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Rádios cobram regularização e fim da repressão no Recife

Cartazes, panfletos, dois carros de som, um mini trio-elétrico e centenas de manifestantes de diversos municípios do Estado exigindo o direito de se comunicar. Esse foi o cenário do primeiro protesto já realizado pelas rádios comunitárias em Pernambuco que tomou conta do Centro do Recife na tarde da última sexta-feira (25). O protesto tinha como objetivo massificar a importância das rádios comunitárias para a sociedade e repudiar as ações da Anatel. Nos últimos anos, o Governo Federal tem sido lento no processo de concessões, mas foi rápida a ação de fechamento, pela polícia federal, contra as rádios comunitárias de Pernambuco.  "Estão querendo calar a nossa voz, mas não vão conseguir porque somos a voz do povo", repetia, ainda na concentração do grupo, na Praça Oswaldo Cruz, o coordenador da Associação Brasileira de rádios Comunitárias (Abraço), Napoleão Assunção.

Munidos de mordaças vermelhas como símbolo de repressão, apitos para se fazerem ouvidos à distância, e de paródias sendo tocadas nos carros de som, o grupo partiu em uma caminhada pela Avenida Conde da Boa Vista até a Praça do Carmo, no Centro do Recife. "Rádio comunitária, sem a nossa voz não há democracia" era a frase que ecoava entre os manifestantes, com ênfase maior na palavra final, democracia. Representante da Associação Mundial de Rádios Comunitárias, Amarc, Manina Aguiar definiu a mobilização como "um sucesso". "Do começo ao fim, foi pacífica e decisiva", declarou.

"Esse é apenas o ponto de partida. Estamos unidos para dizer que não queremos ser criminalizados, muito menos intitulados como rádios piratas", declarou Rebeca Oliveira, também da Abraço e representante da Rádio Cultural da Muribeca. Ela adiantou que o próximo passo na luta pela regularização das rádios comunitárias será uma audiência pública na Assembléia Legislativa de Pernambuco, marcada para as 9h do dia 27 de maio. "A intenção é lotar o auditório e mostrar nossa força. Iremos entregar um relatório sobre a repressão realizada pela Polícia Federal no fechamento de rádios comunitárias. Vamos também pedir direito de resposta e cobrar a criação de uma Comissão de Comunicação Comunitária", explicou Rebeca.

Com respaldo na lei, o representante da Rádio Comunitária Alternativa, do bairro de Engenho Maranguape (em Paulista), David Moreno contesta o fechamento de rádios. "A Constituição Federal nos garante o direito de nos comunicar. Como ainda podemos ser banidos de fazer disso um trabalho social?", questionou. A Rádio Comunitária Alternativa, em seus três anos e cinco meses no ar, já recebeu duas vezes a visita de técnicos da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). "Fechamos duas vezes, mas também abrimos as duas", conta David. A comunidade de Engenho Maranguape possui 22 mil habitantes, todos beneficiados com a rádio. "Usamos esse meio de comunicação para informar a população sobre seus direitos. Temos programas especiais voltados aos deficientes, idosos, adolescentes e crianças. É uma maneira satisfatória de interagir com a comunidade", enfatiza David sobre a importância das rádios.

Ação da Polícia Federal

A Polícia Federal de Pernambuco fechou 30 rádios comunitárias do Estado no último dia 17 de março. Na chamada operação 'Segurança no ar', foram cumpridos 56 mandados de busca e apreensão dos equipamentos de rádios que funcionam sem outorga no Recife e em outras cidades como Olinda e Jaboatão dos Guararapes, na Região Metropolitana, Catende, na Mata Sul, Limoeiro e Caruaru, no Agreste. As rádios comunitárias esclarecem que não interferem no tráfego aéreo, partindo do princípio que seus equipamentos são autorizados e homologados pelo Ministério das Comunicações, que determina a potência de 25 Watts conforme a legislação federal.

A manifestação foi coordenada por organizações de rádios comunitárias, entre elas, a Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (ABRAÇO), pela Associação Mundial das Rádios Comunitárias (AMARC), pela Federação de Rádios Comunitárias de Pernambuco e
Associação das Rádios Populares de Pernambuco. Organizações feministas que integram o Fórum de Mulheres de Pernambuco, como o SOS Corpo, apoiaram a ação e vem desde o começo contribuindo na divulgação das notícias sobre esse ato. Além disso, para fortalecer a programação local das rádios, o SOS Corpo produziu CDs com programas de rádio que tratam do combate à violência contra a mulher.

