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Avanços na transparência

A participação popular e o controle social são meros discursos vazios se não houver oferta ampla e farta de informação. No último dia 13, o governo começou a resgatar uma dívida de mais de 20 anos para com seu povo, enviando ao Congresso Nacional o projeto de lei de acesso à informação, compromisso também assumido pelo país ante a comunidade internacional em vários tratados e convenções. Nos últimos dez anos, intensificou-se o movimento mundial por tal regulamentação e, agora, na esteira da crise financeira, países centrais e organizações internacionais recolocaram o tema em suas agendas com revigorada ênfase.

Foi o que se viu nos EUA, com o presidente Obama decretando nova leitura do Foia (a lei americana de acesso à informação), para, na dúvida, optar-se pela abertura total; foi o que se viu no Banco Mundial, quando da conferência do Carter Center, em Lima, reunindo sugestões dos países para aprimorar sua política de transparência; e nas recentes reuniões do UNODC, do Fórum Econômico e do G20, reconhecendo que na raiz da crise está a falta de transparência de governos, bancos e outras corporações.

O projeto surgiu no Conselho da Transparência Pública, da CGU, em 2005, por proposta da ONG Transparência Brasil. Em 2006, o presidente Lula anunciou sua disposição de encaminhá-lo ao Congresso, após discussão no Executivo, atendendo, inclusive, a um compromisso firmado na campanha com o Fórum de Entidades pelo Direito de Acesso à Informação, coordenado pelo jornalista Fernando Rodrigues, desta Folha.

A lei é essencial, seja porque a informação é o oxigênio da democracia, como diz a ONG Artigo 19, seja porque, para o combate à corrupção, não existe melhor desinfetante do que a luz do sol, como dizia o juiz norte-americano Louis Brandeis. A participação popular e o controle social são meros discursos vazios se não houver oferta ampla e farta de informação.

No Brasil, o Executivo federal já avançou bastante em matéria de oferta espontânea de informação -o Portal da Transparência e outros sites já nos colocam como o oitavo país mais transparente entre os 85 pesquisados pelo IBP, de Washington. Mas nos faltava uma lei que regulasse o acesso a qualquer documento buscado pelo cidadão em particular.

Dificuldades sempre existirão para implementar qualquer medida de transparência, mas elas têm de ser superadas. Há o natural receio do mau uso da informação, da distorção dolosa por alguns setores que se opõem ao governo. Isso é real. Mas a solução não está em deixar de divulgar, mas em insistir na informação verdadeira, enfrentando o debate político e apostando em que a verdade afinal prevaleça.

O acesso à informação pode trazer também, em certos casos, riscos reais para a defesa do país, suas relações internacionais, seus legítimos interesses comerciais ou para eventuais investigações em curso. Mas, para isso, existem as exceções, aceitas em todos os países e por organismos internacionais, que aconselham a observância do princípio da "menor restrição possível", que o projeto brasileiro observa.

O mesmo deve ser dito sobre os possíveis danos aos direitos individuais e à vida privada. E a nossa Constituição é bastante precisa quanto a tais ressalvas. No campo das dificuldades, há ainda as de natureza técnica e tecnológica e as de caráter administrativo, que incluem a necessidade de recursos financeiros e humanos -estes, devidamente capacitados- para manter um sistema de prestação de informações, o que não é trivial.

E há, por fim, a dificuldade maior, que consiste em mudar a "cultura do sigilo". Depois da esperada aprovação pelo Congresso, terá que haver um esforço coordenado de cada esfera de governo (e Poder), no sentido de conscientizar os agentes públicos para superar a cultura do segredo, treinar os servidores nos procedimentos da nova lei, alertá-los para as punições (severas), divulgar amplamente os direitos que dela surgem e a forma, agora regulamentada com clareza, de obtê-los.

