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Sul e Centro-Oeste se destacam; Sudeste decepciona

A regionalização da produção na televisão brasileira não depende e não é influenciada diretamente pelo tamanho dos mercados publicitários. Enquanto regiões com poucos anunciantes e índice potencial de consumo médio, como Sul e Centro-Oeste, apresentam as melhores médias de regionalização, o Sudeste, com os mais ricos anunciantes do país, têm as emissoras com menor presença de conteúdos locais.

Esta foi a principal conclusão do estudo “Produção Regional na TV Aberta Brasileira”, realizado a partir da análise de 58 emissoras em 11 capitais brasileiras [veja aqui]. Segundo a pesquisa, as TVs da região Sul ocupam 13,92% de suas grades com conteúdos realizados em suas cidades. A segunda região com maior índice de regionalização é a Centro-Oeste, que registrou média de 11,66%. 

Na região Sul, o índice acima da média nacional foi puxado pelas duas emissoras públicas, TVE RS e Paraná Educativa, que veiculam, respectivamente, 22,82% e 50% de produção local em suas grades. Outro caso da região que se destaca é o da TV Pampa, que preenche 26,5% do tempo com atrações gaúchas.

No Centro-Oeste, o índice foi impulsionado pelo peculiar caso da TV Rondon, de Cuiabá, que ocupa 45% de sua grade com produções locais, majoritariamente religiosas e de televendas, uma vez que seis das nove emissoras analisadas em Cuiabá e Brasília dedicam menos de 10% do seu tempo  para locais em sua grade. O destaque negativo fica com a SBT Brasília e Cidade Verde, da capital matogrossense, que registraram, respectivamente, 3% e 5,95%.

Já a região Norte, da qual foram pesquisadas as emissoras apenas de Belém, manteve praticamente a média nacional, com 9,91% de produção local em suas seis televisões. Os destaques positivos são a pública TV Cultura, com 15,41%, e a RBA, afiliada à Rede Bandeirantes, com 15,82%. Já o SBT Belém transmite 3,66% e a rede religiosa Boas Novas, 5,65%.

Poder de mercado e riqueza cultural sem influência

A Região Sudeste – que abrange os principais mercados de televisão do país, e, portanto, teria supostamente condições financeiras para sustentar uma política de regionalização mais forte de suas emissoras – teve o desempenho mais baixo, com média de 9,19% de regionalização. Das 11 emissoras analisadas nesta região, apenas duas veiculam mais do que a média nacional, Rede Minas (34,32%) e Record MG (12,5%).

O índice foi baixo pela pouca presença de conteúdo regional nas afiliadas da Rede TV no Rio e em Belo Horizonte, ambas com apenas 1,48% da grade nesta modalidade de programa. Uma razão para o índice da região mais rica do país é a força da programação das cabeças-de-rede, que terminam sendo retransmitidas em proporção maior do que no restante do país.

Se o poder de mercado não está diretamente relacionado à regionalização da produção, tampouco a diversidade de manifestações culturais influencia neste sentido. A região Nordeste, conhecida pela riqueza de suas várias culturas locais, teve índice abaixo da média nacional de 10,83%, com 9,8% do tempo de suas emissoras dedicado à produção local.

Dentre as 20 emissoras pesquisadas nesta região, foi possível constatar uma disparidade muito grande, com TVs com produção local razoável, como a afiliada do SBT no Ceará TV Jangadeiro (20,3%), a afiliada da Band em Recife TV Clube (13,78%) e a afiliada do SBT em Natal TV Ponta Negra (17,5%). Esta última, de propriedade da prefeita da cidade, Micarla de Souza, no entanto, chegou a esta marca com forte ocorrência de programas arrendados a igrejas e televendas. O destaque negativo foi as afiliadas da Rede TV em Fortaleza e Recife e a TV MTV Recife, que não veiculam um minuto sequer de produção local. 

