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Sociedade e governo propõem mudanças em emissoras públicas de Sergipe

Está pronta a proposta de reformulação da Fundação Aperipê, órgão que gerencia uma emissora de TV e duas de rádio em Sergipe. Um dos destaques é a previsão de participação social na gestão da Fundação, por meio de um Conselho Curador com caráter deliberativo e composto por maioria da sociedade civil. A minuta do projeto de lei foi desenvolvida por Grupo de Trabalho (GT), composto por representantes do governo e da sociedade civil, que se balizou na carta do Fórum Nacional de Tv's Públicas, e ainda precisa da aprovação do governador e dos deputados estaduais para se tornar realidade.

A minuta mantém o regime jurídico de Direito Público com sustentabilidade via fundo público com recursos próprios para a Fundação, oxigenado com 15% dos gastos com publicidade pelo governo. A proposta também detalha que o avanço no caráter público assegura maiores garantias trabalhistas para o quadro de funcionários e programação que estimule a produção independente com conteúdo compatível com os interesses locais.

A atual presidente da Aperipê, Indira Amaral, lembra que as atuais propostas surgiram devido a um movimento gestado nacionalmente: "Não é uma aventura, nem projeto isolado. É um processo que se fortaleceu no país. Fomos a primeira TV a manifestar o apoio a Rede Pública Nacional e desde 2007 contribuímos com a TV Brasil".

Indira ressalta que o governo do Estado apoiou o desenvolvimento do trabalho do GT. O maior reconhecimento da Fundação pela sociedade é elencado como fundamental para as mudanças. Feito conquistado, segundo Indira Amaral, por projetos de alcance popular como a transmissão do Campeonato Sergipano de Futebol, que atraiu atenção das concorrentes comerciais, e o programa Periferia, que ronda bairros do Estado e da região Nordeste, produzido com autonomia pelo movimento Hip Hop local.

Conselho Curador

Carol Westrup, representante do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social no GT, lembra que o novo Conselho norteou a participação da sociedade civil. "É necessário que as emissoras de caráter público se atualizem sobre as mudanças tecnológicas e busquem mecanismos de financiamento, porém sem a participação social jamais vão se tornar verdadeiramente públicas, mas sim estatais", ressaltou Carol.

Caso as propostas sejam aprovadas, o órgão de radiodifusão pública de Sergipe pode se tornar o primeiro da Rede Nacional de Comunicação Pública (ver matéria) a aproximar a gestão aos moldes da Empresa Brasil de Comunicação (EBC). Atualmente o Conselho Curador da Aperipê é composto por seis membros indicados pelo Poder Executivo e outro do quadro funcional. Com a minuta, ele pode virar um "órgão superior de natureza consultiva e deliberativa, composto de 13 membros" e apenas os secretários de Educação e Cultura terão assentos reservados pelo governo estadual.

Três sindicatos também têm vagas reservadas: jornalistas, radialistas e artistas. Um vaga será exclusiva dos funcionários da Aperipê e seis serão escolhidas por representantes da sociedade civil, via consulta pública e posterior nomeação do Governador.  A última cadeira será do presidente da Fundação, que por sua vez será escolhido pelo Conselho, mas só terá direito a voz e não voto nas decisões do Conselho Curador.

Todos os conselheiros terão direito a remuneração conforme a participação em reuniões. Os indicados via consulta e o representante do quadro funcional terão mandatos de três anos, renováveis por mais três, no máximo. O Conselho também indica os membros do Conselho de Programação.

Direito Público

O Grupo de Trabalho teve todas as propostas aprovadas por consenso. Uma delas foi a de manter o regime jurídico de Direito Público. O desafio é demonstrar que a escolha pode estimular a captação de recursos e ao mesmo tempo dar garantias trabalhistas aos funcionários. "O gargalo da Fundação é a política financeira. Conseguimos debater que o fundo pode criar autonomia, sem precisar transformar o órgão em Direito Privado", afirma Carol Westrup.

Indira Amaral diz que o fundo sozinho não garante a sustentabilidade e que a arrecadação com publicidade é baseada em critérios de audiência, o que dificulta o aumento dos repasses publicitários do governo. Por isso, a proposta inclui uma reserva de 15% de toda publicidade institucional do governo para a Aperipê e também repasse das verbas destinadas à educação no trânsito, arrecadada pelo Departamento de Trânsito de Sergipe (Detran/SE).