Mas, como diz a sabedoria popular, "cada dia com sua agonia". Agora é celebrar e destacar a importância desse passo inicial, capaz de colocar o Brasil em posição ainda mais favorável no contexto global. Refiro-me à imagem de um país que cultiva a transparência pública como política institucional irreversível, garantidora dos direitos humanos, arma poderosa contra a corrupção e condição indispensável, hoje, para quem pretende consolidar-se como destino preferencial de grandes investimentos, garantindo-lhes regras claras propiciadoras da livre e sadia competição.

Jorge Hage, 71, advogado, mestre em direito público pela UnB (Universidade de Brasília) e em administração pública pela Universidade da Califórnia (EUA), é o ministro-chefe da Controladoria Geral da União.

Pela máxima dispersão da propriedade

Um dos resultados positivos da frustrada tentativa da FCC (Comissão Federal de Comunicações, na sigla em inglês) de "flexibilizar" normas restritivas à propriedade cruzada da mídia (jornal, rádio e televisão), que se seguiu à onda de privatizações das telecomunicações nos Estados Unidos, foi não só a articulação da sociedade civil contra essas medidas mas, também, o surgimento de sólidos estudos que justificaram a permanência das restrições.

O renomado professor de Direito da Universidade da Pennsylvania, C. Edwin Baker, especialista na Primeira Emenda da Constituição dos EUA, por exemplo, publicou em 2007 (Cambridge University Press), o livro Media Concentration and Democracy – Why Ownership Matters (Concentração na mídia e democracia – Por que a propriedade é importante). Entre outros argumentos, Baker defende vigorosamente o princípio da máxima dispersão da propriedade (maximum dispersal of ownership). Ele demonstra que quanto maior for número de "controladores" dos meios de comunicação, isto é, quanto mais estiver distribuído o poder de comunicar, melhor servida será a democracia. Na verdade, mais "controladores" significa a possibilidade do exercício da liberdade de expressão por um número maior de cidadãos.

Resistência histórica

Esta rápida introdução vem a propósito da histórica e contraditória resistência que a grande mídia brasileira tem revelado à democratização das comunicações no nosso país. O último exemplo é a reação que já se manifesta ao decreto assinado na terça-feira (12) pelo presidente da República outorgando à Fundação Sociedade Comunicação, Cultura e Trabalho uma concessão para executar o serviço de radiodifusão por sons e imagens (televisão) em São Caetano do Sul, SP.

A Fundação Sociedade Comunicação, Cultura e Trabalho – que tem entre seus mantenedores o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC – já obteve uma concessão de TV educativa em Mogi das Cruzes (aprovada pelo Congresso Nacional, em 2007) e autorização para explorar rádios educativas em São Vicente e Mogi das Cruzes, estas ainda em tramitação no Congresso.

O Decreto-Lei 236/1967 – que é um dos velhos diplomas legais que ainda regulam a matéria – reza que, além da União, dos estados, territórios e municípios, somente poderão executar o serviço de televisão educativa as universidades e as fundações. Dessa forma, a Fundação Sociedade Comunicação, Cultura e Trabalho está, como qualquer outra fundação que atenda aos requisitos da lei, qualificada para receber a outorga.

Por outro lado, embora seja atribuição do presidente da República, desde a Constituição de 1988, a outorga de concessões de radiodifusão só produz efeitos legais "após a deliberação do Congresso Nacional" (§ 3º do artigo 223). Vale dizer que o decreto deverá tramitar, ser analisado, votado e aprovado (ou não) tanto na Câmara dos Deputados como no Senado Federal, antes de ser transformado em Decreto Legislativo e entrar em vigor.

Haverá, portanto, ampla oportunidade para aqueles que se opõem ou representam os opositores ao decreto manifestarem suas razões. Só depois, o Congresso Nacional decidirá pela aprovação ou não da concessão. Por que será, então, que até mesmo a Associação Brasileira das Emissoras Públicas Educativas (Abepec) manifesta "surpresa" com o decreto do Presidente da República?

O que está em jogo?