Burocracia dificulta regulamentação de rádios comunitárias

Brasília – A burocracia para concessão da outorga de funcionamento de rádios comunitárias impede a regulamentação dessas emissoras. A afirmação é do coordenador nacional de organização e mobilização da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço), Napoleão de Assunção.

– A burocracia do ministério [das Comunicações] atrapalha pessoas que querem desenvolver um trabalho comunitário sério. Tem processo que você dá entrada agora e só vai receber resposta daqui a cinco, seis anos – diz.

Assunção afirma que rádios que já têm processos de concessão tramitando no Ministério das Comunicações foram fechadas. “Então, ficamos à mercê da burocracia. Muita rádio entregou a documentação de interesse, tem seu processo andando no ministério, mas é como se elas estivessem totalmente fora da lei”.

O coordenador lembrou que uma operação da Polícia Federal fechou 34 rádios comunitárias em Pernambuco no mês passado. Segundo ele, a ação visava ao cumprimento de 56 mandados de busca e apreensão na capital, regiões metropolitanas e no agreste de Pernambuco.

Quatro pessoas foram presas por usarem clandestinamente o transmissor, aparelho que emite as ondas de rádio. Atualmente, de acordo com Assunção, existem cerca de 500 rádios comunitárias no estado, mas apenas 129 são legalizadas.

Na avaliação dele, o fechamento das rádios é conseqüência de pressões de empresas comerciais em Pernambuco. Assunção acredita que o baixo alcance dos transmissores comunitários não prejudica os grandes veículos.

– Os grandes meios de comunicação do estado alegam que perdem uma parcela de avisos publicitários, e que é uma concorrência desleal pois não pagamos impostos nem funcionários. O que não procede, porque são pessoas que fazem um trabalho voluntário, sem fins lucrativos – diz.

Anatel pode apreender equipamento sem aval de juiz, diz STF

A apreensão de equipamento de transmissão de rádio comunitária pode ser feita por agentes da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). A conclusão é do Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao rejeitar reclamação proposta por Cleber Guarnieri contestando a apreensão de equipamentos.

A reclamação foi apresentada contra decisão do juiz da 3ª Vara da Justiça Federal de Mato Grosso, que não aceitou pedido de mandado de segurança. O autor relata que, em abril de 2007, agentes administrativos da Anatel aprenderam, sem mandado judicial, um transmissor linear, modelo RO 25/50 W, série AH 069, de sua propriedade. Por isso, recorreu à Justiça.

Na Reclamação ao STF, o autor alegou que o juiz afrontou decisão proferida pelo Supremo na Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.668. Na ocasião, o STF suspendeu a aplicabilidade do artigo 19, inciso XV, da Lei 9.472/97, sustentando que a busca e apreensão de bens está sujeita a prévio controle judicial.

Ao votar pela improcedência da reclamação, a ministra Cármen Lúcia se reportou a parecer da Procuradoria-Geral da República, que também se pronunciou pela rejeição da Reclamação. O procurador observa que a decisão do juiz federal de Mato Grosso não afrontou decisão do Supremo, porque não se baseou nos dispositivos suspensos pela corte.

“Segundo se extrai dos autos, o juízo reclamado amparou seu entendimento nas informações apresentadas pelo gerente da unidade operacional da Anatel, o qual alega que a medida de constrição está autorizada pela Lei 10.871, de 20 de maio de 2004.”

“Ora, além de tal legislação haver sido editada posteriormente à decisão proferida na ADI 1.668, não há notícia, nos autos, de que essa lei haja sofrido qualquer impugnação, encontrando-se, portanto, em plena eficácia”, concluiu a ministra Cármen Lúcia, citando o parecer da PGR. Ela foi acompanhada pelos demais ministros presentes à sessão de quinta-feira (3/4).

Entidades pressionam governo a agilizar legalização em SP

A repentina legalização da Rádio Heliópolis, que se tornou a primeira rádio comunitária oficialmente autorizada em São Paulo, será usada como mote para a retomada das pressões sobre o Ministério das Comunicações e a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) pela regularização de mais emissoras na capital paulista.

