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Movimentos sociais aprovam manifesto pró-Banda Larga

O ato da Coordenação dos Movimentos Sociais (CMS) e da campanha Banda Larga é um direito seu reuniu mais de uma centena de lideranças sindicais, estudantis, femininas e comunitárias, parlamentares e blogueiros, segunda-feira (15) à noite, em São Paulo, em repúdio ao “termo de compromisso” assinado pelo ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, com as empresas de telecomunicações.

Reconhecer a internet como serviço público, incorporar o tema da banda larga ao debate sobre o marco regulatório para o setor de telecomunicações, reabrir o diálogo com as organizações da sociedade civil, fortalecer o papel do Estado e retomar o investimento na Telebrás. Essas são algumas das principais reivindicações dos movimentos presentes no ato.

Sob o mote “Banda larga é um direito seu – Por uma internet rápida e de qualidade para todos e todas”, o evento aconteceu no auditório do Seesp (Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo).

As reivindicações foram reunidas em manifesto aprovado pelos participantes e visam fazer frente ao recente retrocesso no PNBL (Plano Nacional de Banda Larga). Lançado em 2010, O plano sofreu mudança de rota importante, mediante negociação entre o Ministério das Comunicações e as empresas de telecomunicações ao final de junho último.

Conforme divulgado no site da campanha “Banda larga é um direito seu!”, que reúne dezenas de entidades representativas, “sem controle de tarifas, continuidade ou metas de universalização para o acesso à internet, o acordo fechado vai na contramão da democratização dos serviços”.

Conforme explicitou João Brant, do Intervozes, os termos de compromisso firmados preveem que, até 2014, seja assegurada banda larga de 1 Mega a R$ 35,00 em todos os municípios do País. No site da campanha, o vaticínio: “são completamente insuficientes para os usuários, que continuarão pagando caro pelo uso de uma internet lenta e concentrada nas faixas de maior poder aquisitivo.”

Brant fez uma analogia que elucida isso: “enquanto, nos Estados Unidos, está em discussão 100 Megabytes para 75% da população, nós estamos falando em um.” Ademais, de acordo com Brant, na prática, embora haja alguma tentativa de massificação, não há quaisquer garantias de oferta ampla do serviço – que pode ficar restrito às áreas mais rentáveis dos municípios. Muito menos de que seja prestado com qualidade.

Segundo explanou Rosane Bertotti, secretária nacional de comunicação da CUT (Central Única dos Trabalhadores), além da velocidade limitada, esse é um dos cinco grandes pontos do PNBL em que há divergência. Para reverter esse quadro, os movimentos pleiteiam ainda que a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) aprove regulamentos de qualidade e metas de competição efetivos.

Os demais aspectos em que há discordância são o fato de que, apesar de não ser explícito, o acordo abre brecha à venda casada com a telefonia fixa; não contempla Internet na área rural; e em caso de não cumprimento de metas, as multas às teles serão revertidas para investimento nas próprias empresas.

Brant complementou: “houve atenuamento das propostas colocadas no PNBL. A lógica da internet como um direito público cai fora e dá lugar à do regime privado em que o que conta é o lucro. Suavizam-se muito as obrigações de investimento, as letras miúdas desfiguram o serviço e o tornam limitado e diferenciado.”

Por tudo isso, o deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP), membro da Frente Parlamentar pela Liberdade de Expressão, classificou o acordo com as teles de “intolerável”. E ironizou: “A capacidade é tão restritiva que não deveria ser considerada banda larga, mas internet discada um pouquinho melhor."

Na mesma linha, o presidente do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, Altamiro Borges, salientou: “No processo de negociação no varejo, em que predominou a força econômica das teles, cujo faturamento anual é de R$ 160 bilhões, o plano expande e massifica uma carroça e gera segregação. Temos que pressionar nas ruas por mudanças.Precisamos de uma estratégia no sentido da democratização da comunicação”, disse.

Mobilização

Coordenadora da Frente Parlamentar pela Liberdade de Expressão, a deputada federal Luiza Erundina (PSB-SP) destacou durante o ato que é fundamental haver mobilização para se preservarem as conquistas obtidas com a realização da 1ª Confecom (Conferência Nacional de Comunicação), em dezembro de 2009.

Graças à pressão das entidades representativas da sociedade civil é que se conseguiu, nas palavras de Brant, “após anos de inação do governo nessa área”, que se emplacasse o PNBL. Agora, a luta é para que seu necessário caráter estratégico ao desenvolvimento do país e à inclusão social seja garantido.