A questão fundamental implícita nas resistências à concessão de um canal de TV a uma fundação que tem entre os seus mantenedores um sindicato de trabalhadores é, como diria o professor Baker, a distribuição democrática do poder de comunicação. Há uma evidente dificuldade na transição entre a defesa abstrata da liberdade de expressão (e da liberdade de imprensa) e sua efetivação através de medidas do Estado que promovam a democratização do poder de comunicar.

Prevalece vigorosa e ativa, entre nós, a ultrapassada posição do liberalismo clássico que considera o Estado apenas como ameaça às liberdades individuais e não, muitas vezes, como promotor delas. É esse papel do Estado que é defendido pelo professor da Universidade Yale, Owen Fiss, no seu fundamental e indispensável A Ironia da Liberdade de Expressão – Estado, Regulação e Diversidade na Esfera Pública (Editora Renovar, 2005).

Por que os trabalhadores não podem ter um canal de TV? Que tipo de ameaça eles representam para a democratização do espaço público e a formação das opiniões em nosso país? A outorga não deveria, ao contrário, ser louvada não só pela grande mídia, mas pelas demais entidades do setor de comunicações, como um passo no sentido da democratização da liberdade de expressão?

Essas são, sem dúvida, questões que devem ser debatidas na 1ª Conferência Nacional de Comunicação.

Venício Lima é pesquisador sênior do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política (NEMP) da Universidade de Brasília e autor/organizador, entre outros, de A mídia nas eleições de 2006 (Editora Fundação Perseu Abramo, 2007)

A esperteza publicitária

O estádio do Pacaembu foi palco da segunda partida das finais do campeonato paulista deste ano. Com o empate em um a um, o Corinthians tornou-se campeão, já que vencera o primeiro jogo na Vila Belmiro. O "próprio da municipalidade paulistana", como o estádio era chamado pelo locutores de outras épocas, viveu um dia de festa (apesar das trapalhadas da Federação na hora de premiar os vencedores, causando até um princípio de incêndio).

O Pacaembu, velho de quase 70 anos, a serem completados no ano que vem, deu conta do recado. As reclamações da imprensa se restringiram ao gramado, realmente muito mal cuidado pela atual administração. Sobre o pior, que estava à vista de todos, não se ouviu nenhum pio, por motivos óbvios.

Placas de publicidade, colocadas estrategicamente ao redor do campo para obter os melhores e mais constantes ângulos das câmeras de TV, anunciavam bebidas alcoólicas cuja propaganda pelo rádio e pela televisão é proibida no horário em que o jogo se realizava. Sem nenhum pudor a TV anunciava, ainda que indiretamente, marcas de cachaça e conhaque que, pela lei, só poderiam ser mostradas depois das 21 horas.

As tentativas da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) de impedir que bebidas de teor alcoólico mais baixo, como as cervejas e os vinhos, continuassem a ser veiculadas a qualquer hora do dia nunca vingaram. E uma das razões, sem dúvida, está no fato das cervejarias patrocinarem as principais transmissões de eventos esportivos no país.

Ainda assim, a lei determina que bebidas com mais de 13 graus na escala Guy Loussac (caso da cachaça e do conhaque) só podem ser propagandeadas pela TV e pelo rádio entre as nove da noite e as seis da manhã. Mas na final do Paulistão, lá estavam sendo exibidas sem nenhuma restrição em plena tarde de domingo.

Emissoras, agências de publicidade, anunciantes e concessionários dos espaços publicitários no Pacaembu (e de outros estádios onde a prática se repete) encontraram um belo atalho para burlar a lei. Além de resistirem bravamente a possíveis restrições à propagada diurna de cervejas, conseguiram veicular também nesses horários bebidas de alto teor alcoólico, mostrando toda a sua esperteza. A cada tomada de câmera da pinga que "é uma boa idéia" ou do conhaque "macio", risos de superioridade devem aparecer nas faces dos que operam à margem da lei.