Entidades historicamente ligadas ao movimento das comunitárias querem que o governo esclareça a situação atual dos processos já em andamento de outras organizações, que pleiteiam a mesma autorização conseguida pela Heliópolis, assim como os critérios usados nas avaliações dos dois órgãos.

Na última segunda-feira, um grupo formado por parte destas organizações e entidades de apoio se reuniu em mesa de trabalho do Escritório Paulista da Amarc (Associação Mundial de Rádios Comunitárias) e delineou algumas ações conjuntas para pressionar o ministério e a Anatel. Uma delas é a realização de um ato político que reivindicará transparência e agilidade nos processos de autorização de rádios comunitárias na capital paulista. Outra, dar entrada em pedidos formais para que ambos os órgãos tornem pública a situação desses processos. Participaram da reunião o Escritório Modelo Dom Paulo Evaristo Arns, da PUC-SP, ABRAÇO-SP, Associação Cantareira, Projeto Cala-Boca Já Morreu, Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social e a Oboré Projetos Especiais em Comunicação.

Segundo noticiou este Observatório [veja aqui], a autorização do Minicom à Heliópolis foi motivada pela visita do jogador de futebol Zidane e a possibilidade da passagem do presidente Luís Inácio Lula da Silva pela comunidade. A visita do craque francês aconteceu no dia 16 de março. A publicação do ato do ministério no Diário Oficial da União, no dia 13.

Planejando uma festa para comemorar a outorga, o coordenador de comunicação da União de Núcleos, Associações e Sociedade de Moradores de Heliópolis e São João Clímaco (Unas), Geronino Barbosa, afirmou às entidades reunidas na última segunda-feira que a rádio seguirá participando das ações pela regularização das demais emissoras. “Muitas rádios tem tanta importância para a comunidade como a Rádio Heliópolis e ainda aguardam autorização. Nossa luta é coletiva, é pelo segmento de rádios comunitárias”, completa Barbosa.

A própria comemoração em Heliópolis deverá ser transformada no ato em defesa das rádios comunitárias paulistanas. A data prevista é 10 de maio.

Processo complicado

A Unas estava entre as 117 organizações comunitárias consideradas aptas pelo Ministério das Comunicações para receberem concessão de rádio dentro de aproximadamente 36 áreas de execução. Um dos problemas mais graves a ser solucionado nos processos de regularização é que, em teoria, apenas uma emissora pode operar em cada uma destas áreas. O ministério, no entanto, ainda não divulgou quais das 117 organizações aptas têm de fato chances de receber a autorização. Ou seja, além de todos os requisitos legais, ainda é preciso superar a morosidade governamental em solucionar os impasses que são, aparentemente, técnicos.

Segundo a coordenadora de Radiodifusão Comunitária do Ministério das Comunicações, Alexandra Costa, a demora deve-se justamente aos laudos técnicos enviados pelas entidades. Das aproximadamente 36 áreas de execução, apenas duas estão com problemas jurídicos. “A grande maioria contém algum erro nas especificações técnicas. Ou é a categoria do transmissor, ou a planilha inicial, ou as coordenadas geográficas, etc”, explica Costa. No caso da Heliópolis, o governo federal solicitou que a entidade apressasse a finalização de um laudo técnico, que desse conta das exigências processuais.

A ausência de informações claras sobre o processo foi justamente o que motivou a deputada Luiza Erundina (PSB-SP) a apresentar um pedido de informações ao Ministério das Comunicações em que solicita esclarecimentos sobre o andamento dos processos e a definição dos critérios que decidirão quais organizações receberão as autorizações. A expectativa é que a resposta a esse pedido de informações possa ser apresentada no ato do dia 10 de maio.

Visita de Zidane agiliza legalização da primeira rádio de SP

Quase dez anos depois de aprovada a Lei de Radiodifusão Comunitária, a maior cidade do país recebe sua primeira autorização para o funcionamento de uma emissora nessa categoria. O ato de outorga do canal 87,5 FM à União de Núcleos, Associações e Sociedade de Moradores de Heliópolis e São João Clímaco (Unas) foi publicado na última quinta-feira (13/3), no Diário Oficial da União. Com ele, a Rádio Heliópolis, fechada tantas vezes pela Polícia Federal e tantas vezes reaberta, reafirma sua legitimidade.

