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Voto de Emília Ribeiro reforça peso da Lei do Cabo e questiona número ilimitado de outorgas

A leitura do relatório da conselheira Emília Ribeiro sobre a questão do Planejamento de TV por Assinatura mostra dois aspectos importantes: primeiro, o tamanho do problema político-regulatório sobre o qual a Anatel está debruçada. Segundo, a força que a Lei de TV a Cabo, de 1995, tem e que continuará tendo sobre qualquer processo de decisão que envolva o mercado de cabo.

A mudança do planejamento está em debate desde abril de 2002, tendo passado, desde então, por nada menos do que duas consultas públicas, analisada por sete conselheiros relatores, passou oito vezes pela análise da procuradoria jurídica da Anatel e resultou na elaboração de sete informes da área técnica, isso sem contar a medida cautelar de maio deste ano que, finalmente, propôs a suspensão total do planejamento. O curioso é que ao longo de todo o arrazoado sobre as idas e vindas do processo que visa rever o planejamento, existe apenas uma referência à manifestação do Ministério das Comunicações sobre o tema, ocorrida em 2005. Ou seja, desde 2002, o setor de TV por assinatura praticamente não foi objeto de preocupação em termos de orientação política do governo. Em se tratando de um assunto em que interesses conflitantes aparecem do lado de setores poderosos como o de radiodifusão e o de telefonia, fica claro que a maior dificuldade de levar adiante a abertura do mercado de TV paga talvez tenha sido, em essência, de natureza política. E fica claro também que muitas das decisões tomadas pela agência até aqui foram decisões de natureza muito mais política do que técnica.

Assunto decidido

A conselheira inicia a análise de seu voto dizendo que o conselho diretor já decidiu sobre o tema ao expedir a cautelar que suspendeu o planejamento. “Forçoso reconhecer, nesse sentido, que a partir da referida decisão, o Conselho Diretor antecipou a deliberação do processo ora examinado, traçando os contornos do Planejamento dos Serviços de TV a Cabo e MMDS e as diretrizes para sua outorga, e ratificando, em última instância, a proposta de se eliminar em todas as áreas de prestação de serviço, de forma imediata, a restrição do número limitado de operações”, diz a conselheira.

Emília relata que a própria área técnica já considera que essa será a posição final do conselho: “A expectativa é de que o novo planejamento (…) seja aprovado com a sugestão de eliminação do número de prestadores por áreas de prestação, visando dar maior dinamismo no setor”, disse a superintendência de comunicação de massa em um despacho interno.

A análise que se segue, contudo, procura demonstrar que existem, nas inúmeras manifestações das áreas técnica e jurídica da Anatel ao longo de todos esses anos em que o processo está em andamento, e também nas manifestações do Tribunal de Contas da União, posições antagônicas sobre aspectos fundamentais, como a possibilidade de entrada das teles, limites ao número de outorgas e o preço a ser cobrado.

Limites de outorgas

Uma das posições mais importantes da análise da conselheira Emília Ribeiro é a de que a lei específica, a Lei do Cabo, prevalece em caso de conflitos sobre a Lei Geral de Telecomunicações. Daí que o serviço de TV a cabo, por força de lei, não pode ser analisado e interpretado como um simples serviço privado de telecomunicações, cuja distribuição de outorgas pode ser feita irrestritamente. Essa foi a leitura também do TCU. Nesse sentido, argumenta o voto da conselheira, o regulamento e a norma do cabo, que regulamentam a lei, precisam ser levadas em consideração, e eles estabelecem claramente “a discriminação das áreas de prestação do serviço, de acordo com a viabilidade econômica da operação, e o número de concessões a serem outorgadas em cada área”.. Daí a necessidade de realização de estudos econômicos para estabelecer estes limites.

Sobre o argumento de que não há razão técnica que imponha limites ao número de outorgas, a ponderação da conselheira Emília Ribeiro é que não houve, nos últimos anos, nenhuma mudança tecnológica que mudasse substancialmente a interpretação que foi feita em 1997, quando o regulamento do Cabo, publicado por decreto da presidência da República, a Norma do Cabo, editada pelo Ministério das Comunicações e o Planejamento de TV por Assinatura, também elaborado pelo Minicom, estabeleceram a necessidade de limites de outorgas por área. “Nesse sentido, um aspecto fundamental a ser considerado é justamente a ausência, no âmbito do presente processo, de estudos econômicos que, a exemplo daqueles que suportaram a elaboração do planejamento ora cautelarmente suspenso, sustentem a participação de um número ilimitado de prestadoras no mercado de TV a cabo e, consequentemente, a inexigibilidade de licitação para novas outorgas”. Além disso, diz o voto da conselheira, a Lei do Cabo estabelece os princípios da rede única e rede pública, que prevê o compartilhamento de redes e esforços que evitem a sua duplicação.