Diferentes realidades

Se observadas individualmente as cidades, é possível perceber realidades bem diferenciadas no país. A capital paranaense, Curitiba, foi a cidade com índice mais alto de regionalização, com 15,74%. O índice é puxado pela Paraná Educativa, que dedica 50% de seu tempo a conteúdos locais, bem como por experiências como as da Rede Paranaense de Comunicação, afiliada da Rede Globo, que preenche surpreendentes 12,99% de sua grade com atrações locais.

Cuiabá foi a segunda cidade com maior índice de localidade, com 14,38% das grades de suas emissoras ocupados por programas locais. O destaque positivo é o já citado caso da TV Rondon (Rede TV), que preenche 45% de sua grade com produções cuiabanas, seguida de longe pela TV Gazeta (Record), com 15,22%. As TVs Centro América (Globo) e Cidade Verde (SBT) equilibraram o índice, com cerca de 6% de conteúdo local inseridos em suas grades.

Belo Horizonte destaca-se em meio à baixa média do Sudeste, com 12% de regionalização. O índice foi garantido pela grande presença destes conteúdos na Rede Minas (34,32%), que compensou as escassas atrações locais na Rede TV MG (1,48%) e na Globo Belo Horizonte (5,9%). Em seguida vem Porto alegre, que registrou 11,77% de média. Embora tenha duas emissoras com altos índices, TVE RS e TV Pampa, as emissoras SBT Poa e Band RS, com, respectivamente, 1,78% e 3,57%.

Logo abaixo vem a capital baiana, Salvador, que atingiu índice pouco acima da média nacional, com 11% de produção local. O percentual foi sustentado pela TVE BA, com 14,78% de conteúdos locais na grade, e pela TV Itapoan (Record), com 12,50%. O índice foi garantido também pelo desempenho razoável das outras três emissoras com menos atrações locais, TV Bahia (Globo), TV Aratu (SBT) e Band Bahia, todas com mais de 9% das horas dedicadas a atrações produzidas em Salvador.

As emissoras de Fortaleza veiculam 11,2% de atrações locais. A média é resultado de uma situação díspar, com três emissoras com bons índices – Tv Jangadeiro (SBT) (20,3%), TV Ceará (15,97%) e TV Cidade Record (13,44%) – e duas com pouco espaço à produção local – TV Verdes Mares (Globo) (6%) e Rede TV Fortaleza (0%).

Natal manteve-se pouco acima da média nacioinal, com 10,74% de atrações locais. O destaque positivo foi a TV Ponta Negra, de propriedade da prefeita, Micarla de Souza. No entanto, o alto índice é resultado de intensa participação de shows religiosos e infomerciais de televendas que alugam espaço da emissora. Das quatro emissoras avaliadas (a TVU não disponibilizou sua grade de programação), duas mantiveram-se na média: Band Natal (9,82%) e Tropical (Record) (9,92%). O pior índice foi da afiliada da Rede Globo TV Cabugi (5,75%).

Uma das cidades com cultural local de maior prestígio no país, Recife obteve um dos índices mais baixos, com apenas 7% de horas dedicadas à produção local entre suas emissoras. O percentual é resultado do fato de duas emissoras, MTV Recife e Rede TV Recife, não terem nenhum programa realizado na capital pernambucana. Diferente de outras cidades, as afiliadas da Band, TV Clube, e do SBT, TV Jornal, dedicam mais tempo do que a média para atrações locais, 13,78% e 12.40%, respectivamente.

Brasília, a despeito de alimentar o restante do país como fonte de informações políticas, foi uma das cidades com pior desempenho, atingindo média de 6,61%. A única emissora que ultrapassou a média nacional foi a TV Brasília, de propriedade dos Diários Associados e do vice-governador do DF, Paulo Octávio, com 11% de conteúdos locais transmitidos. As demais emissoras, afiliadas das quatro maiores redes, mantêm índices piores: Record DF (8,48%), Globo (5,75%), Band (4,76%) e SBT (3%).