Nesse sentido, uma série de ações foi definida durante o ato no Seesp. Entre elas, o pedido de audiência com a presidente Dilma Rousseff, a articulação de um ato público no Congresso Nacional e de várias manifestações.

A primeira delas ficou programada para ocorrer em Brasília, no dia 25 de agosto, dia em que também se estabeleceu um twitaço (divulgação ampla da campanha pela banda larga pela rede social Twitter). As entidades devem ainda massificar as reivindicações por intermédio de seus meios de comunicação e da realização de debates em universidades, auxiliadas pelas mídias alternativas

Manifesto aprovado pela CMS:

No final de junho, o Governo Federal fechou um acordo com as empresas de telecomunicações para garantir banda larga de 1 Mbps a R$ 35 em todos os municípios do país até o fim de 2014. À primeira vista, a medida soou como um avanço. Especialmente na região Norte e em áreas mais distantes dos grandes centros urbanos, é a primeira vez em que o serviço será oferecido a um preço razoavelmente acessível.

Contudo, o acordo tem vários problemas e revela a ausência de uma política de longo prazo para o setor das comunicações. Revela também uma concepção política que renega o papel estratégico do Estado e o interesse nacional em prol dos monopólios privados. Não há como garantir o direito de todos os cidadãos a uma internet barata e de qualidade sem ações efetivas do Estado na regulação e na prestação do serviço.

Afora essa dimensão política geral, o acordo evidencia outros problemas de várias ordens:

1.O pacote definido no termo de compromisso é limitado e diferenciado, cheio de restrições escritas em letras miúdas, e está longe de garantir a universalização do serviço. Os termos de compromisso assinados foram moldados a partir da disposição das empresas – como consequência, são bons para as teles e completamente insuficientes para os usuários. O termo cria um pacote popular com franquia de download (isto é, limite de uso da internet), promove venda casada com a telefonia fixa e não garante o serviço para todos os cidadãos – ele pode ficar restrito às áreas mais rentáveis dos municípios. Além disso, o instrumento jurídico de termo de compromisso é bastante precário e expressa a dificuldade do governo em impor metas mantendo a prestação do serviço em regime privado. É inadmissível, por exemplo, que se possibilite que as sanções em caso de não cumprimento das metas sejam transformadas em investimentos nas redes privadas.

2.A velocidade estabelecida está fora do que já hoje é considerado banda larga. Se considerado que o valor vai ser alcançado só em 2014, ainda pior. Apenas para se ter uma ideia, o Plano Nacional de Banda Larga dos EUA prevê universalização da internet com 75% da população tendo velocidade de 100 Mbps em 2020, e velocidade mínima de 4 Mbps. O plano brasileiro propõe a oferta em larga escala de serviços de 5 Mbps em 2015, mas não estabelece nenhuma obrigação nem dá qualquer garantia de que isso vá de fato ocorrer;

3.Embora o Programa Nacional de Banda Larga (PNBL) englobe várias outras ações de políticas públicas, este acordo condiciona as políticas de longo prazo e todas as outras ações a serem tocadas no âmbito do plano. Concretamente, ele deixa pouco espaço para se avançar além do que foi acertado com as operadoras agora, sem estabelecer como meta a universalização do serviço, sem garantir controle de tarifas e deixando na mão das empresas as redes construídas a partir de recursos provenientes do serviço público de telefonia fixa;

4.A questão das redes é justamente um dos problemas sérios da ausência de políticas de longo prazo. Na prática, os recursos para o cumprimento das metas do PNBL virão da cobrança da assinatura básica da telefonia fixa. Isso significa que um serviço prestado em regime público, cujos investimentos deveriam resultar em bens públicos (a serem devolvidos à União ao final do período de concessão), ajudará a financiar redes privadas, sobre as quais pesam poucas obrigações de serviço público;

5.A Telebrás, que poderia ter um papel de forçar as empresas de telecomunicações a se mexer, investir em infraestrutura e baixar seus preços, está cada vez mais se transformando em estrutura de apoio para as próprias teles. O problema maior, neste momento, não é nem a empresa deixar de prestar serviço ao usuário final, mas sim o fato de ela ter perdido boa parte dos recursos e deixado de ter o papel de tirar as empresas privadas de sua 'zona de conforto', com uma política agressiva de provocar competição por meio de acordos com pequenos provedores locais;

