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O LOBBY DA INDÚSTRIA DE DIREITO AUTORAL PARA BLOQUEAR SITES NO BRASIL

Pressão dos grandes estúdios e produtores de conteúdo contra compartilhamento de arquivos ganha força no Congresso. Saiba o que você perde

Por Marina Pita*

Há alguns anos, copiar um filme para uso doméstico, emprestar para os amigos uma fita VHS ou uma cassete com suas músicas favoritas era parte do nosso cotidiano.

Com a passagem do mundo analógico para o digital, a prática da cópia passou a ser vista como algo criminoso – mesmo que copiar seja muito diferente de roubar. Quando se copia, ninguém fica sem, vale lembrar.

Mesmo assim, as entidades representantes de grandes produtoras de conteúdo investem cada vez mais pesado em mídia e lobby para que a distribuição de conteúdos seja tratada como crime da mesma gravidade que o terrorismo, tráfico de drogas, exploração sexual de crianças e adolescentes e tráfico internacional de armas. Não fosse a lavagem cerebral feita diariamente sobre os consumidores, este tipo de comparação soaria ultrajante.

Não negamos aqui que a legislação de direitos autorais no Brasil precisa ser atualizada diante dos avanços tecnológicos.

Todos os setores, tanto as grandes empresas controladores de milhares de registros de direito autoral, quanto educadores, autores, músicos e defensores da liberdade de expressão concordam com isso. Mas como atualizar a lei é a grande polêmica.

De um lado, estão aqueles que defendem que os direitos autorais devem ser defendidos a todo custo – doa a quem doer. De outro, os que entendem que o direito autoral não é mais eficaz para garantir a produção artística e, por isso, propõem modelos alternativos para o setor.

Parcela dos especialistas, talvez a maioria, também aponta a importância de regular de maneira diferente segmentos diferentes.

Trata-se de um debate que precisa ser feito com profundidade, envolvendo todos os diferentes interesses em jogo – inclusive o dos cidadãos, que tem direito de acesso à informação e à cultura no mundo digital.

O problema é que o poder econômico da indústria do direito autoral tem falado mais alto. O circo está pegando fogo, queimando rápido, sem que a maioria se dê conta disso.

Em 2016, no apagar das luzes da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) dos chamados crimes cibernéticos, a Motion Picture Association (MPA) – que representa mega estúdios como Disney, Fox, Sony, NBC, Universal e Viacom –, junto com associações de caráter semelhante, conseguiram inserir no relatório final da CPI a previsão para o bloqueio total de sites que violem direitos autorais.

A medida teve pouca repercussão na época, até porque parte da imprensa brasileira – sobretudo os veículos ligados ao Grupo Globo – também tem interesse no assunto. Aprovado na CPI, o texto começou a tramitar na Câmara dos Deputados.

Agora, o lobby dos estúdios encontrou uma ótima brecha para que ele seja aprovado rapidamente, sem qualquer debate público. Pretendem pegar carona na votação de um projeto, que já se encontra do plenário da Câmara, em fase final de votação, que pretende justamente o contrário: impedir o bloqueio de sites e aplicativos como o WhatsApp.

A jogada da MPA é inserir uma emenda no PL criando uma exceção para os sites que violem direitos autorais – que poderiam, então, sem bloqueados totalmente.

Por que bloquear sites por infração de direitos autorais é um problema

Não é a primeira vez que a indústria do direito autoral tenta resolver seus interesses econômicos pegando carona em outras leis em debate no Parlamento.

Quando o Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014) estava sendo debatido, também houve enorme pressão para que ele trouxesse a previsão de que conteúdos supostamente violadores de direitos autorais fossem removidos das redes sem ordem judicial.

Na época, felizmente se compreendeu que o tema era bem mais complexo e que tais questões deveriam ser tratadas num processo específico, de reforma da Lei de Direitos Autorais.

Na época, o tema estava em discussão no Ministério da Cultura, mas agora também foi congelado. Os grandes produtores de conteúdo voltaram então à baila para criar um novo penduricalho legal, agora se aproveitando do PL que impede o bloqueio de sites e aplicativos.

Além de ignorar a complexidade do tema, que requer uma discussão minimamente aprofundada na sociedade, autorizar o bloqueio de sites por infração de direitos autorais terá consequências problemáticas.

Em primeiro lugar, a medida pode impedir que páginas online dedicadas ao compartilhamento de arquivos entre pessoas se tornem inacessíveis no Brasil, mesmo que elas não sejam usadas exclusivamente para compartilhar conteúdos violadores de direitos autorais.

Várias plataformas de troca de conteúdo entre pessoas de diversas partes do mundo podem ser penalizadas, fazendo com que o mal uso dessas plataformas por parte de seus usuários impeça que a plataforma em si exista.

