Organizações apresentam propostas para gestão mundial da Internet

Entre os dias 12 e 15 de novembro acontece no Rio de Janeiro a segunda edição do Fórum de Governança da Internet (IGF), criado pela ONU para debater temas e modelos relacionados à governança da Internet, em seus aspectos político, econômico, tecnológico e social. O IGF, que foi criado durante a segunda Cúpula Mundial da Sociedade da Informação (CMSI) em 2005, teve sua primeira edição realizada em Atenas, em 2006.

Após se reunirem em dois seminários nos meses de julho e setembro, diversas organizações da sociedade civil divulgaram um manifesto pré-IGF, no qual defendem, entre outras questões, que o Fórum deve garantir a promoção de padrões abertos “como condição para a autodeterminação tecnológica dos povos” e a internacionalização da ICANN (Internet Corporation for Assigned Names and Numbers), agência que atualmente define as políticas para a Internet e é controlada pelos Estados Unidos. Além disso, o documento exige o pleno respeito ao direito à liberdade de expressão “sem prévio controle” e ressalta a importância do direito à privacidade ser garantido na rede. Assinado pela Associação Software Livre, Intervozes, Ibase e Rede de Informações para o Terceiro Setor (RITS), entre outras entidades, o documento foi encaminhado ao Itamaraty e a outros ministérios do governo federal.

Segundo os pesquisadores e ativistas envolvidos na redação do manifesto, a internacionalização da ICANN é fundamental para que a gestão mundial da Internet fique livre da influência de interesses comerciais, governamentais e do Departamento de Comércio dos Estados Unidos, ao qual é hoje subordinada, e passe a ser gerida em nível internacional, por múltiplos Estados e atores, inclusive com a participação dos usuários da rede e da sociedade civil. Já a defesa dos padrões abertos se faz sob os argumentos da universalização dos conteúdos, garantindo a interoperabilidade, ou seja, que o conhecimento não fique atrelado a um formato definido por uma determinada empresa.

Para Gustavo Gindre, membro do Intervozes e do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.Br), a intenção é “internacionalizar a ICANN, mas mantê-la cuidando apenas do registro de nomes e domínios”. Dessa forma, a regulamentação política da rede ficaria a cargo da UIT (União Internacional das Telecomunicações), mas, segundo Gindre, esta também teria que ser reformulada, já que hoje é controlada pelos interesses das empresas multinacionais de telecomunicação.

Possíveis avanços

Outra questão levantada pelo manifesto é a defesa da neutralidade da rede, para garantir que a privacidade do usuário não seja violada nem que uma empresa possa utilizar-se de tecnologia para prejudicar seus concorrentes. “Violar a neutralidade da rede tem dois objetivos: político e econômico. No caso político se dá através da espionagem, no econômico se obtém vantagens na concorrência”, afirma Gindre. Ele cita o exemplo da Brasil Telecom, que sabotava a qualidade do Skype (software que é uma espécie de telefone que funciona pela Internet) para que seus clientes não deixassem de fazer chamadas em DDD ou DDI.

“Os possíveis avanços do Fórum relacionam-se à garantia de maior participação social e à inclusão, nas recomendações finais do IGF, de questões que de fato levem em conta as necessidades reais da sociedade” opina Alessandro Octaviani, pesquisador em direito e desenvolvimento pela Fundação Getúlio Vargas e também signatário do manifesto. Para ele, o acesso à informação e ao conhecimento é fator chave para o desenvolvimento. “Um IGF bem conduzido representa um avanço para a construção coletiva e colaborativa de políticas de governança global relativas à Internet”, afirma o pesquisador.

A programação do IGF gira em torno de cinco eixos: Acesso, Abertura, Diversidade, Segurança e Recursos Críticos, que serão desenvolvidos através de diferentes modalidades de debate, como painéis, workshops e as coalizões dinâmicas – grupos de discussão com representantes de governos e da sociedade civil, e que se estendem para além dos dias em que se realiza o Fórum. “Desta forma, ao invés de ser um encontro de diplomatas, é um encontro de pessoas e de necessidades” afirma Octaviani. “O IGF está sendo estruturado de uma forma que permite a realização de reuniões e simpósios paralelos às reuniões principais, o que possibilita o intercâmbio de experiências e de soluções adotadas em diversos paises”, conclui.    

Segundo Seiiti Arata Jr., membro do secretariado do IGF no escritório das Nações Unidas em Genebra, o IGF não é uma nova organização internacional, nem tem o mandato para tomar decisões, mas pode colaborar na formação de opinião pública e gerar impacto nos processos de tomada de decisão em outras instâncias. "O que muitos desejam, incluindo o Brasil, é uma maior força para o IGF, deixando de ser uma plataforma de diálogo para se tornar uma fonte de recomendações", defende Arata.

Para Gustavo Gindre, “a grande batalha é saber para que serve o IGF: governos e iniciativa privada querem esvaziar seu caráter político e torná-lo um espaço de capacitação, mas o futuro da Internet é que vai ser o grande debate”. Em relação à terceira rodada do IGF, que acontecerá em 2008 na Índia,  Gindre afirma que o governo indiano já sinalizou que no ano que vem “não vai colocar o dedo na ferida. Ou seja, se as coisas não andarem no Rio de Janeiro, dificilmente vão andar em Déli”.

Governo e sociedade civil

Em reunião realizada no Itamaraty  no dia 2 de outubro,  o Ministério da Cultura, juntamente com o Ministério das Relações Exteriores, elaborou o texto “Elementos para a posição do governo brasileiro sobre governança na Internet” (http://www.cultura.gov.br/blogs/igf/?p=40). O texto, que é definido como “preliminar” e “em elaboração”, diz não representar posição oficial do governo brasileiro, apresenta consonância com o manifesto das entidades da sociedade civil, especialmente em pontos como a necessidade de participação democrática de todos setores numa gestão multilateral e transparente da Internet e de discussão dos custos de interconexão internacional.

Clique aqui para ter acesso ao manifesto.

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