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O começo do fim da comunicação pública no Brasil?

Texto: Iara Moura

Colaboraram: Oona Castro, Camila Nóbrega (Intervozes) e Caio Barbosa (Cinco de Terra e Ecoar)

 

https://www.youtube.com/watch?v=sKFE1bW8md0

Governo interino de Temer intervém na Empresa Brasil de Comunicação (EBC) e ameaça a continuidade do incipiente projeto de comunicação pública nacional

Um dos primeiros atos do presidente interino Michel Temer foi a exoneração do diretor-presidente da Empresa Brasil de Comunicação (EBC). Com a demissão de Ricardo Melo e de mais de uma centena de funcionários, e a declaração de que deverá editar Medida Provisória para mudar o caráter da Empresa e extinguir o Conselho Curador, sem nenhum debate público, Temer dá sinais de intenção de retomar o caráter de propaganda estatal que veículos de comunicação pública já tiveram em outros momentos da história do Brasil, como o período do Estado Novo e da Ditadura Militar.

Buscando se proteger das implicações legais da demissão de Ricardo Melo, o governo interino de Michel Temer anunciou ainda que estava editando uma Medida Provisória para mudar o funcionamento da EBC. Segundo informações divulgadas da Folha de São Paulo no dia 18/05, a MP ainda está em elaboração e contém dentre suas alterações, a extinção do Conselho Curador, órgão cuja principal função é zelar pela autonomia da EBC, impedindo ingerência do governo e do mercado sobre a programação, o conteúdo e a gestão da comunicação pública.

“Houve um boato da exoneração do presidente que feria a lei e essa exoneração foi confirmada no Diário oficial após o Conselho Curador esclarecer esse governo de que a prerrogativa de demitir o presidente é deste órgão aqui. Isso foi feito numa fase em que o país está esperando que seja julgado o processo de impeachment da presidenta Dilma. Esse ato sugere para a sociedade a intenção de aparelhamento”, defendeu Rita Freire, presidenta do Conselho Curador, durante a reunião extraordinária do órgão que aprovou nota  de pedido de esclarecimento ao presidente interino Michel Temer nesta terça-feira (31).  A reunião foi interrompida quando um grupo de ativistas foi impedido de entrar no salão. Após serem autorizados, os ativistas entoaram: “Michel Temer não me representa. Nem Rimoli não me representa. Eu vou explicar. Não tá entendendo? Mexeu com a EBC, você vai sair perdendo”.

https://www.youtube.com/watch?v=FrldaO2Vypk&feature=youtu.be

Intervenção durante reunião extraordinária do Conselho Curador da EBC, na tarde de 31/05/2016

Segundo Ricardo Melo, o clima na Empresa nos dias subsequentes à sua exoneração é de insegurança. “Eu não fui comunicado da exoneração. Eu fiquei sabendo que estava exonerado pelo Diário Oficial. São madrugadas e madrugadas que a maioria dos funcionários da nossa emissora ficam acompanhando a hora que o diário oficial vai sair pra saber o que vai acontecer no outro dia”, denunciou durante solenidade em homenagem a ele próprio realizada na Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro no último dia 23 de maio. Segundo relato do jornalista, a Empresa está vivendo um processo truculento, “de fazer inveja aos momentos ditatoriais no Brasil”. “A EBC vai ser simplesmente um porta-voz das medidas que o governo golpista pretende tomar se ele continuar no poder”, afirmou.

Em entrevista à Agência Brasil, o presidente empossado, Laerte Rimoli, defendeu-se das críticas e prometeu “devolver a empresa para a sociedade brasileira”. Rimoli atuou como diretor de comunicação na Câmara dos Deputados, durante a gestão do presidente afastado da Casa, Eduardo Cunha. Ricardo Melo, porém, relata que a promessa de apaziguar os ânimos na empresa não é o que está acontecendo na prática.  Melo denunciou a truculência de episódios como o arrombamento da sala da superintendente da regional sudeste I, Marília Baracat, e a tentativa de obstrução ao trabalho que ele mesmo sofreu, quando coordenava o fechamento do Repórter Brasil no sábado anterior (21), já que continuava na função de diretor de jornalismo. O cancelamento da transmissão do show de Mano Brown (dos Racionais MCs) na Virada Cultura de São Paulo como uma tentativa de silenciar manifestações contrárias ao governo Temer e a demissão do jornalista recém-contratado, Sidney Rezende, também foram episódios repudiados pelo ex-diretor.

