O BitTorrent Live funciona exatamente ao contrário da forma como funcionavam, até agora, as transmissões ao vivo: quanto mais pessoas estão conectadas a um mesmo serviço, mais veloz pode ser a conexão. Impressionante. Este simples conceito poderia revolucionar várias coisas ao mesmo tempo: “Meu objetivo é extinguir a televisão”, disse Bram Cohen, em fevereiro, um pouco sério e um pouco em tom de brincadeira. Também permitirá realizar transmissões, ao vivo, sem grande infraestrutura. É que mais de 40% da circulação mundial usa o protocolo BitTorrent, que o próprio Cohen inventou, há pouco mais de uma década, quando revolucionou a forma de compartilhar arquivos. Agora, ele vem com um serviço de “transmissão”, em linha, que é conceitualmente fabuloso, num momento em que as águas da circulação de informação na Internet estão “quentes”.
A pressão internacional do FBI e de outras administrações para que se retire de circulação os sítios de downloads diretos, como MegaUpload ou os distribuídos como The Pirate Bay, foi visto como uma vitória das empresas defensoras da “propriedade intelectual”. Porém, como se sabe, entre MegaUpload e The Pirate Bay existe uma diferença estrutural: o sítio criado por Kim Doctom permitia realizar downloads diretos (de um só servidor) e isto agilizava as transmissões em tempo real, sem necessidade de baixar o arquivo previamente. A velocidade era consideravelmente boa, mas, também, era simples o rastreamento da fonte: uma vez descoberto o arquivo era fácil rastreá-lo e pedir que fosse dado baixa. The Pirate Bay, ao contrário, era (é) um buscador de arquivos que estão alojados de forma distribuída, por meio deste protocolo chamado BitTorrent. Os arquivos não estão “dentro” do The Pirate Bay, este só funciona como um índice. Estas fontes estão distribuídas por todo o planeta: uma vez plantada a semente, cada pessoa que se conecta, não somente está baixando o material, mas também compartilhando o material baixado com os demais.
Esta forma de comunicação inventada por Bram Cohen, chamado BitTorrent, é a versão mais difundida do protocolo peer-to-peer, ou par a par ou p2p. Não é novidade para ninguém: BitTorrent foi inicialmente planejado por Cohen no CodeCon, em 2001, e em 2002 juntou um pouco de pornografia grátis, para testar seu programa. Esse protocolo foi desenvolvido, inicialmente, para uma empresa de segurança, que tinha que distribuir seus arquivos de forma criptografada, de maneira tal que não se poderia destruir as cópias de segurança e, ao mesmo tempo, fosse impossível conhecer o conteúdo dos mesmos. Atualmente, BitTorrent tem 150 milhões de usuários ativos, com maior permanência que o Facebook ou YouTube.
Desde seu nascimento, as produtoras de Hollywood e dos selos discográficos pressionam aos provedores de Internet para que desacelerem as comunicações realizadas por meio deste protocolo. Na Argentina, todos os provedores tendem a isso, diminuindo a largura de banda dedicada, afetando o conceito de neutralidade da Internet, onde cada “pacote” de comunicação deveria ser considerado da mesma maneira. O que Bram Cohen apresentou, há algumas semanas, sob o nome de BT Live poderia revolucionar os consumos culturais, por meio da Internet: usa fontes distribuídas, porém, não para “baixar” arquivos, mas para transmitir conteúdo, o que se conhece no inglês como “streaming”. No último dia 20 de janeiro, foi transmitido pela primeira vez, para todo o público, um concerto de Dean Guitars (fabricantes de instrumentos musicais) dentro das conferências de NAMM, cuja fonte não era uma só, mas estava distribuída em dezenas de computadores ao redor do planeta.
Para que este protocolo funcione corretamente, Cohen teve que escrevê-lo praticamente de novo, já que a versão existente de BitTorrent tinha problemas de latência, ou seja, o tempo que demora o envio e recepção dos dados. Segundo a declaração de Bram Cohen, em seu blog oficial, o objetivo de BT Live é “eliminar um problema fundamental dos serviços de transmissão, em tempo real (streaming), na Internet, eliminando a necessidade de ter servidores custosos com a infraestrutura e reduzindo consideravelmente as demoras nas transmissões”. O objetivo do acontecimento era experimentar o protocolo que – segundo Cohen – funcionou, incrivelmente, de maneira estável e precisava ser provado de forma massiva. “O streaming ao vivo, do BitTorrent, trabalha com um modelo de distribuição entre aqueles que estão vendo a transmissão. Ou seja, a arquitetura de peer-to-peer aproveita dos recursos de cada usuário, de cada computador, de cada rede e quanto mais gente se soma a uma transmissão, melhora ainda mais a velocidade da mesma”, disse Cohen. BT Live está testando o protocolo, durante semanas, na página oficial live.bittorrent.com, para o qual é necessário instalar o programa de BitTorrent, e um aplicativo que se baixa de sua web. Talvez, o lado mais fraco de BT Live é que quando há poucas pessoas assistindo, a velocidade é menor. Porém, o espírito do protocolo permite que seja mais fácil exibir uma transmissão “direta” para menos pessoas.
Do ponto de vista tecnológico, a proposta de Bram Cohen bane rupturas: até agora se supunha que para “garantir” uma maior demanda de uma transmissão, seria necessário ter maior infraestrutura. BT Live irá mudar essa lógica (sempre e quando o deixar, os provedores de serviço, e não filtrem o protocolo): quanto maior for a demanda de um serviço, maior será também a velocidade de transmissão. Essa lógica, agora, está pensada para as transmissões ao vivo, porém, não demorará muito para que alguém comece a usá-la na visualização de qualquer tido de conteúdo cultural. O grande desafio de Cohen é fazer a indústria compreender que BT Live não é um inimigo, mas um aliado do investimento. Do ponto de vista filosófico, pretende-se recuperar os pilares de uma Internet livre, distribuída e neutra.
Tradução: Cepat – Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores