Política educacional: esquizofrenias entre debate público e debate midiático

Quando os gestores públicos se retiram do debate frente a frente com a sociedade, a relação entre Estado e organizações, movimentos, universidades e sindicatos – no limite – passa a ser mediada pela mídia, que, por sua vez, não dá voz a estes últimos. O diálogo vira uma guerra de monólogos.

A história é simples, mas o debate é complexo e tem uma série de implicações. Na última semana, nos dias 10 e 11 de abril, a Ação Educativa realizou um seminário para discutir as recentes mudanças na educação paulista, anunciadas pela Secretaria Estadual de Educação no âmbito da gestão, do currículo e da profissão docente e contidas no documento chamado “Uma nova agenda para a educação pública”. O documento afirma que os últimos censos escolares e avaliações de aprendizagem apontam que “o desempenho insuficiente do sistema” é o principal problema da educação pública de São Paulo.

A intenção do encontro era reunir gestores públicos da SEE, pesquisadores, profissionais da educação, jornalistas que cobrem o campo da educação e dos direitos humanos em jornais paulistas e representantes de ONGs, movimentos e sindicatos para possibilitar que a Secretaria apresentasse o Plano, expondo objetivos, princípios e ações, para que se pudesse entender a reforma no seu conjunto; e provocar o debate sobre as reformas, envolvendo atores estratégicos na formulação, implantação e controle das políticas educacionais, como a universidade, profissionais da educação, organizações da sociedade civil e trabalhadores da imprensa.

Contatada com um mês de antecedência e tendo confirmado presença no seminário, a SEE já havia informado que a secretária Maria Helena Guimarães de Castro não poderia estar no evento, mas enviaria uma representante para a abertura e representantes para as demais mesas de debate, o que seria fundamental para a informação dos participantes do encontro, que desejavam, entre outras coisas, conhecer as propostas da secretaria e como seria sua implementação na prática.

Tal foi a surpresa dos cerca de 100 participantes do evento na manhã de abertura na última quinta, a secretaria não apareceu por meio de nenhum dos seus representantes. Alguns integrantes da mesa de abertura questionaram a ausência do órgão e lamentaram a perda da visão da SEE no debate, que prosseguiu a despeito da sua ausência e num grau elevado de qualidade e pertinência.

É, no mínimo, de se entranhar. Por um lado, a SEE teve, recentemente, destaque em veículos de grande circulação nacional depois da entrevista da secretária Maria Helena às páginas amarelas da Veja e tem, cotidianamente, espaços fixos como fonte da grande mídia. Por outro, abriu mão do debate corpo a corpo com uma pluralidade de acadêmicos, pesquisadores e trabalhadores da educação. Por quê? No limite, atribuiu à mídia (a grande mídia, privada) o papel de mediar a relação do Estado com a sociedade.

Ora, sabemos que este tem sido, cada vez mais, o papel da comunicação (legitimado, geralmente, pelos governos, que sabem que a grande mídia tem e defende, no limite, os seus interesses). Neste caso, ficou clara a retirada da secretaria do debate público e o deslocamento para o debate midiático, que é “terreno seguro”.

Mas quando o debate público se recente da presença dos gestores e o debate midiático se recente da presença da sociedade civil e dos movimentos, como fica o diálogo? Que mídia é esta que promove a mediação, já que não estamos falando de veículos alternativos e comunitários? Como se dá esta mediação? De fato, em defesa do interesse público? Promovendo o debate? Por que sem pluralidade de vozes, sabemos que este debate é, na verdade, um monólogo. Monólogo que as organizações e movimentos tentam combater com seus veículos próprios e estratégias de ocupação do espaço midiático que, sabemos, são bem menos eficientes que as ações do poder público em relação à mídia.

* Michelle Prazeres é jornalista, mestre em Comunicação e Semiótica e integra a coordenação do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social. 

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