Para representantes dos trabalhadores e trabalhadoras da EBC e movimentos sindicais, a ingerência que hoje se apresenta de maneira “truculenta e ilegal”, marcou a história da empresa em outros momentos e se refletiu em dificuldades internas. A diretora do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro, Cláudia Abreu, lembrou que a EBC não é um “projeto de governo”, mas é “resultado de uma cobrança da sociedade civil sobre a necessidade de um projeto de comunicação pública”.

A jornalista defende que é necessário ampliar o debate interno e a valorização profissional dos trabalhadores concursados e repudiou episódios de assédio moral a líderes sindicais e a condução de trabalhadores à Polícia Federal acusados de fazer piquete durante a greve de 2013.  Apesar das críticas, Cláudia destaca a necessidade da união dos gestores, trabalhadores e sociedade civil “contra o golpe e em defesa do caráter público da empresa, que é uma conquista da sociedade e não de um governo”.

Enquanto fechávamos esse texto, estava em análise, no Supremo Tribunal Federal, um mandado de segurança impetrado por Ricardo Melo denunciando a ilegalidade de sua exoneração e da nomeação de Laerte Rimoli. Na Corte, a relatoria da ação ficou sob a responsabilidade do ministro Dias Toffoli, que determinou a notificação do presidente da República interino para que ele preste informações. Até o fechamento deste texto, Toffoli não havia se pronunciado sobre o caso . Após longo debate público que levou à criação da EBC, firmou-se a concepção de que o diretor-presidente deveria ter mandato-fixo, não coincidente com a Presidência da República, de 4 anos. O mandato de Melo seguiria até o ano de 2020 e a violação desta determinação é o principal argumento que levou à abertura do mandado de segurança em análise.

Futuro incerto

As notícias de mudanças abruptas na EBC têm sido recebidas com preocupação em várias regiões do país. É o caso da Amazônia, região comumente negligenciada na programação de canais privados de comunicação do país. A Rádio Nacional Alto Solimões, caçula das emissoras da EBC, funciona atualmente com sete funcionários que se revezam nas funções de produção, jornalismo, locução, atendimento aos ouvintes e questões administrativas. Em 2016, completa dez anos de existência. Como parte da comemoração, os funcionários da emissora e os ouvintes aguardam com ansiedade o presente prometido: reformas técnicas para propiciar a chegada do sinal às áreas rurais e ribeirinhas mais remotas e concurso público para ampliar a equipe técnica. As últimas intervenções do presidente interino Michel Temer transmitem para a pequena sucursal de Tabatinga um clima de insegurança quanto ao futuro.

Os cuidados para evitar o surto de H1N1 que o Brasil atravessa, as indicações de como identificar os sintomas da doença e os grupos prioritários na vacinação: esse era o destaque da manhã do dia 23/05/2016 no noticiário Bom Dia Amazônia, transmitido para a região da Amazônia legal e do Alto Solimões, extremo oeste do estado do Amazonas.  O programa entra no ar, ao vivo, de segunda a sábado, às 05h, pela Rádio Nacional da Amazônia e às 03h na Rádio Nacional do Alto Solimões. Entremeando a entrevista com um médico especialista na doença, ídolos da música popular brasileira e do pop nacional animavam a manhã dos ouvintes. Diferente da erudita Rádio Mec – também do campo público e que se dedica à música clássica – ali, ídolos do tecnobrega e do reggaeton também figuravam na programação.

A emissora foi criada em 2006 e está localizada no limite fronteiriço do Brasil com a Colômbia e o Peru, no município de Tabatinga (AM). Atualmente, segundo a coordenadora Miss Lene Ferreira, a rádio alcança satisfatoriamente quatro municípios: Tabatinga, Benjamin, Atalaia do Norte e São Paulo de Olivença. A medição do alcance, para além dos aparatos técnicos, se dá de maneira muito simples: pela participação ativa dos ouvintes. “As pessoas ligam ou vêm até a rádio pra dar e receber notícias sobre a família, para saber de concursos públicos, anunciar festas, reuniões. É pela Rádio que elas são convocadas a comparecer no Fórum. É a ligação com a cidade, com o país”, explica.

O sinal é uma preocupação constante da rádio que nasceu com a pretensão de alcançar nove municípios (Tabatinga, Atalaia do Norte, Benjamim Constant, São Paulo de Olivença, Amaturá, Santo Antônio do Içá, Tocantins, Jutaí e Fonte Boa). Por meio das ondas de AM e FM, o resgate da cultura lusófona-brasileira também está entre os objetivos da emissora. Miss Lene conta que as rádios que alcançavam a maior parte da região eram colombianas ou peruanas. “As pessoas usam a rádio também do outro lado (da fronteira) para aprimorar ou aprender o português”, conta.