A proposta de bloquear sites inteiros também é ineficaz. Hoje, mesmo quando plataformas usadas exclusivamente para compartilhar conteúdos protegidos são tiradas do ar, rapidamente outras equivalentes são criadas.

E cada vez mais cresce o número de usuários capazes de mascarar tecnicamente a origem de suas conexões e assim navegar na rede como se estivessem em outra parte do mundo, escapando os bloqueios determinados em um ou outro país.

O esforço técnico e econômico para barrar tais contornos de acesso a páginas eventualmente bloqueadas claramente não valeria a pena. A lista de sites seria sempre crescente, num jogo de gato e rato infinito.

Argumentar que este tipo de lei vem sendo adotado em vários países europeus e, por isso, o Brasil deveria seguir o mesmo caminho, também é algo que não se sustenta.

Não há como comparar o Brasil com a França ou com a Bélgica em termos de capacidade de acesso das populações a bens culturais. Também a posição econômica dos países na cadeia de produção dos bens culturais é outra.

É mais interessante para um país que recebe vultosos recursos em direitos autorais e taxas de propriedade intelectual defender a implementação deste tipo de lei. Aqui, o caso é diferente.

Soluções alternativas

No Brasil, o surgimento de novos modelos de oferta de conteúdo – como rádios digitais e locadoras de vídeo virtuais – tem se mostrado efetivo para converter tradicionais usuários de serviços de compartilhamento de arquivos em consumidores registrados e pagantes.

A facilidade e a garantia de segurança no acesso ao conteúdo convencem boa parte da população com recursos a arcar com  assinaturas dos serviços.

E, ainda que nem todos os usuários da Internet deixem de consumir, irregularmente, em casa, conteúdos protegidos por direito autoral, isto não é necessariamente ruim.

O impacto que este tipo de bloqueio total pode ter no acesso a bens culturais em um país de extrema desigualdade social como o Brasil é algo a se considerar seriamente.

A própria indústria detentora dos direitos autorais poderia perder, já que lucra cada vez mais com o licenciamento de produtos (roupas, brinquedos, acessórios em geral) relacionados ao conteúdo original.

Quanto menos gente tem acesso a eles, menos produtos são vendidos. Estamos falando de um país em que metade da população não tem acesso ao cinema.

Nessas circunstâncias, permitir a aprovação de uma mudança legislativa dessa forma é mais do que temerário. O que o Brasil precisa é de uma agenda legislativa e de políticas culturais relacionadas ao mundo digital que respondam às necessidades do país e de sua população, 50% ainda desconectada.

Aprovar o total bloqueio de sites e aplicações em função de uma suposta proteção aos direitos autorais dos grandes estúdios só ampliará a exclusão cultural – prática que começa a virar moda no Brasil de hoje.

* Marina Pita é jornalista e integra o Conselho Diretor do Intervozes.

 

LIÇÕES DO “ATLETIBA” CONTRA O MONOPÓLIO DA GLOBO

Postura das equipes demonstra a importância de resistir ao oligopólio midiático, cujo prejuízo para espectadores vai muito além do futebol

Por André Pasti*

O clássico de domingo 19 entre Atlético-PR e Coritiba (o “Atletiba”) entrará para a história como um capítulo na luta contra o monopólio da Globo no futebol brasileiro. Os clubes negaram o péssimo acordo financeiro proposto pela emissora para transmitir a partida e decidiram exibir o jogo em seus canais no Youtube e Facebook.

Com a torcida nas arquibancadas e os jogadores prontos para o jogo, o inacreditável aconteceu: a Federação Paranaense de Futebol, a pedido da Rede Globo, impediu a transmissão da partida online. Só haveria jogo sem transmissão, em recado da Globo aos clubes “rebeldes”. Como os clubes não recuaram, a federação impediu a partida de acontecer.

Acostumada a mandar no futebol nacional, a Globo não contava com a coragem das equipes. Com a ação, elas deram visibilidade aos prejuízos do monopólio da emissora ao esporte. Como discutimos há algumas semanas, os danos do monopólio de transmissões são muitos.

Desde o horário das partidas às dez da noite, péssimo para os torcedores trabalhadores e para os próprios jogadores, a campeonatos estaduais inteiros “escondidos” das torcidas. Do financiamento extremamente desigual dos direitos de imagem dos clubes, que inviabiliza o crescimento das equipes menores, à invisibilização do futebol feminino.

A frase “quem paga a banda, escolhe a música” tem sido usada há tempos pelos comentaristas submissos à Globo para justificar esses absurdos das decisões do monopólio. Nesse “Atletiba” ficou muito claro o quanto essa lógica é prejudicial a todos os envolvidos no esporte: não importavam os direitos dos jogadores, dos clubes, nem dos torcedores presentes na Arena da Baixada; não importava o futebol – só o interesse da emissora estava valendo.

