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Sociedade civil pede controle social na conferência potiguar

Nem parecia uma conferência. O Auditório da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Norte estava acima da sua capacidade na manhã da quarta-feira (18), mas os ânimos pareciam tranqüilos demais entre os representantes da sociedade civil empresarial, do poder público e dos movimentos sociais. A etapa potiguar da Conferência Nacional de Comunicação iniciava os debates dos eixos temáticos com uma metodologia simples: cada um anunciava sua proposta ao plenário, não havia discussão e quase não havia disputa. Afinal, todas as propostas seriam enviadas à etapa nacional, conforme definido pelo regimento da Confecom estabelecido pela Comissão Organizadora Nacional.

Aberta na noite da terça-feira (17), com uma solenidade que contou com falas rápidas de representantes de diversas entidades – entre elas, a Comissão Estadual Pró-Conferência, a Associação Brasileira de Emissoras Públicas, Educativas e Comunitárias (Abepec), a Federação dos Interestadual dos Trabalhadores em Telecomunicações (Fittel), a Associação Brasileira de Telecomunicações (Telebrasil) e Associação Brasileira de Radiodifusores (Abra) – a etapa potiguar da Confecom optou por uma programação também simplificada: a manhã da quarta-feira ficou reservada para a apresentação de propostas, sem divisão de grupos; à tarde, seriam eleitos os delegados.

Abertos os microfones, cada segmento tratou de demarcar o seu território. Enquanto os representantes das operadoras de telefonia celular reivindicavam a participação no recém-anunciado Plano Nacional de Banda Larga, representantes dos movimentos sociais e da Academia defendiam a criação em uma de uma infra-estrutura pública para a prestação do serviço. Os radiodifusores apresentaram proposta pela garantia da multiprogramação às emissoras de televisão digital. Os movimentos sociais cobraram critérios democráticos para a concessão ou renovação de outorgas, proibição de monopólio ou oligopólios, garantia de diversidade e respeito aos direitos humanos e aos princípios constitucionais no rádio e na televisão brasileiros.

Controle social

O controle social da comunicação foi um ponto de confluência nas falas de boa parte dos representantes dos movimentos sociais e do poder público. O coordenador de Direitos Humanos e Defesa das Minorias e coordenador da etapa estadual da Confecom Marcos Dionísio Caldas apontou o tema como central no processo. “Parece haver uma unanimidade no movimento social em discutir mecanismos de controle social da comunicação. A conferência tem que aprofundar esse debate e formular sobre ele”, afirmou. Rudson Soares, do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, resumiu a questão: “Controle Social não tem nada haver com censura, tem haver com democracia. Controle Social é fundamental para a democracia.”

Os participantes da etapa potiguar da conferência também discutiram questões locais. A situação da TV Comunitária de Natal foi denunciada. Ocupada por um grupo religioso, os grupos propuseram que ela passe a funcionar conforme previsto na Lei da TV a Cabo e de forma democrática. Outra proposta foi a democratização das emissoras legislativas do Estado, com a realização de concursos públicos para a contratação de pessoal e a instalação de conselhos de participação popular para a gestão dos canais.

A situação das rádios comunitárias também foi debatida na conferência. Emissoras da capital e do interior do Estado denunciaram a ação da Polícia Federal em conjunto com a Anatel no fechamento e apreensão dos equipamentos, além da lentidão no processo de autorização. Íbero Hipólito conta a história da Rádio Alternativa de Mossoró. “Nossa emissora já foi fechada cinco vezes e teve seus equipamentos roubados pela Polícia Federal. Vários ativistas respondem a ações judiciais e nosso pedido de autorização tramita no Ministério das Comunicações há quase doze anos”, lembra.

O processo do processo

As mobilizações para a realização da Confecom começaram tarde no Rio Grande do Norte. Somente em abril, cerca de trinta entidades da sociedade civil não-empresarial iniciaram as discussões que garantiriam a realização da primeira Conferência Estadual de Comunicação. O grupo reunia estudantes, grupos de mulheres, sindicatos e centrais sindicais, profissionais da área de comunicação, psicólogos, professores e pesquisadores do tema. Foram realizadas cinco conferências livres em Natal e Mossoró, além de debates e audiências públicas.

Graças à mobilização da sociedade civil, o governo do estado convocou a Conferência Estadual de Comunicação no último dia do prazo regimental. Apesar de o texto do decreto afirmar que a conferência seria presidida pelo Secretário de Comunicação Rubens Lemos Filho, o processo foi todo operacionalizado pela Coordenadoria de Direitos Humanos e Defesa de Minorias da Secretaria de Justiça e Cidadania. Lemos não apareceu em nenhum momento do processo.

Delegação potiguar

Após o intervalo do almoço, o segmento empresarial já estava com seus delegados escolhidos: 3 representantes da Telebrasil, 3 da Acel, 2 do Sindtelebrasil e 2 da Abra. O poder público elegeu, em uma rápida discussão, representantes da Assessoria de Comunicação do Governo do Estado, do Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e do Poder Legislativo.

Os movimentos sociais levaram mais tempo para chegar a um consenso sobre sua representação. Representantes dos movimentos de mulheres defendiam a eleição de ao menos três delegadas, os estudantes de comunicação e o representante do movimento LGBT também reivindicaram uma vaga cada. Por alguns minutos, o plenário da conferência, agora ocupado somente pelos representantes dos movimentos sociais, viveu momentos de discussão e disputa.

A chapa eleita por maioria contemplou o pleito das mulheres, com três delegadas representando a Marcha Mundial de Mulheres, o Fórum de Mulheres do RN e a Federação da Umbanda e Candomblé. A Central Única dos Trabalhadores e a Central dos Trabalhadores Brasileiros terão um representante cada. O interior do Estado será representado por delegados do Instituto Anatália de Melo Alves, de Mossoró, e pelo representante dos blogueiros, do município de Lajes do Cabugi. O Intervozes, o Sindicato dos Jornalistas e a recém-fundada Associação Brasileira de Saúde Mental (Abrasme) completam a delegação.

O balanço

Terminada a conferência, a coordenadora de Políticas para Mulheres do governo do estado, Amélia Freire, destacou o caráter do evento e o papel dos movimentos sociais. “A conferência foi um espaço muito forte de poder e a sociedade civil foi a mola que impulsionou nossos debates”, afirmou. Já quem viu o processo de fora garante que o tempo foi curto. Para Edson Pedro Lima, representante da Fittel, “o processo foi bom, mas as discussões ficaram prejudicadas pelo pouco espaço de debates, ainda assim, tocamos em pontos importantes nas propostas locais e nacionais”.