Segundo relatório da ouvidoria da EBC, a questão do sinal é o maior motivo das reclamações que o órgão recebeu no ano de 2015. Até nas grandes cidades é comum a TV e as rádios do sistema ficarem fora do ar. “Embora as queixas sejam provenientes de vários pontos do Brasil, as zonas norte e oeste da cidade do Rio de Janeiro se destacam. O sinal da área provém da estação retransmissora da Serra do Mendanha, cujos equipamentos não garantem boa qualidade do sinal e muitas vezes deixam a região sem sinal algum durante meses”, destaca o documento. No mesmo informe, a superintendência de suporte explica que a demora em resolver as questões técnicas se dá pela burocracia para aquisição de equipamentos e realização dos reparos.

Enquanto na tarde do dia 20./05 no Alto Solimões, ouvia-se a segunda edição do Repórter Amazônia, nas capitais São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro funcionários, ouvintes, telespectadores, leitores e apoiadores ocupavam as sedes das EBC em protesto contra a exoneração de Ricardo Melo. A nomeação que já havia sido antecipada na imprensa se confirmaria com a publicação no Diário Oficial da União na manhã daquele dia.

Para aqueles que protestavam na sexta-feira (20), a troca de presidentes fere a autonomia da EBC uma vez que passa por cima da lei de criação da empresa (11.652/2007) a qual estabelece, em seu artigo 19, que o mandato de quatro anos do presidente só pode ser interrompido por meio de dois dispositivos: a saída espontânea ou a existência de dois votos de desconfiança feitas pelo Conselho Curador da Empresa.

No ato organizado pela Frente em Defesa da Comunicação Pública em Brasília, a presidenta do Conselho Curador, Rita Freire, ressaltou: “estamos caminhando junto com os trabalhadores e a sociedade civil que está representada nesse conselho e está levantando sua voz hoje para que o direito à comunicação pública não seja maculado, violado, agredido por interesses circunstanciais de mudança na vida do país”.

A EBC foi criada em 2007 após a realização do I Fórum Nacional de TVs Públicas. Integrou as veteranas Rádio Nacional do Rio de Janeiro, Rádio Nacional Amazônia, Rádio Mec e outras emissoras geridas pela extinta Radiobrás e pela TVE do Rio de Janeiro numa só rede nacional de  comunicação pública. As emissoras estaduais educativas também foram incorporadas ao Sistema Público de Comunicação. Concomitantemente à criação da empresa, entraram no ar também a TV Brasil e a Agência Brasil. O portal da EBC estreou em julho de 2012.

Diversidade em xeque

Não é a primeira vez que a EBC sofre com interferências que comprometem o caráter público, a atividade jornalística e a relação de confiança com o público.  Ao longo da existência da empresa, questões de ingerência foram constantemente denunciadas pelos empregados e até pelos espectadores/as, ouvintes e leitores/as através da ouvidoria.

Durante o final de 2015 e o início de 2016, com o acirramento da conjuntura de crise política nacional, a ouvidoria recebeu denúncias de espectadores questionando uma suposta falta de equilíbrio nos conteúdos dos programas jornalísticos das rádios, da TV e nas coberturas da Agência Brasil. O relatório de março de 2016, por exemplo, período de manifestações a favor e contra o impeachment e de divulgação de grampos telefônicos pelo juiz Sérgio Moro, destaca a reclamação de uma telespectadora que se diz indignada com a edição do dia 10/03/2016 do Repórter Brasil:

“Considero grave o uso de uma emissora pública, bancada com recursos públicos, ser usada assim para atender os interesses político-partidários do governo do momento. Os apresentadores e os dois jornalistas convidados para comentar o pedido de prisão não disfarçaram suas preferências políticas e fizeram de tudo para tentar caracterizar as investigações recentes como injustas, indevidas”, diz um trecho da reclamação.

Em coluna publicada no portal da EBC, a ouvidora Joseti Marques endossa a crítica da leitora, mas chama atenção para o fato de que também são recorrentes reclamações que apontam os programas jornalísticos da EBC como iguais aos das emissoras comerciais em forma e conteúdo. São comuns também comentários que criticam o fato de as reportagens não defenderem o governo. A ouvidora explica que a confusão entre público, estatal e governamental ainda é um desafio a ser superado.