Preço

Em relação à questão do preço da outorga, a conselheira Emília Ribeiro, em seu parecer, destaca que houve, em diferentes momentos, diferentes manifestações da área técnica, ora sugerindo uma cobrança baseada no faturamento da operadora, ora sugerindo a cobrança de preço administrativo. Diante de posições conflitantes, a conselheira fica com uma delas: a de que se considere “todos os investimentos, custos operacionais, administrativos e tributários, receitas operacionais e acessórias, reinvestimentos, que considera inclusive, os perfis de diferentes mercados locais”, ou seja, não é possível definir, de antemão, que o preço administrativo será a melhor solução. Este assunto é objeto de um processo específico em trâmite na agência, relembra a conselheira.

Teles

Por fim, sobre a possibilidade de entrada das teles no setor de cabo, a conselheira relata as diferentes manifestações técnicas e jurídicas que reforçam a leitura da Lei do Cabo de que as concessionárias de telefonia só podem entrar em caso de “desinteresse manifesto de empresas privadas, caracterizado pela ausência de resposta a edital relativo a uma determinada área de prestação de serviço”. Para a conselheira Emília Ribeiro, “é nosso entendimento que a prestação do serviço de TV a cabo por concessionária de STFC, suas coligadas, controladas ou controladoras, só seria possível após verificação da inexistência de outros interessados, respeitando a norma de preferência prevista na Lei de TV a Cabo”. Como ela não admite de antemão a hipótese de um número ilimitado de operadores, essas condições teriam que ser verificadas caso a caso.

Com base em tudo isso, a conselheira recomenda a área técnica que refaça os estudos técnicos para analisar o número de outorgas por região, bem como proponha mecanismos que assegurem o compartilhamento de infraestrutura e, por fim, que a questão do preço seja definida em processo específico já em curso.

Justiça suspende liminarmente cobrança do ponto-extra

Uma decisão tomada pela Justiça Federal de Santa Catarina poderá reacender a polêmica que durou anos sobre a legitimidade de se cobrar dos clientes de TV por assinatura pela oferta de pontos extras. A juíza federal Cláudia Maria Dadico concedeu liminar proibindo a cobrança do aluguel dos equipamentos, como a Anatel vinha autorizando até então. A ação civil está sendo movida pelo Ministério Público de Santa Catarina, mas a decisão liminar não ficou restrita aos clientes cadastrados na comarca de Joinville, onde o caso será julgado.

O entendimento da juíza é que a suspensão da cobrança deve valer para todos os clientes das empresas protestadas. No caso, todos os consumidores da Net Serviços em Florianópolis, da Via Embratel e da Sky na cidade não poderão ter seus equipamentos classificados como ponto-extra cobrados durante a vigência da liminar. A decisão da juíza Cláudia Dadico pode gerar conseqüências ainda mais amplas, com a reabertura de todo o debate sobre a regulamentação do assunto.

Isto porque a juíza determinou que a Anatel suspenda os efeitos da Súmula nº 9, de 19 de março de 2010, que permitiu às operadoras de cabo definir livremente o sistema de contratação dos conversores e decodificadores "sendo cabível, portanto, que o façam por meio de venda, aluguel, comodato, dentre outras, vedado o abuso do poder econômico". Para a juíza, a súmula entra em contradição com o Regulamento de Proteção e Defesa dos Assinantes dos Serviços de Televisão por Assinatura, editado pela própria Anatel por meio da Resolução nº 528/2009.

Ofensa aos direitos

"Verifico que a edição da mencionada Súmula acarretou a responsabilidade da Anatel por ofensa aos direitos dos assinantes, na medida em que, por vias transversas, permitiu e chancelou a cobrança de valores em razão dos pontos-extras, prática vedada por sua própria Resolução 528, de 2009 que permite a cobrança tão somente da instalação e das despesas decorrentes de reparos da rede", analisou a juíza. A Justiça exige ainda que a Anatel abra procedimentos administrativos para penalizar as empresas que cobraram pelo aluguel dos equipamentos, descumprindo assim a previsão de gratuidade desse serviço descrita no regulamento da própria agência nos artigos 29 e 30.

A Anatel, que figura entre as rés no processo movido pelo MPF de Santa Catarina, pode ser punida com multa diária caso descumpra a liminar. Inclusive, a pena fixada para a agência reguladora é o dobro da estipulada para as operadoras de cabo que alugaram os equipamentos sob autorização da Anatel. Enquanto a multa prevista para a Anatel é de R$ 10 mil por dia, a das empresas é de R$ 5 mil. A multa contra a agência reguladora será aplicada "em face da pessoa física responsável pela prática do ato".

No caso específico das empresas, além de não poder cobrar pelo ponto-extra, as operadoras também não poderão interromper o fornecimento dos equipamentos ou faturar indiretamente pela oferta dos decodificadores. Em qualquer uma dessas hipóteses, será aplicada a multa judicial fixada. O entendimento da Justiça no caso foi de que as empresas desrespeitaram as regras do setor e fizeram cobranças indevidas, já que o regulamento só permite o repasse dos custos de instalação e reparo aos clientes.

"Ademais, a cobrança de valores mensais a título de 'aluguel' dos equipamentos necessários ao acesso dos canais contratados pode ser caracterizada como enriquecimento ilícito e prática abusiva, pois, não há a prestação contínua de serviço que justifique a cobrança, sendo suficiente a cobrança de uma única taxa de adesão para tal desiderato", conclui a juíza. O caso foi considerado tão grave pelo potencial lesivo do mercado consumidor que a juíza concedeu liminar inaudita altera pars, ou seja, sem apresentação dos argumentos finais das empresas. A NET foi a única a não se pronunciar desde o início do processo, segundo o relatório.

Ainda não há previsão de julgamento do mérito da ação e a Anatel não confirmou se já foi notificada da decisão.

PL 29 continua com futuro incerto no Congresso Nacional

Não é novidade a tramitação tumultuada do PL 29/2007 na Câmara dos Deputados, um dos projetos mais controversos envolvendo o setor de telecomunicações, senão o mais polêmico. A proposta, que inicialmente visava apenas derrubar as barreiras legais para que as concessionárias de telefonia entrassem no mercado de TV a cabo, ganhou novo escopo ao longo dos três anos de discussão na Câmara dos Deputados e agora abrange também uma intricada política pública de fomento do audiovisual, que definitivamente não agrada a todos os segmentos afetados pelo projeto.

Nesta semana, um recurso foi apresentado pelo deputado Régis Oliveira (PSC/SP) para que o PL 29 seja votado também pelo Plenário da Casa. A manobra, articulada pela Sky e pela Associação Brasileira dos Programadores de Televisão por Assinatura (ABPTA), já era aguardada. Ainda assim, a apresentação do recurso com 113 assinaturas reacendeu as disputas políticas que envolvem a matéria e ainda causa muita confusão aos não familiarizados com as peculiaridades do rito regimental da Câmara dos Deputados.

A ala defensora do projeto já conseguiu convencer 39 deputados a retirarem suas assinaturas do recurso, que foi publicado nessa quinta-feira, 27, com 74 signatários válidos. Mas esta publicação não significa que o destino do PL 29 está selado para ir a Plenário. Para que se possa entender o funcionamento do recurso, algumas regras regimentais precisam ser esclarecidas.

Confirmação

Um Recurso nada mais é do que um instrumento classificado como "ordinário" para que os deputados peçam uma análise do pleno de parlamentares. Ele não serve apenas para levar projetos terminativos (como o PL 29) para o Plenário. Dúvidas sobre a regra regimental na tramitação de um projeto, por exemplo, podem virar objeto de recurso ao pleno, onde a maioria dos deputados dá a palavra final sobre o assunto discordante.

Por ser uma matéria ordinária, o recurso também precisa cumprir o rito de qualquer matéria legislativa. Isso significa que, mesmo com o apoio de 74 deputados, a solicitação contida no recurso não tem efeito automático e precisa ser deliberada, como qualquer projeto ou requerimento, pelos deputados antes de ser realmente válido. Ou seja, as assinaturas valeram apenas para que o deputado Régis Oliveira pudesse entrar com o recurso, mas agora o pedido tem que ser votado no Plenário para que o PL 29 realmente passe pelo pleno.

