Todo cidadão tem direito de gravar TV digital

No final de maio, eu e muitos brasileiros estávamos entusiasmados com a posição do ministro das Comunicações, Hélio Costa, quando ele defendia nosso direito de gravar programas de TV digital. “Proibir a gravação é inconstitucional' – bradava Costa, na mesma linha dos demais ministros que compõem o Comitê de Desenvolvimento da TV Digital.

Esse comitê discordou publicamente da proposta das emissoras de TV de instalar bloqueadores nos aparelhos de TV digital para impedir a cópia de filmes, jogos de futebol e novelas. E pediu aos membros da Câmara do Sistema Brasileiro de TV Digital (SBTVD) para que não especificassem nenhuma tecnologia capaz de inibir ou bloquear a possibilidade de gravação de programas digitais pelos telespectadores em suas residências.

Como cidadão e telespectador, minha concordância com o ministro durou, pois Hélio Costa mudou de posição, após almoçar na terça-feira com diretores de emissoras de TV, em sua residência, em Brasília.

“Nós éramos contra porque achávamos que (bloquear gravação) era inconstitucional, mas se tiver uma cláusula que supere isso, tudo bem” – explica Hélio Costa. Presente ao mesmo almoço, a ministra Dilma Rousseff, da Casa Civil, esclareceu, em nota oficial, no dia seguinte, que nada foi decidido pelo governo.

Esclareçamos a questão: gravar programas de TV, analógica ou digital, é um direito do cidadão, nos Estados Unidos, na Europa e na maioria dos países democráticos e desenvolvidos. Até recentemente, o telespectador brasileiro gravava livremente em videocassete seus programas favoritos, para vê-los ou revê-los mais tarde. Agora grava em DVD ou em discos rígidos. O mesmo critério deve prevalecer para a TV digital. Como assinante de TV via satélite Sky, gravo tudo, digitalmente, num Personal Video Recorder (PVR), com disco rígido de 160 gigabytes.

CUSTO DO CONVERSOR

Um dos argumentos utilizados pelo ministro das Comunicações é o da redução de custos do licenciamento de conteúdos e do próprio conversor. Como disse em entrevista na quarta-feira, a liberdade de gravar encarece os custos de licenciamento de filmes, programas, grandes coberturas esportivas ou novelas. Num receptor de TV digital, é usado um cabo de conexão, chamado High Definition Multimedia Interface (HDMI), para liberar o sinal para gravação. Para bloquear, usa-se outro dispositivo que inibe a capacidade de gravar, o High-Bandwidth Digital Content Protection (HDCP).

Supondo-se um total de 100 mil receptores digitais, o custo da licença, sem restrição para gravar, é hoje de US$ 0,31, por dispositivo.

Com restrição ou bloqueio de gravação, o custo cai para US$ 0,15. Confira esses valores no site HDMI ou no site Digital CP.

Talvez sem compreender bem esse mecanismo, o ministro das Comunicações afirmou quarta-feira passada que, se o Brasil inibir o direito de gravar, o custo dos conversores cairá 30%. Isso não é verdade, dizem os especialistas.

QUE É PIRATARIA?

Copiar programas em casa para vê-los mais tarde é um benefício que a TV digital proporciona a milhões de pessoas no mundo civilizado. Pirataria é outra coisa.

Os verdadeiros piratas têm quebrado praticamente qualquer código de proteção para fazer milhares de cópias.

O crime não está em fazer uma cópia de um programa de TV digital para uso pessoal e doméstico, mas em multiplicar essas cópias para revendê-las, sem remunerar os detentores de seus direitos. É essa pirataria que deve ser combatida.

O risco maior é o governo, com seu imediatismo, optar pelo caminho menos inteligente, constrangendo milhões, a título de combater a fraude.

Isso equivaleria a punir 99,999% da população, a pretexto de se evitar a pirataria, praticada por apenas 0,001% das pessoas. E vale repetir: os delinqüentes quebram quaisquer bloqueios.

Como sabemos, o Brasil é um dos campeões mundiais de pirataria, seja de conteúdos de CDs, de softwares ou de DVDs. A impunidade é total. Os produtos pirateados são vendidos ostensivamente, a qualquer hora do dia nas ruas de São Paulo, do Rio e de outras cidades. Isso, sim, precisa mudar.

COMBATE AO CRIME

Existem, pelo menos, três caminhos para se combater a pirataria. O primeiro e mais eficaz deles é a educação, embora só tenha seus melhores efeitos em longo prazo. Pais e professores deveriam ensinar as crianças a respeitarem a propriedade intelectual e os direitos autorais.

O segundo caminho é o uso de tecnologias avançadas para a detecção da fraude. O terceiro é uma legislação implacável com os fraudadores – mas que seja, efetivamente, aplicada e aplicável.

Nossa esperança é que o Comitê de Desenvolvimento da TV Digital, formado por dez ministros defenda a sociedade e os direitos do cidadão, nesta semana, e libere a gravação de todos os programas.

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