Mais um projeto de lei voltado para o universo da convergência de meios tramita na Câmara dos Deputados. Desta vez, o autor é o deputado João Maia (PR/RN), com o PL 1.908/07, que foi apresentado no último dia 29 de agosto. Se por um lado o projeto de Maia aparenta ser alinhado aos interesses das empresas de telecomunicações, por outro é um projeto que estabelece cotas para conteúdos nacionais. Sabe-se apenas que não se trata de um projeto que represente um conjunto de interesses, pois as associações setoriais estão, em conversas reservadas com este noticiário, surpresas com o texto.
Segundo a justificativa ao projeto apresentado pelo autor, a idéia é “regulamentar o novo serviço de comunicação eletrônica de massa para garantir a oferta de serviços de TV por assinatura de qualidade com abrangência nacional e que possibilite o acesso a este pelas classes sociais de menor renda, democratizando assim o acesso da sociedade brasileira a conteúdo eletrônico qualificado”. A principal inovação do projeto de João Maia é justamente criar o Serviço de Comunicação Eletrônica de Massa, definido como “um serviço de telecomunicações que possibilita a distribuição, de conteúdo eletrônico estruturado em uma grade de programação, ao público em geral, com acesso mediante contrato de assinatura do serviço e com interatividade”.
O novo serviço pode, de acordo com o projeto, ser prestado por qualquer empresa de telecomunicações, e as teles também podem “produzir, programar, prover e distribuir conteúdo eletrônico no todo ou em parte, observada a regulamentação que vier a ser estabelecida”. Conteúdo eletrônico é definido no projeto como “conjunto de informações de texto, sons, imagens ou de qualquer outra natureza, de caráter informativo, educativo ou de entretenimento, veiculado por qualquer meio eletrônico”.
O projeto também livra as empresas de telecomunicações de qualquer restrição de capital e também não restringe a oferta do serviço de comunicação eletrônica de massa a nenhuma tecnologia.
A única exigência é que a programação distribuída através do serviço de comunicação eletrônica de massa “deverá conter em sua grade pelo menos 50% de conteúdo brasileiro, sendo que deste percentual 10% deverá ser produzido por produtores independentes brasileiros”. Essa disposição, segundo o projeto, vale inclusive para as prestadoras de serviços regidas pela Lei do Cabo.
Definição de conteúdo brasileiro
Conteúdo brasileiro, segundo a definição do projeto de lei, é aquele “produzido em língua portuguesa por empresa produtora brasileira ou por produtor independente”. Pode ser também o conteúdo que tenha participação majoritária de profissionais brasileiros “tais como autores, roteiristas, diretores, atores, apresentadores, locutores, jornalistas ou outros artistas”; ou aquele conteúdo que contenha “sons e imagens de transmissão em língua portuguesa de eventos culturais, esportivos, entre outros realizados no território nacional, dos quais participem majoritáriamente brasileiros que atuem nas áreas de cultura, artística ou desportiva”.
Ou ainda, por fim, “aquele realizado em regime de co-produção por empresa brasileira ou produtor independente brasileiro em associação com empresas de outros países com os quais o Brasil não mantenha acordo de co-produção, assegurada a titularidade de no mínimo 40% dos direitos patrimoniais da obra à empresa ou ao produtor independente brasileiro e utilizar para sua produção dois terços de artistas ou técnicos brasileiros ou residentes no Brasil há mais de 3 anos”.
Regras da TV aberta
A prestadora de serviço de comunicação eletrônica, segundo o projeto, poderá distribuir os sinais das redes de televisão abertas conforme padrões técnicos definidos pelo regulador. E as emissoras de TV aberta ficam obrigadas a ceder o sinal gratuitamente.
O provimento do serviço de acesso à Internet, segundo o projeto, não requer obtenção de “qualquer espécie de licença para a prestação deste serviço de valor adicionado, nem haverá nenhuma restrição à participação de capital estrangeiro na composição societária do provedor”.
O projeto não só diz que o novo serviço de comunicação eletrônica de massa é prestado mediante autorização outorgada pela Anatel, sem limites de quantidade, salvo limitações técnicas, como diz que “a outorga de serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens permanecem como competência do Poder Executivo, devendo a Anatel elaborar e manter os respectivos planos de distribuição de canais”.
