Massificação da banda larga: muito discurso e pouca ação

Apesar do grande volume de discussões sobre a massificação da banda larga no Brasil, o assunto permanece pendente em uma eterna queda-de-braço entre os players, como operadoras e fabricantes, e o governo. Isso ficou muito claro durante o 13º Encontro Tele.Síntese, realizado nesta segunda-feira em São Paulo, que contou com a participação de representantes dos dois lados. Mesmo com todos adotando o discurso de trabalho conjunto entre as iniciativas privada e pública, no final as empresas colocam a responsabilidade no colo do governo, e vice-versa.

As principais exigências pelo lado das operadoras e fabricantes dizem respeito a impostos e regulamentação. "Para promovermos a massificação da banda larga, ou seja, para que todos os usuários do País tenham acesso ao serviço, o impacto do governo é importante, principalmente em relação aos tributos. Na banda larga móvel os impostos são 20% superiores aos da fixa. E a tributação sobre as novas redes é uma arrecadação que não existe, então, se o governo quer mesmo massificar o acesso, não deveria falar em tributá-lo", defendeu Marcelo Pereira, diretor da receita da Claro Brasil. Já em relação às licitações e aos contratos de concessão, os empresários cobram mais garantias e proteção aos investimentos. "Quando uma empresa analisa investimentos pesados, como é o caso de aumento e melhoria de redes, quer garantias, como por exemplo, de que não haverá desagregação pelo menos no curto prazo", comentou Rodrigo Uchoa, diretor da Cisco do Brasil.

Patinhos feios

O grande desafio continua sendo levar o acesso rápido de forma acessível às regiões consideradas pouco interessantes pelas operadoras, onde predominam principalmente as classes C e D, como o Norte e Nordeste do País. Um passo considerado importante já está sendo dado pelo governo, que deverá assinar agora no começo de abril o aditivo aos contratos de concessão das telefonias fixas que substitui a obrigação de instalar os chamados PSTs (Postos de Serviços de Telecomunicações) pela implantação de um backhaul para a inclusão digital.

No entanto, o problema da última milha continua. "Nas áreas mais densamente populadas ainda não há um modelo de negócios para levar a banda larga para as classes mais baixas, como aconteceu com a telefonia móvel. Penso que um caminho seria a publicidade, mas os atores desse setor ainda não foram envolvidos na discussão. No entanto, nas áreas com a população mais pulverizada o problema é maior, pois não há demanda batendo à porta para justificar os i nvestimentos. Até há uma potencial demanda por parte do governo, mas nada muito certo.

Vai ser preciso achar uma combinação", avaliou João de Deus Macedo, diretor de planejamento executivo da Oi. Pereira, da Claro, complementou o raciocínio: "no Brasil temos um mercado grande, com potencial. No entanto, precisamos de escala para investir, o que não acontece em todas as regiões. Essa é uma equação difícil de resolver". "Há uma camada da população que as empresas não vão conseguir atender, e precisamos trabalhar com essa realidade. No entanto, devemos nos esforçar para trabalhar com a maior parcela possível", concordou Eduardo Navarro, diretor de estratégia e desenvolvimento de negócios da Telefônica para a América Latina.

Otimismo governamental

Apesar de todos os obstáculos, o governo permanece animado. "Sou otimista. Creio que em oito anos 60% das pequenas cidades terão acesso 3G. Também acredito que em dez anos 30% do País terá acesso através de fibra", disse Plínio de Aguiar Júnior, conselheiro da Anatel. O especialista passou grande parte de sua apresentação defendendo o controle do governo sobre a oferta de banda larga, por se tratar, segundo ele, de um benefício social. "Para que haja mais investimentos nesta área é preciso haver mais competição. Um caso que devemos olhar é o da Europa, que através de multas fez os incumbents se adequarem ao modelo pensado pelo governo para o desenvolvimento do mercado", comentou. No entanto, Aguiar admitiu que ainda há muitos tropeços regulatórios a serem solucionados, como a exigência sobre propriedade de rede. "Há regras a estabelecer e o mercado é complicado".

Já Cezar Alvarez, coordenador de inclusão digital do governo federal, comemorou a iminente assinatura do acordo relativo aos PSTs, vendo aí a semente para o desenvolvimento de um plano nacional de banda larga. "Não podemos subestimar o processo. Se vamos fazer a banda larga chegar a mais de 5.500 municípios, a iniciativa privada e a pública precisam trabalhar juntas para que esse recurso atenda toda a população, desde o prefeito até o padeiro", comentou. No entanto, ele não poupou críticas às empresas que, segundo ele, adotaram uma atitude muito unilateral. "A Abinee, por exemplo, nos diz que se construirmos a infra-estrutura eles entram com a oferta de serviços. Assim é fácil", criticou.

Esperança

Mesmo com toda a dificuldade da situação e com interesses tão divergentes, muitos especialistas consideram os pequenos passos dados até agora muito importantes, tendo em vista a dificuldade de se colocar em prática um plano com as proporções da inclusão digital no Brasil. É o caso do consultor Mario Ripper, organizador do evento, para quem ações como a troca dos PSTs e os leilões de 3G representam um grande avanço para a capilaridade da banda larga no País. "No caso da substituição dos PSTs, por exemplo, mesmo sendo uma banda pequena, já é importante, porque pelo menos teremos uma estrutura chegando a essas localidades", considerou.

O especialista disse estar com esperanças em relação à entrada mais efetiva do BNDES no desenvolvimento do plano de inclusão digital brasileiro. "Eles têm uma estrutura boa, com mais pessoas capazes de dar suporte ao assunto", avaliou. Margarida Baptista, assessora da presidência do BNDES presente no evento, confirmou o interesse. "Temos o objetivo de dar apoio à inovação e à melhoria da infra-estrutura do País. Dentro dessa missão, ajudar nos programas de inclusão digital é um desafio que temos", afirmou. A assessora explicou que atualmente o Banco está estudando muitas idéias neste sentido, tentando combinar suas linhas de crédito atuais no sentido de otimizar as iniciativas do governo. "Um mesmo projeto pode ser financiado com várias linhas, inclusive com a participação acionária. Estamos muito receptivos a novos projetos que propulsionem a inclusão digital", convidou Baptista.

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