Arquivo da tag: Agência

Reestruturação da Anatel proposta por Sardenberg prevê núcleo jurídico paralelo

Há cinco anos a ideia de reestruturar a Anatel causa polêmica dentro e fora da agência reguladora. Mas a mais recente proposta de remodelação da autarquia feita pela presidência da agência tem potencial para alastrar a briga por territórios até então pacificados. Um dos itens mais polêmicos da proposta entregue pelo presidente da Anatel, embaixador Ronaldo Sardenberg, ao ministro das Comunicações, José Arthur Filardi, abriu um novo flanco de batalha com os advogados públicos federais: a agência quer ter um "núcleo jurídico" paralelo à Procuradoria Federal Especializada.

Pelo novo organograma proposto por Sardenberg, essa área jurídica ficaria ligada à Superintendência-Executiva, que já existe na estrutura atual e seria mantida. Iniciativas como esta não são novidade na administração pública. Mas até hoje nenhuma prosperou, existindo reiteradas decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) contra a constituição de núcleos jurídicos na administração.

"A Constituição Federal é bem clara com relação a esse tipo de atividade de consultoria e assessoramento jurídico. Esse tipo de atividade só pode ser feita pela Advocacia-Geral da União (AGU), que possui representação nos órgãos da administração pública, inclusive na Anatel na forma da procuradoria", explica o presidente em exercício da União dos Advogados Públicos Federais (Unafe), Júlio Borges. "Para a Unafe, essa proposta é inconstitucional desde o início", complementa.

Assim que soube da ideia, a Unafe se mobilizou para tentar impedir a criação de um núcleo jurídico paralelo na Anatel, por conta de uma outra batalha envolvendo a procuradoria da agência reguladora: o bate-boca entre o superintendente de Administração-Geral, Rodrigo Barbosa, e a procuradora Fernanda Bussacos. A entidade que representa os advogados federais tem sido a principal apoiadora dos procuradores neste episódio, entrando com representações nas mais diversas esferas da administração e no Poder Judiciário contra o superintendente, que teria atacado verbalmente a procuradora.

Triste coincidência

Para Borges, a inclusão de um núcleo paralelo de assessoramento jurídico na Anatel justamente nesse momento, em que as relações entre a Anatel e a AGU estão estremecidas, é "no mínimo, uma triste coinciência". "É sério porque isso pode parecer algum tipo de resposta à atuação firme da procuradoria na manutenção do cumprimento da lei", avalia. Coincidentemente, a reestruturação da Anatel entregue por Sardenberg ao Minicom foi produzida pela Superintendência de Administração-Geral (SAD), comandada por Rodrigo Barbosa.

Como se trata apenas de uma proposta, a Unafe não tem como adotar nenhuma medida jurídica contra a criação do novo "núcleo". "O que podemos fazer é marcar posição política contra", diz Borges. "A Unafe vai lutar para que essa proposta não avance". A descoberta dos planos da Anatel com relação ao núcleo paralelo também não interfere diretamente nas representações e ações movidas pela entidade contra a Anatel e o superintendente por conta da briga na procuradoria. Mas acentua um incômodo da instituição: a falta de um posicionamento claro do Conselho Diretor da Anatel sobre o bate-boca e, principalmente, sobre o reconhecimento da importância da procuradoria na agência.

"A gente está começando a sentir a necessidade de uma posição mais clara do Conselho Diretor da Anatel, porque esse silêncio pode significar uma espécie de complacência com a postura adotada contra a procuradoria", reclama Borges. Até o momento, a Anatel apenas informou que irá pedir reconsideração do posicionamento da AGU contra o sistema próprio de compras adotado pela agência, alvo da briga entre o superintendente e a procuradora. Com relação à reestruturação, a proposta encaminhada por Sardenberg ao Minicom não teria sido debatida com os demais conselheiros. Segundo fontes da agência, nem todos concordam com a ideia de estabelecer um núcleo paralelo de análise jurídica.

Ouvidor faz duras críticas à Anatel

O ouvidor da Anatel, Nilberto Miranda, fez hoje (26) duras críticas à agência durante reunião do Conselho Consultivo. A falta de transparência, a proximidade maior com o setor regulado do que com a sociedade e a despadronização dos processos sancionatórios adotados nos Pados (Processos de Apuração de Descumprimento de Obrigações) foram algumas das queixas do ouvidor que, segundo ele, são problemas recorrentes na Anatel.

Miranda enfatizou que as falhas da agência foram apontadas no relatório da Ouvidoria apresentado no ano passado e que não tiveram nenhuma solução. Ele citou, por exemplo, a falta de ação da presidência da agência para apuração das responsabilidades pela elaboração e ao apensamento em 180 Pados, por parte da Superintendência de Serviços Públicos, de informe questionando a razoabilidade aos valores das multas aplicadas pela própria SPB. “Entendemos que tal atitude é contrária ao interesse público, visto que o próprio órgão sancionador passou a ofertar aos sancionados os argumentos para os questionamentos administrativos e judiciais”, disse.