Já a capital carioca teve a média mais baixa, com 5,82%. Se a cidade é conhecida nacionalmente por conta da penetração de produções das cabeças-de-rede TV Globo e TV Brasil, o conteúdo voltado ao Rio das emissoras possui pouco espaço em suas grades, cujos destaques negativos são a Rede TV Rio e o SBT Rio, ambos com 1,48%.

TVs privilegiam jornalismo nas produções locais

Entre as poucas horas de conteúdos regionais veiculadas pelas emissoras nas principais capitais do país, os programas jornalísticos são os mais produzidos. Os telejornais e congêneres somam 464 horas e 7 minutos dentre o universo pesquisado pelo estudo “Programação Regional na TV Aberta Brasileira”, realizado pelo Observatório do Direito à Comunicação, a partir da análise de 58 emissoras em 11 capitais do país [veja aqui].

A emissora que mais veicula programas jornalísticos é a Paraná Educativa, com 23 horas e 25 minutos. Em seguida vêm a Record MG, com 21 horas, a Cidade Record, com 20 horas e 40 minutos, e a TV Pampa, de Porto Alegre, com 20 horas. A Record é a rede que dá mais atenção a este gênero, tendo 8 das 10 emissoras com maior tempo de jornalismo local. Tal desempenho deve-se muito à estratégia de programação local da sede paulista, que privilegia jornais feitos pelas afiliadas em edições na hora do almoço e de noite, além de garantir cerca de duas horas de versões locais do programa Balanço Geral.

O segundo gênero mais freqüente dentre as produções locais é o entretenimento, com 79 horas e 10 minutos. O termo é usado no estudo para agrupar shows de variedades, humorísticos, programas de auditório e filmes. Verifica-se que as iniciativas locais deste gênero não fazem parte das estratégias das cabeças, mas são uma opção das afiliadas. Este tipo de atração é relativamente barata, pois se apóia fortemente em conteúdos ao vivo, com diálogo entre estúdio e pessoas na rua.

Os programas de variedades também são um dos tipos de produção mais realizada pelas emissoras, em razão de seu alto potencial de retorno publicitário. “Programas de variedades são mais fáceis, tanto para fazer quanto para vender. Ele tem leque maior, pois posso ter um cliente que quer fazer quadros diferentes, e acabo fazendo-os adequados aos clientes. São programas mais complexos para produzir, porque demandam equipe maior, mas de mais fácil retorno”, explica Beth Caminha, da TV Jangadeiro.

Outra opção corrente é o humor local, geralmente comandado por algum apresentador ou protagonista de forte carisma, como é o caso de “Caju e Totonho em Off”, da TV Alterosa de Belo Horizonte. No Ceará, programas locais como o “Panelada da Babalu”, da TV Jangadeiro, têm obtido bons índices de audiência.

Na terceira colocação estão os programas esportivos, com 71 horas e 51 minutos. Este gênero faz parte das estratégias das cabeças e é uma opção para as afiliadas pela audiência garantida, sobretudo em razão da forte atração de conteúdos relacionados ao futebol. Há dois tipos principais de programas esportivos: ou próprios das afiliadas, como o Esporte Record Pará, ou inserções locais no programa feito pela cabeça, como os blocos do Globo Esporte.

Com total de horas quase idêntico, os programas culturais somaram 65 horas e 30 minutos. Compõem este gênero principalmente atrações voltadas às artes, sobretudo à música, e com temáticas relacionadas às culturas locais de determinadas regiões. Neste grupo de conteúdos, é visível o desequilíbrio quanto à modalidade de televisão que os veiculam, concentrando-se majoritariamente nas televisões públicas. Estas são responsáveis por 91% do total dos programas culturais.

A emissora com maior volume de produções neste gênero é a Rede Minas, com 16 horas e 50 minutos, seguida pela Paraná Educativa, com 12 horas e 40 minutos, e pela TV Cultura do Pará, com 11h. Das 52 emissoras comerciais analisadas, apenas 12 transmitem este tipo de programa. 

