Responsável pela interatividade – o chamariz para a atração do consumidor para a TV Digital Terrestre aberta – o software brasileiro Ginga, em fase final de desenvolvimento, esbarra, agora, em questões ligadas ao pagamento ou não de licença de uso de interfaces Java. O impasse pode adiar o lançamento da versão completa do Ginga para o segundo semestre, quando o prazo esperado era final de abril.
O chamado ginga J, baseado na linguagem Java, pode ter que vir a pagar licença de uso de APIs, interfaces de aplicações, baseadas na linguagem, desenvolvida pela Sun Microsystems. A discussão acontece mundialmente, mas ainda não há uma posição oficial se há ou não obrigação relativa ao pagamento de royalties pelo uso de algumas interfaces (APIs).
O problema já mobiliza o Fórum do Sistema Brasileiro de TV Digital Terrestre. Isso porque na norma de criação da TV Digital aberta, apesar de não ser uma imposição, há uma diretriz que o Ginga deverá ser lançado de forma integral, ou seja, reunindo as duas vertentes – o Ginga NCL e o Ginga J.
Fontes que participaram da reunião do Fórum do Sistema Brasileiro de TV Digital Terrestre, realizada na última segunda-feira, 25/02, na capital paulista, admitem que o impasse preocupa. Sem uma solução, o lançamento poderia ser adiado de final de abril para o segundo semestre.
"Será um problema se houver um atraso. A interatividade é o grande chamariz da TV digital e todos sabem que os fabricantes estão preocupados com a fraca demanda dos conversores, até porque o próprio ministro falou para a população não comprar os que estão no mercado por considerá-los caros e sem a interatividade", diz uma fonte que pede para não ser identificada.
Quando dois + dois são quatro
A norma do Fórum do Sistema Brasileiro de TV Digital Terrestre prevê dois diferentes "engines" para o Ginga, o middleware nacional da interatividade. São eles: o Ginga J e o Ginga NCL, este último, desenvolvido pela PUC do Rio de Janeiro para prover uma infra-estrutura de apresentação de aplicações baseadas em documentos hipermídia escritos em linguagem NCL, com facilidades para a especificação de aspectos de interatividade, sincronismo espaço-temporal de objetos de mídia, adaptabilidade e suporte a múltiplos dispositivos.
O Ginga NCL é declarativo e tem foco na sincronização de mídia, ou seja, ele é capaz de utilizar instruções ou procedimentos para definir o conteúdo (vídeo, áudio, imagens e textos) tornando-o um único conteúdo interativo. Esta versão, de acordo com as fontes presentes a reunião do Fórum, está bastante adiantada e dentro do cronograma que previa o lançamento de conversores no mercado com Ginga até o final de abril.
Já o Ginga J – hoje motivo do impasse – foi desenvolvido pela Universidade Federal da Paraíba, e tem como base a linguagem Java. O desenvolvimento da ferramenta também está bastante adiantada do ponto de vista tecnológico, mas, agora, há as dúvidas relativas à necessidade ou não de pagamentos de royalties (licenciamento) pelo uso de algumas APIs(Application Programming Interface ou Interface de Programação de Aplicativos).
Todo o temor com relação ao adiamento do lançamento oficial do Ginga para o segundo semestre reside no fato de o Ginga J complementar o Ginga NCL, uma vez que ele permite implementar qualquer tipo de algoritmo ou aplicações mais sofisticadas, não possíveis, do ponto de vista técnico na linguagem NCL, segundo explicações de especialistas ligados ao desenvolvimento do Java.
A discussão sobre royalties determinou, inclusive, uma maior participação da Sun, desenvolvedora da linguagem Java, no processo de criação do Ginga. Há um grande esforço para que o impasse venha a ser solucionado o mais rápido possível. O ponto central não é o fato de ter que pagar pelo uso das APIs Java, dizem as fontes, mas sim, a necessidade de a questão dos royalties ficar explicada de forma transparente para todos os integrantes do Fórum.
Essa definição é necessária para que, num futuro, o problema de licenciamento não venha prejudicar a evolução do Ginga no Brasil e, a venda do middleware, para outros países, que por ventura venham a adotar o sistema brasileiro de TV digital terrestre, que adapta o ISDB-T japonês. A norma de criação da TV Digital Terrestre especifica que o ideal é que o Ginga venha a ser lançado completo, ou seja, com as duas vertentes disponibilizadas, mas não há uma imposição oficial.
Segundo as fontes consultadas pelo Convergência Digital, já há uma parcela de fornecedores interessados em lançar uma versão do conversor (set-top-box) – equipamento que vai converter o sinal analógico para o digital – apenas com o Ginga NCL – que já permitiria interatividade para o consumidor final – comprometendo-se a tão logo a questão do Ginga J seja resolvida, incorporá-la ao seu produto. Esse posicionamento, no entanto, não é unânime e, por enquanto, a discussão está ainda centralizada no Grupo de Trabalho de Mercado do Fórum. O Governo não teria, pelo menos, segundo as fontes, sido consultado sobre a questão.