Além disso, não viu nenhuma atitude da agência para corrigir a prática de repassar as reclamações dos usuários às prestadoras, sem um efetivo controle do atendimento. Também reclamou da inação da Anatel em nivelar a gerência de relações com os usuários às superintendências, necessidade apontada no relatório da Ouvidoria, objetivando obter o equilíbrio administrativo interno e uma melhor ascendência junto às prestadoras.

O ouvidor criticou ainda a falta de informações à sociedade quanto ao andamento da implantação das ações previstas no PGR (Plano Geral de Atualização das Regulamentações das Telecomunicações) e a indiferença da agência sobre a exagerada participação da assinatura básica sobre a receita com serviços locais das concessionárias (cerca de 61%) e sobre a receita operacional bruta (cerca de 25%).

Miranda disse que o relatório questiona também o termo de contrapartida assinado pela Anatel com a nova empresa Oi/BrT referente à garantia do número mínimo de postos de trabalho, cujo mês de referência é fevereiro de 2008, quando as empresas possuíam cerca de 25 mil empregados. “Ocorre que, quando da publicação do ato de fusão, essas empresas possuíam cerca de 31 mil empregados, seis mil a mais do que em fevereiro, o que permitiu aos empresários a possibilidade de demissão desses trabalhadores, exatamente num momento de crise, onde esforços republicanos estavam lutando para a sua reversão”, disse.

Elogios

A explanação do ouvidor não foi somente de críticas à Anatel. Ele elogiou o trabalho da força-tarefa criado pela agência para a cobrança das arrecadações do Fust (Fundo de Universalização) e Funttel (Fundo de Desenvolvimento), que estavam prestes a perderem a validade. Também considerou exitoso o esforço para implantação da portabilidade numérica no país, ressaltando que as duas ações foram efetivadas com servidores da própria agência.

Miranda considerou também positiva a atitude da Anatel em reconhecer as fragilidades do setor, diante da apresentação do relatório do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), do Ministério da Justiça, que apontou a predominância das queixas (62%) dos usuários aos segmentos regulados pela a agência.

MPF-DF já está investigando a Anatel por falta de transparência

A preocupação com a falta de transparência da Anatel não é só da conselheira Emília Ribeiro, que apresentou proposta de alteração do regimento interno da agência, propondo, entre outras coisas, que as reuniões do Conselho Diretor sejam públicas. O Ministério Público Federal do DF abriu processo preparatório para apurar eventual violação ao princípio constitucional da publicidade dos fatos da administração pública.

O procurador da República Marcus Marcelus Goulart enviou ofício à Anatel na última quinta-feira (18), solicitando informações sobre como a agência tem dado publicidade aos procedimentos para apuração dos descumprimentos de obrigações (Pados), bem como às sessões e votos do Conselho Diretor. O prazo para encaminhamento das informações é de 20 dias.

Para o procurador Marcus Goulart, a notícia sobre a proposta de reformulação do regimento interno pode indicar o interesse da Anatel em modificar sua atitude em relação à publicidade dos seus atos. “Vou acompanhar esse processo para ver se o interesse público é contemplado”, disse.

Caso não mude seus procedimentos, o MPF-DF pode instaurar um inquérito público civil e estudar medidas judiciais para o enquadramento da agência. “A agência tem que prestar contas dos seus atos para a sociedade e para os órgãos de controle”, defende o procurador.

Conselheira apresenta proposta para ampliar transparência na Anatel

A discussão sobre a transparência da Anatel ganhou um novo capítulo nesta segunda, dia 22. Entrou em consulta interna dentro da agência a proposta da conselheira Emília Ribeiro do novo texto do Regimento Interno da agência A conselheira apresentou uma longa proposta de revisão do regimento, sugerindo a mudança de diversos procedimentos da agência para que ela atenda melhor ao princípio da transparência. As propostas que estão sendo submetidas à avaliação dos funcionários da agência estão disponíveis na homepage do site TELETIME.

Após a inclusão do informe de Emília Ribeiro no sistema, o mecanismo de consultas internas sofreu uma pane técnica e a proposta foi retirada da lista de matérias para contribuição. Esta reportagem questionou a Anatel sobre o motivo da consulta não estar mais disponível, mas não obteve resposta da assessoria até o fechamento desta matéria.

O destaque da proposta é a nova disciplina para a realização de reuniões e divulgação de documentos. A conselheira sugere que todos os encontros do Conselho Diretor sejam realizados por meio de "sessões públicas", onde a população possa ter acesso às deliberações sem restrição. Atualmente, as reuniões são fechadas e apenas em raras exceções a discussão pode ser acompanhada pela sociedade – o debate público mais recente foi o que culminou na mudança do Plano Geral de Outorgas (PGO) em 2008.

"É necessário que a Anatel seja não somente modelo de eficiência e equilíbrio, mas também amplamente visível para a sociedade. Em outros termos, por mais qualificadas, fundamentadas e formalmente regulares que sejam suas decisões, tais qualidades devem restar evidentes. A transparência assume, dessa forma, o papel de um fator proeminente de legitimação do modelo vigente", argumenta a conselheira no informe que encaminha a proposta à consulta.