Religiosos e televendas crescem nas produções regionais

Na análise por gênero, o estudo identificou uma crescente presença dos programas religiosos e de televendas, ocorrida especialmente por meio do arrendamento de espaços nas grades de programação. Os primeiros totalizam 28 horas e 30 minutos do tempo total veiculados pelas emissoras. Já a venda de produtos pela TV soma 47 horas e 15 minutos nas emissoras analisadas. No entanto, boa parte deste tempo deve-se à TV Rondon, de Cuiabá, que aluga 34 horas e 40 minutos de sua grade para este este tipo de programa.

O tempo de programas religiosos aparenta contraste com a presença crescente deste tipo de conteúdo nas cabeças-de-rede nacionais, mas justifica-se pelo fato do aluguel de espaço local ainda ser pouco rentável para as organizações religiosas, que apostam nos horários distribuídos pelas cabeças de alcance nacional.

Já os infomerciais, como são chamados os programas de televendas, têm encontrado nos espaços locais das grades uma estratégia de ocupação do espaço da televisão. “Isso [televendas] não é indústria de TV, com profissionais de TV, que produzem etc. É um vendedor que fica ali anunciando produto. Eu teria restrições a chamar isso de TV, inclusive de permitir concessão para este tipo de coisa. É ilegal, porque leva as emissoras a ultrapassarem o limite de 25% do tempo para veiculação de publicidade”, critica o professor César Bolaño.

Para o acadêmico, este tipo de “barbaridade” ocorre pela falta de uma regulação do conteúdo transmitido na TV, e termina por ocupar um espaço precioso que deveria servir para expressar a diversidade de opiniões políticas e culturas com mensagens puramente comerciais.

Educativos e infantis desprezados

Do total de horas veiculadas pelas emissoras, 16 horas e 12 minutos são programas que têm como temática o campo. Este tipo de atração é presente, sobretudo, nos estados da Região Sul, Paraná e Rio Grande do Sul, e atendem a um público de produtores rurais, que contribuem fortemente com o retorno publicitário.

Com percentual baixíssimo, na base do ranking, estão os programas educativos e infantis, que totalizam apenas, respectivamente, 5 horas e 30 minutos e 4 horas e 30 minutos. Mesmo nas emissoras públicas, que internacional e nacionalmente dão bastante atenção à produção de conteúdos de cunho pedagógico, o tempo totalizado ficou apenas em 4 horas e 30 minutos.

Públicas dão mais espaço à programação regional

Por trás da baixa média de reserva de 10,83% das programações das emissoras de TV para conteúdos locais esconde-se uma reveladora disparidade. Enquanto as televisões públicas têm em média 25,55% de suas grades preenchidas por conteúdos realizados nas suas cidades, as comerciais ocupam apenas 9,14% de suas horas transmitidas com este tipo de atrações. Ou seja, o índice das primeiras é quase três vezes maior do que o das segundas. A conclusão é do estudo “Produção local na TV Aberta Brasileira”, realizado pelo Observatório do Direito à Comunicação a partir da análise de 58 emissoras em 11 capitais brasileiras [veja aqui].

Das seis televisões públicas avaliadas, cinco estão entre as dez com maior índice de regionalização. Em média, estes veículos reservam 25,5% de sua grade para conteúdos realizados em suas cidades. O índice é alavancado especialmente pela Paraná Educativa, Rede Minas e TVE-RS. Uma ressalva importante é o fato da maioria destas emissoras, sobretudo a paranaense e a gaúcha, exibirem número elevado de reprises, o que aumenta seu percentual sem, necessariamente, significar novas produções.

Para César Bolaño, professor da Universidade de Brasília e coordenador do Grupo de Trabalho de Economia Política e Política de Comunicação da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação (Compós), a baixa incidência de produção local nas TVs comerciais deve-se à estrutura de mercado, que, pela sua natureza de altos custos de produção e riscos no lançamento de novos produtos, acaba levando as afiliadas a considerarem mais seguro um acordo com as cabeças-de-rede.

