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Violações aos direitos humanos não revogam concessões no Brasil

Relacionar o controle público dos meios de comunicação a regulação de conteúdo se consolidou como um dos maiores tabus do Brasil nos últimos oito anos. O pavor que a pauta se aproximasse da censura foi instaurado pelos grandes empresários, esparramou-se pela classe política, até chegar no cidadão comum. Assim, setores do governo e organizações sociais foram transformados em algozes por defender a permanência do termo.

Sem os mesmos espaços para se explicar, qualquer reivindicação associada ao conteúdo se confrontou com reações desproporcionais, quando o teor, na maioria das vezes, solicitava apenas o cumprimento da legislação ou enquadramento do país a acordos internacionais.

O resultado é que pouca coisa avançou no Brasil em termos de regulação de conteúdo. E o pior, esse tema se tornou um dos maiores obstáculos para a sociedade compreender a natureza pública da comunicação e o porquê de se realizar reformas imediatas no marco regulatório.

Laurindo Leal Filho, apresentador do Ver Tv na Tv Brasil, narra que, nos últimos 15 anos, a sociedade civil aumentou seu senso crítico, enquanto a televisão buscou formatos apelativos para disputar a audiência. Para ele, os caminhos das reivindicações de conteúdo sempre foram democráticos tornando importante sua manutenção: "O que aconteceu é que houve confusão deliberada para caracterizar regulação de conteúdo com censura, proibição. Isso ajuda a desqualificar discussões mais amplas como propriedade cruzada".

Professor aposentado da USP, Laurindo explana que resumir a questão ao controle remoto é argumento dos concessionários, sem sustentação na realidade nacional: "O que é oferecido ao público é via interesse comercial. Colocam no ar programação semelhante. Qual a consequência? Ao telespectador não sobra alternativa na programação", defende o professor.

Violações sem punições

Ao final do Governo Lula nenhuma concessão de rádio e televisão foi revogada por violar os direitos humanos. Em contrapartida, iniciativas para acabar com a sensação de impunidade dos radiodifusores se ploriferaram na sociedade civil. Pouco a pouco observatórios e campanhas se estabeleceram em busca do cumprimento à legislação federal e aos tratados internacionais dos quais o país é signatário.

O governo federal tentou corresponder a essas reivindicações e teve como principal ato o 3º Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3). Porém o bombardeio dos setores conservadores foi intenso, tendo resoluções e ações modificadas na calada da noite , para felicidade dos radiodifusores.

Laurindo acha que o Brasil está na "idade da pedra" em termos de regulação da mídia e relaciona o PNDH com a necessidade de um caderno de encargos, inexistente no país: "É preciso assumir uma série de compromissos com o concedente, um destes seria o de respeito aos Direitos Humanos, dentro da lei brasileira e acordos internacionais".

Para Bia Barbosa, associada do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, a Classificação Indicativa foi o único trunfo do Governo Lula e no recuo do PNDH-3: "Ficou explícito que o governo não pretendia mesmo comprar nenhum enfrentameno neste sentido com os donos da mídia", e continua: "Somente nos últimos meses o discurso mudou, com a realização de um seminário internacional no país, promovido pela Secom (Secretaria de Comunicação da Presidência da República), que apresentou inúmeros exemplos de regulação democrática de conteúdo em diferentes nações".

Ministério Público

Sem ter acolhimento no Executivo e Legislativo em Brasília, o Ministério Público, seja estadual ou federal, se tornou o principal aliado das entidades. O caso de maior êxito da parceria foi com o Ministério Público Federal, quando o programa Tardes Quentes da RedeTV!, apresentado por João Kléber, esnobou dos convites da Justiça para adequar sua programação e teve a transmissão suspendida por 30 dias em 2005. No lugar foi exibido o programa Direitos de Respostas, realizado por um conjunto de organizações.

A campanha Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania, iniciada em 2002, chegou ao seu 18º ranking no fim de 2010 e programas como o Pânico na TV (Rede TV), Big Brother Brasil (Rede Globo) e Brasil Urgente (Band) são costumeiros frequentadores dos primeiros lugares, mas até o momento nenhuma medida contundente foi tomada.

A Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara Federal é responsável direta pela criação e continuidade da campanha e tem como presidente Janete Pietá, única deputada federal mulher pelo PT paulista. Pietá adianta que o tema levantará discussões profundas no Congresso, mas por enquanto a única estratégia a seguir é "mudar de canal": "A medida que a população começar a rejeitar, mudando de canal, fazendo críticas, isso vai mostrar que não são alguns grupos, mas grande parte da população".