 985 milhões nos bolsos com a venda de sua parte na Brasil Telecom.

Para especialistas entrevistados pelo Observatório do Direito à Comunicação, o caso coloca sob suspeição o processo de compra da Brasil Telecom, o que não pode ser ignoradas nos debates sobre a revisão do Plano Geral de Outorgas (PGO) de telefonia fixa. A alteração normativa é condição para que a fusão se concretize, uma vez que pela legislação atual, uma concessionária deste serviço não pode adquirir outra. Assim, além da análise sobre a validade política, técnica e econômica da mudança, o caso Dantas colocaria uma nova polêmica sobre a licitude da operação entre BrT e Oi que, afinal, motivou o debate sobre o PGO.

“Do ponto de vista político, o processo se tornou mais complexo e delicado, tanto no âmbito do Poder Executivo quanto no âmbito da Anatel [Agência Nacional de Telecomunicações]”, avalia o coordendor do Laboratório de Políticas de Comunicação da UnB, Murilo Ramos. Para Gustavo Gindre, integrante do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social e do Comitê Gestor da Internet no Brasil, o governo não pode levar a cabo um processo onde sua atuação está sendo questionada. “Com Dantas na cadeia e seu advogado dizendo que vai revelar denúncias sobre o PT, é no mínimo complicado que o governo autorize um negócio que o beneficia em mais de US$ 1 bilhão. Uma operação financeira desta envergadura não pode passar a impressão de que o governo está sendo chantageado e, em troca, paga um cala-boca deste valor”, diz.

Por diversas vezes, desde setembro de 2007, Daniel Dantas criticou a fusão. Em janeiro deste ano, seus advogados apresentaram como parte da defesa no litígio entre o banqueiro e o Citigroup documento contendo acusações de corrupção entre a Oi e integrantes do governo. “Dantas acusava o PT de um esquema com a Andrade Gutierrez, envolvendo o filho do Presidente da República e os fundos de pensão para formar a BrT-Oi. Seis meses depois, Dantas sai com quase US$ 1 bilhão dessa negociação. O que aconteceu no meio?”, indaga Samuel Possebom, jornalista especializado na área de comunicação.

Para o deputado Ivan Valente (PSOL-SP), tanto a transação entre as duas concessionárias, como a revisão do PGO estão sob suspeita e podem ser questionadas judicialmente. Antes mesmo da prisão e posterior soltura de Dantas, a negociação já havia sido objeto de uma representação do jornalista Paulo Henrique Amorim ao Ministério Público de São Paulo, datada de 12 de junho deste ano. O documento não só critica as benesses obtidas por Daniel Dantas, como ataca o negócio como um todo, afirmando ter sido uma operação financiada com dinheiro público – por meio do aporte do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) – para beneficiar empresários, no caso, os controladores da Oi Sérgio Andrade e Carlos Jereisatti.

Nada de errado

Apesar do conjunto de acusações e suspeições, o governo federal e a Anatel têm dito que o caso não trará conseqüências à revisão do PGO. Em entrevista à revista especializada Teletime, o ministro das comunicações, Hélio Costa, afirmou que o resultado da Operação Satiagraha “não interfere em nada” relativo à fusão. E reforçou: “a fusão não tem absolutamente nada a ver com isso [a prisão e soltura do banqueiro]”. Pela sua assessoria, a Anatel também afirmou que não há qualquer mudança na condução da revisão do PGO por conta da operação da Polícia Federal.

A traqüilidade do governo pode, curiosamente, ser abalada pelo próprio governo. Segundo o blog Conversa Afiada, do jornalista Paulo Henrique Amorim, o comandante da operação, delegado Protógenes Queiróz, prometeu ao juiz Fausto De Sanctis novos relatórios que trariam evidências de irregularidades envolvendo Dantas desde a privatização do setor de telecomunicações à negociação entre Brasil Telecom e Oi.

“Essa cadeia societária formada e estrategicamente planejada, participou do processo de privatização de empresas estatais e arrematou no leilão de telefonia fixa a Tele Centro-Sul (atual Brasil Telecom), na telefonia móvel a Tele Norte Celular (hoje Amazônia Celular) e Telemig Celular. Todo esse cenário criado foi praça de inúmeros fatos, envolvendo notícias de corrupção de autoridades públicas e espionagem industrial, manipulação da mídia, ações judiciais entre outros fatos”, aponta trecho da investigação da PF reproduzido no blog de Amorim.

Em artigo no último número da revista Carta Capital, seu editor, Mino Carta, cita uma conversa em off com uma “altíssima” autoridade do governo segundo a qual a abertura do disco rígido do grupo Opportunity “acabaria a República”. Especulações a parte, não se sabe o que está por vir. Mas se as conseqüências podem não chegar a confirmar o temor da fonte do editor de Carta Capital, é possível que a prisão de Dantas e as revelações posteriores tenham na fusão da BrT-Oi uma de suas primeiras vítimas.

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