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É hora de salvar as rádios e TV Cultura

Nos últimos anos, mais de 2 mil funcionários foram demitidos da Fundação Padre Anchieta, responsável pelas rádios e TV Cultura de São Paulo. Para se economizar 350 mil reais com o sinal da TV parabólica, 30 milhões de telespectadores foram privados do sinal da emissora. Produções originais foram cortadas ou transformadas em espaço para veiculação de programação terceirizada. Tal retrato difere, em muito, do que vêm à memória quando pensamos na Cultura dos anos 90.

Com programação de qualidade nas rádios e referência na produção de conteúdo infantil, jornalístico e cultural na televisão, a Cultura marcou época com produções como o Castelo Rá-tim-bum, Confissões de Adolescente, Roda Viva, Ensaio, Vitrine e tantos outros. Vários programas de referência, entretanto, foram extintos, como Zoom, Grandes Momentos do Esporte, Vitrine, Cocoricó e Bem Brasil. Agora, programas como Viola Minha Viola e Provocações também correm o risco de acabar. Outros, como o infantil Quintal da Cultura, podem virar mera plataforma para a exibição de desenhos animados tercerizados.

Esse processo vem acompanhado de demissões em massa e de precarização das relações de trabalho, tanto na TV quanto nas rádios, com estrangulamento da equipe de jornalismo e radialismo; enfraquecimento da produção própria de conteúdo, inclusive dos infantis; entrega, sem critérios públicos, de horários na programação para meios de comunicação privados, como a Folha de S.Paulo; sucateamento da cenografia, da marcenaria, de maquinaria e efeitos, além do setor de transportes.

A última fase de desmonte daquela que, durante muito tempo, se colocou como uma alternativa aos meios de comunicação comerciais, cumprindo as finalidades artísticas, culturais e informativas previstas na Constituição Federal para toda a radiodifusão e consolidando um exemplo de comunicação pública reconhecido pela população, pode estar próxima. O governo do Estado de São Paulo reduziu recentemente em 20% o orçamento da Fundação Padre Anchieta, e pretende fazer cortes ainda maiores nos canais.

Em reação a esse movimento, trabalhadores, artistas, comunicadores e organizações da sociedade civil lançam uma nova mobilização em defesa das rádios e da televisão Cultura. Na próxima segunda-feira, dia 10, às 9h, um ato de protesto ocorrerá diante dos estúdios da emissora. Neste momento, o Conselho Curador da Fundação estará reunido, e a expectativa é mostrar a indignação da população contra o desmonte de uma das principais emissoras públicas de comunicação do país.

Um manifesto em defesa da Cultura Viva também está no ar. O texto lembra a excelência do trabalho produzido durante décadas por jornalistas, radialistas, artistas e técnicos, que renderam inúmeros prêmios nacionais e internacionais aos canais. A valorização da cultura nacional, da música clássica, da música popular brasileira e da programação infantil também são destacadas como um legado histórico da Cultura, que, desde os anos 2000, vem sofrendo brutais transformações.

“Acompanhamos esse processo estarrecidos, mas não passivamente. Vamos lutar para impedir o desmanche da Cultura. Queremos a Cultura Viva, refletindo a diversidade e a pluralidade do povo paulista e brasileiro. Queremos a Cultura Viva, mas queremos que ela seja ainda mais pública, que ouça a sociedade, que espelhe de forma criativa a complexidade e a efervescência cultural do nosso estado e do Brasil”, afirma o documento, que está disponível aqui para adesões.

Texto originalmente publicado no Blog do Intervozes na Carta Capital.

EBC: comunicação pública ou governamental?

Há um mês, a repórter Cristiana Lobo, da GloboNews, informou, “em primeira mão”, a notícia, ainda não confirmada pelo Palácio do Planalto nem publicamente pela diretoria da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), de que haverá mudanças na “comunicação do governo”.

A jornalista anunciou que Nelson Breve, atual diretor presidente da EBC, deve voltar a coordenar a Secretaria de Imprensa da Presidência da República; que o atual secretário de Imprensa, Olímpio Cruz, passará a dirigir a programação da EBC; e que Américo Martins, atual diretor geral da EBC, será o novo diretor-presidente da empresa.