“Existe uma concentração de poder que faz com que a cabeça tenha todo o poder e as afiliadas ganhem bem do ponto de vista do mercado local, porque é sempre melhor ter acordo com a cabeça do que estar sozinha.” A cabeça assegura à afiliada audiência garantida de um programa já experimentado em escala nacional e preenche boa parte de sua grade de programação, ação altamente custosa para um operador local.

O afiliado mantém sua segurança financeira ao arrecadar receitas provenientes dos anúncios publicitários vendidos por ele e veiculados nos intervalos da programação local, bem como em parte dos anúncios que serão veiculados durante as atrações da rede. Neste acordo, as afiliadas aceitam submeter-se à grade nacional, não podendo, na maioria dos casos, veicular produções próprias fora dos horários pré-estipulados pela cabeça.

“Tem horário pré-estipulado para todas as afiliadas”, conta Beth Caminha, gerente de programação da TV Jangadeiro, afiliada do SBT. “De 10h45 às 14h15 durante a semana, no sábado e de 9h às 11h é liberado pelo SBT. Fora disso, tenho que entrar na rede”, ilustra César Prates, da TV Aratu, de Salvador. A equipe do Observatório do Direito à Comunicação entrou em contato com representantes de todas as cabeças-de-rede para confirmar as informações e compreender a relação entre elas e suas afiliadas, mas não obteve resposta.

Record na frente, Globo em último lugar

Entre as redes comerciais, a maior incidência de produção local é nas afiliadas da Rede TV!, com média de 12,2%. Por trás do resultado esconde-se uma diferença brutal entre emissoras com bom desempenho, como a TV Rondon (Cuiabá – 45%) e a TV Pampa (Porto Alegre – 26,5%), de um lado, e afiliadas à rede em Belo Horizonte e Rio de Janeiro, que reservam 1,48% do tempo para estes conteúdos, e em Recife e Fortaleza, que não mantêm nenhum programa realizado em suas sedes.

Pelo reduzido número de emissoras da RedeTV!, o estudo classifica, considerando uma proporção qualificada, a Rede Record como grupo comercial de melhor desempenho, com média de 11,2% de atrações locais entre suas afiliadas. Das 11 televisões analisadas, cinco estão acima da média, com destaque para a TV Gazeta (Cuiabá – 15,22%), Cidade Record (Fortaleza – 13,44%) e Record Belém (12,9%).

Parte importante deste percentual é garantido pelo extenso tempo de duração do programa Balanço Geral, formato elaborado pela cabeça-de-rede adequado à realidade local, que ocupa 2 horas do dia. Além disso, as afiliadas da rede também mantêm um bom índice de jornalismo local.

Logo atrás, com média de 9,12%, estão as emissoras da rede CNT. No entanto, a ressalva feita à Rede TV! é aplicada também neste caso, mas de maneira mais incisiva, uma vez que foram analisadas apenas duas televisões associadas a esta rede. Em seguida, praticamente empatadas, estão o SBT e a Rede Bandeirantes, com médias de, respectivamente, 8,6% e 8,56% de produção local em suas grades.

As afiliadas ao SBT apresentam realidade bem diversa, que vai de casos de forte regionalidade como os da TV Jangadeiro (Fortaleza – 20,3%) e TV Ponta Negra (Natal – 17,5%), aos da SBT Belém (3,66%), SBT Brasília (3%), SBT Porto Alegre (1,78%) e SBT Rio de Janeiro (1,48%). O levantamento permitiu constatar que o índice é menor nas TVs próprias da rede, subordinadas mais fortemente à grade da cabeça-de-rede, em São Paulo. Já nos casos com maior índice, é freqüente o arrendamento de espaços para televendas e programas religiosos, atrações que sustentam o maior número de horas da TV Ponta Negra e da TV Jangadeiro.