Afinal eles são mesmo muito espertos

A essa gente não interessa, por exemplo, os resultados de duas pesquisas recentes realizadas aqui e na Europa. A brasileira, apoiada pela Fapesp (Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo) e divulgada pela Fundação Oswaldo Cruz, mostra a diferença de atitude em relação à bebida dos adolescentes que ficam mais ou menos tempo expostos à propaganda desses produtos. Os primeiros consomem álcool em quantidades maiores do que os outros.

Os pesquisadores estudaram o comportamento de estudantes de 14 a 17 anos, da rede pública de ensino de São Bernardo do Campo, diante da exposição de 32 propagandas de cerveja. Entre os adolescentes que já haviam sido expostos previamente a mais mensagens publicitárias, a pesquisa constatou que o consumo de bebidas alcoólicas é de cinco a dez vezes maior. "As propagandas que mais chamavam a atenção dos estudantes estavam associadas a sexualidade, humor e futebol", disse o principal autor do trabalho, Alan Vendrame, pesquisador da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).

Na Holanda, cientistas da Universidade de Radboud conduziram um experimento com 80 estudantes universitários do sexo masculino, de idades entre 18 e 29 anos, divididos em quatro grupos. Um deles assistiu ao filme American Pie – A Primeira Vez é Inesquecível, com muitas referências ao consumo de bebidas alcoólicas durante a trama e com propagandas desses produtos nos intervalos. Outro grupo assistiu ao mesmo filme sem nenhuma propaganda. Um terceiro grupo assistiu ao filme 40 Dias e 40 Noites, que tem menos referências a bebidas alcoólicas mas que foi interrompido algumas vezes por comerciais de bebidas. E o quarto assistiu ao mesmo filme, sem intervalos.

Durante a exibição os participantes tinham acesso a uma geladeira com cerveja, pequenas garrafas de vinho e refrigerantes. Aqueles que assistiram ao American Pie serviram-se de 1,5 copos a mais de cerveja ou vinho do que os que assistiram ao 40 Dias e 40 Noites. Os resultados sugerem que o efeito do conteúdo de álcool na TV não só é capaz de aumentar a compra de bebidas alcoólicas, mas pode também estimular o seu consumo imediato.

"Nosso estudo mostra claramente que exibir bebidas alcoólicas em filmes e propagandas não apenas influi nas atitudes das pessoas e nas regras para bebida na sociedade, mas pode funcionar como uma sugestão que afeta o desejo e o subsequente consumo de bebida", afirmou o pesquisador Rutger Engels que liderou o estudo. A pesquisa foi publicada na edição de maio-junho de 2009 da revista científica britânica Alcohol and Alcoholism.

As conseqüências desse consumo são mais do que conhecidas: doenças, atitudes anti-sociais, mortes no trânsito, entre outras. Mas a resposta dos publicitários e dos seus associados é sempre a mesma: a auto regulamentação resolve tudo. Afirmação igualmente desmentida por outra pesquisa conduzida por Alan Vendrame. Ele investigou a violação das regras impostas pelo código de ética do Conar (Conselho Nacional de Auto Regulamentação Publicitária) e constatou que 12 das 16 regras para a publicidade de bebidas alcoólicas são violadas. Entre elas, a que impede a propaganda de utilizar imagens, linguagens ou idéias sugerindo ser o consumo do produto um sinal de maturidade ou que contribua para o êxito profissional, social ou sexual.

A determinação de que os personagens da propaganda não devem ter, nem aparentar ter menos de 25 anos, também não é cumprida. Assim como a que impede o apelo sexual. O pesquisador entrevistou 282 estudantes de 14 a 17 anos de escolas públicas também de São Bernardo dos Campo mas não os mesmos que participaram da outra pesquisa acima mencionada.

São constatações que mostram claramente a necessidade da presença do Estado nesse tipo de relação. A sua ausência não só permite o desrespeito às regras de auto regulamentação como dá aos agentes da propaganda a sensação de total impunidade, levando alguns deles a buscar caminhos tortuosos para burlar o pouco de lei existente. Como no caso das placas publicitárias colocadas nos campos de futebol para serem exibidas pela TV.