Emília Ribeiro sugere também que todos os documentos que serviram para subsidiar as decisões do Conselho Diretor sejam colocados na página da agência na Internet para leitura do público.

A mesma sugestão é apresentada para o tratamento dos votos dos conselheiros. Atualmente não há um regramento claro sobre a divulgação dos votos e cada conselheiro decide se o apresenta a público ou não. Mais de uma vez a divulgação dos votos por iniciativa individual causou polêmica dentro da agência, especialmente quando o posicionamento apresentado ao público era contrário à deliberação final do Conselho Diretor.

Para o diretor de Comunicação do Sindicato Nacional dos Servidores das Agências Reguladoras (Sinagências), Ney Jobson, a proposta é positiva para a Anatel e a reforma já deveria ter sido feita há muito tempo para assegurar a transparência na autarquia. "O sindicato apoia a proposta e entende que ela é importante e até tardia. É preciso tornar o processo regulatório e decisório adequado à Constituição Federal e às boas práticas da administração pública, na medida em que torna públicas as reuniões e os documentos e estudos que subsidiaram as decisões, assim como os votos, mesmo aqueles que tenham sido dissidentes. Até porque o contraditório é importante para o fortalecimento regulatório", avalia o representante do Sinagências.

Procurada por esta reportagem, a conselheira autora da proposta mostrou-se otimista com a possibilidade de reforma do processo decisório da agência. "Estou muito animada com a abertura da Anatel. Este é um dos grandes anseios da sociedade nos últimos anos e é mais do que necessário atualizar o regimento da agência", afirmou a conselheira, que está nos Estados Unidos representando a Anatel no CTIA Wireless 2010. Emília Ribeiro ponderou que a proposta ainda não se trata da reestruturação da agência reguladora, em processo de análise, mas apenas de uma atualização do regimento com relação aos procedimentos decisórios.

A conselheira disse esperar receber contribuições dos funcionários da agência reguladora para aprimorar a proposta, primeira desse gênero desde que a Anatel foi criada em 1997. A apresentação das sugestões também é inovadora em outro aspecto: é a primeira vez que um conselheiro faz uma proposta direta aos funcionários da casa, apesar de esse tipo de iniciativa estar prevista no regimento em vigor.

Ministro volta a cobrar reestruturação da Anatel

O ministro das Comunicações, Hélio Costa, voltou a aproveitar um evento oficial da Anatel para pedir que a agência reguladora conduza rapidamente seu processo de reestruturação, em gestação há anos na autarquia. "A reestruturação da Anatel é essencial para que a agência esteja preparada para as demandas do futuro", afirmou Costa em seu discurso durante a posse do novo conselheiro da Anatel, Jarbas Valente. Em cerimônias anteriores, Costa já havia dado destaque a este ponto da agenda da autarquia. A última vez foi em junho do ano passado, durante a posse do conselheiro João Rezende.

O projeto de reestruturação previa, originalmente, o abandono da estrutura voltada para "serviços", investindo em uma regulação por "processos". A ideia consiste em reorganizar a agência em superintendências mais sintonizadas com o processo de convergência dos serviços de telecomunicações, ao invés do perfil atual onde a divisão é em serviços "públicos", "privados" e de "comunicação de massa". Não se sabe, porém, se a reestruturação seguirá ainda estas premissas quando for executada pela Anatel.

Oportunidade única

O recém-empossado Jarbas Valente mostrou simpatia pela execução do projeto ao incluí-lo como um dos seus cinco objetivos para seu mandato como conselheiro. Após a cerimônia, Valente reforçou sua defesa na reestruturação. "Quanto mais rápido ela acontecer, melhor", declarou. O conselheiro já promoveu uma mini-reestruturação na Superintendência de Serviços Privados (SPV) quando comandava a área e disse que a experiência foi muito positiva. "Acho que há um ganho muito bom na eficiência do trabalho", afirmou.

A intenção de promover, enfim, a reestruturação da autarquia poderá afetar a escolha de um substituto para Jarbas Valente no comando da SPV. Com a entrada de Valente no conselho, a superintendência passará a ser conduzida interinamente por Dirceu Baraviera. E se a reestruturação deslanchar, a SPV pode ficar ser um superintendente efetivo na SPV. Isso porque Valente defende que ninguém seja efetivado até que a mudança estrutural na Anatel seja concluída.

Nesse quesito, o novo conselheiro não está sozinho, pois outros conselheiros já têm defendido, internamente, esta posição. Além da SPV, a Superintendência de Serviços Públicos (SPB) também está sem um superintendente efetivo, sendo comandada por Fernando Pádua interinamente. Para Valente, essas duas "vagas" acabam ajudando no processo de reestruturação. "Acho que enquanto tivermos substitutos, isso facilita", afirmou. Na visão do conselheiro, efetivar os funcionários na iminência de uma reforma na agência seria prejudicial para os próprios servidores. "Efetivá-los agora geraria expectativas que talvez se frustrem em uma reestruturação".