Ainda segundo o “off” dado pela GloboNews, as mudanças não ficarão apenas nos cargos de diretoria. Há fontes dentro da EBC que confirmam que mais gente da Secretaria de Comunicação da Presidência da República (Secom) está sendo cotada para aterrissar (ou flutuar) na comunicação pública.

Mantém-se, assim, a já conhecida dança das cadeiras entre o órgão responsável pela comunicação governamental e a direção da empresa pública de comunicação – como já ocorreu com o (ainda) atual presidente da EBC Nelson Breve; com o antigo diretor geral Eduardo Castro; com o atual vice-presidente, Sylvio de Andrade; a atual secretária executiva Regina Silvério; e tantos outros antigos e atuais diretores, assessores e superintendentes da EBC, que fizeram o mesmo caminho, passando pela mestra catraca.

Assim, uma vez mais, a Secom contribui para consolidar a já tão questionada, deslegitimada e promíscua relação entre comunicação pública e governo, num modelo em que não há espaço para o florescimento de uma real e imprescindível autonomia da empresa pública frente ao Planalto.

Tal autonomia, vale lembrar, está legalmente escrita nas primeiras linhas da lei de criação da EBC, que ratifica a separação entre os poderes público e estatal de comunicação previstos na Constituição brasileira. Ela é base para o sucesso e pleno funcionamento de emissoras públicas em todo o mundo. Basta olhar os clássicos exemplos da inglesa BBC ou dos canais da France Télévisions: governo de um lado, comunicação pública de outro, em respeito aos cidadãos e ao interesse público (e não de governo) que deve reger tais espaços.

É sabido que a Lei nº 11.652, de 7 de abril de 2008, dá ao Palácio o direito de nomear a presidência da EBC. Não se questiona a legalidade destas decisões, mas sim sua legitimidade e pertinência. E, ainda, a forma como o Palácio do Planalto, uma vez mais, opta por fazer mudanças na EBC: sem qualquer consulta aos funcionários da empresa, sem qualquer diálogo com a sociedade, e dando o “furo de reportagem” nas mãos da imprensa comercial.

A Secom conhece a importância de mecanismos de gestão da EBC, como seu Conselho Curador, que poderia ser acionado para tornar mais participativas e democráticas as escolhas feitas para a empresa. Entretanto, parece ter optado, mais uma vez, pelo automatismo da dança das cadeiras.

Fica ainda mais difícil compreender a decisão do governo em mudar a direção da EBC antes mesmo do término da gestão Nelson Breve, previsto para novembro, quando o próprio Conselho Curador da EBC convocou, para o próximo mês de agosto, um seminário para discutir justamente o modelo institucional da empresa. Em vez de aproveitar o espaço para debater coletivamente um perfil para a ocupação dos cargos da maior empresa de comunicação pública do País, o processo corre seu já tradicional rumo, na contramão de um projeto de comunicação pública autônoma, nunca antes assumido nestas dimensões por qualquer governo no Brasil, e que poderia hoje ser visto como um legado das últimas gestões para a democracia do País.

Não se trata de criticar os nomes escolhidos nessa sucessão. O atual diretor-geral da EBC, Américo Martins, cotado para a presidência, está inclusive entre os poucos diretores da empresa que tem experiência em comunicação pública e que não vieram da Secom ou de outros órgãos do governo.

Mas mudanças superficiais, como quem passa um verniz ou reboco, pouco atenderão aos desafios colocados para a EBC. Não adianta mudar a cabeça e ter uma calda pesada, amarrada, dura e espinhosa. Não dá para fazer comunicação pública sem um formato de gestão verdadeiramente pública.

E é porque defendemos, desde o início, que processos democráticos e participativos são fundamentais para o êxito da EBC que acreditamos que este projeto pode – e vai – dar certo. É só querer.

Texto originalmente publicado no Blog do Intervozes na Carta Capital.

Vai sair o Canal da Educação. Mas não era um canal público?