A autorização, no entanto, surge em meio a um processo conturbado de regularização das rádios comunitárias em São Paulo. Segundo o Observatório do Direito à Comunicação apurou, a interferência direta da Presidência da República levou o Ministério das Comunicações a realizar em menos de uma semana as etapas finais do processo de outorga da Heliópolis.

A ordem foi dada depois de quase um ano e meio de esforços da sociedade para viabilizar a legalização coletiva de diversas emissoras na capital. E por uma razão exótica: a visita do ex-jogador da seleção francesa de futebol, Zinedine Zidane, à comunidade no domingo, dia 16. O craque francês inaugurou a nova quadra esportiva da Unas.

A Adidas, patrocinadora da benfeitoria e do atleta, convidou o presidente Luís Inácio Lula da Silva para participar do evento. Diante desta oportunidade, o Planalto avaliou quais seriam as ações do governo federal que poderiam ser apresentadas pelo presidente no domingo.

O nome da Rádio Heliópolis surgiu e, com ele, a informação de que a emissora não havia sido regularizada. A avaliação dos assessores do governo foi de que a visita presidencial a uma comunidade onde uma rádio aguarda há anos legalização “pegaria mal”.

O resultado da correria em Brasília beneficia a comunidade de Heliópolis e reforça o pleito das diversas organizações que aguardam a mesma autorização. Ao mesmo tempo, atesta a incapacidade do governo de, em cinco anos, definir uma política pública que dê conta da demanda pela instalação das rádios comunitárias.

Heliópolis e o caos paulistano

Funcionando desde 1992 no centro da maior favela da capital paulistana, a Rádio Heliópolis tornou-se um dos símbolos da perseguição oficial às comunitárias ao ser lacrada, em julho de 2006, por agentes da PF e da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). A mobilização da comunidade e do movimento de rádios conseguiu recolocar o sinal da Heliópolis no ar, com uma solução precária: a emissora passou a funcionar em caráter científico-experimental, numa parceria com a Universidade Metodista de São Paulo.

Neste vai-vem, o caso Heliópolis ganhou também notoriedade jurídica. A Justiça Federal julgou ação movida pela rádio e proclamou que seu funcionamento sem autorização do governo não configurava crime. Foi considerado ilícito administrativo. Ainda assim, há duas semanas, agentes da Anatel estiveram na sede da rádio, prontos para fechá-la novamente. “Ligamos pra direção da Anatel aqui em SP e nem eles estavam sabendo desta ação”, contou Geronino Barbosa, uma das lideranças responsáveis pela emissora.

De um lado, a autorização põe fim às incertezas para a comunidade e, aparentemente, encerra a indecisão do governo sobre como se comportar em relação às rádios comunitárias na capital paulista. De outro, o espontaneísmo com que surge a outorga surpreendeu os vários atores envolvidos no processo de regularização coletiva iniciado em dezembro de 2006, com a publicação do Aviso de Habilitação para a capital paulista.

O Aviso é um tipo de edital para promover o cadastro de interessados em receber a autorização para rádio comunitária. Responderam ao Aviso 154 entidades, das quais 117 foram consideradas aptas para concorrerem à autorização. A Unas era uma destas mais de cem organizações habilitadas.

“O que é mais surpreendente é que, ao longo de todo este tempo, o Ministério das Comunicações não fez qualquer esforço para solucionar a questão paulistana, para chegar a um acordo para colocar o maior número de rádios no ar”, avalia a advogada Anna Claudia Vazzoler, coordenadora do Escritório Modelo D. Paulo Evaristo Arns. O escritório assessorou diversas organizações no processo de habilitação e acompanhou os esforços de acordo feitos pelas próprias rádios para garantirem as autorizações.

Um dos esforços vem sendo colocar o maior número de emissoras em funcionamento, respeitando a distância obrigatória de 4 quilômetros. A decisão antecipada sobre a Rádio Heliópolis, por exemplo, pode dificultar a instalação de rádios por duas outras entidades habilitadas, nos bairros Saúde e Vila Alpina.

Juçara Terezinha Zottis, da Associação Comunitária Cantareira, uma das entidades habilitadas junto ao ministério para receber a autorização, espera que a decisão indique a disposição de acelerar o processo de todas as rádios comunitárias. Mas ela se mostra surpresa. “A gente está se perguntando por que aquela rádio e não todas. Não dá pra saber qual o critério do Ministério.”

Em tempo: o presidente Lula decidiu não participar da atividade com Zidane no domingo.