Muitos torcedores brasileiros têm questionado o monopólio midiático no futebol, com campanhas como a “Jogo dez da noite, NÃO!”, que chegou a diversos estádios pelo País. No ano passado, a “Gaviões da Fiel” protestou com faixas “Rede Globo, o Corinthians não é seu quintal” e “Jogo às 22h também merece punição”. A novidade agora é o enfrentamento do monopólio pelos próprios clubes.

Combater o monopólio da mídia no futebol é possível, como comprova a experiência argentina. Lá, o programa “Futebol para Todos” e a regulação democrática da comunicação audiovisual (a famosa “Lei de Meios”) reconheceram o direito à audiência dos eventos esportivos pela população e o futebol como patrimônio cultural nacional.

As transmissões passaram a ser realizadas em diversos canais e horários, incluindo a televisão pública, com transmissões online gratuitas em alta qualidade. Além disso, as cotas de TV foram redistribuídas, melhorando a competitividade do campeonato nacional. Infelizmente, esses avanços estão sendo agora atacados pelo governo neoliberal de Maurício Macri.

Pode a internet abalar o poder da Globo?

Os clubes propuseram como alternativa à transmissão televisiva a exibição por suas contas nas plataformas Youtube e Facebook. Mas, se a intenção é fazer frente ao monopólio da Globo, é importante apontar alguns limites dessa transmissão online.

Em primeiro lugar, há uma disparidade de acesso: apenas metade (51%) das residências brasileiras possuem acesso à internet, segundo a pesquisa TIC Domicílios 2015/CGI. Entre os usuários de internet, 31% não possuem acesso à banda larga. A mesma pesquisa revela que 97% dos domicílios brasileiros possuem televisão – com acesso a canais abertos.

Portanto, ainda é muito desigual no Brasil o alcance e o acesso possibilitado pela televisão aberta e pela internet. Essa desigualdade de acesso também se reflete entre as regiões do território brasileiro e nas distintas condições presentes nas cidades.

Outro limite está dado pelas plataformas escolhidas. Youtube e Facebook estão longe de ser plataformas livres. Pertencem a grandes empresas estadunidenses que estão concentrando a produção e circulação de informações nas redes.

Eles são novos “porteiros” digitais, decidindo o que desejam censurar, o que nós podemos visualizar, quais informações terão ou não destaque. Transferir a concentração do controle da informação dos conglomerados da radiodifusão para os conglomerados de internet seria apenas mudar os donos do monopólio.

É preciso pensar políticas que democratizem efetivamente a comunicação, considerando a realidade do território brasileiro. Vale lembrar que a televisão aberta – caso da Globo – é uma concessão pública, que deve atender ao interesse público e cumprir regras previstas em nossa Constituição.

Para além do futebol

A Globo segue agindo como a péssima “dona da bola” do futebol de rua**. A emissora mandou seu recado: ninguém poderia contrariar uma decisão do monopólio. Desta vez, no entanto, os clubes enfrentaram o canal e deram um exemplo de que é possível dizer não e lutar contra os danos do monopólio ao futebol nacional.

Aos que começaram a perceber os prejuízos do monopólio da Globo ao futebol, é preciso, também, fazer um alerta: os danos de uma mídia monopolizada vão muito além do esporte. Nossos direitos de cidadãos são ignorados ou atacados como os direitos dos torcedores no “Atletiba”.

O controle dos discursos em circulação tem permitido aos monopólios sustentar golpes de estado, invisibilizar e criminalizar movimentos sociais e pautas de direitos humanos, defender políticas danosas aos mais pobres, criminalizar a juventude negra das periferias, entre tantos outros problemas. A diversidade cultural, regional, étnica e sexual presentes em nosso país são tão prejudicadas pelo monopólio quanto o futebol.

Que o “Atletiba” seja o início de uma resistência em defesa do futebol e da comunicação como direitos de todos. Precisamos ampliar essa resistência e o combate ao monopólio midiático, dentro e fora do futebol.

**Em nota, o SporTV se isentou da responsabilidade no episódio de ontem, apesar de evidências de que a partida não ocorreu por conta da tentativa de transmissão via internet, segundo disse o 4º árbitro do jogo.

*André Pasti é doutorando em Geografia Humana na USP, professor do Cotuca/Unicamp e integrante do Coletivo Intervozes

INFORMAÇÕES MAL APURADAS CONTRIBUEM PARA SENSAÇÃO DE CAOS NO ES

Relações entre a mídia e governos locais ainda são entrave ao direito à informação; violência no Espírito Santo é caso singular desta situação

Por Cinthya Paiva e Augusto Cesar Brandão*

O Espírito Santo vive uma de suas maiores crises de segurança pública. Embora boa parte dos policiais militares que estava aquartelada tenha retornado aos postos de trabalho no início desta semana, as informações sobre o fim da paralisação e sobre os acordos feitos entre os policiais militares e o governo estadual ainda são desencontradas e confusas.