Por Veridiana Alimonti*

No último dia 14 de maio, foi lançado o Canal da Educação, um dos canais públicos previstos no Decreto 5.820/2006, que definiu o padrão de TV digital no Brasil e estabeleceu diretrizes para a transição do sistema analógico. A Portaria que regulamenta o canal (2.098/2015) foi assinada entre Ministério da Educação e Ministério das Comunicações. Contudo, o que deveria ser concebido como um canal público parece inaugurar outro capítulo de confusões com o sistema estatal na televisão brasileira.

A previsão de novos canais públicos foi uma das poucas boas notícias que vieram com o decreto da TV digital. A definição do padrão japonês, ainda que com o Ginga brasileiro, e a consignação às emissoras existentes de uma faixa adicional do espectro com tamanho que, na tecnologia digital, permitiria a transmissão de bem mais do que uma programação, marcaram a escolha do governo federal pela alta definição em detrimento de maior pluralidade na televisão. Apesar disso, o decreto de 2006 estabeleceu a criação de ao menos quatro novos canais digitais: do Poder Executivo, da Cidadania, da Cultura e da Educação.

Embora a exploração desses canais tenha sido atribuída ao Poder Público federal, desde aquele momento os canais da Cidadania, da Cultura e da Educação foram compreendidos como parte do sistema público de radiodifusão. Isso está explícito numa portaria de 2009 que reserva canais digitais para o que passou a ser chamado de Serviço de Televisão Pública Digital. A portaria veio depois da edição da Lei 11.652/2008, que criou a EBC (Empresa Brasil de Comunicação) e instituiu princípios e objetivos à radiodifusão pública.

Qual o problema, afinal?

A recente regulamentação do Canal da Educação indica que tanto sua gestão quanto a definição de sua programação serão essencialmente estatais – como ocorre hoje com os canais dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. A Portaria Interministerial que o regulamenta estabelece que o canal será consignado ao Ministério da Educação, com a difusão de até cinco faixas diferentes de programação no sistema digital. O conteúdo de todas elas, ainda não está definido mas se sabe que uma das faixas será voltada para a educação básica, com a exibição de programação da TV Escola, produzida diretamente pelo MEC, e de secretarias estaduais e municipais de educação. Outra faixa terá como prioridade o ensino superior, cuja programação será gerada principalmente por universidades e centros de formação federais, que nem sempre gozam de autonomia em relação à administração pública.

Ainda não há definição sobre o uso das demais faixas, mas tal tendência é preocupante quando consideramos o que deveria ser entendido como uma televisão pública. Num sistema como o previsto pela Constituição brasileira, que divide a comunicação entre estatal, pública e privada, a comunicação pública não é aquela feita diretamente pelo Estado, mas pela sociedade, com diversidade e autonomia na sua gestão. A participação social e a independência em relação ao Estado estão no cerne dessa definição.

Não à toa, a Lei 11.652/2008 consagrou como princípios da radiodifusão pública, mesmo quando prestada por órgãos ligados ao Poder Executivo:

– a autonomia em relação ao governo federal para definir sua produção, programação e distribuição de conteúdo;
– e a participação da sociedade civil no controle da aplicação dos princípios do sistema público de radiodifusão, respeitando-se a pluralidade da sociedade brasileira.

A portaria que regulamenta o Canal da Educação prevê a criação de uma Ouvidoria e de um Conselho, de natureza consultiva, para o canal. Ele deve ter participação do governo federal, do Poder Legislativo e de representantes da sociedade civil. Ainda que estas sejam garantias formais importantes, em si elas não asseguram a efetividade do canal como veículo da sociedade. Tudo dependerá de como serão definidas suas instâncias de gestão, de como serão escolhidos os integrantes da Ouvidoria e do Conselho e de como será decidida a sua produção e programação.

Nesse sentido, o Canal da Cidadania, também previsto no decreto da TV Digital, já regulamentado e em fase mais avançada de consignação de canais, apresenta um modelo mais interessante. Ele está igualmente planejado para se dividir em diferentes faixas de programação. Parte delas será destinada à veiculação das atividades dos Poderes Públicos municipal e estadual, podendo incluir, ainda, uma faixa para União e serviços de governo eletrônico. Todavia, já foi definido que duas de suas faixas serão destinada à veiculação de programas produzidos pela comunidade do município ou que tratem de questões relativas à realidade local. A responsabilidade por essa operação será de associações comunitárias definidas em processo seletivo.

