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Estados acumulam prejuízos com cessão de retransmissoras

Toda a confusão de dados e versões sobre as retransmissoras de TV em nome de órgãos públicos estaduais [ver 'Sem controle ou transparência, estados cedem estrutura a redes privadas de TV'] , produto típico da desregulamentação e da falta de fiscalização adequada e de controle público sobre a radiodifusão, chega a desviar a atenção do fato de governos estaduais terem bancado ou ainda bancarem a infra-estrutura que garante a manutenção do sistema comercial de TV. 

A presença dos estados é certamente bem menos expressiva do que os dados levantados em estudo recente do pesquisador James Goergen sobre as RTVs autorizadas para prefeituras municipais e cedidas a emissoras privadas [ver 'Prefeituras financiam emissoras comerciais de televisão']. Segundo Goergen, um terço dos canais retransmitindo o sinal das grandes redes de TV são autorizações dadas aos governos municipais. Ainda assim, não é possível ignorar estas “versões estaduais” de apropriação do público por interesses privados.

A situação de Minas Gerais, estado do ministro Hélio Costa, é a que aponta de forma mais flagrante o problema e também a que persiste sem sinalizações de mudança de rumo. Em alguns casos, os canais de retransmissão autorizados ao Departamento de Telecomunicações de Minas Gerais (Detel) estão cedidos há mais de 20 anos. A comparação entre os dados oficiais e do Detel também permite concluir que o número de RTVs cedidas a emissoras privadas cresceu nos últimos anos, chegando aos 234 canais atuais.

Apesar disso, é preciso registrar que investimentos maiores foram feitos na consolidação da cobertura da Rede Minas, tarefa sob responsabilidade do Detel. Segundo o diretor técnico da TV educativa, Luiz Meirelles, a dedicação do departamento a esta tarefa tem sido maior desde o final da década de 90. De lá para cá, o número de retransmissores dobrou, chegando aos 781 atuais.

Meirelles afirma, no entanto, que o departamento tem dificuldades em fazer a manutenção das estações retransmissoras, o que faz com que a área de cobertura da Rede Minas seja apenas estimada. “Vamos terceirizar a manutenção e esperamos resolver 80% dos casos no curto prazo”, informou o diretor.

A cessão dos canais às emissoras privadas parece não ser, portanto, nem um “bom negócio” para o Detel. Ao contrário, o departamento é responsável pelo investimento inicial, comprando os aparelhos retransmissores. Depois, são feitos contratos de dois tipos com as emissoras privadas: de “cessão de uso” ou de “manutenção de onerosos”.

Devolução

A devolução dos canais cedidos à Rede Globo ao Departamento de Telecomunicações de Pernambuco (Detelpe) é uma boa notícia, porém evidencia o prejuízo acumulado. Com esta retomada, a TV Pernambuco, emissora educativa ligado ao governo estadual, só agora consegue ampliar sua área de cobertura. Mas a duras penas.

Como se fosse um inquilino qualquer, a emissora simplesmente abandonou as instalações anteriormente ocupadas, cabendo ao Detelpe rearranjar o orçamento para fazer funcionar as estações retransmissoras. “Usando o transmissor antigo, se estiver em boas condições, e a infra-estrutura já existente, custa cerca de R$ 6 mil. Só que boa parte precisa de mais investimentos”, estima Wellington Sampaio, diretor-técnico do Departamento de Telecomunicações de Pernambuco (Detelpe).

Funtelpa

O caso mais escandaloso envolvendo governos estaduais e redes privadas de TV também terminou em devolução das RTVs cedidas. Mas só com a intervenção da Justiça foi possível à Fundação de Telecomunicações do Pará (Funtelpa) reaver os 78 canais usados há anos pela TV Liberal e parar de pagar à emissora mais de R$ 400 mil mensais pela manutenção dos serviços.

Aos poucos, a Funtelpa está recuperando fisicamente as antenas e conseguindo instalar novos retransmissores. Em 20 de janeiro, haverá a inauguração simbólica de 13 retransmissoras da TV Cultura do Pará. Os planos da fundação incluem colocar as 78 RTVs funcionando novamente até o fim do ano.

Ministério diz que lei trata só de pessoa física

O Ministério das Comunicações afirmou que o Código Brasileiro de Telecomunicaçõ es de 1962 e o decreto-lei 236 de 1967 só disciplinam as participações acionárias diretas de pessoas físicas em empresas de radiodifusão e que as participações indiretas, por meio de pessoas jurídicas, não são disciplinadas em lei.

Com isso, o ministério entende que os limites de propriedade de televisão -no máximo duas emissoras por acionista, no mesmo Estado, e máximo de dez em todo o país- não se aplicam às ações adquiridas por empresas, como no caso da compra de 30% da TV Record de Franca, no interior do Estado, pela Rádio e Televisão Record S.A, do bispo Edir Macedo.

A informação oficial é que a transferência das ações da TV Record de Franca foi analisada pela Secretaria de Serviços de Comunicação Eletrônica e pela consultoria jurídica do Ministério das Comunicações e, ainda, pela chefia de Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência da República, com assessoramento da Advocacia Geral da União.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, segundo o ministério, autorizou a transferência em 20 de junho de 2005, pelo despacho 52, publicado no Diário Oficial da União.

Para o Ministério das Comunicações, não há risco de a concessão da TV Record de Franca ser cassada, uma vez que ele entende que não foram infringidos os limites de propriedade de emissoras estabelecidos pelo decreto-lei 236.

Universal e Record

Procurada pela Folha, a Igreja Universal do Reino de Deus não quis se manifestar sobre o assunto das concessões de TV e recomendou ao jornal que procurasse o Ministério das Comunicações. A Rede Record foi informada do teor da reportagem, mas também optou por não dar entrevista.