Plano Nacional traça diretrizes para políticas de comunicação

Enquanto iniciativas parlamentares sofrem historicamente com o poder político dos radiodifusores dentro do Congresso Nacional e o Ministério das Comunicações demonstra pouca ou nenhuma disposição de enfrentamento, a área da Cultura pode se tornar, dentro do espaço governamental, um foco de transformações para a desanimadora conjuntura da comunicação no Brasil. A democratização das comunicações, o fortalecimento da TV pública e o fomento às produções regionais e independentes foram alguns dos itens incluídos no Plano Nacional de Cultura (PNC), que deve se tornar o principal guia para atuação do Ministério da Cultura e órgãos relacionados.

O PNC é resultado das deliberações da I Conferência Nacional de Cultura (CNC), realizada em 2005, e de outros eventos que pautaram a construção do texto, cuja última versão foi apresentada no início de junho. Atualmente nas mãos do deputado Frank Aguiar (PTB-SP), relator do projeto na Câmara dos Deputados que o transforma em lei, o plano deve vigorar na perspectiva plurianual do decênio de 2008 a 2018.

Os debates sobre o plano tiveram início em 2003 com a realização do Seminário Cultura para Todos, promovido pelo Ministério da Cultura (MinC), e se consolidaram em 2005, quando da realização da Conferência Nacional, que mobilizou no total cerca de 60 mil pessoas. As resoluções da CNC compõem o projeto de lei do Plano Nacional de Cultura e são a base de desenvolvimento de suas diretrizes gerais.

Entre as chamadas políticas intersetoriais – o esqueleto do PNC –, a comunicação se destaca no documento pela afirmação de que “a diversidade cultural ainda não é satisfatoriamente representada nos meios de comunicação do país” e que “a concentração empresarial dos meios de produção e distribuição da informação e do audiovisual restringe a socialização democrática dos valores plurais da sociedade brasileira”. Um avanço conceitual bastante significativo, não apenas porque coloca o debate sobre a democratização da comunicação em pauta, mas também demonstra o tempo perdido pelo Ministério das Comunicações.

Consta nas pretensões do PNC a “revisão geral dos instrumentos de regulamentação e controle das atividades do setor”, definida como a formulação de uma Lei Geral de Comunicação Social. As prioridades estão dispostas no sentido de fortalecer e explorar a convergência digital e suas potencialidades enquanto “ambiente contemporâneo de circulação de cultura”. Também aponta o fortalecimento do campo público de comunicação através da recém-criada Empresa Brasil de Comunicação (EBC), tida como “um agente estratégico”, e ainda “promover a qualificação de todo o campo público de radiodifusão, de forma horizontal e democrática”.

Universalização

“Este é o primeiro planejamento de longo prazo para a cultura desde a redemocratização”, afirma Gustavo Vidigal, coordenador do Plano Nacional de Cultura. “Estamos tentando promover uma ampliação do conceito de cultura.”

Esta ampliação justificaria, segundo ele, a inclusão de temas ligados à comunicação no PNC. “Para nós, comunicação é cultura, desde o que envolve política de audiovisual, TV pública, conteúdo”, avalia Vidigal. Exemplo de que esta perspectiva já faz parte dos projetos do ministério seria o DocTV, bem-sucedido programa de incentivo a produção de documentários.

O texto do PNC se fundamenta na expectativa de “superar positivamente as indústrias culturais e seu caráter restritivo e homogeneizador, predominante até os anos 90”. As diretrizes do plano buscam, então, alargar “possibilidades de experimentação e criação estética” e universalizar o acesso à cultura também através de políticas que incidam sobre setores ligados à área da comunicação. Isso se traduz no plano, por exemplo, em recomendações como “estimular a criação de programadoras nacionais, estaduais e municipais de distribuição de conteúdo audiovisual para os meios de comunicação, cineclubes, circuitos universitário e comercial de exibição, escolas, centros culturais, bibliotecas públicas, museus e videolocadoras”.

Em relação à chamada cultura digital, o PNC estabelece parâmetros que vão além dos programas de inclusão. As políticas públicas defendidas no plano vão desde programas de capacitação até o apoio ao “desenvolvimento das linguagens de expressão e a oferta de conhecimentos de domínio público por meio das plataformas digitais”. Também uma política de digitalização de acervos e o aproveitamento da Internet e da banda larga são contemplados, na perspectiva de servirem como “instrumento estratégico para novas formas comerciais e não-comerciais de compartilhamento de cultura”.

TV pública

O Plano Nacional de Cultura atribui grande ênfase ao papel da TV pública na divulgação cultural. O Ministério da Cultura foi o grande impulsionador governamental da constituição de um sistema público de radiodifusão, quando convocou o I Fórum de TVs Públicas. Perdeu certo espaço para a Secretaria de Comunicação Social, do ministro Franklin Martins, quando da criação da Empresa Brasil de Comunicação e, recentemente, enfraqueceu um pouco mais sua posição com as saídas da EBC do diretor-geral Orlando Senna e do diretor de relacionamento e rede Mario Borgneth, ambos ligados ao MinC. Assim mesmo, é grande a expectativa contida no PNC em relação às potencialidades da TV pública.

“A televisão pública se distingue da estatal justamente por ser guiada por diretrizes de longo prazo, desvinculadas tanto dos interesses de governo, como de mercado”, afirma o PNC. Partindo deste princípio, acredita-se na possibilidade de utilização dos sistemas de rádio e TV públicos para a veiculação de programas de formação artística e cultural, por meio de editais adaptados à realidade cultural das comunidades participantes.

Iniciativas em andamento

Duas questões que vem tendo repercussão na mídia atualmente já estão incluídas no PNC, segundo Gustavo Vidigal. A primeira são as políticas públicas do Plano de Aceleração do Crescimento, o PAC da cultura, que prevêem as ações de curto prazo, e também a readequação da Lei Rouanet. “O plano vai servir como arcabouço para novas legislações”, conta Vidigal.

O coordenador do PNC conta que, assim que o projeto for aprovado no Congresso, deve ser iniciada a discussão e definição dos planos setoriais, abrangendo teatro, dança, cinema, etc. Os planos setoriais estipulam, a partir das diretrizes do PNC, metas para cada área. O texto do Plano Nacional de Cultura ora apresentado ainda não é definitivo e ainda deve servir de base para novos debates públicos antes da apreciação no plenário da Câmara.

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