A regra do recurso

Para um parlamentar apresentar um recurso são necessárias 52 assinaturas apoiando a iniciativa, o que corresponde a 10% do número de deputados mais um. Recursos sem o número mínimo de assinaturas sequer são recebidos pela Secretaria Geral da Mesa Diretora. No caso do pedido relacionado ao PL 29, Oliveira conseguiu mais do que o dobro do necessário: 113 signatários.

Os parlamentares que assinam um recurso têm o direito de se "arrepender" e retirar suas assinaturas até a data de publicação. No caso do PL 29, os apoiadores do envio do projeto diretamente ao Senado Federal conseguiram convencer 39 deputados a cancelarem o apoio à iniciativa. Assim, a lista final publicada no Diário da Câmara dos Deputados ontem ficou com apenas 74 signatários, número ainda assim superior ao mínimo regimental.

Votação do recurso

Com a publicação, o recurso agora entra no regime de tramitação tradicional das matérias que irão a Plenário. Ele entra na "fila" de documentos ordinários, onde constam não só recursos, mas outros instrumentos legislativos como projetos de lei comuns, requerimentos, mensagens, etc. Para se ter uma ideia da dimensão da "fila", cerca de 100 recursos estão na frente do 438/2010, que pede a votação em Plenário do PL 29. Se forem contados apenas os projetos de lei aguardando análise do pleno, o número atinge impressionantes 1,2 mil.

O recurso 438 ficará no fim desta fila de matérias, ou seja, com mais de mil propostas com prioridade de votação por terem chegado primeiro à Mesa Diretora. Ainda assim, há maneiras de a proposta "furar" essa fila. Uma delas é a apresentação de um requerimento de urgência, tal qual se faz com projetos. Esse requerimento de urgência também precisa ser votado pelo Plenário, mas esse tipo de documento não segue o rito tradicional na maior parte das vezes, sendo apreciado prioritariamente.

Outra maneira é pedir prioridade, urgência ou antecipação da votação por meio de um acordo firmado pelo Colégio de Líderes. Essa estratégia exige um acordo das lideranças, uma vez que a Câmara dos Deputados tem por praxe passar à frente apenas projetos e propostas que já disponham de acordo firmado. Por ora, nenhuma das duas alternativas foi adotada para agilizar a análise do recurso.

Retirada do recurso

Por outro lado, há mais uma ferramenta para bloquear a vigência de um recurso. A manobra regimental consiste na apresentação de um "Requerimento de Retirada", mas essa alternativa tem suas peculiaridades quando se trata de um recurso ao Plenário. Os deputados contrários ao debate de um projeto no pleno devem convencer ao menos a metade mais um dos signatários do recurso a assinarem o requerimento de retirada. No caso o PL 29, os apoiadores do projeto precisam de 38 assinaturas para validar a estratégia. Mas vale frisar que essas assinaturas devem, necessariamente, ser de parlamentares que assinaram o pedido de recurso.

O requerimento de retirada não tem um prazo fixo para ser apresentado. O prazo é o da votação do recurso. A lógica é simples: se o recurso for aprovado pela maioria dos deputados no Plenário, não faz sentido deliberar sobre um pedido de retirada, mesmo que seja dos apoiadores da iniciativa. Assim, os deputados têm até o dia da votação do recurso (ainda sem data por conta da longa fila) para se "arrepender". Depois da decisão do pleno não há mais o que se fazer e o PL 29 será cabalmente votado no Plenário da Câmara dos Deputados.

Regime terminativo

Toda a confusão sobre a votação ou não no Plenário do PL 29 só existe porque este é um projeto que tramita em regime "terminativo". Esse tipo de projeto tem votação conclusiva nas comissões da Câmara dos Deputados, ou seja, não passa pela análise do pleno cabendo apenas às áreas temáticas decidir o destino da matéria.

