Ministério Público quer inventário e suspensão do novo regulamento sobre bens reversíveis

Diante das evidências de controle precário sobre os bens reversíveis sob controle das concessionárias de telefonia, o Ministério Público Federal quer que a Anatel divulgue o inventário desse patrimônio público e suspenda a tramitação do novo regulamento em discussão no órgão regulador – proposta que, em essência, permite que as empresas vendam ou substituam os bens vinculados à concessão mesmo sem o conhecimento da agência.

Em parecer datado de 13/7, o procurador da República, Marcus Marcelus Gonzaga Goulart, argumenta que as alegações da Anatel de que a lista dos bens é protegida por sigilo comercial não faz sentido – afinal, o patrimônio é da União – e que a mudança nas regras relativas a eles é "temerária ao erário", visto que uma auditoria realizada pelo próprio órgão regulador, concluída no ano passado, constatou que sobram irregularidades nesse assunto.

O MPF, assim, apoia o pedido feito à Justiça pela Proteste, em ação de maio deste ano, na qual a entidade de defesa dos consumidores requer uma cópia dos inventários dos bens e a suspensão do novo regulamento. Junta-se à fila onde também estão o Tribunal de Contas da União, esse desde 2008, e a Câmara dos Deputados, que aprovou requerimento igualmente pedindo a lista do patrimônio à Anatel.

Justiça seja feita, apesar de já ter alegado possuir "controle absoluto" sobre os bens reversíveis, a própria Anatel quer a lista também. Tanto que determinou à Oi (incluindo a fatia da Brasil Telecom) e à Embratel que realizassem um inventário do patrimônio – a Telefônica se prontificou a fazê-lo antes de ser obrigada. Deu às empresas seis meses para concluírem o trabalho, prazo que venceu no último dia 10.

A determinação da agência veio à reboque de uma auditoria, concluída no ano passado, que verificou várias irregularidades no tocante aos bens reversíveis. As empresas não mantém inventário atualizado e, mais grave, alienaram, substituíram e oneraram bens sem anuência da Anatel, o que contraria a legislação e os contratos de concessão, bem como não incluíram cláusulas de sub-rogação em contratos com terceiros. Naturalmente, tampouco depositaram os recursos provenientes das vendas em conta vinculada, como também prevê a lei.

A auditoria (Relatório 11/2010-AUD) revelou, ainda, que apesar de pelo menos cinco Processos de Apuração de Descumprimento de Obrigações (Pados) terem sido abertos sobre os problemas identificados com os bens reversíveis, somente dois foram julgados com a aplicação de multas nas concessionárias – de quase R$ 100 milhões, segundo a Superintendência de Serviços Públicos da agência -, mas estas não foram recolhidas.

Não surpreende, portanto, que o Ministério Público entenda que "o perigo de dano decorrente da negligência da Anatel em relação ao inventário dos bens reversíveis vem aumentando a cada dia". Daí, portanto, apoiar integralmente o pedido feito pela Proteste para que as listas sejam apresentadas. Além disso, sustenta o procurador que "a alteração do regulamento dos bens reversíveis, antes que a Anatel demonstre que possui o inventário de tais bens e que efetivamente os fiscaliza, constitui medida deveras temerária para o erário".

O MPF também critica o tratamento por vezes dado aos bens reversíveis e lembra o que chamou de "gracejo" do secretário-executivo do Ministério das Comunicações, Cezar Alvarez, ao mencionar a reversão ao patrimônio da União de "fusquinha 68" e "computador 386". Para o Ministério Público, tal tratamento "revela a falta de seriedade (para não dizer má-fé) com que as autoridades do setor encaram a alteração do regulamento".

Explica-se. Tratar os bens como obsoletos não omite apenas o fato de que os meios para a prestação do serviço, que é público, devem retornar à União como garantia de continuidade após o fim das concessões. Em 2025, o Estado – vale dizer, os brasileiros – vai entregar um cheque às operadoras em compensação pela modernização da infraestrutura, prevista nas regras do jogo.

Como bem colocou o deputado Hugo Motta (PMDB-PB), autor do requerimento da Câmara, "como ressarci-las se não sabemos o que tínhamos antes?" Assim entendido, não é demais lembrar que nas contas das próprias concessionárias de telefonia – que a cautela recomenda tratar como subdimensionadas -o "fusquinha" vale mais de R$ 20 bilhões.

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