O representante do Sindicato dos Jornalistas de Sergipe, George Washington Silva, defende uma revisão nos critérios de distribuição da publicidade: "Para a Globo o governo paga para fazer uma campanha de vacinação. Para a TV pública não paga nada. Isso está equivocado. Da mesma forma que investe na comunicação privada, deve-se investir na pública."

Quanto ao regime de trabalho, George Washington acredita que a transformação da Fundação em Direito Privado poderia vir acompanhada de migração dos funcionários para o regime seletista e uma consequente fragilidade do profissional conforme as mudanças no governo: "Caso fosse transferido para CLT, fica mais fácil perseguir politicamente um funcionário."

O contra argumento enfrentado pelo sindicato é que a estabilização pode gerar acomodação e queda do rendimento. Washington lembra que cabe ao gestor oferecer cursos e possibilidades de reciclagem: "Os profissionais não querem parar no tempo. Eles reivindicam qualificação para as mudanças tecnológicas e estéticas. Nos governos anteriores eles eram envolvidos no sucateamento da emissora. Hoje é preciso que os trabalhadores e empresa evoluam juntos."

 

Associações promovem II Fórum Nacional de TVs Públicas

Nesta quinta e sexta-feira (26 e 27), um evento preparatório em Brasília marca o início do II do Fórum Nacional de TVs Públicas, iniciativa da Associação Brasileira das Emissoras Públicas, Educativas e Culturais (Abepec), Associação Brasileira de Televisão Universitária (ABTU), Associação Brasileira de Televisões e Rádios Legislativas (ASTRAL) e da Associação Brasileira de Canais Comunitários (ABCCom). A primeira edição foi realizada entre novembro de 2006 e abril de 2007 e resultou na Carta de Brasília [veja aqui], documento contendo concepções e diretrizes sobre os desafios à consolidação do campo público de televisão no país.

No evento, representantes das associações e de entidades interessadas na temática da comunicação pública irão debater seis temas: (1) regulamentação, (2) financiamento, (3) infra-estrutura em plataforma de TV Digital Terrestre, (4) migração dos canais básicos de acesso gratuito da TV a cabo ao sinal aberto na transição à tecnologia digital; (5) novos parâmetros de medição da performance das emissoras no que tange à programação; e (6) novos modelos de produção para o campo público.

A questão que receberá maior atenção será a regulamentação da legislação que rege estas emissoras. A Lei 11.652/2008, que criou a Empresa Brasil de Comunicação (EBC), mantenedora da TV Brasil, embora contenha parâmetros de definição dos princípios que devem reger uma televisão pública até então inéditos no âmbito jurídico brasileiro, apenas regulamenta as atividades da empresa operada pela União e de suas emissoras, deixando todas as demais no limbo regulatório.

Já as emissoras que operam no cabo, principalmente as universitárias e comunitárias, desejam sair deste ambiente restrito e ganhar o sinal aberto. O Decreto 5.820/2006, que instituiu o Sistema Brasileiro de TV Digital Terrestre (SBTVD-T), prevê que o Poder Público deve operar quatro canais nesta nova tecnologia: um da cidadania, um da educação, um da cultura e um do Poder Executivo. Porém, esta questão ainda não está devidamente regulamentada.

O II Fórum Nacional de TVs Públicas também irá discutir o financiamento das emissoras, a implantação e as transformações acarretadas pela chegada da TV digital, as questões ligadas à programação – suas características, modos de produção, multiprogramação, regionalização, novos conteúdos voltados às novas plataformas e, principalmente, seus parâmetros de aferição de audiência.

As discussões do evento preparatório serão levadas para a etapa final do II Fórum, prevista para ocorrer no final do mês de maio em Brasília. Nela, as associações pretendem reforçar as recomendações da Carta de Brasília não executadas pelo poder público e sair com uma proposta de regulamentação a ser apresentada ao governo federal e ao Congresso Nacional.

* Com informações da Associação Brasileira de Emissoras Públicas, Educativas e Culturais