Normalmente esse regime é aplicado a projetos técnicos, que podem tranquilamente ser avaliados pelos grupos temáticos, desafogando a pauta do Plenário. Mas, seguindo o princípio democrático, sempre é possível pedir que o pleno delibere sobre o assunto, utilizando-se de vários argumentos políticos: relevância para o país, controvérsia nas comissões (pareceres contraditórios) ou mesmo tensões políticas em torno das matérias. Para apresentar o recurso em si não é exigida uma justificativa clara, mas apenas a discordância sobre a análise conclusiva de qualquer uma das comissões.

Redação final

Caso a estratégia do recurso funcione, o PL 29 passará por uma votação comum no Plenário. Sempre é possível solicitar "urgência" ou "urgência urgentíssima", mas, em princípio, o projeto irá para o fim da fila de entrada na pauta, o que pode retardar em meses a sua votação. Uma vez votado, o pleno decidirá a redação final do projeto e o despachará ao Senado Federal. Para os parlamentares, apoiadores ou opositores do projeto, é certo que a votação em Plenário impedirá o encaminhamento ao Senado ainda em 2010.

Caso a estratégia seja frustrada, com a apresentação de um requerimento de retirada, o PL 29 não seguirá automaticamente ao Senado como muitos pensam. Uma última etapa ainda precisa ser cumprida nas comissões antes do despacho aos senadores: a aprovação da redação final do projeto. Se a proposta não passar pelo Plenário, ela será devolvida à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), última área que analisou a matéria na Câmara. A CCJ então terá que compilar a redação final do projeto, considerando a tramitação nas demais comissões. O trabalho é relativamente simples e consiste em uma mera pro forma regimental.

No entanto, exatamente por ser uma pro forma, há uma saga de prazos regimentais para a devolução do PL 29 da Mesa Diretora aos Avulsos e, depois, à CCJ para só então começar a compilação da redação final. A comissão tem o prazo de 10 sessões (conta-se as realizadas pelo Plenário) para finalizar o texto. Concluído o documento, ele passa por uma votação praticamente simbólica da redação. O tempo para a votação é de duas sessões, contadas a partir da publicação do texto ou da distribuição aos gabinetes, o que acontecer primeiro.

Só então, o PL 29 será, de fato, encaminhado aos Avulsos novamente com destino ao Senado Federal. Essa jornada para a finalização do texto mostra que, mesmo o esforço para que o projeto siga ainda em 2010 para o Senado Federal pode ser frustrada com o simples fato de ter sido apresentado um recurso. Segundo técnicos da Câmara dos Deputados, a elaboração da redação final e a votação têm sido resolvidas rapidamente pela CCJ. Mas os deputados mais otimistas, que apostavam que o projeto poderia ser até mesmo votado pelo Senado neste ano, já não contam mais com essa tramitação veloz do projeto. A perspectiva agora é que, com ou sem Plenário, o PL 29 só retome concretamente sua tramitação em 2011.

Votação do PL 29 na CCJ fica para maio

O polêmico PL 29/2007, que estabelece novas regras para o setor de TV por assinatura e para a veiculação de conteúdo nacional, deve começar a ser debatido na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados na próxima terça-feira, 27. Mas não há a intenção de se fazer a votação no mesmo dia. A preocupação do relator, deputado Eduardo Cunha (PMDB/RJ), é que se construa um bom acordo entre os parlamentares, garantindo assim a aprovação do texto de forma tranquila.

“Não tenho o objetivo de votar o projeto hoje”, afirmou o deputado durante a sessão desta terça. “Só vou colocar em votação quando houver um amplo acordo”, arrematou. O projeto era o item 149 da pauta, mas um pedido de inversão assegurou que a discussão do calendário de debates ocorresse ainda nesta terça, 20. Na próxima quarta-feira, 28, a CCJ deverá debater e votar um dos projetos mais polêmicos na casa, o Projeto de Lei Complementar nº 518/09, mais conhecido como “Ficha Limpa”. Por conta disso, a votação do PL 29 só deve ocorrer a partir da primeira semana de maio.

Polêmicas

Ao deixar o Plenário da CCJ, Cunha explicou que sua maior preocupação não é com a quantidade dos destaques que os deputados podem apresentar na comissão – pedidos para deliberação em separado de emendas que foram rejeitadas pelo relator -, mas sim de que se pacifique as principais polêmicas na tramitação da proposta na comissão. A polêmica envolvendo os riscos de que as mudanças implementadas com a política de cotas pressionem os operadores a retirar canais religiosos do line-up parecem ser o maior desafio.

