Sobre o debate na Argentina e a concentração da mídia

Luis Pardo, presidente da Associação Internacional de Radiodifusão (AIR), entidade de empresários que reúne representantes de rádios e televisões comerciais da América Latina, publicou, no dia 18 de maio, uma coluna de opinião no diário Clarín denominada "Não violar a liberdade de expressão".

Nessa coluna, Luis Pardo relata uma reunião realizada entre o Conselho Diretor da AIR e o Secretário Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), José Miguel Insulza, e aproveita para expressar a opinião desta organização sobre o anteprojeto de lei de serviços de comunicação audiovisual que está em discussão na Argentina.

A reunião foi celebrada no dia 4 de maio em Washington DC,  Estados Unidos, no marco das comemorações do Dia Mundial da Liberdade de Imprensa. O representante da OEA foi acompanhado pela Dra. Catalina Botero, Relatora Especial para a Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH).

Pardo menciona na nota as declarações de Insulza diante da delegação da AIR ali reunida. Segundo o presidente da AIR, "o Secretário General reconheceu importantes avanços na matéria, entre os quais se encontra a despenalização de certos delitos – como a difamação e o desacato – e a legislação, em vários países, para garantir o acesso à informação pública, ainda que tenha lamentado que nem todos os estados da região tenham tido avanços semelhantes".

Entretanto, o mais importante é o que ele não diz que disse Insulza*.

É importante justamente porque, mesmo que o Secretário Geral da OEA não tenha mencionado o anteprojeto de lei em debate na Argentina, alguns dos pontos abordados na sua intervenção têm relações estreitas com os conteúdos do mesmo. E suas afirmações adquirem um conteúdo especialmente simbólico se for levado em conta o momento e os interlocutores que tinha a sua frente.

Diante dos representantes de poderosos conglomerados midiáticos como Televisa, TV Azteca, Globo e Clarín, José Miguel Insulza falou do impacto "determinante" que a concentração dos meios de comunicação tem na restrição da liberdade de expressão.

Não era um evento acadêmico ou uma reunião de comunicadores a favor da democracia, era um encontro com os grupos mais concentrados da América Latina, aos quais ele disse que essa concentração, da qual eles são exemplo, é obstáculo fundamental para que haja uma comunicação democrática.

Após relatar aspectos centrais da agenda de liberdade de expressão regional como as agressões e assassinatos de jornalistas ou o crescente uso de mecanismos indiretos para censurar vozes críticas, Insulza afirmou que "o Estado não é a única fonte de restrições à liberdade de expressão, pois também o é, e de maneira muito determinante, a concentração da propriedade dos meios.

Quando se chega a uma circunstância desse tipo, frequentemente, as pessoas não recebem todas as perspectivas dos assuntos que lhes dizem respeito, o que por certo não contribui para a vigência efetiva da liberdade de expressão e da democracia, que implica sempre em pluralismo e diversidade".

O que tampouco disse a AIR é que Insulza agregou, citando a Corte e a Comissão Interamericana, que "os monopólios ou oligopólios da propriedade e controle dos meios de comunicação atentam gravemente contra o direito à liberdade de expressão" e que, por tanto, é "obrigação dos Estados" tomar medidas ativas para evitá-los.

De acordo com sua opinião, os Estados devem "sujeitar a propriedade e o controle dos meios a leis gerais antimonopolistas para evitar a concentração de fato ou de direito que restrinja a pluralidade e diversidade que assegurem o pleno exercício do direito à informação dos cidadãos",  assim como "a aprovação de concessões de rádio e televisão devem considerar critérios democráticos que garantam uma verdadeira igualdade de oportunidades de acesso para todos".

Para o Secretário Geral da OEA, nada menos que frente aos principais opositores às emissoras comunitárias, para que haja diversidade e pluralismo é "fundamental o reconhecimento de todas as formas de comunicação, incluindo as rádios comunitárias".

A tarefa de limitar a concentração tem como objetivo principal garantir a liberdade de expressão, não a afetar. É justamente o contrário do que defende a AIR. Aqueles que defendem seus interesses concentrados com o discurso do chamado "jornalismo independente" são os que atentam, na prática, contra a liberdade de expressão.

É obrigação dos Estados tomar medidas para impedir que se limite a diversidade e o pluralismo na mídia, condição indispensável para um exercício efetivo da liberdade de expressão de todas as pessoas e não de somente uns poucos grupos econômicos.

Ernesto Lamas é Coordenador Regional da Asociación Mundial de Radios Comunitarias – América Latina y Caribe, AMARC ALC. Gustavo Gómez é diretor do Programa de Legislaciones y Derecho a la Comunicación, AMARC-ALC.

Tradução: Gustavo Machala

* Discurso del Secretario General de la OEA, José Miguel Insulza, “La Libertad de Expresión en las Américas”, AIR, Washington, 4 de mayo. Ver comunicado de prensa enhttp://www.oas.org/OASpage/press_releases/press_release.asp?sCodigo=C-157/09)

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