Desencontro e confusão na apuração e publicização das informações, aliás, marcaram todo o período, mostrando mais uma vez a incapacidade da imprensa capixaba em produzir informações contundentes sobre o que estava acontecendo de fato no Estado.

Muito do que chegou ao conhecimento do público nacional foram boatos, a maioria divulgados via redes sociais como Facebook e Whatsapp e sem muita garantia de procedência. Não se sabe, por exemplo, se alguns vídeos postados foram produzidos pelos próprios policiais para difundir o clima de insegurança e pressionar o governo a abrir negociação.

Esta falta de informação não ocorre por acaso. Assim como na maioria dos estados do País, no Espírito Santo grupos de mídia possuem relação muito estreita com o poder institucionalizado, ora em função das relações interpessoais construídas, ora porque os governos estaduais são grandes financiadores da imprensa local, por meio de anúncios publicitários.

Tudo isto acaba dificultando processos de apuração da notícia quando esta envolve denúncias de corrupção ou pressão de grupos sobre governos. Basta lembrar que, no início dos anos 2000, quando acontecia a CPI do Narcotráfico – que acabou na prisão do presidente da Assembleia Legislativa do Estado, José Carlos Gratz – os primeiros veículos de imprensa a repercutir o assunto foram os nacionais como Veja, Época e IstoÉ, sendo seguidas depois pela imprensa local.

No episódio recente do aquartelamento dos PMs, as informações também foram pouco apuradas.  Para se ter uma ideia, na sexta-feira 10, o Jornal Nacional noticiou que o governo estadual havia realizado um acordo com as Associações de Policiais Militares para encerrar a suposta “greve”. Informação que não foi confirmada minutos depois pelo Secretário Estadual de Direitos Humanos, Julio Pompeu, em entrevista coletiva transmitida ao vivo por algumas cadeias de TV.

Vale lembrar que um dos principais grupos de mídia capixaba, a Rede Gazeta, é afiliada da TV Globo, logo, deve ter sido a origem da informação equivocada emitida pelo JN.

Não bastasse isto, logo após a entrevista coletiva do representante do governo, foi iniciada outra entrevista coletiva, desta vez com as Associações dos Policiais Militares, interlocutores do acordo que encerrou a suposta “greve”.

Apesar do interesse público desta entrevista, que poderia esclarecer parte do que estava acontecendo no estado, ela não teve transmissão ao vivo pela grande imprensa local, nem tampouco apareceu como informe em plantões de notícia, sendo acessível apenas por um link no Facebook, colocado pelos próprios PMs e reproduzido nas páginas da imprensa na internet.

É importante destacar que as Associações dos Policiais Militares, que supostamente entraram em acordo com o governo, não eram, até então, protagonistas do movimento de reivindicações de ajuste salarial e melhores condições de trabalho – que estava sendo protagonizado por mulheres, amigos e familiares dos PMs, que cercaram os portões dos quartéis.

E não houve, por parte da imprensa local, qualquer questionamento sobre esta nova interlocução, nem sobre o fato de ela ter gerado o “acordo” firmado com a categoria – o que coloca o próprio acordo em cheque. Também não foi questionado o uso de helicópteros da Polícia Militar para retirar dos quartéis os policiais que aparentemente queriam voltar ao trabalho, mas estavam sendo impedidos de sair.

Aumento da criminalidade

Outro ponto-chave em toda a crise capixaba foi a cobertura sobre o aumento da criminalidade. É claro que a maior parte dos vídeos divulgados com cenas de assaltos à mão armada, saques e tiroteios não teve os grandes meios como principais divulgadores.

A maior parte circulou pelas redes sociais, especialmente, o Whatsapp. Porém, é questionável o papel da imprensa tradicional de não apurar a origem destes vídeos e apenas reproduzi-los em suas reportagens, o que, certamente, contribuiu para o aumento da sensação de insegurança e de falta de ordem.

Todos os dias, a imprensa local divulgava os dados “extraoficiais” dos assassinatos de pessoas – que passou de 140 em 10 dias de paralisação –, tendo como fonte o Sindicato da Polícia Civil.

Organizações de direitos humanos questionaram estes números e denunciaram possível participação de PMs nestas mortes chamadas, até então, de “acertos de contas” entre bandidos. Esta possibilidade encontra eco no histórico comprometimento da PM capixaba com grupos paramilitares e esquadrões de extermínio, mas quase nada se apurou sobre isto.

Depois de muita cobrança da sociedade, os veículos de imprensa locais começaram a destacar repórteres para apurar quem eram os mortos. Ainda assim, é preciso pesquisar com maior profundidade as circunstancias de cada morte e acompanhar os inquéritos que serão abertos pela Polícia Civil para investigar os casos.