Essa polêmica foi iniciada depois que empresas de TV por assinatura procuraram parlamentares da bancada evangélica sugerindo que, mantida a redação atual do projeto, os canais religiosos seriam retirados da programação.

Isso gerou um movimento na bancada para que os programas religiosos sejam incluídos na classificação de “conteúdo qualificado” para que, assim, tenham sua veiculação garantida.

A interpretação gera controvérsia nos bastidores da negociação e o tema continua dando dor de cabeça aos articuladores da aprovação do PL 29. O próprio relator, que é evangélico, tem tratado o assunto de forma delicada. “Eu preciso ter muito cuidado para que não mexer no mérito do projeto tentando resolver isso”, afirmou a esta reportagem. Regimentalmente, a CCJ só pode avaliar os projetos do ponto de vista da legalidade, juridicidade e constitucionalidade, sem direito a mexer no mérito das propostas legislativas.

Transição das TVAs

Também há problemas nas quatro emendas supressivas apresentadas pelo próprio relator, tirando o regime de transição específica do Serviço Especial de Televisão por Assinatura (TVA) para o futuro Serviço de Acesso Condicionado (SAC).

O relator contou que pode alterar o texto do projeto, mudando algumas expressões que em seu entendimento são inconstitucionais, mas, ainda assim, assegurando o regime especial de transição da TVA. Cunha não detalhou, no entanto, se irá de fato retirar alguma emenda supressiva ou apenas suavizá-las.

PL 29 recebe 22 emendas na Comissão de Justiça da Câmara

[Título original: Com 22 emendas na CCJ, PL 29/2007 terá primeiro debate jurídico]

 

A maior parte dos observadores que acompanha a tramitação do PL 29/2007, que cria novas regras para a TV paga e para o setor audiovisual, apostava que as disputas se dariam, a partir de agora, no Senado. Poucos acreditavam que ainda surgisse, na Comissão de Constituição e Justiça (última etapa de tramitação do projeto na Câmara), algum fato novo que levasse a mais tempo de discussão do projeto pelos deputados.

O fato é que o PL 29/2007 recebeu nada menos do que 22 sugestões de emendas na CCJ, e a maior parte delas com uma complicada e abrangente argumentação sobre a constitucionalidade de partes importantes do texto em debate. Em resumo, o deputado Eduardo Cunha (PMDB/RJ), relator do projeto na CCJ, terá que buscar muitos argumentos jurídicos no Direito Constitucional para rechaçar as emendas propostas. Ou, se optar por acatá-las, terá que retirar do PL 29 praticamente tudo o que diz respeito a conteúdos, deixando o texto muito próximo do PL 29 original proposto pelo deputado Paulo Bornhausen em fevereiro de 2007. Ou seja, terá que excluir as principais inovações introduzidas pela Comissão de Ciência, Tecnologia e Comunicação.

As emendas foram apresentadas por quatro deputados: Gerson Peres (PP/PA), Zenaldo Coutinho (PSDB/PA), Regis de Oliveira (PSC/SP) e Paes Landim (PTB/PI). Em essência, as emendas contestam os artigos que criam distinção entre programadoras nacionais e estrangeiras; a imposição de cotas na programação e nos canais; a regulação da atividade de programação e empacotamento; o poder da Ancine para estabelecer horários com o fim de direcionar a atividade de classificação indicativa; o poder de credenciamento e análise dos conteúdos pela agência de cinema; as restrições à atividade de estrangeiros no campo da produção de conteúdo; os limites à publicidade em TV paga; a imposição de contribuições para o fomento audiovisual entre outros aspectos.

O importante das emendas são os argumentos e os novos campos de debate que se abrem. Eles se referem, como não poderia deixar de ser (dada a natureza da CCJ), a questões de natureza constitucional que nunca foram analisadas pelo Congresso no que diz respeito à Comunicação Social.

Por exemplo, a discussão sobre a possibilidade ou não de impor a estrangeiros limites na atividade artística e informativa em alguma área que não seja a radiodifusão ou empresas jornalísticas; ou ainda, a atuação do Estado como regulador de uma atividade de comunicação privada que independe de concessão pública. Até mesmo o papel que a Ancine ganharia no credenciamento de programadores e empacotadores caso o PL 29 fosse aprovado hoje é questionado com o argumento constitucional de que a necessidade de aprovação prévia da agência pode configurar censura. Em nenhum momento das discussões do PL 29 nas três comissões em que ele tramitou até agora (Comissões de Assuntos Econômicos, Comissão de Defesa do Consumidor e Comissão de Comunicação) estes argumentos foram colocados. Os debates, até então, se deram apenas em questões econômicas, políticas e mercadológicas.

