Produção de documentários dobra no Brasil, mas público se mantém em 2,5%

RIO – Os documentaristas brasileiros trabalharam dobrado no ano passado. No período da Retomada, de 1995 em diante, os documentários representaram cerca de 26% do total da produção do país. Em 2008, por exemplo, dos 77 títulos nacionais lançados, 20 eram documentários. Mas aí os equipamentos de produção e exibição baratearam, alguns programadores passaram a apostar mais no gênero, e muitos diretores acabaram se curvando ao charme de histórias (mais ou menos) reais, muitas sobre ídolos da música ou sobre esportes. A consequência foi que, dos 85 filmes nacionais que estrearam em 2009, 40 eram documentários. Ou seja: a produção chegou perto dos 50%, o melhor resultado tanto em valores percentuais quanto absolutos da História do nosso cinema. Só que, enquanto o número de filmes crescia numa ponta, a taxa de ocupação das salas se estagnava na outra. Mesmo com uma oferta maior, o público dos documentários nacionais foi de 2,5% em relação à produção brasileira. A taxa média da Retomada? 2,5%.

O melhor público de um documentário brasileiro em 2009 foi o de "Simonal – Ninguém sabe o duro que dei", de Claudio Manoel, Micael Langer e Cavito Leal, com 71,4 mil espectadores. Porém, incluindo-se os filmes de ficção, "Simonal…" surge como o 16º da lista.

“Os documentários sempre serão mercadologicamente um cinema marginal. Estão dentro do circuito do cinema de arte em qualquer lugar do mundo e nunca foram um grande negócio. Não dá para você imaginar que eles serão campeões de bilheteria”, afirma Amir Labaki, criador e diretor do É Tudo Verdade, maior festival de documentários da América Latina, cuja programação começou no Rio anteontem e segue até o próximo domingo. “No Brasil, estamos construindo para o documentário um mercado que não existia. Nos EUA, o desempenho da bilheteria do gênero também é baixo.”

Subgêneros preferidos são esporte e música

O filme "Burma VJ", de Anders Ostergaard, que foi indicado ao Oscar este ano como melhor documentário em longa-metragem, vendeu menos de sete mil ingressos nos Estados Unidos. Mesmo o vencedor do Oscar, "The cove", não teve um desempenho de blockbuster no país: foram cerca de 115 mil.

“Os documentários têm um circuito exibidor mais restrito, passam apenas em capitais. Eles também são lançados com pouquíssimas cópias, e muitos nem conseguem ser exibidos. Em geral, não há interesse dos grandes distribuidores, que se baseiam em pesquisas de consumo para tomar a decisão de distribuir ou não um título. Assim sendo, se os distribuidores não distribuem, os exibidores não exibem”, afirma Helena Sroulevich, sócia da Caribe Produções e pesquisadora do laboratório do audiovisual do Núcleo de Economia do Entretenimento da UFRJ.

Helena preparou este ano uma pesquisa, ainda inédita, sobre o desempenho dos documentários nacionais durante a Retomada. Segundo ela, dos 666 longas-metragens brasileiros exibidos entre 1995 e 2009, 178 (26,7%) foram documentários. O público total dos filmes nacionais foi de cerca de 138 milhões de espectadores no período, com pouco menos de 3,5 milhões (2,5%) para os documentários.

O trabalho de Helena também chama a atenção por apontar uma clara preferência do público quanto ao tema dos documentários nacionais. Entre os filmes lançados no gênero, 6,6% são esportivos, 11,6% são musicais e 10,5% são biográficos. Porém, olhando para a bilheteria, tudo muda: os documentários esportivos ficaram com mais de 25% dos espectadores; os musicais, com mais de 20%; e os biográficos, com 17,5%.

“Isso não é surpresa. Os brasileiros adoram música e esportes. Os filmes de surfe, por exemplo, tiveram um bom resultado. Em outros cantos do mundo, a situação é a mesma. Lembram como foi a corrida para se assistir a "This is it", o filme do último show do Michael Jackson?”,pergunta Labaki.

Porém, mesmo com a recente enxurrada de títulos musicais em 2009, o público total permaneceu em seus 2,5%, o que sugere a existência de um teto de preferência entre os espectadores de documentário.

“Ficou mais fácil captar e fazer documentários no Brasil, e muitos diretores estão indo por esse caminho. Mas nem sempre com talento, boas ideias ou um grande material. Para atingir o público de cinema, o documentário precisa trazer uma informação inédita ou polêmica, como foi o "Simonal". Quando isso não acontece, ele cai numa mesmice e entra numa disputa difícil por espaço nos cinemas”, diz Paulo Sérgio Almeida, diretor do portal de análise de mercado Filme B.

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