Criminalização do movimento

A Constituição veda aos policiais militares o direito de fazer greve, uma vez que a função da manutenção da ordem e segurança pública por meio de armas de poder letal é indelegável, motivo pelo qual a categoria optou por fazer um movimento de aquartelamento amparado nos familiares, que impediam a entrada e a saída de viaturas e dos próprios PMs dos quartéis. As reivindicações do movimento eram melhores salários, bonificações e melhores condições de trabalho.

O enfoque maior da imprensa, no entanto, foi na ilegitimidade do papel das mulheres dos policiais aquartelados e a responsabilização da própria PM pela insegurança nas ruas. Em nenhum momento o governador do estado, Paulo Hartung, foi questionado por não ter aberto diálogo imediato com a categoria de policiais – como se não houvesse responsabilidade da gestão estadual no atual estado de caos pelo qual passou o Espírito Santo.

Além disso, o governo também já declarou que vai abrir processo administrativo disciplinar contra mais de 700 PMs para apurar se houve crime de motim e já foram indiciados 155 policiais, que após passarem por um processo administrativo disciplinar, poderão ser demitidos.

Valeria questionar ao governador e secretários estaduais – papel da imprensa fazer tais questionamentos – se, na conjuntura de suposto aumento da criminalidade e de falta de recursos para o reajuste de salário (justificativa do Governo para não fazer negociação), é acertada a decisão de punir os insurgentes. Mas, até agora, sobre isto, segue prevalecendo o silêncio.

O suposto acordo firmado previa que os policiais militares deveriam comparecer ao trabalho às 07 horas da manhã seguinte (sábado, dia 11). Ainda assim, na segunda-feira, dia 13, ônibus de algumas linhas não passaram por certos bairros e outras linhas ficaram desativadas.

As atividades de ônibus e shoppings foram suspensas às 21h. Algumas escolas não tiveram atividades regulares como anunciado. Ainda, três ônibus foram queimados e em Vila Velha, cidade da Grande Vitória, e o Convento da Penha, ponto turístico da cidade, foi assaltado.

Com o fim da paralisação noticiada na última sexta-feira, aos poucos policiais militares estão retornando às ruas. Informe da assessoria da Secretaria de Estado da Segurança (Sesp) disse na terça, dia 14, que 2.351 policiais militares responderam ao chamado operacional feito pelo comando geral da PMES em todo o Estado. E que o policiamento ostensivo durante aquele dia contou com 157 viaturas. O chamado operacional começou no último sábado com cerca de 600 policiais retornando aos seus pontos de trabalho.

A mídia noticiou a volta das atividades normais após o acordo, mais uma vez, cumprindo o papel de correia de transmissão de informações oficiais do governo. O que se tem observado, no entanto, é que algumas mulheres de PMs ainda seguem movimentando as portas dos quartéis. Não se sabe ao certo se houve um acordo de fato com a categoria ou se o próprio movimento foi minado por dentro. Pode ser que o “acordo” feito com a categoria não esteja tão selado assim.

Cinthya Andrade de Paiva Gonçalves é advogada e membro do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social. Augusto Cesar Coutinho Brandão é gestor de projetos e neurolinguista.

Publicado originalmente no blog do Intervozes na Carta Capital em 16 de fevereiro de 2017.

“Conversem com suas esposas”: as imagens midiáticas da greve dos PMs

Como o jornalismo legitimou o esvaziamento das imagens das “mulheres” e do debate político na cobertura da greve de policiais do Espírito Santo

Por André Keiji Kunigami*

Trata-se de uma cena familiar do cinema: a personagem feminina é punida, mesmo que indiretamente, pela catástrofe que se armou. O serial killer corre, arma nas mãos, seguido de perto por uma câmera sôfrega que nos envolve, espectadores, fisicamente na ação, eventualmente alcançando a menina que vai ser morta diante de nossos olhos. No cinema de horror clássico, a mocinha que possui alguma agência é a primeira a ser morta pelo assassino, e o filme produz seu efeito pedagógico a partir da eliminação dessa agência.

Façamos agora um corte para a semana passada no Brasil, quando, durante a crise instaurada pela paralisação da PM capixaba, em 10 de fevereiro de 2017, podia-se ler na manchete do El País: “Governo do Espírito Santo endurece o tom e diz que as mulheres serão penalizadas”. A relação sem dúvida se dá num nível do imaginário midiático, e por isso mesmo revela complexidades, ambiguidades e nós discursivos que valem a pena explorar.

Dos muitos acontecimentos recentes no cenário político brasileiro talvez um dos que tenham mobilizado mais a opinião pública foi a recente paralisação da Polícia Militar do Espírito Santo. O evento se iniciou em 4 de fevereiro, quando oito mulheres, esposas de policiais, bloquearam a saída da 2ª companhia do 6º batalhão da PM em Serra, região metropolitana de Vitória, reivindicando aumento salarial e melhoria das condições de trabalho.