No caso do Canal da Educação, a destinação de suas faixas adicionais ainda não está definida. Nada se fala também quanto ao aproveitamento desse espaço para potencializar iniciativas importantes de comunicação já em funcionamento, como o Canal Saúde, emissora de TV do Sistema Público de Saúde (SUS), acessível por antena parabólica digital. Enquanto iniciativas como essa são desprezadas nos planos dos canais dito públicos, as emissoras comerciais investem em transmitir esse tipo de informação, como se vê na faixa matinal da Rede Globo.

O exemplo reforça a necessidade de se discutir com a sociedade os rumos do Canal da Educação. Sua concepção até agora ficou restrita a órgãos de governo, como as secretarias de educação e associações ligadas à direção das instituições de ensino, não havendo um debate mais amplo sobre o tema dentro do próprio campo da educação.

Financiamento

Outra questão colocada é o financiamento do Canal. Na faixa de educação superior, por exemplo, quais os recursos disponíveis para as universidades públicas federais produzirem a programação considerando os inúmeros problemas de repasse de recursos do MEC para a manutenção das instituições federais?

A questão do financiamento não para por aí. Ela atinge os canais públicos de maneira geral. Atualmente, a infraestrutura para a migração para a transmissão digital representa um pesado investimento na instalação de antenas e torres por todo o país. O governo federal chegou a dar os primeiros passos para a construção de uma infraestrutura única de transmissão para a televisão pública digital, o chamado de Operador de Rede. Porém, o projeto foi abandonado – em princípio por falta de recursos – e não há notícias de que algo semelhante venha a ser desenvolvido. Isso compromete seriamente a qualidade e a penetração dos canais públicos no sistema digital.

O Canal da Educação é, portanto, apenas mais um intrincado capítulo da novela que é a consolidação de um sistema público de radiodifusão no país. Nela, sucedem-se momentos críticos que envolvem a ausência de um projeto coordenado para a comunicação pública, a recorrente confusão entre sistema estatal e público, e entraves e desafios ligados ao financiamento. Em verdade, esses problemas refletem algo anterior e mais profundo – a histórica indefinição do que seria o sistema público brasileiro e o fato de sua consolidação nunca ter realmente entrado na ordem do dia das políticas de comunicação do país.

Sem dúvida, o lançamento do Canal da Educação é uma boa nova em termos da veiculação de programações voltadas à formação crítica do indivíduo, para sua qualificação para o trabalho e para a universalização dos direitos à educação, à informação, à comunicação e à cultura. No entanto, ele só cumprirá o seu papel se estiver fundamentado nos parâmetros centrais da comunicação pública: efetiva participação social e autonomia de gestão e de recursos. Será melhor se pudermos escrever o roteiro do que ainda vem pela frente com mais e mais diversas mãos.

* Veridiana Alimonti é advogada e integrante do Conselho Diretor do Intervozes.

Texto originalmente publicado no Blog do Intervozes na Carta Capital.

FNDC discute com governo medidas para comunicação pública

A coordenação executiva do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) se reuniu com o ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, Edinho Silva, nesta quarta (20/5), para tratar das políticas públicas do setor. Entre as reivindicações, a entidade cobrou maior compromisso com o fortalecimento das emissoras do campo público de comunicação e mudança nos critérios de distribuição das verbas oficiais de publicidade, para garantir maior pluralidade e diversidade na mídia brasileira.

“É fundamental que o governo reconheça, de fato, a comunicação pública como eixo estratégico para a democratização do país”, avalia Rosane Bertotti, coordenadora-geral do FNDC. Rosane ressaltou que a Constituição Federal estabelece a coexistência dos sistemas público, privado e estatal de comunicação, mas historicamente apenas as emissoras comerciais conseguiram se estabelecer com força no país, desequilibrando o ambiente de diversidade informativa. “Estamos falando de um conjunto amplo que reúne centenas de emissoras que atuam sem finalidade comercial e que tem como missão ser reflexo da sociedade, tanto na sua diversidade cultural, quanto na pluralidade de ideias, contribuindo para a construção da cidadania”, acrescenta. Ela entregou ao governo a “Plataforma para o Fortalecimento da Comunicação Pública”, documento da sociedade civil com propostas para o setor, aprovadas durante o Fórum Brasil de Comunicação Pública, em novembro de 2014.