Já a Rede Bandeirantes tem realidade semelhante. O maior índice de regionalização ocorre em afiliadas de grupos regionais, como a RBA (Belém – 15,82%) e a TV Clube de Recife (13,78%). Se analisadas apenas as emissoras que levam o nome do grupo no nome, como a Band Paraná ou a Band Brasília, a média cai para 6,78%. Na última colocação está a Rede Globo, com 7% de média. Tal resultado pode ser atribuído à rigidez da grade nacional, cuja manutenção termina por ser mais rentável pela alta arrecadação nacional e local a partir dela.

Emissoras veiculam 10% de conteúdos locais

A regionalização da produção audiovisual é uma preocupação recorrente para estudiosos da comunicação, telespectadores, produtores independentes e gestores públicos. Tal é sua importância que o capítulo da Comunicação Social da Constituição Federal estabelece como princípios da produção e programação das emissoras de radiodifusão, em seu artigo 221, a “regionalização da produção cultural, artística, e jornalística”. Para medir a presença destes conteúdos na programação das emissoras de televisão, o Observatório do Direito à Comunicação realizou o estudo “Produção Regional na TV Aberta Brasileira” [veja aqui].

A partir da análise de 58 emissoras em 11 capitais das cinco regiões brasileiras, a pesquisa chegou a um dado preocupante: apenas 10,83% do tempo veiculado é ocupado com conteúdos de origem local.  O índice é bastante inferior ao percentual de 30% previsto no Projeto de Lei da ex-deputada Jandira Feghali (PcdoB-RJ) (256/1991), que visa regulamentar o dispositivo constitucional citado acima, tramitando no Congresso Nacional há 18 anos.

“O índice de 10% é extremamente baixo. Totalmente insuficiente para a quantidade e qualidade de matéria-prima que temos em termos de cultura popular local e regional e um sinal de como a produção, circulação e o consumo da cultura no país obedece a uma lógica vertical e antidemocrática”, avalia Rosário Pompéia, mestre em comunicação social, integrante do Centro de Cultura Luis Freire, de Olinda (PE), e pesquisadora do tema. 

A emissora com maior tempo dedicado a conteúdos locais é a Paraná Educativa, sediada em Curitiba e vinculada ao governo do Paraná, que preenche 50% de sua grade com atrações produzidas naquela cidade. Em seguida vêm a TV Rondon, afiliada da Rede TV! em Cuiabá (MT), com 45%, a pública Rede Minas, com 34,32%, e as gaúchas TV Pampa, afiliada à RedeTV!, com 26,5%, e a também pública TVE RS, com 22,82%. Entre as 10 emissoras com melhor desempenho na análise, evidencia-se a presença das regiões Sul e Nordeste, com três televisões cada uma. 

Emissoras públicas são as mais regionalizadas

Tais dados revelam a disparidade entre emissoras públicos e comerciais. As primeiras reservam, em média, 25,5% de sua grade para conteúdos realizados em suas cidades. Os destaques são as já citadas Paraná Educativa (50%), a Rede Minas (34,32%) e TVE RS (22,82%). Além destas, a TV Ceará e a TV Cultura do Pará também figuram entre as 10 primeiras, com índice de regionalização de 15,97% e 15,41%.  

Já as redes comerciais ficam abaixo da média nacional, reservando a média de 9,14% de suas grades de programação para conteúdos locais. Para especialistas entrevistados na pesquisa, tal quadro é resultado dos condicionantes políticos e econômicos impostos pelo modelo centralizado de rede. Um problema dos contratos de afiliação é o tempo pré-estabelecido pelas cabeças para a produção regional. Outra dificuldade é o alto risco de retorno financeiro, que muitas vezes leva as emissoras a nem sequer preencher o pouco tempo permitido pelas cabeças.