O Espírito Santo é o estado que menos paga aos seus policiais militares. Em poucos dias, a situação tomou proporções de calamidade pública, ocasionando mais de cem homicídios (não especificados até agora), fechamento de escolas, comércio e órgãos públicos, paralisação da circulação de ônibus e uma atmosfera de medo generalizado por todo o estado, culminando com o envio das Forças Armadas e o clima de paranoia nacional com a possibilidade de ações similares em outros lugares do País.

Ao fim, mais de setecentos policiais foram indiciados por “crime de revolta”, e a narrativa que opõe uma categoria profissional contra a sociedade foi construída pela mídia corporativa, especialmente no uso das imagens.

Uma das questões mais marcantes desse evento tão político quanto midiático foi justamente o que chamarei de seu dispositivo: as “esposas” ou “mulheres” dos policiais – palavra muito utilizada pela grande mídia para descrever e personalizar as iniciadoras do processo em que culminou a crise. Digo um dispositivo porque o simples fato de terem sido aquelas mulheres das famílias dos policiais a iniciarem a paralisação tornou-se um mecanismo sutil de distração ativado pela mídia: não é o Estado, são os policiais; não são os policiais, são as famílias; não são as famílias, são as mulheres.

Um dispositivo que não apenas personaliza um problema de ordem estrutural e sistêmica, mas também se arrisca a reproduzir uma penalização dos corpos femininos no exato momento que eles se tornam agentes políticos – ou dos próprios policiais, quando se enfatiza hipótese de ser tudo uma “armação”, um subterfúgio que se utiliza das famílias para produzir uma falsa paralisação forçada, uma vez que a greve não é um direito militar.

Ou seja, o dispositivo, que é possibilitado pela presença física daquelas mulheres diante dos batalhões e das câmeras, também inclui os próprios policiais: todos saem perdendo. Mas em qualquer uma das hipóteses, o fato é que aquelas mulheres são desprovidas de sua ação como sujeitos para se tornarem um instrumento que permite o esvaziamento – legitimado pela mídia – do debate político que deveria ali se instalar: a desmilitarização da polícia e a violência do Estado.

Um dispositivo que organiza as forças que estão ali em confronto de forma a deslocá-lo: não se trata mais dessas pautas, mas sim da proteção da sociedade “de bem”. Em vez de mudança, manutenção.

De fato, o grande nó da narrativa discursiva construída pela mídia trata-se justamente da relação entre PM e esposas, traçando conjecturas sobre a possível ação conjunta entre as duas partes. O pêndulo oscila entre afirmar a ação das mulheres ou representá-las como apenas parte do plano de greve dos policiais. Por exemplo, no dia 6 de fevereiro, a BBC publicou uma das primeiras abordagens focadas nas mulheres, relatando que os próprios policiais não sabiam da articulação, feita por redes sociais.

Na reportagem da Mídia Ninja de 8 de fevereiro, a voz é dada especificamente às familiares que se organizaram para protestar. Por outro lado, o portal G1 no dia 11 do mesmo mês anuncia que “coordenadores das forças militares e autoridades governamentais não dão credibilidade a isso pois acreditam que os PMs usam os familiares para tentar escapar de punição”.

O G1 volta a suspeitar no dia 13: “As mulheres sempre alegam que são elas que estão no comando da paralisação. Mas, para as autoridades, essa é uma tentativa de encobrir o que, na verdade, seria um motim dos PMs”. Logo em seguida, o texto nos relembra: “Sem policiamento nas ruas, uma onda de violência se instaurou”.

Numa disputa marcada por pânico, incertezas e imagens de violência, um dispositivo emerge a partir das flutuações de posições que o evento pode ter – quem fere, quem é ferido: os policiais militares, em sua estrutura de trabalho precarizada, ou a sociedade que deve ser defendida?

A estratégia que se solidifica é, obviamente, aquela que coloca os dois grupos como antagonistas. “Os empresários precisam de paz”, anunciava-se na caminhada das famílias pela paz na capital Vitória, segundo relatos, deixando claro a favor de que “sociedade” se fala.

Nas imagens, a construção desse dispositivo torna-se ainda mais clara, mesmo que talvez de forma oblíqua. Primeiro, em vídeo de 7 de fevereiro, quando a situação havia recém-adquirido contornos de calamidade, o jornal Extra, do grupo Globo, publica um vídeo no qual, de maneira bastante ensaiada e artificializada, um policial militar negocia com “um grupo de mulheres” que se encontra do outro lado do portão do 8º Batalhão, em Colatina.