O ministro prometeu analisar as propostas e afirmou que a comunicação pública é prioridade para o governo e que é preciso “resgatar a função social” dessas emissoras do campo público. Edinho também defendeu mudanças na legislação para permitir que as emissoras comunitárias e educativas possam captar publicidade comercial.

Sobre as verbas oficiais de publicidade, o ministro disse que o tema está em estudo pelo governo. Para Bia Barbosa, que representa o Intervozes na coordenação executiva do FNDC, é fundamental garantir sustentabilidade e autonomia econômica para as emissoras comunitárias, mas ponderou que o governo não pode jogar apenas para o Congresso a responsabilidade de promover mudanças normativas. “Há um conjunto de temas que o governo pode e deve enfrentar para que avancemos na garantia do direito à comunicação. No caso das verbas de publicidade, é preciso desenvolver outros critérios que levem em conta pluralidade e diversidade”, ressaltou.

O FNDC também cobrou do governo a instalação de uma mesa de diálogo interministerial, que reúna Secom/PR, Secretaria Geral, Ministério das Comunicações e Ministério da Cultura para debater questões do setor. “As políticas de comunicação estão diluídas em vários ministérios. Seria muito produtivo discutir essas questões em conjunto, com as várias áreas envolvidas”, explicou Bia.

EBC

Outra reivindicação mais urgente apresentada pelo FNDC foi a nomeação dos cinco novos conselheiros, indicados pela sociedade civil, para as vagas em aberto no Conselho Curador da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), ainda no primeiro semestre de 2014. “O Conselho é o principal espaço deliberativo da EBC e expressa o caráter público da empresa, com garantia da participação social e autonomia frente a governos e mercado”, explicou Renata Mielli, secretária-geral do FNDC e do Centro de Estudos da Mídia Alernativa Barão de Itararé. De acordo com Renata, a não nomeação dos conselheiros, que já dura mais de um ano, tem criado mal-estar entre as organizações sociais.

Já o ministro Edinho destacou que a nomeação já foi encaminhada por ele à Casa Civil e aguarda assinatura da presidenta da República. “A decisão é que os nomes indicados respeitem a ordem da lista tríplice encaminhada pelo próprio Conselho Curador”, ressaltou. Com a próxima reunião do Conselho marcada para junho, a expectativa é que até lá os novos conselheiros tenham sido nomeados. O ministro também recebeu cópia do Projeto de Lei de Iniciativa Popular da Mídia Democrática e prometeu articular uma reunião dos movimentos pela democratização da comunicação com a presidenta Dilma.

O secretário-executivo do Fórum, Pedro Rafael Vilela, também participou da reunião.erior da página e no link “download” que irá aparecer logo abaixo.

Fonte: FNDC

Eduardo Cunha entrega comunicação da Câmara para bancada evangélica

Por Mayrá Lima*

Considerado o inimigo n.º 1 um do Marco Civil da Internet na Câmara Federal, o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), atual presidente da Casa legislativa, protagoniza agora outra medida polêmica na área da comunicação. De acordo com o deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ), é dada como certa a indicação do deputado Cleber Verde (PRB-MA) para gerir todo o sistema de comunicação da Câmara – composto por uma emissora de TV, uma de rádio, um jornal impresso, o site da Câmara e toda a estrutura de relações públicas da Casa.

Cleber Verde é membro da chamada bancada evangélica. Vem do Partido Republicano Brasileiro, que possui ligação com a Igreja Universal do Reino de Deus, e foi um dos apoiadores de Cunha, também integrante da bancada formada por parlamentares orientados por dogmas religiosos.

A nomeação de Verde faz parte de uma série de mudanças nas chefias da Câmara. A disputa de cargos pela bancada neste processo visa dificultar a aprovação de leis que contrariem os interesses dos evangélicos, como o projeto de criminalização da homofobia e os de descriminalização do aborto, ou que ampliem o conceito de família, com a inclusão em leis de direitos aos casais homossexuais.