Para Priscilla Kerche, repórter da TV Brasil de São Paulo, a tentativa da empresa em copiar os modelos de gestão dos meios privados, hierarquizado e pouco democrático, faz confundir o papel do meio público e cria problemas para o exercício da atividade jornalística. “ A influência governista pesou em cargos decisórios assumidos por comissionados que, mais uma vez, se espelham na mídia tradicional. Muito por conta de uma cultura jornalística do país também. O desafio é produzir conteúdo qualificado e diferenciado numa estrutura que reproduz a lógica de empresas comerciais, mas que não tem estrutura pra fazer igual e nem deveria ter isso como objetivo”, defende.

Para o jornalista Albert Steinberger, que passou pelas redações da TV Câmara, TV Globo, BBC Brasil (sucursal da TV pública britânica para o Brasil), ZDF (TV pública alemã – Canal 2) e Deutsche Welle (canal alemão estatal/público voltado para o exterior), as interferências ao trabalho dos jornalistas estão presentes nos diversos tipos de meios em diferentes níveis:

“Seja uma linha editorial neoliberal, ou uma limitação para lidar com assuntos da família real britânica. Não dá para idealizar e acreditar que exista um meio com liberdade total para o jornalista. Todos os veículos têm suas limitações de acordo com a cultura da empresa, fonte de financiamento, chefia e outros fatores”, defende.

O jornalista destaca, porém, que a existência de uma variedade de vozes na grande imprensa, como acontece na Inglaterra e na Alemanha, onde é possível, por exemplo, investigar livremente as contas do governo ou as acusações de irregularidade em determinada empresa e “ver um fato sob diferentes olhares”, é positivo e necessário para a sociedade. Buscando garantir essa diversidade, a Constituição Federal estabelece em seu artigo 222 a complementaridade dos sistemas público, estatal e privado na exploração dos serviços de rádio e TV em território nacional.

Democracia fora do ar

Episódios anteriores de interferência dos governos e de grupos empresariais nas atividades das emissoras do campo público deixaram marcas profundas na história do Brasil. Em 30 de março de 1964, na madrugada que marcou a instalação da ditadura civil-militar, a Rádio Nacional do Rio de Janeiro virou meio de transmissão de grupos que se opunham ao golpe que estava em vias de acontecer reunidos na Rede Pela Legalidade.

No primeiro dia do golpe, o diretor da Rádio Nacional foi informado pelo telefone da chegada de dois tanques de guerra que apontavam os canhões para os transmissores da Rádio Nacional, acompanhados por cerca de 100 soldados armados. Assim que se instalou, o presidente Castelo Branco demitiu 39 funcionários da Rádio Nacional sem qualquer processo. A emissora, criada em 1936 e estatizada pelo Estado Novo em 1940, tinha 800 empregados e produzia 20 horas de programação diária, liderando a audiência no país.

Documentos reunidos na pesquisa “O Serviço Nacional de Informações e a comunicação” (Peic/UFRJ) revelam que a espionagem, a censura e a demissão e perseguição de funcionários eram expedientes utilizados pelos governos militares como forma de conter as críticas ao regime feitas pelos movimentos democráticos. A partir da madrugada do dia 30 de março para o dia 1º de abril de 1964, os veículos públicos, privados, comunitários, educativos e alternativos eram alvos a serem neutralizados pela inteligência dos militares. A pesquisa mostra ainda que, nem mesmo com o fim da ditadura notou-se significativa mudança de  percepção do ponto de vista do controle de conteúdo.

“A linguagem e os métodos utilizados para vigiar os meios de comunicação permaneceram similares mesmo após o fim da ditadura. O que evidencia o caráter do que historicamente entendemos por ‘transição suave’ e que, mesmo no contexto democrático, a vigília e o controle permaneceram”, relata Janaine Aires pesquisadora da UFRJ.

Documentos coletados nos arquivos do SNI sobre espionagem de veículos do campo público por governos militares  

O uso dos meios públicos alemães durante a Segunda Guerra para a propaganda nazista se tornou episódio exemplar do imperativo de proteger o interesse público e garantir a diversidade de ideias nos meios de comunicação. Embora a independência financeira seja constantemente alvo de pressão dos meios privados, os canais públicos, tanto na Alemanha quanto na Inglaterra, se financiam por meio de uma taxa anual que os cidadãos dos dois países pagam. Atualmente a taxa anual de TV está em 215,76 euros  por residência na Alemanha (por ano). No Reino Unido, o valor anual é de 145,50 libras.