Em segundo plano, outro policial filma a cena com seu celular. As falas são hesitantes e teatralizadas, como um script mal praticado que ainda não se fixou na memória do seu ator. O grupo de menos de dez mulheres responde, e uma delas discorre sobre a lista de condições e reivindicações para a câmera. Em comentário de um leitor, lê-se: “Encenação ridícula…”. Nesse vídeo, o espetáculo é uma farsa, orquestrada pela PM e executada pelas “mulheres”.

As "mulheres" dos policiais militares

Em outro vídeo, de 11 de fevereiro, agora da GloboNews, o repórter narra, por telefone, o acordo assinado entre PM e governo do estado, e a resistência por parte delas de acatar a negociação da qual não participaram.

“As mulheres continuam impedido a saída [dos policiais]”, diz o repórter, enquanto vemos em looping repetido por inúmeras vezes uma sequência de imagens: um grupo de policiais em um batalhão, mulheres protestando, homens das Forças Armadas com fuzis e tanques de guerra nas ruas, um carro fugindo pela praia, pessoas saqueando lojas, um carro da guarda municipal atrás de alguém em uma rua deserta.

Uma montagem de imagens “amadoras” que, na necessidade da televisão de sempre ter imagens, é repetida muitas vezes enquanto a âncora e o repórter debatem o porquê da insistência das mulheres em manter o protesto: “Quando o acordo começa a avançar essas mulheres saem, e quando elas retornam, retornam com outra proposta”, explica o repórter.

Uma montagem mostrando um estado de caos que, na sua repetição incessante sob as falas dos jornalistas da GloboNews, torna-se produto das próprias mulheres, que no discurso são referidas como empecilhos à paz.

Numa imagem, trata-se de uma encenação. Na outra, trata-se de teimosia daquelas mulheres. Falta ou excesso de verdade. Em ambos os casos, diz-se “as imagens não mentem”, mesmo quando mostrando a sua própria mentira (como no caso do Extra).

Acima de tudo, em ambos, essas “mulheres” são utilizadas pela mídia como mecanismo discursivo – e estético – que, seja como um coro ensaiado ou como agentes da desordem, funcionam como um dispositivo que regula forças que se recusam a ceder.

Do seu lugar de desejo por transformação, elas são capturadas por um dispositivo construído em imagens e discursos que logram cindir a sociedade em partes – a que deve ser defendida, e aquela que deve ser exterminada (juventude negra, pobre e periférica).

Não são mais as mulheres dos policiais, são um dispositivo-“mulheres” que reorganiza reivindicações e revoltas, transformando-as em perigo à sociedade de bem e englobando o outro lado frágil da relação institucional que são os próprios policiais, trabalhadores precarizados.

Para a mídia, um espetáculo transmitido nacionalmente em tempo real, que garante a vitimização do governo estadual (Paulo Hartung, sem partido, e seu vice César Colnago, PSDB) e que se constrói a partir do sutil esvaziamento do debate político e da mobilização de sentimentos conservadores e tradicionalistas. “Conversem com suas esposas”, não à toa, foi sugerido pelo governo como solução ao impasse.

*André Keiji Kunigami é pesquisador, mestre em Comunicação pela Universidade Federal Fluminense e cursa doutorado em Literatura e Cinema na Universidade de Cornell (EUA)

Publicado originalmente no blog do Intervozes na Carta Capital.

Novos ares na programação da Globo: como mudar sem mexer no essencial

Reposicionamento da emissora permite veicular programas de conteúdo progressista sem tocar nos interesses centrais e no poder político do grupo.

Por Pedro Ekman*

Denúncia contundente do racismo estrutural existente no Brasil; Globeleza vestida e representando a diversidade cultural do País; personagens LGBT finalmente ganhando as telas e até as ocupações das escolas recebendo apoio nas produções da emissora de maior audiência no Brasil.

De forma direta e decidida, em mais de um episódio de Amor & Sexo, de Fernanda Lima, a promoção do feminismo e um ataque frontal ao machismo, com artistas como Gaby Amarantus e Ney Mato Grosso debatendo temas há muito evitados por toda a TV brasileira. Na abertura de Tá no Ar, de Marcelo Adnet, o clássico dos Titãs “a televisão me deixou burro, muito burro demais” indica que a programação da TV segue como alvo das críticas em mais uma temporada do programa.

Aí você pensa: “alguma coisa mudou”. Será? A Globo nunca foi inconsequente em suas movimentações. Nesse momento, não é diferente. Vejamos.

Remontando à TV Pirata, dos anos 80, a comédia liderada por Adnet em geral faz críticas aos ricos e preconceituosos, em um recorte mais progressista. Mas mira sua ironia ácida na concorrência, retratando programas religiosos e policialescos, entre outros, produzidos exclusivamente pelas emissoras adversárias, que na disputa de apenas 30% de um mercado extremamente concentrado se valem dos conteúdos mais bizarros na corrida pela audiência. Programas próprios da Globo também aparecem, mas estão longe de serem objeto das piadas.

