Conselho Deliberativo da TVE avaliará suposta censura

Porto Alegre – A Comissão Administrativo-Financeira do Conselho Deliberativo da Fundação Cultural Piratini, que engloba as emissoras TVE-RS e FM Cultura, abrirá procedimento para apurar denúncias de censura na redação da TVE gaúcha. Para tanto, serão ouvidos servidores e cargos de confiança (CCs) envolvidos em dois episódios de suposta censura ocorridos desde que o diretor de jornalismo, Léo Gerchmann, saiu de férias. 

Um dos casos a ser analisados é a não-veiculação de matéria sobre uma audiência pública realizada em 03/04 na Assembléia Legislativa gaúcha, que tratou do sucateamento da Fundação. Na época, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul (SJPRS), que participou do encontro, divulgou nota criticando a ausência de reportagem sobre o tema. “Como não poderia deixar de ser, o telejornalismo enviou uma equipe para fazer a cobertura do evento. A matéria foi editada, mas estranhamente não foi ao ar, supostamente por problemas técnicos na gravação da entrevista com o presidente Aírton Nedel, fonte fácil de se recuperar”, dizia o texto. De acordo com Alexandre Leboutte da Fonseca, representante dos funcionários no Conselho, o material chegou a desaparecer da redação pouco antes do horário em que seria veiculado, tendo reaparecido apenas no dia seguinte.

A outra situação a ser apurada diz respeito a uma matéria sobre o zoneamento florestal, aprovado em abril pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema). Conforme Fonseca, a matéria foi ao ar com informações que seriam apenas de interesse do governo, tendo havido cortes no boletim da repórter. O presidente do SJPRS, José Nunes, informou ao Comunique-se que recebeu relato dos jornalistas sobre o fato, mas que a pedido dos próprios envolvidos não haverá qualquer medida mais severa por enquanto. “Estamos mantendo um diálogo com a presidência da TVE. Segundo Nedel, o que aconteceu foi um mal entendido, pois ele teria indicado uma edição mais cuidadosa, e não a censura”, explica.

Para Fonseca, o fato repete uma série de outros vetos que vêm sendo praticados dentro da redação. “A maioria dos cargos de decisão da TVE é composta por CCs, o que prejudica a liberdade na produção das matérias.”

Nunes diz que a TVE, não apenas nessa gestão, recebe interferência governamental na medida em que existe orientação para que não sejam divulgadas determinadas matérias. “O que o sindicato tem feito é pedir providências da Secretaria de Cultura (Sedac) para que haja maior acompanhamento nesse sentido, de modo a evitar censura.”

A secretária de Cultura do estado, Mônica Leal, também se manifestou contrária à prática e afirma desconhecer a autoria da censura. “Sempre serei uma jornalista que acredita na importância da  informação na íntegra para que o público faça a sua avaliação e tenha opinião própria. Portanto, não aprovo que matérias sejam vetadas ou informações alteradas, pois esse é um compromisso ético de  formação pessoal e profissional”, afirma.

Futuro incerto

A situação da TVE e da FM Cultura vem sendo alvo de especulações e temores há mais de um ano no estado. Com falta de recursos financeiros para garantir a estrutura física e o quadro funcional, a Fundação Piratini corre o risco de ser transformada em uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip), apesar das críticas de servidores e entidades representativas jornalísticas.

Em meio às incertezas, a emissora permanece sem presidente desde outubro de 2007, quando Luiz Fernando Moraes pediu exoneração. Nedel, que ocupava o cargo de assessor de integração regional da emissora, assumiu interinamente o posto, mesmo sem ter qualquer formação na área editorial. O único diretor ainda vinculado ao jornalismo é Gerchmann, mas, conforme boatos na redação, ele não deve retornar mais à emissora.

“Em conversa com os funcionários, o presidente interino não negou que Gerchmann estivesse demissionário. O que se diz é que o diretor de jornalismo teria pedido afastamento por discordar do que está sendo projetado para a TVE nas próximas semanas”, afirma Fonseca. Entre as propostas discutidas, estaria um maior direcionamento da emissora para a divulgação de informações institucionais.

Em 09/04, por pressão da sociedade, o governo desistiu de veicular a TVE à Secretaria-Geral, mantendo o vínculo direto com a Sedac. A proposta chegou a ser analisada na Assembléia em caráter de urgência até ser retirada da pauta, mas, para o representante dos funcionários, deve ser retomada em breve.

Na prática

James Görgen, vice-presidente do Conselho Deliberativo, informa que a Comissão vai ouvir as partes envolvidas nos dois episódios durante esta e a outra semana, devendo apresentar os resultados na próxima reunião do Conselho, marcada para 12/05. O objetivo do órgão é verificar se as diretrizes gerais do conselho estão sendo desobedecidas. Entre as determinações a serem verificadas está a indicação de que coberturas jornalísticas devem ser pautadas pelo princípio da observância da pluralidade de versões em matéria controversa, ouvindo as diversas posições – de indivíduos ou de instituições – que tiverem relevante envolvimento com os fatos noticiados.

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