Na Alemanha e em outros países da Europa – como Portugal e Espanha – onde o modelo de radiodifusão se desenvolveu primeiro como monopólio público e o uso privado só veio posteriormente, a comunicação pública percorreu um caminho próprio consolidando-se e servindo de modelo para os demais sistemas no mundo. Lá, a ZDF lidera a audiência com 12,6%, seguida pela ARD com 11,5%. A rede privada RTL aparece encostada em terceiro lugar com 10%.

Do mesmo modo, a BBC inglesa é líder de audiência com uma programação variada que mescla entretenimento e informação. Por conta disso, as emissoras também são alvo das mídias privadas.  No Bild Zeitung na Alemanha e no The Sun são recorrentes os ataques. Aqui, durante a recente troca de presidentes da EBC, os jornais O Globo e O Estado de São Paulo publicaram editoriais questionando a rentabilidade e a relevância da EBC e acusando a empresa de ser instrumento de “propaganda lulopetista”. Ambos os jornais, de grandes grupos de mídia, acusam a EBC de representar um gasto estatal desnecessário e desproporcional.

A EBC custa à União cerca de R$ 750 milhões anuais.  Os gastos com publicidade do Governo Federal, empregados na Rede Globo, por outro lado, somam 6,2 bilhões de reais nos 12 anos de governo petista, ou seja, uma média de 516 milhões ao ano, sem contar a verba empregada em suas afiliadas.

Programação infantil na contramão do consumismo

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Programa TV Piá, exibido pela TV brasil. Foto: divulgação

“Nasce hoje uma nova televisão para que os brasileiros tenham mais liberdade de escolha. Isso é pluralidade. Isso é democracia. A TV Brasil quer ser um espelho de nosso país, espera refletir a multidão de brasileiros de todas as raças, cores, credos, regiões e condições sociais que formam o coletivo chamado Brasil”.

O trecho da vinheta exibida durante a primeira transmissão da TV Brasil em 2 de dezembro de 2007 foi lido pela atriz Zezé Motta e resume o intento da emissora em ter uma programação diversa que refletisse a cultura nacional e o interesse público. A grade da TV Brasil foi formatada a partir de uma perspectiva generalista com programas informativos, jornalísticos e de entretenimento, além da programação infantil.

A programação voltada para este público é reconhecida em âmbito internacional antes mesmo da TV Brasil entrar no ar. Os casos de sucesso “Meu amigãoZão” e “TV Piá”, no qual crianças de diferentes regiões do Brasil aparecem compartilhando saberes, brincadeiras e suas culturas, demonstram que a TV Brasil busca se diferenciar das TVs comerciais nos desenhos, séries e revistas eletrônicas voltadas para os pequenos.

“Enquanto as emissoras comerciais visualizam a criança e o adolescente principalmente como consumidores, a TV Brasil olha as crianças sob a ótica da cidadania. Uma implicação imediata dessa diferença é a inexistência de publicidade nas 7 horas de programação infanto-juvenil exibidas cotidianamente”, explica Inês Vitorino, pesquisadora da Universidade Federal do Ceará, coordenadora do Grupo de Pesquisa da Relação Infância e Mídia (Grim). À convite do Conselho Curador da EBC, o grupo fez um monitoramento que analisou a programação infanto-juvenil da emissora levando em consideração critérios de diversidade regional, originalidade, incentivo à criatividade, a ausência de conteúdos danosos ao desenvolvimento do público infantil, entre outros.

A transmissão de campeonatos de futebol feminino e das séries B, C e D do futebol masculino também são destaques na programação que em 2016 apostou na transmissão de eventos culturais e shows como o Desfile das Campeãs durante o carnaval do Rio de Janeiro e a Virada Cultural de São Paulo.

Pensar a programação da emissora é uma das prerrogativas do Conselho Curador formado por 22 membros: 15 representantes da sociedade civil, indicados via consulta popular e aprovados pela presidência; quatro do Governo Federal; um da Câmara dos Deputados; um do Senado Federal; e um representante dos trabalhadores da EBC. Os representantes do público são escolhidos por meio de consulta pública. Se a intenção da Medida Provisória de Temer se confirmar, o órgão pode ser extinto e o acompanhamento da sociedade civil quanto
à diversidade, a isenção jornalística e o respeito aos direitos humanos, dentre outros princípios da comunicação pública, podem ficar fora do ar por um longo tempo.