Cervejarias doaram R$ 2 mi a deputados; representantes de TVs admitem lobby

Praticamente um em cada cinco deputados federais está ligado a empresas com interesses contrários à regulamentação da publicidade de cerveja. Dos 513 parlamentares, 87 têm concessões de rádio e televisão e/ou receberam doações de campanha da indústria de bebidas e de comunicação.

Nesta semana, o projeto que restringe a propaganda de bebidas com baixo teor alcoólico, inclusive a cerveja, entre as 6h e as 21h em rádio e televisão, foi retirado da pauta de votações da Câmara, a pedido do governo, após resistência de líderes partidários.

Há mais de um mês, representantes da indústria de cerveja e de emissoras de rádio e TV vão ao Congresso quase diariamente para fazer lobby pela derrubada da proposta -bandeira do ministro José Gomes Temporão (Saúde).

Levantamento feito pela Folha a partir de dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) mostra que 33 deputados eleitos tiveram parte da campanha eleitoral de 2006 financiada pela indústria de cerveja. Eles receberam R$ 2.130.120.

As maiores doadoras foram a Schincariol e a Fratelli Vita, controlada pela AmBev, dona de marcas como Brahma e Antarctica. No ano passado, o PT também recebeu R$ 375 mil da cervejaria Petrópolis.

Ao menos seis deputados receberam doações de empresas de rádio e televisão. O valor recebido é menor: R$ 23.695. Além disso, segundo a ONG Transparência Brasil, 57 parlamentares detêm concessões de rádio e televisão.

Entre eles, estão dois líderes partidários, cujas orientações, em tese, têm de ser seguidas pela bancada. Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) comanda a maior bancada da Câmara, com 89 deputados. Ele detém concessões em Jardim do Seridó, João Câmara, Mossoró e Natal (RN). Luciano Castro, líder do PR, também tem concessão em Boa Vista (RR). A lista de donos de concessões não inclui o líder do DEM Antônio Carlos Magalhães Neto (BA), cuja família é dona da TV Bahia.

Segundo a Abert (Associação Brasileira de Rádio e Televisão), que tem como associadas as principais emissoras, a empresas de cerveja estão entre os quatro maiores anunciantes da televisão e entre os dez maiores do rádio.

Representantes de TVs admitem lobby

Representantes das emissoras de televisão admitem ter feito lobby no Congresso para o adiamento da votação do projeto que restringe a propaganda de cerveja. Os deputados, por sua vez, negam ter sucumbido a interesses econômicos.

"A Abert conversou com lideranças tentando mostrar que precisamos de mais conversas. A nossa posição é que a publicidade não é a responsável pela dezena de acidentes que acontecem", disse o diretor da Abert, Flávio Cavalcanti Júnior. Ele disse que conversou no último mês com líderes partidários e com os "principais deputados". É "natural", diz.

A Schincariol não quis comentar o assunto. A AmBev não se manifestou.

O líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves, diz que o fato de ter concessões de radiodifusão no Rio Grande do Norte não influenciou a sua posição favorável ao adiamento da votação nem irá interferir no seu voto.

Por outro lado, ele diz que é contra a proposta do governo, ainda que defenda mudanças na lei. "Acho um exagero. Podemos achar maneiras de conciliar, porque tem muitos eventos patrocinados por essa área, e isso não é culpa das tragédias que vemos nas estradas."

A Folha também procurou os seis deputados com mais doações da indústria de cerveja em 2006. Paulo Renato Souza (PSDB-SP), que recebeu R$ 80 mil da Fratelli Vita -controlada pela AmBev- diz que "não vende idéia e sempre votou de acordo com suas convicções".

Olavo Calheiros (PMDB-AL) não quis falar. A assessoria do deputado João Paulo Cunha disse que ele estava incomunicável no interior. Também procurados no final da tarde, Renildo Calheiros, Alexandre Santos e Carlos Alberto Leréia não foram localizados.

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