O projeto passa ainda para a Anatel a competência para a regulação das questões de conteúdo eletrônico “distribuído através de serviços de telecomunicações, inclusive aqueles que serão prestados por radiodifusores mediante o uso da plataforma de TV digital”. Os serviços de telecomunicações que utilizem a plataforma da TV digital, diz o projeto, serão outorgados, regulamentados e fiscalizados pela agência. Segundo o projeto, o Poder Executivo teria prazo de seis meses para baixar todos os atos, regulamentos e normas necessárias para a implementação das disposições previstas na proposta de João Maia.
A quem interessa
O projeto é, naturalmente, alinhado aos interessante das empresas de telecomunicações. Mas há um porém: introduzir um novo projeto sobre convergência nesse momento atrapalha a negociação das teles com o deputado Jorge Bittar (PT/SP), que relata o conjunto de projetos convergentes que começaram a tramitar no início do ano. As emissoras de TV estão certas de que foram as teles que propuseram o texto de João Maia. Mas sabe-se que não foi uma proposta organizada pelas associações que tradicionalmente representam as teles, segundo apurou este noticiário. Resta saber se foi uma proposta individual de alguma empresa de telecomunicações.
De qualquer maneira, vários especialistas ouvidos por este noticiário consideram o texto proposto por João Maia consistente do ponto de vista jurídico, simples em sua abordagem e inovador em alguns sentidos, como na idéia de propor uma cota de produção nacional no serviço de comunicação eletrônica de massa. É, portanto, um texto forte, que pode alterar o rumo das discussões na Câmara.
A íntegra deste projeto está disponível clicando aqui.
Bittar que projetos convergentes tramitando juntos, e mantém prazos
O deputado Jorge Bittar (PT/RJ) pretende apresentar um requerimento para que o projeto de lei 1.908/2007, do deputado João Maia (PR/RN), tramite apensado aos projetos que tratam de temas semelhantes. "O projeto do deputado Maia mostra que existe um grande interesse sobre o tema da convergência e que o debate está envolvendo todos os setores, o que é muito positivo. Certamente o projeto dele contribuirá muito para os demais que já estão tramitando", disse Jorge Bittar. Ele relata na comissão de comunicação da Câmara os PLs 29/2007, 70/2007 e 332/2007, que tratam da questão da produção, programação e provimento de conteúdos para meios de comunicação eletrônicos. O projeto do deputado João Maia cria o serviço de comunicação eletrônica de massas, e por isso, segundo Bittar, deve tramitar em conjunto.
"Acho que todos os agentes do setor entenderam a necessidade de se buscar um marco regulatório equilibrado", disse Bittar. Ele mantém a intenção de apresentar seu substitutivo aos três (ou quatro) projetos sobre convergência até meados de setembro.
O que virá
Bittar começa a dar indícios mais claros do que vai propor em seu substitutivo. Para o deputado, a nova lei deverá tratar apenas dos meios de comunicação eletrônica de acesso condicionado, ou seja, apenas os meios por assinatura. "Não haveria como colocar a radiodifusão no mesmo grupo, até porque a Constituição separa as coisas". Segundo Bittar, seu substitutivo trará ainda o conceito de cotas de produção nacional, "como a legislação de TV sem fronteiras, da Comunidade Européia". Ele explica que adotará cotas para produção independente e produção regional, mas ainda não está claro como será o enquadramento de conteúdos esportivos e jornalísticos, nem os percentuais obrigatórios.
Bittar é um forte defensor da desagregação de redes para empresas de telecomunicações, até como forme de evitar monopólios sobre várias plataformas, mas reconhece que o trabalho de impor a desagregação deverá ficar para a Anatel, "até porque é um conceito que já está na Lei Geral de Telecomunicações e na Lei do Cabo e não precisaria ser repetido". Mas ele diz que trabalhará com o conceito de poder de mercado significativo (PMS) na hora de avaliar se existe concentração demasiada de redes.
Bittar dá indícios de que gostaria de ver empresas de telecomunicações entrando no mercado de TV paga. "Entendo que esse mercado de TV por assinatura está estratificado, com apenas 5 milhões de assinantes, e a competição pode ajudar o mercado a crescer", diz ele. Para o deputado, a nova lei deverá substituir a Lei do Cabo, "aproveitando as conquistas que ela trouxe para a sociedade". Ele diz ainda que sua proposta busca permitir a criação de mais sistemas de TV por assinatura "de forma simples e desimpedida, respeitadas apenas as limitações tecnológicas", explica.
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