6.O serviço de banda larga tem hoje problemas graves para o consumidor, e essa expansão está sendo pensada sem resolver esses problemas nem garantir parâmetros mínimos de qualidade. Estão previstas resoluções da Anatel sobre isso até 31 de outubro, mas é preciso pressionar para que elas de fato garantam o interesse público e sejam efetivas;

7.A Anatel, que deveria ter o papel de defender o interesse do usuário, não tem atuado desta forma. A agência assume que não tem controlado a venda de bens reversíveis (bens que estão na mão das concessionárias mas são essenciais à prestação de serviços e não poderiam ser negociados sem autorização), estabeleceu um Plano Geral de Metas de Universalização para a telefonia fixa que não cria nenhuma nova obrigação para as empresas e não tem sido capaz de garantir a expansão do serviço para as áreas rurais;

Frente a esses fatos, movimentos sociais reunidos na CMS (Coordenação dos Movimentos Sociais) e as organizações participantes da campanha Banda Larga é um direito seu! manifestam sua preocupação com os rumos do PNBL e apresentam as seguintes reivindicações:

Que o Governo Federal construa uma política estratégica de médio e longo prazo para o setor das telecomunicações, a partir da definição da banda larga como serviço prestado em regime público, de forma a garantir a expansão constante das redes e a universalização progressiva do serviço, na linha das propostas aprovadas na I Conferência Nacional de Comunicação. A definição de regime público não significa que deve ser apenas prestado pelo Estado, mas que podem ser exigidas das empresas privadas metas de universalização, controle de tarifas, garantias de qualidade e continuidade do serviço e gestão pública das redes;

Que o Governo Federal garanta recursos e volte a investir na Telebrás como instrumento de políticas públicas e regulação econômica do setor, como promotora de franca competição e atendimento às necessidades das diversas localidades em que a empresa tem condições de atuar;

Que o Governo Federal e a Anatel garantam a universalização dos serviços de internet na área rural com oferta adequada e barata em todo o país;

Que a Anatel aprove regulamentos de qualidade e metas de competição que imponham obrigações que garantam de fato o interesse público, em condições proporcionais às capacidades técnica e financeira de cada empresa;

Que o Governo Federal incorpore o tema da banda larga ao debate sobre um novo marco regulatório para o setor das comunicações, tratando-os de forma combinada, por meio da revisão da Lei Geral das Telecomunicações e da definição de uma política que garanta o caráter público das redes;

Que o Governo Federal retome o diálogo com as entidades do campo popular para pensar um projeto estratégico para as comunicações e discutir as políticas públicas para o setor.

Como um serviço essencial à realização de direitos, a internet deve ser tratada como um serviço público. A limitação em seu acesso enfraquece a democracia e pode ser um entrave ao desenvolvimento econômico. Assim, o compromisso da CMS e da campanha Banda Larga é um direito seu! é com a defesa da banda larga barata, de qualidade e para todos. A avaliação sobre o quadro atual das políticas para banda larga deve ser feita com base nesses parâmetros. Ainda que não se possa, nem se queira, ignorar os avanços em relação à ausência de políticas que imperava até 2009, não se podem excluir dessa avaliação as críticas devidas, nem se contentar com avanços absolutamente limitados, condicionados pelas teles e descolados de uma política estratégica de longo prazo.

Conferência de SP aprova repúdio ao governador José Serra

SÃO PAULO – “Apesar de José Serra, nós realizamos a 1ª Conferência de Comunicação de São Paulo!”. Seguido por gritos de aprovação e uma longa salva de palmas no plenário da Assembléia Legislativa, o desabafo da representante da sociedade civil Terezinha Vicente Ferreira simbolizou o repúdio manifestado pelas centenas de pessoas que participaram da conferência estadual à falta de apoio do Governo de São Paulo para a realização do evento.

Ao propor uma moção de repúdio a José Serra que foi aprovada por cerca de 90% do plenário, Terezinha não poupou críticas ao tucano: “É uma grande falta de compromisso com a história o governador não apoiar esse importante debate sobre comunicação no estado. A conferência paulista somente aconteceu graças ao empenho de parlamentares, de prefeituras municipais e dos movimentos sociais organizados pela democratização da comunicação”, disse.

O texto da moção afirma que “a 1ª Conferência Nacional de Comunicação de São Paulo, convocada por decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, não teve pelo Governo de São Paulo o apoio para sua concretização em nosso estado. O governo Serra repassou aos deputados a obrigação democrática de convocar a discussão sobre a comunicação em São Paulo, eximindo-se da responsabilidade enquanto poder público executivo e não garantindo a estrutura necessária para que a sociedade paulista tenha garantido o seu direito de participar dignamente da etapa preparatória em âmbito estadual”.