Record tem o melhor desempenho 

Entre as redes nacionais, o estudo registra o mais alto percentual na Rede Pública de TV organizada em torno da TV Brasil, com média de 25,55% de programação regionalizada. Entre as comerciais, o melhor desempenho foi o da RedeTV!, com 12,2%, seguida de perto pela Record, com 11,2%. Como o número de emissoras afiliadas à primeira rede foi consideravelmente menor do que o da segunda, a pesquisa conclui pelo melhor desempenho da rede do Bispo Edir Macedo. 

A Rede CNT apresentou média de 9,12% de atrações locais, mas o desempenho também é relativizado pelo levantamento só ter analisado duas emissoras desta rede. Em seguida, praticamente empatados, estão SBT e a Rede Bandeirantes, com índices de 8,6% e 8,56%, respectivamente. Na última colocação está a mais poderosa organização de televisão do país, a Rede Globo, com média de 7%.  

Jornalismo em alta, educativos e infantis em baixa 

Dentre os conteúdos locais analisados, o estudo identificou maior presença do gênero jornalístico, que soma 464 horas e 7 minutos. O segundo gênero com maior presença é o entretenimento, com 79 horas e 10 minutos, seguido pelos programas esportivos, com 74 horas e 51 minutos, e os culturais, que totaliza 74 horas e 40 minutos. Enquanto os conteúdos voltados ao entretenimento são quase exclusivos das redes comerciais, as atrações culturais são veiculadas majoritariamente pelas televisões públicas.  

O levantamento registrou a forte presença de programas de televendas e religiosos, que ocupam, respectivamente, 47 horas e 15 minutos e 28 horas e 30 minutos das grades das 58 TVs analisadas. Os conhecidos programas “policiais” somam 38 horas e 15 minutos. As atrações rurais, com temáticas relacionadas ao campo, tradicionais nos estados do Sul e Centro-Oeste, totalizam 16 horas e 12 minutos. O destaque negativo ficou com a baixíssima incidência de conteúdos educativos e infantis, com, respectivamente, 5 horas e 30 minutos e 4 horas e 30 minutos em um universo de quase 60 emissoras de TV. 

Sul mais local 

A região com melhor média de produções locais foi o Sul, com 13,92%. A tendência abrange as duas cidades pesquisadas, Porto Alegre e Curitiba. A segunda região com maior índice de regionalização é o Centro-Oeste, com 11,66%. No entanto, verifica-se um alto percentual nas emissoras de Cuiabá, contra um desempenho mais fraco em Brasília. A região Norte, embora a análise tenha se restringido à Belém, apresentou média de 9,1%.  

O Nordeste, conhecido pela riqueza de suas manifestações culturais, ficou levemente abaixo da média nacional, com suas emissoras reservando 9,8% do tempo de suas grades para atrações realizadas nas próprias cidades. Em último lugar está a região mais rica do país, o Sudeste, com 9,19%. O resultado mostra que a presença de produções locais não está diretamente ligada ao peso dos mercados. 

Alerta à sociedade 

Apesar de utilizar uma amostra de 58 dentre as 421 geradoras de televisão existentes no país, o estudo “Produção Local na TV Aberta Brasileira” traz importantes elementos para entender a realidade da televisão brasileira. A julgar pela estrutura vertical das redes de televisão, a extensão de suas análises para todas as capitais ou para as geradoras no interior poderia certamente apresentar um quadro mais completo, mas dificilmente iria alterar radicalmente a evidência da desvalorização da cultural regional pelas emissoras de TV nacionais.

O percentual de 10,83%, mais do que um número, é um alerta. No ano de 2005, a Organização das Nações Unidas para a Ciência, Educação e Cultura (Unesco) aprovou a Convenção pela Proteção da Diversidade Cultural, afirmando a importância dos bens culturais serem tratados como patrimônio das diversas nações e dos variados segmentos no interior delas. Este projeto, no entanto, está distante de fazer parte da realidade do mais importante meio de comunicação do Brasil.

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