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Governador do Rio de Janeiro atenta contra o direito à comunicação

O governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB), baixou decreto, publicado no Diário Oficial no dia 22 (segunda), criando uma Comissão Especial de Investigação de Atos de Vandalismo em Manifestações Públicas. Com a medida ficou estabelecido que operadoras de telefonia e provedores de internet teriam 24 horas de prazo para atender os pedidos de informações da comissão. No dia 24, foi noticiado pela Folha de São Paulo que o governante teria recuado e deveria alterar a redação do texto, porém sem informar quais seriam as modificações.

O presidente nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Marcus Vinicius Furtado, se pronunciou afirmando a inconstitucionalidade do decreto assinado pelo governador com a finalidade de “investigar atos de vandalismo”. "A Constituição Federal assegura a inviolabilidade das comunicações entre pessoas. Não tenho a menor dúvida em afirmar que o decreto é flagrantemente inconstitucional", defendeu.

O interesse do governador do Rio de Janeiro de controlar informações se manifestou mais uma vez na noite do mesmo dia 22, quando, durante os protestos em frente à sede do governo, os repórteres do grupo “Mídia Ninja” foram arbitrariamente impedidos de veicular as imagens das manifestações e levados à delegacia, da qual saíram mediante pressão e apoio dos manifestantes que se dirigiram ao local.

As manifestações ocorridas no Rio de Janeiro têm criticado fortemente o governo estadual. Manifestantes já se dirigiram à sede do governo e chegaram mesmo a acampar em frente à casa do governador, no Leblon, de onde foram retirados à força. Os acontecimentos do dia 22 demonstram o interesse de Sérgio Cabral em lidar com  a crítica das ruas por meio do controle da informação, passando por cima de princípios invioláveis, como do direito à privacidade e à liberdade de expressão.

Segundo Daniel Fonsêca, representante do Intervozes e membro da Frente Ampla pela Liberdade de Expressão do Rio de Janeiro (Fale-Rio), “a prisão de dois integrantes do grupo Mídia Ninja não é somente um atentado à liberdade de imprensa, de acordo com a ideia que a mídia comercial tradicional costuma convencionar este conceito. Mais do que isso, principalmente sabendo que outras nove pessoas foram detidas na mesma noite, é uma ação de um Estado que viola os direitos às liberdades de expressão, de organização e de manifestação”

Para Fonsêca,o governo de Sérgio Cabral (PMDB) é “exemplo caricato” da estratégia comum de utilização do “estado de exceção” por governos autoritários para lidar com a intensa demanda por participação popular em um momento como atual de crise do capitalismo. A perseguição a jornalistas e a vigilância sem limites seriam expressão desse modelo de política. “Nesse contexto, o direito à comunicação, que é transversal na garantia dos demais direitos humanos, tem se mostrado uma das causas mais destacadas nas manifestações que se espalharam pelo país desde junho. A afirmação desse direito vai desde a repulsa à presença dos meios comerciais ao apoio à implementação de uma nova legislação por uma mídia democrática”, completa.

OEA recebe denúncias sobre criminalização de rádios comunitárias no Brasil

A organização Artigo 19 e a Associação Mundial de Rádios Comunitárias (Amarc Brasil), com apoio do Movimento Nacional das Rádios Comunitárias (MNRC), estiveram em Washington no dia 11 de março (segunda) para denunciar violações ao direito humano à comunicação no Brasil. A ação foi realizada em uma audiência temática da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), órgão da Organização dos Estados Americanos (OEA), que abordou questões relativas às rádios comunitárias.

A audiência foi solicitada pela Artigo 19 e pela Amarc Brasil com o objetivo de evidenciar o modo como o Estado brasileiro vem lidando com as rádios comunitárias. Segundo Camila Marques, da Artigo 19, o tratamento tem sido “repressivo”, “não fomenta políticas públicas abrangentes e acaba por sufocar as rádios comunitárias”.

Aos olhos da representante da Artigo 19, o Estado brasileiro precisa ainda compreender que sua prática com as rádios está em total desacordo com a Convenção Americana sobre Direito Humanos. “As rádios comunitárias são empurradas para a ilegalidade, são empurradas para funcionar irregularmente”, afirma Marques. Segundo Marques, “quando vemos que temos uma previsão legislativa no âmbito penal que criminaliza o exercício irregular dessas rádios, a gente vê uma desconformidade gritante com a Convenção Americana que dispõe que não deve haver criminalização da liberdade de expressão”.

De acordo com Arthur William, da Amar Brasil, a recepção na audiência da OEA foi “positiva”, inclusive por parte da representante da Secretaria dos Direitos Humanos do governo brasileiro que se encontrava presente. “Espera-se que com a ação se possa causar mudanças na lei das rádios comunitárias”, defendeu William. De acordo com ele, há uma boa relação do movimento de comunicadores populares com o órgão, diferentemente do que tem acontecido com o Ministério das Comunicações. “É preciso uma política pública efetiva e não que cada ministério aponte para um lado”, reclamou.
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Em 2005, a Amarc Brasil e o Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH) já haviam levado denúncias à OEA e solicitado medidas para pôr fim à criminalização das rádios comunitárias. Como resultado, o grupo de trabalho interministerial brasileiro que discutia a política do setor foi pressionado a se abrir para a participação da sociedade civil. Ao solicitar por meio da Lei de Acesso à Informação ao Ministério das Comunicações os relatórios desse GT e do ocorrido em 2003 (sem participação da sociedade), o movimento de rádios comunitárias afirma ter recebido como resposta que os documentos estão perdidos.