Entidades propõem criação de GT sobre rádio digital

As críticas à falta de transparência nos testes e na definição do padrão para a digitalização do rádio no Brasil não se esgotaram com a Portaria 290/2010, que criou o Sistema Brasileiro de Rádio Digital. Ao contrário, sua publicação estimulou a divulgação de uma carta conjunta assinada por 11 entidades nacionais. No documento, as organizações pedem que as definições sobre o SBRD sejam tratadas como política pública fundamental para a democratização da comunicação e, como tal, seja “construída de forma amplamente democrática, ouvindo o conjunto da sociedade e garantindo ferramentas de participação popular e controle público”. A carta defende a criação de um Grupo de Trabalho do SBRD.

A Portaria 290 foi assinada pelo ex-ministro Hélio Costa em seu último dia à frente do Ministério das Comunicações. Apesar de tratar da “criação do SBRD”, o texto aponta apenas as diretrizes para a digitalização do rádio, mantendo indefinido o padrão tecnológico a ser adotado.

Para os autores da carta, a portaria aponta alguns “valores fundamentais”, mas este caráter genérico não só permite, como indica a necessidade de que é preciso mais tempo para o debate público do que será o SBRD de fato. “Não há por quê apressar esse processo. Em nenhum lugar do mundo o rádio digital está consolidado. Não há motivos para correr”, afirma Arthur William, do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social.

Na carta, as entidades alertam para o fato de que a digitalização é uma chance para a integração do rádio ao processo de convergência das mídias. Entretanto, isso só vai ocorrer se a definição tecnológica for “precedida pela definição dos modelos de serviços e de negócio, uma vez que os atuais impasses do rádio localizam-se no esgotamento dos referidos modelos”.

“A proposta agora é a constituição de um grupo de trabalho que incorpore um conjunto representativo das entidades. Isso resolve dois problemas: por um lado, o controle social por parte da sociedade civil e, por outro, a transparência por parte do governo”, afirma Orlando Guilhon, presidente da Associação das Rádios Públicas do Brasil (Arpub). A carta lembra que o govenro já havia criado um grupo para discutir a digitalização do rádio, mas que este era constituído, basicamente, por representações empresariais.

Entre as tarefas do novo GT, as entidades apontam a responsabilidade de realizar o debate das diretrizes políticas e técnicas da digitalização. Além disso, as organizações também pedem que o SBRD seja definido em lei. "Não podemos esquecer que o Congresso é um poder popular. Tornar o SBRD uma lei, chama o assunto para o Congresso e o torna política pública", diz Guilhon.

Diretrizes políticas

A carta, entretanto, sublinha a necessidade de dar diretrizes políticas claras e democratizantes ao SBRD. “O processo de escolha do padrão está ocorrendo dentro de um aspecto técnico, é preciso que ocorra também em aspecto político. A digitalização do rádio no Brasil pode proporcionar a inclusão de quem se encontra à margem da comunicação, uma melhor utilização do espectro, com a criação de novos canais e oferta de serviços agregados”, lembra Arthur William, do Intervozes.

O texto assinado pelas 11 entidades enumera algumas questões-chave a serem consideradas. Entre elas, está a manutenção da gratuidade do serviço, a melhoria da qualidade da recepção dos sinais em qualquer situação, a garantia de que os receptores tenham preço acessível e a coexistência dos padrões analógico e digital em condições iguais. Além disso, fazem algumas exigências em relação à política industrial, como a adaptabilidade do padrão ao parque técnico instalado.

A carta reforça, ainda, a necessidade da digitalização caminhar na direção da democratização do uso do espectro, com a ampliação do número de outorgas disponíveis e maior presença de rádios públicas e comunitárias. Neste cenário, seria preciso, ainda, garantir condições iguais para o processo de transição de padrão a todas as emissoras, de qualquer porte, com especial atenção às rádios comunitárias.

Tecnologias

Em relação às diretrizes técnicas, a carta conjunta aponta a necessidade de se aprofundar e dar maior publicidade aos testes que já vêm sendo realizados com alguns sistemas (o Iboc, norte-americano, e o DRM). Também defendem a necessidade de testes com outros padrões internacionais disponíveis e não deixam de citar a possibilidade de o SBRD estar apoiado em tecnologia genuinamente nacional.

“Nenhum dos recursos disponíveis atendem plenamente as necessidades brasileiras. Serão necessárias adaptações”, aponta Nélia Del Bianco, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (Intercom). Para ela, não é possível hoje tomar qualquer decisão, nem mesmo se os resultados com os padrões norte-americano e europeu já realizados tornem-se públicos. “Existem tecnologias abertas? Elas poderão ser modificadas para melhor se adequarem?”, são algumas das perguntas que a pesquisadora diz ser necessário responder.

Veja a íntegra da carta.

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