No documento aprovado, Serra também é criticado por não privilegiar a participação popular na elaboração de políticas públicas: “Esta não é a primeira vez que o Governo de São Paulo desrespeita a participação da sociedade nas discussões de políticas públicas e nega apoio para a realização de conferências. O mesmo aconteceu nas conferências de Meio Ambiente e de Saúde. Têm sido comuns as dificuldades e o desrespeito por parte do Governo de São Paulo em relação à participação popular na definição de políticas públicas”, diz o texto.

Os participantes da conferência paulista aprovaram também outras moções de repúdio, dirigidas à baixa qualidade da programação da tevê aberta, à forma discriminatória como são tratadas as mulheres pela grande mídia, à formação de cartéis e grandes conglomerados de mídia, à criminalização dos movimentos sociais, ao fim do diploma de jornalismo e ao fechamento de rádios comunitárias pela Polícia Federal e a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), entre outras. Também foram aprovadas moções de apoio à causa palestina, à difusão da cultura digital e à abertura dos arquivos da ditadura, entre outras.

Acordo inédito

Outro dado importante da conferência realizada em São Paulo foi o fechamento de uma chapa de consenso no setor empresarial, fato que ainda não havia acontecido em nenhuma outra etapa estadual da Conferência Nacional de Comunicação. Graças ao acordo, pequenos empresários da mídia alternativa levarão 20 delegados à Brasília: “Há uma enorme representatividade nesta chapa, que reflete a diversidade de opiniões que a conferência de São Paulo levará à conferência nacional”, afirma Renato Rovai, diretor da revista Fórum.

Boicotado pelos grandes veículos reunidos na Associação Brasileira de Empresas de Rádio e Televisão (Abert) e na Associação Nacional de Jornais (ANJ), o processo da conferência de comunicação contou em São Paulo com importante colaboração da Associação Brasileira de Radiodifusores (Abra), que reúne Bandeirantes e Rede TV, além de dezenas de representantes de empresas de telecomunicações como Oi, Claro e Vivo.

“O acordo que foi feito aqui entre os pequenos empresários e duas empresas relativamente grandes como a Bandeirantes e a Rede TV – e as teles que são poderosíssimas – faz parte de um processo de mudanças em curso no Brasil. Eles foram obrigados a reconhecer a importância desse pequeno núcleo de empresários. O esqueleto da comunicação saiu do armário”, afirma o diretor-executivo da Carta Maior, Joaquim Ernesto Palhares.

O processo de mudanças, segundo Palhares, ocorre em toda a América Latina e dificilmente será detido no Brasil: “Após a realização da conferência nacional, a comunicação no país passará a um outro patamar. A própria Rede Globo, assim como os jornalões, não serão mais os mesmos. A coisa começa a se movimentar no sentido de dar uma solução para a comunicação no Brasil e na América Latina. Isso provocará uma transformação na correlação de forças e fará com que determinadas mudanças que hoje são tidas como impossíveis pelas grandes empresas passem a ser aceitas”.

“Conferência é crucial”

Para o chefe da delegação da Abra, Walter Ceneviva, ignorar a Conferência Nacional de Comunicação, como fazem as outras entidades representativas da grande mídia, não é uma boa idéia: “A Abra entende que participar dessa conferência é crucial e determinante. A gente se organizou e se estruturou para fazer essa participação e contamos que nossos profissionais irão fazer um bom papel na conferência nacional”.

Ceneviva se disse satisfeito com o resultado da conferência em São Paulo: “A importância maior da conferência estadual era estimular o debate no âmbito regional e eleger os delegados que irão à Brasília. Os dois objetivos foram atingidos porque houve muito debate e os delegados estão eleitos”, disse.

O representante da Abra espera que o entendimento entre os empresários acontecido em São Paulo se repita em Brasília: “Nossa expectativa para a conferência nacional é aprofundar as discussões. A nossa esperança, mais do que o nosso prognóstico, é de que os debates sejam menos panfletários e mais concretos, de tal maneira que, ao contrário de outras conferências estaduais, ao invés de a gente simplesmente produzir propostas que não virem realidade, a gente seja capaz de desenhar o sonho de longo prazo e um plano concreto e efetivo para realizar esse sonho etapa por etapa”.