É a primeira vez, desde que a Câmara dos Deputados instituiu um sistema próprio de comunicação, que ocorre este nível de ingerência política em sua estrutura, historicamente dirigida por profissionais de carreira – ainda que a indicação fosse feita pela Mesa Diretora.

Com a estrutura de chefia ocupada por servidores, mesmo que não garantida, conseguia-se uma espécie de equilíbrio entre as forças políticas ali presentes, já que os funcionários da Câmara não podem sofrer pressões político-partidárias na execução de suas funções.

Ao ser indagado pelo deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) sobre a medida, durante reunião do Colégio de Líderes na semana passada, Cunha justificou a entrega da Secretaria de Comunicação ao PRB de uma forma, no mínimo, inusitada. Segundo ele, “esta é a Câmara dos Deputados e não a Câmara dos Servidores”. Para o novo presidente, eleito com os votos de mais da metade da nova legislatura, “não faz sentido a TV Câmara, por exemplo, apresentar, aos domingos, programa sobre chorinho para concorrer com o Domingão do Faustão”.

Ainda que o cargo de Cleber Verde não interfira, diretamente, na tramitação de projetos de lei, seu papel será definidor na maneira de como a Câmara passará a divulgar e cobrir jornalisticamente debates que interessam politicamente à bancada evangélica.

O risco não pára por aí. Segundo Jean Wyllys, Cunha ainda pretende contratar uma pessoa de fora do quadro concursado da Casa para comandar a programação da TV Câmara. Este profissional, denunciou o deputado em uma rede social, seria um dos diretores da Rede Record, também ligada à Igreja Universal. Tal jornalista assumiria um cargo Comissionado de Natureza Especial, cuja faixa salarial chegaria a 16 mil reais.

É importante lembrar que a TV Câmara, ainda que com dificuldades de transmissão em sinal aberto, é uma das emissoras com maior audiência entre o conjunto das legislativas. Em março do ano passado, conseguiu ter mais pontos no Ibope que canais como Sony, ESPN, GNT e até mesmo a HBO.

Mesmo com a missão de divulgar, prestar contas e atribuir transparência aos atos legislativos dos deputados federais, o sistema de comunicação da Câmara dos Deputados conseguiu, nos últimos anos, imprimir uma lógica de prestação de serviços públicos e até mesmo educativos à sua programação geral e cobertura jornalística. Tanto que é no campo público que a TV Câmara se autodescreve quando buscamos informações sobre a TV.

Além do conteúdo essencialmente jornalístico, a emissora veicula um número importante de debates que não se vêem costumeiramente nos canais comerciais e uma programação cultural que prioriza a produção nacional, além de dispor de um acervo considerável de filmes documentais produzidos por seu corpo de funcionários. A diversidade e pluralidade de conteúdos e materiais que atendem a diversos públicos é justamente um dos principais diferenciais da comunicação da Câmara. E, o melhor, sem a vinculação à propaganda comercial que condicione sua produção.

Ao contrário do que entende o deputado Eduardo Cunha, a régua para a medição da qualidade do sistema de comunicação da Câmara nunca pode ser a mesma de uma emissora privada, pois tem objetivos e compromissos de caráter público, construídos pelo próprio legislativo, incomparáveis com os canais comerciais. Caráter este que atende ao propósito de dar visibilidade à extensão do que acontece na sociedade, que é mais ampla e complexa que o lugar do pronto atendimento de seus representantes – no caso, o conjunto dos deputados.

Ao entregar todo sistema para um representante da bancada evangélica, Cunha não só atenta contra a laicidade da comunicação da Câmara como também ameaça a produção artística e cultural que tem na TV e na Rádio Câmara um potencial distribuidor que ameniza o cerco imposto pela mídia comercial à diversidade necessária a este setor.

* Mayrá Lima é jornalista, mestra em Ciências Sociais e integrante do Conselho Diretor do Intervozes.

Texto originalmente publicado no Blog do Intervozes na Carta Capital.