* Laurindo Lalo Leal Filho, sociólogo e jornalista, é professor de Jornalismo da ECA-USP e da Faculdade Cásper Líbero. É autor, entre outros, de “A TV sob controle – A resposta da sociedade ao poder da televisão” (Summus Editorial).

Telecentros comunitários, inclusão e exercício da cidadania

Com a capacidade de promover a inclusão digital, a consciência política e o exercício da cidadania, os telecentros comunitários têm potencial para transmutar a realidade de milhares de brasileiros colocados à margem da sociedade. Em situação de risco social, 120 milhões de cidadãos, número correspondente, segundo Censo Escolar, a 89% da população do país, encontra-se alijada de interagir na Rede Mundial de Computadores, teia digital multifacetada e multimídia, povoada pela infinita diversidade de informações.

À frente da telinha mágica do PC, comunidades colocadas à mercê das manipulações políticas podem mudar, ao serem conectadas à internet, sua "condição de espectador passivo para a de sujeito operativo e interativo" (FUSER, Bruno), uma vez que informações coletadas na Rede Mundial de Computadores transformam-se em matéria-prima para o exercício da cidadania. Os telecentros são "un espacio donde las personas acceden a las TIC y las usan como medios para influir em el desarollo de sus comunidades, mejorando su calidad de vida" (FUSER, Bruno).

"Um instrumento político de classes subalternas"

Além de facilitarem o acesso a informações de qualidade sem a censura existente nas linhas editoriais de uma considerável parcela dos veículos de comunicação de massa, os telecentros comunitários garantem à comunidade plena integração com a realidade na qual se encontra inserida.

Ao resgatarem o princípio dos medias comunitários, segundo o qual as "mensagens são produzidas para que o povo tome consciência de sua realidade ou para suscitar uma reflexão ou ainda gerar uma discussão" (PERUZZO, Cicília Maria Krohling), os telecentros motivam a população local a "alterar o injusto, alterar o opressor, alterar a inércia histórica que impunha dimensões sufocantes, através de uma vocação libertadora que se nutre por uma multiplicidade de experiências comunicativas" (PERUZZO, Cicília Maria Krohling).

Ao deparar com a realidade que a cerca para produzir o conteúdo abrigado em sites, blogs, vídeos ou podcasts, disponibilizados via internet, a comunidade cria informações de caráter crítico-emancipador, questionando a causa dos problemas com os quais se defronta em seu dia-a-dia.

Temos, assim, o telecentro comunitário como uma faceta da comunicação alternativa, ou seja, "um instrumento político de classes subalternas para externar sua concepção de mundo, seu anseio e compromisso na construção de uma sociedade igualitária e socialmente justa" (PERUZZO, Cicília Maria Krohling).

Informação e acesso à tecnologia

Embasada em notícias e reportagens recheadas com conteúdo crítico-emancipador, a comunidade torna-se capaz de debater importantes conceitos sobre administração pública, responsável pela gestão do bem-estar coletivo, para reivindicar ágeis soluções para os problemas detectados durante a produção editorial.

Engajados na cobrança de soluções para os problemas comunitários, milhões de brasileiros tornar-se-iam aptos, através das novas tecnologias da comunicação, a se libertarem da exclusão social com a prática da cidadania, pois os telecentros comunitários garantem "a informação e o acesso à tecnologia permitindo às pessoas participar nos processos de tomada de decisão que afetam suas vidas" (PHIPPS, Linda), instituindo "uma sociedade baseada em igualdade, oportunidade, independência, autodeterminação, integração social com a melhoria da qualidade de vida" (PHIPPS, Linda).

Regiane Santos é jornalista, blogueira e assessora de comunicação freelance, Pedro Leopoldo, MG.