Com o personagem ativista que aparece criticando a própria emissora, com argumentos estapafúrdios, a Vênus Platinada passa um recado muito claro. Afirma que as críticas ao seu histórico de abusos e violências são infundadas. O personagem, aliás, destoa em qualidade e ritmo do resto do programa, “hackeando” o sinal com uma transmissão caseira.

O telespectador, que pela edição geral do programa parecia zapear pela TV, se depara de forma pouco crível com um personagem precário, mas que dá ao público conservador algo em que se agarrar.

Esse movimento feito pela emissora não é recente. Durante abertura democrática pós-ditadura militar, programas como a TV Pirata e Malu Mulher seguiram no mesmo caminho, com a defesa de uma agenda liberal clássica, de direitos individuais.

Em 2013, depois de ter diversas equipes de jornalismo hostilizadas nos volumosos protestos – que, entre outras palavra de ordem, entoaram nas ruas “a verdade é dura, a Rede Globo apoiou a ditadura” –, Willian Bonner foi obrigado a ler o editorial do Jornal Nacional admitindo que havia sido um erro o apoio da empresa à ditadura, trocando o termo “Revolução de 64”, utilizado até então, por golpe militar.

O reposicionamento da marca começa, então, quando pesquisas indicam que a emissora poderia passar a ser vista como uma grande vilã nacional. Novos indicadores de mercado também ajudam a quebrar tabus perpetrados até então. Um beijo gay na novela, assim como a veiculação de conteúdos antirracistas ou feministas, também não são mais um problema que afugenta grande parte dos anunciantes.

A evolução cultural, obviamente, não é obra da Globo. É uma conquista das inúmeras lutas travadas por movimentos e segmentos sociais que conseguiram debater essas pautas com a sociedade a ponto do mercado aceitar que elas agora permeiem seus produtos. Assim, a Globo vê uma oportunidade de evitar a caracterização de vilã e inicia sua vacina contra as multidões que lutam por liberdades e igualdade.

Aqui é importante fazer um parêntese. Mesmo que tais conteúdos possam ser melhor trabalhados, essa abertura é um importante avanço e deve ser aproveitada para frear ou debilitar a propagação de ideias reacionárias no País. Ter esse tipo de conteúdo na emissora de maior audiência do Brasil não é de se desconsiderar para quem quer que as opressões de fato diminuam.

Mas que ninguém tenha dúvidas de que, ao girar parte da sua programação para um espectro político mais progressista, sem interferir diretamente no seu modelo de negócios, a Globo pode continuar fazendo o que faz de melhor: conduzir o poder no país segundo seus interesses políticos e econômicos.

É assim, por exemplo, que um programa como o Profissão Repórter consegue existir em meio a um jornalismo que chafurda com exclusividade no golpismo. Em 2016, após a derrubada de Dilma, Caco Barcelos e sua equipe chegaram a ser agredidos aos gritos de “golpistas” ao cobrir uma greve de servidores públicos no Rio de Janeiro.

Contraditoriamente, o Profissão Repórter prestava ali um grande serviço à greve dos servidores públicos que o agrediam durante a gravação, denunciando as péssimas condições de trabalho das categorias e dando voz a seus líderes.

Assim como em temas como trabalho escravo, exploração sexual infantil, saúde pública, educação e transporte, o Profissão Repórter destoa do jornalismo de Willians Bonner e Waack. Mas esta é a janela permitida pela emissora para veicular minimamente histórias e vozes invisibilizadas nos quatro jornais diários. A proporção é de mais ou menos 20 para 1.

São inflexões políticas calculadas no conjunto de todo o conteúdo exibido na semana. Analisando o tratamento do JN e do Jornal da Globo dado à Operação Lava Jato antes e depois do impeachment da presidenta Dilma, assim como às questões que circundam o governo federal nestes dois períodos, fica explícito onde de fato está o foco político da emissora e que peças ela quer mover neste tabuleiro.

Na última semana, depois que em uma prova do BBB17 dois participantes decidiram gritar “Fora Temer! Volta Dilma!”, a orientação da direção do programa foi para que “falassem dos colegas da casa e não de quem está fora”. Não é novidade: o compromisso da Globo era com a de derrubada de Dilma e agora é com a sustentação do governo Temer, pelo menos enquanto não se desenhar outra condução para o País que mantenha o seu monopólio de pé.

Assim, a Globo avança em temas que não influenciam diretamente na estrutura da política governamental e continua atuando consistentemente na definição dos rumos do País. O galho enverga e não quebra. Quem grita ruas “O povo não é bobo, abaixo à Rede Globo” não pode perder de vista que também a Globo de boba não tem nada.

* Pedro Ekman integra o Conselho Diretor do Intervozes.

Publicado originalmente no blog do Intervozes na Carta Capital.