"As atividades de programação e empacotamento são atividades comerciais puramente privadas e não dependem de concessão pública. Trata-se de atividade econômica livre, que não pressupõe restrições e nem necessita de outorgas. O estabelecimento de obrigações e princípios não previstos na Constituição Federal é inconstitucional, submetendo a liberdade de expressão das atividades artísticas, informativas e culturais ao arbítrio de um controlador regulador, o que é vedado", argumenta o deputado Paes Landim em algumas de suas emendas.

Sem restrições

"O serviço de acesso condicionado, exercido em regime privado, é sujeito à regulação das telecomunicações na formado artigo 21, XI da Constituição. Já a 'comunicação' em si, não pode ser objeto de restrição ou impedimento por autoridade administrativa eis que feriria cláusulas Constitucionais pétreas, especialmente o direito de comunicação", completa.

Para o deputado, o serviço de acesso condicionado, que é telecomunicação, não se confunde com radiodifusão, e, portanto, "não pode obedecer a regras de regionalização, promoção da língua portuguesa e da cultura brasileira; estímulo à produção independente e regional; por exemplo, uma vez que é uma alternativa de garantia de diversidade nacional e internacional e não apenas local". Segundo Landim, "é inconstitucional e descabida a elevação da Ancine, que é uma agência de fomento do cinema e do audiovisual, a uma agência efetivamente reguladora e fiscalizadora das atividades puramente privadas como a produção, programação e empacotamento".

Segundo a argumentação do deputado ao reclamar contra as restrições a que estrangeiros atuem na atividade de produção, a exigência de brasileiros natos ou naturalizados para exercer atividades profissionais nas programadoras com sede no Brasil deve ser suprimida, "uma vez que a Constituição Federal não autoriza a distinção entre capital nacional e estrangeiro. (…) A restrição à pessoa estrangeira de exercer atividade de programador viola o artigo 5º", diz.

Papel da Ancine

As emendas trazidas pelo deputado Paes Landim também levantam a questão da legalidade da atuação da Ancine na atividade de defesa dos interesses de crianças e adolescentes. "O tema da classificação indicativa se encontra constituicional e legalmente sistematizado, cabendo ao Ministério da Justiça exercer a classificação e, na forma do Estatuto da Criança e do Adolescente, a fiscalização pelo Judiciário, através do Juizado da Infância e da Adolescência e ao Ministério Público. Não há previsão no sistema para conferir a uma Ancine, como autarquia de fomento do cinema brasileiro, poderes de interferir com a política nacional de proteção à infância e a adolescência", diz.

Ao criticar o fato de o PL 29/2007 colocar a TV por assinatura sob as regras do Artigo 221 da Constituição, o deputado Paes Landim afirma que "o serviço não se confunde com radiodifusão", que por ser "uma alternativa de garantia de diversidade nacional e internacional, e não apenas local", não cabe falar em estímulo à produção regional e independente na TV paga e que o 221 refere-se "às empresas jornalísticas brasileiras e as de radiodifusão, em qualquer modalidade de comunicação eletrônica e não pode ser estendido a outras formas de comunicação", especialmente a serviços nitidamente de telecomunicações.

Para o deputado Régis de Oliveira, a Constituição atribui à iniciativa privada o papel fundamental da produção ou circulação de bens ou serviços, "sendo o alicerce sobre o qual se constitui a ordem econômica, ficando o Estado adstrito apenas a uma função supletiva". Ele também critica a obrigação, trazida pelo PL 29, de que a produção audiovisual esteja sujeito à prévia "fiscalização e conhecimento da Ancine", o que classifica como censura. Daí o pedido para a derrubada dos artigos 9, 10, 12, 13, 14, 21, 22, 30 e 31 do projeto.

Outras emendas trazidas são menos conceituais e mais práticas. Preveem, por exemplo, a compensação dos operadores de TV por assinatura atuais que, ao migrarem para o novo serviço de acesso condicionado, sejam obrigados a levar novos canais obrigatórios.