Bibliografia:

 

FUSER, Bruno. Inclusão digital: o telecentro como equipamento de comunicação comunitária. Disponível aqui [Consultado em maio de 2009]

GRECO, Musso. Juventude e mídias comunitárias: sujeitos de um agora sem datas. Disponível aqui [Consultado em maio de 2009]

LACERDA, Luciano de Sousa. Telecentros comunitários: questões teórico-metodológicas e vivências midiáticas digitais. Disponível aqui [Consultado em maio de 2009]

NUNES, Márcia Vidal. Novas tecnologias e cidadania: a internet como fator de politização ou de adequação das comunidades excluídas ao sistema produtivo? Disponível aqui [Consultado em maio de 2009]

PERUZZO, Cicília Maria Krohling. Revisando os conceitos de comunicação popular, alternativa e comunitária. Disponível aqui [Consultado em maio de 2009]

PHIPPS, Linda. Controle social pelos excluídos: modelos para a sociedade da informação. Disponível aqui [Consultado em maio de 2009]

 

O Brasil e a revolução dos conteúdos audiovisuais digitais

Em tempos de mídias digitais e de mudança do sistema analógico de televisão para o modelo de TV digital (TVD), várias transformações se fazem necessárias, como a preparação dos técnicos e profissionais de comunicação e de telecomunicação que já se encontram no mercado, ou a atualização dos currículos universitários na área da Comunicação, para que professores e alunos possam desenvolver e exercitar a produção de conteúdos audiovisuais digitais.

Isso inclui produção de conteúdos de áudio, vídeo, texto e dados para diferentes plataformas tecnológicas como celulares, TV digital móvel, rádio e cinema digital, computadores mediados por internet e videojogos em rede. Uma produção que pode ser desenvolvida para cada aparelho ou conteúdos voltados para a convergência entre as diferentes tecnologias, o que exige pensar, desenvolver e realizar pesquisas para os novos formatos audiovisuais digitais interativos e interoperáveis.

A TV e rádio digital, os celulares, os videojogos em rede, os computadores mediados por internet ou os conteúdos audiovisuais pensados para a convergência exigem novos formatos de programação e também novos modelos de negócios para essas mídias. Isso porque não é possível comparar os modos de produção jornalística ou ficcional para TV e rádio analógica com as novas necessidades da TV e rádio digital, nem simplesmente repassar esses conteúdos para a TV usada em um computador com acesso a internet. Tampouco é possível desenvolver conteúdos ficcionais ou jornalísticos para celulares que, além de possuírem uma tela pequena, exigem outro tipo de linguagem e relação com seus públicos.

No caso da televisão digital, os novos formatos audiovisuais terão de ser elaborados pensando as possibilidades interativas do público com a TVD, pensando multiprogramação, acessibilidade, usabilidade (do controle remoto, que poderá ser usado como um miniteclado) e pensando a melhora considerável da imagem que permite observar detalhes antes não vistos na TV analógica (rugas, espinhas, defeitos nos estúdios etc).

Outra diferença importante do sistema analógico para o digital é que é possível mudar a origem da produção dos conteúdos audiovisuais digitais, até então restrita a grupos de comunicação como Globo, SBT, Grupo Abril, Record etc. Ou seja, a produção de conteúdos audiovisuais digitais poderá ser feita por profissionais de Comunicação ou mesmo por produtores independentes, eliminando a necessidade de intermediários como os grupos de comunicação brasileiros que há anos concentram e produzem conteúdos para diversas mídias – como rádio AM e FM, televisão aberta e por assinatura, TV digital, provedor de internet, jornais e revistas impressas e por internet, produtoras de filmes e vídeos, empresas discográficas, agências de notícias, etc.

Neste caso, a produção de conteúdos audiovisuais digitais interativos poderia ser feita desde casa, de um estúdio ou redação, ou mesmo a partir de uma organização não governamental em um bairro ou grupo social, representando outras vozes ao discurso informativo e ficcional atual.

