Em 29 de outubro de 1969, um grupo de pesquisadores se reuniu na Universidade da Califórnia (UCLA), em Los Angeles, para enviar uma mensagem a outros cientistas do Instituto de Pesquisa de Stanford, em São Francisco. A ideia era comprovar que duas máquinas poderiam se comunicar por meio de uma rede. A mensagem que deveria ser enviada era simples: apenas a palavra “log”. No entanto, o único texto recebida pelos cientistas foram as letras “l” e “o”. Na metade da experiência, a conexão caiu e impediu que as máquinas concluíssem a conversa. O projeto, realizado sem muita ambição e batizado com o codinome Arpanet, é considerado o embrião(1) de uma das maiores invenções do último século e que 40 anos depois seria conhecida por gente de todo o mundo como internet.
Leonard Kleinrock, professor de informática da UCLA e responsável pelo envio da frustrada mensagem que deu início à revolução da rede mundial de computadores, participou na última semana de um evento em comemoração à ocasião. Em entrevista à agência de notícias Efe, ele declarou que tinha apenas o objetivo modesto de integrar diferentes máquinas por meio de uma rede. “Dei-me conta disto (da dimensão do projeto) quando apareceu o e-mail. Tratava-se, então, de uma comunicação entre pessoas, não apenas entre máquinas”, comentou.
E foram justamente essas pessoas que passaram a utilizar em grande escala a web — principalmente a partir dos anos 1990, quando ela se tornou comercial — que ajudaram a tornar um emaranhado de computadores interligados numa rede mundial de usuários ávidos em descobrir o que havia depois das fronteiras regionais. Sites de notícias (e, depois, portais de conteúdos), mensageiros instantâneos, redes sociais, páginas de games online, serviços governamentais e uma infinidade de outras possibilidades demostraram que a ideia dos pesquisadores norte-americanos era não só próspera como fundamental para uma nova sociedade globalizada.
No entanto, a rede só conseguiu florescer, durante a época de seu desenvolvimento, por conta da ausência de regras no setor. “Durante boa parte da história da internet, ninguém tinha ouvido falar dela. Isso permitiu demonstrar toda a sua funcionalidade”, conta Jonathan Zittrain, professor de direito e cofundador do Centro Berkman para a Internet e a Sociedade de Harvard. “Hoje existe mais liberdade para que o usuário comum da internet possa jogar, se comunicar e fazer compras, por exemplo”, conta o professor, lembrando que o próprio governo norte-americano, que financiou as primeiras pesquisas como parte de um projeto militar, não se envolveu muito com a invenção e deixou que os engenheiros promovessem a ideia de uma rede aberta.
A web de amanhã
O que, porém, os próximos anos reservam para os mais de 1 bilhão de internautas que surfam nas ondas da internet nos quatro cantos do mundo? De acordo com Kleinrock, qualquer prognóstico para o futuro se parecerá com um filme de ficção científica. Para ele, na próxima década a web sairá da tela do computador para as paredes de edifícios, escritórios e casas, até chegar às “unhas dos dedos ou aos óculos” dos usuários. “Tudo estará baseado na tecnologia integrada, na nanotecnologia, em pequenos sensores que saberão como você é, conhecerão suas preferências e se adaptarão às suas necessidades e aos seus gostos”, defende. Após quatro décadas de existência, Kleinrock sustenta que a internet chegou a um ponto sem volta, no qual os conteúdos superaram a tecnologia como motor que impulsiona o desenvolvimento da rede.
Responsável por coordenar a equipe que efetuou a primeira conexão de internet no Brasil, em 1991, entre a Fapesp e a Energy Sciences Network (ESNet), nos Estados Unidos, por meio de uma rede conhecida como Bitnet, Demi Getschko concorda que nos próximos anos a internet estará sempre em nossa volta. “Num primeiro momento, a rede começou como uma conexão entre poucos computadores. Depois, com a web, os usuários ajudaram a tornar o que ela é hoje. O próximo passo é o que acreditamos ser a internet das coisas, quando cada dispositivo de nossas casas estará conectado”, diz. “A rede vai controlar a geladeira, o ar-condicionado, a TV, e, com isso, vamos conseguir automatizar muitas coisas em nosso dia a dia”, acredita Getschko, que atualmente atua como diretor-presidente do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (Nic.BR).
Para o diretor de desenvolvimento tecnológico da Intel para a América latina, Reinaldo Affonso, a rede deve tornear cada atividade de nossa vida. “Cada vez mais vamos ver a internet nos nossos bolsos, principalmente com o celular oferecendo conectividade. A web também vai para a TV (com o sistema digital), possibilitando ver, de forma simultânea, sites, álbum de fotos em alta definição, jogos de futebol, classificação do nosso time etc.”, acredita. “Também vamos ver em maior número a adoção de sites em 3D, que vão permitir que o usuário interaja com um ambiente amigável”, diz.
(Colaborou Tiago Falqueiro)
Saiba Mais
Longo caminho
Para a internet ser o que é hoje, ela passou por várias revoluções. A primeira delas ocorreu na década de 1970, quando foram criados os protocolos de comunicação TCP/IP, que facilitaram a conexão de várias redes. Na década de 1980, foi inventado um sistema de direções que utilizava sufixos como .com e .org. Somente na década de 1990, depois que o físico britânico Tim Berners-Lee inventou a web, uma subdivisão da internet que facilitaria o uso de recursos de diferentes origens, a internet emergiu como ferramenta de uso comum.
Revoluções
Comércio online
A rede mundial de computadores vem reinventando o modo de comercialização de produtos e serviços. De acordo com a consultoria de pesquisas de mercado e-bit, o Brasil deve fechar 2009 com um total de 17 milhões de consumidores online, alcançando um faturamento de R$ 10,6 bilhões — crescimento de 30% em relação a 2008.
Comunicação
A internet vem decretando a aposentadoria de meios de comunicação como telefone e fax. Cada vez mais pessoas e empresas utilizam ferramentas como e-mail, bate-papo instantâneo e serviços de voz sobre IP (VoIP) para se comunicar, trocar arquivos e documentos e realizar reuniões e videoconferência. A rede diminuiu distâncias e acabou com fronteiras.
Publicidade
Com mais de 1 bilhão acessando regularmente a internet, várias empresas do mercado (de clínicas de fertilidade a montadoras de automóveis) estão querendo ser vistas na web. De acordo com uma pesquisa feita por consultorias do setor, os gastos com publicidade online na Grã-Bretanha no primeiro semestre deste ano, por exemplo, já superam os da TV, atingindo 1,752 bilhão de libras (R$ 5 bilhões).
Redes de amigos
A internet também trouxe mudanças de hábitos e costumes. As novas gerações, por exemplo, se acostumaram a se reunir com amigos em sites de redes sociais. Segundo um relatório da Nielsen Online, 80% dos internautas brasileiros visitaram redes de relacionamento e blogs ao longo de 2008. Aliás, esse tipo de site é o que mais cresce em visitação na web e fica atrás apenas de páginas de busca, portais e software para PCs.
Gratuidade
Com um volume cada vez maior de usuários, as empresas desenvolvedoras de serviços e softwares começaram a buscar outra forma de levantar receitas com seus produtos — principalmente por meio de anúncios pagos — sem ter que onerar seus clientes. Com isso, uma série de serviços na internet, que antes eram pagos, passaram a ser oferecidos gratuitamente. E essa corrente tende a crescer nos próximos anos.