Desenvolvimento da criatividade

Pensando na possibilidade de ampliar a produção de conteúdos audiovisuais independentes para as mídias digitais e, por conseqüência, abrir novos nichos no recém criado mercado audiovisual digital, o governo brasileiro apresentou em 2008 a proposta de criar o Centro Regional de Produção de Conteúdos Digitais para América Latina e Caribe.

Esse Centro foi aprovado no Congresso da Sociedade da Informação para América Latina e Caribe realizado em El Salvador, em fevereiro do ano passado. Na prática, isso significa desenvolver políticas nacionais de comunicação e estimular a criação de centros nacionais em toda a região, atividade que ficou a cargo do Grupo de Trabalho (GT) sobre Conteúdos Digitais Interativos da Sociedade da Informação / eLAC 2010, cuja coordenação é brasileira.

Uma das atividades desse GT é realizar seminários internacionais sobre inclusão e produção de conteúdos digitais interativos com a participação de diferentes atores sociais, como governos, empresas de diferentes portes, ONGs e academia, abrindo a discussão sobre as possibilidades de produção de conteúdos digitais interativos em diferentes mídias e para diferentes áreas em cada país. Essas áreas abrangem a educação a distância, o jornalismo digital, os produtos ficcionais audiovisuais, serviços voltados para saúde e cidadania – como marcar consultas no SUS a partir da TV digital e acompanhar processos jurídicos; ou serviços bancários, como pagamento de contas, além de projetos de inovação e tecnologia, alfabetização digital, entre outros.

Outro ponto importante é criar as condições para a criação dos Centros Nacionais de Produção de Conteúdos Digitais, voltados para o desenvolvimento da criatividade, da inovação tecnológica e de uma futura venda desses conteúdos audiovisuais tanto para o mercado interno como externo, gerando renda e um pólo alternativo de produção, diferente dos já existentes em países como EUA ou Inglaterra.

Possibilidades de inclusão

Em 2008, foram convocados dois seminários internacionais na região, sendo o primeiro foi organizado por SELA, na Venezuela (outubro/2008) e o outro realizado no Brasil pelo Ministério de Ciência e Tecologia (MCT), com o apoio da Comisión Económica para America Latina e Caribe – CEPAL/Unesco e do governo federal. O Seminário Internacional sobre Inclusão e Produção de Conteúdos Digitais Interativos realizado em Brasília (dezembro/2008) contou com a presença de representantes de 14 países e sua coordenação acaba de lançar o relatório com as recomendações do evento, assim como a Carta de Brasília (ver aqui). Na mesma ocasião, o MCT lançou oficialmente o Centro Nacional de Produção de Conteúdos Digitais Interativos e Interoperáveis que ainda se encontra em fase de implantação.

Entre as atividades do Centro Brasileiro estão:

** A realização de oficinas para que profissionais, professores e estudantes de todo o país aprendam a usar o Ginga para desenvolver conteúdos digitais interativos e com multiprogramação, pois esse middleware é uma das grandes contribuições brasileiras para a padrão nipo-brasileiro de TV digital;

** O levantamento de onde estão localizadas as pesquisas na área acadêmica voltadas para o desenvolvimento de conteúdos digitais para as diferentes plataformas tecnológicas existentes atualmente para, em breve, apoiar esses pesquisadores para que desenvolvam projetos e produtos nessa área;

** A disponibilização ao público latino-americano e caribenho da Coleção "Comunicação Audiovisual Digital" em português e espanhol (versão impressa e eletrônica), estimulando a reflexão e o desenvolvimento de novos projetos de conteúdos audiovisuais no país e ainda apontar as melhores práticas na área;

** O desenvolvimento de competência nessas novas áreas da Comunicação em todo o país.

Nesse sentido, o Brasil busca também tornar-se uma referência na região. Para isso, estimula a adoção do sistema brasileiro de TV digital (SBTVD) em outros países e leva seus especialistas para debater e apresentar conferências mostrando as possibilidades de inclusão através das novas mídias digitais e da produção de conteúdos audiovisuais na América Latina e Caribe.